Introdução
Este estado de conhecimento foi realizado no ano de 2019, por pesquisadora do Núcleo de Educação Popular Paulo Freire (NEP) e do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGED), da Universidade do Estado do Pará (UEPA).
Compreende-se o estado de conhecimento como “o estudo que aborda apenas um setor das publicações sobre o tema estudado” (ROMANOWSKI; ENS, 2006, p. 40). No caso, periódicos contidos no site da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e na internet.
Esta investigação faz parte de uma pesquisa mais ampla, financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e vinculada à Rede Internacional Luso-brasileira de pesquisa em educação e formação de professores de jovens e adultos, intitulada: “Fundamentos e autores recorrentes do campo da educação de jovens e adultos no Brasil: a construção de um glossário eletrônico”, sob a coordenação da Profª Drª Maria Hermínia Lage Fernandes Laffin da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Integram esta pesquisa as seguintes instituições: Universidade de Coimbra (UC), Universidade do Minho (UMinho), Universidade Federal de Goiás (UFG), Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Universidade do Estado do Pará (UEPA), Instituto Federal do Espírito Santo (IFES), Universidade Federal do Alagoas (UFAL), Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Universidade Federal do Paraná (UFPR), Universidade Federal Fluminense (UFF), Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) e Universidade Federal do Acre (UFAC).
O objetivo deste estudo é analisar o levantamento de artigos científicos de periódicos nacionais que tratam da interface entre a Educação de Jovens e Adultos (EJA) e a Educação do Campo.
Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, cuja sistematização e a análise dos dados foram realizadas por meio de categorizações, tendo por base técnicas da Análise de Conteúdo de Bardin (2002). Utiliza-se como recursos o uso de quadros, que auxiliaram na sistematização e categorização para análise dos dados.
Lüdke e André (1986, p. 48) destacam que as categorizações possibilitam desvelar “mensagens implícitas, dimensões contraditórias e temas sistematicamente ‘silenciados’”.
A organização do texto foi efetivada por meio de categorias temáticas, que:
[...] constituem o que denominamos de indicadores de análise, ou seja, fatores, aspectos, elementos do fato ou situação em estudo, que são classificados e reunidos em eixos ou unidades temáticas a partir e com os dados coletados. Essas unidades temáticas podem ser subdivididas para facilitar a organização dos dados (OLIVEIRA, I.; MOTA NETO, 2011, p. 164).
O levantamento dos periódicos foi realizado via internet, na Plataforma da CAPES de Periódicos, por meio do descritor Educação de Jovens e Adultos e Educação do Campo, considerando existir uma interface entre os dois campos de saber.
O que o Movimento de Educação do Campo visa, desde 1998, quando se realizou, no Brasil, a Conferência Nacional por uma Educação Básica do Campo é a garantia do direito de todos (as) à educação, tendo como referência as especificidades históricas e socioculturais da população que vive do e no campo.
No campo, significa que o povo tem direito a ser educado no lugar onde vive e do campo, porque “o povo tem direito a uma educação pensada desde o seu lugar e com a sua participação, vinculada à sua cultura e às suas necessidades humanas e sociais” (CALDART, 2002, p. 26).
Na educação do campo, historicamente, não é considerada a relação trabalho-educação do campo e existe uma separação entre cidade e campo expressa por meio de um paradigma escolar urbanocêntrico, que não leva em conta as especificidades da população que vive do e no campo. Por isso, o Movimento de Educação do Campo defende uma educação que supere “a oposição entre campo e cidade e a visão predominante de que o moderno e mais avançado é sempre o urbano, e que o progresso do país se mede pela diminuição de sua população rural” (CONFERÊNCIA NACIONAL..., 2004, p. 7).
No campo encontram-se vários sujeitos, entre os quais os da educação de jovens e adultos, que na perspectiva da educação do campo, precisam ser olhados como sujeitos de direitos e respeitada a sua situação de sujeitos de conhecimento e de cultura.
Para Caldart (2004) a educação do campo pressupõe que as pessoas que trabalham no campo, se organizem e assumam a condição de sujeitos sociais, bem como o trabalho e a cultura são matrizes pedagógicas na educação do campo. Isto significa serem os homens e mulheres do campo sujeitos de seu conhecimento e ações sociais, devendo ser valorizado o seu trabalho no campo, bem como os seus saberes e práticas culturais.
Essa questão está relacionada à Educação de Jovens e Adultos porque esses jovens e adultos precisam ser reconhecidos como sujeitos e valorizados no processo educacional seus saberes culturais e suas práticas de trabalho social, como pessoas que vivem do e no campo.
Para Caldart (2004, p. 34) a educação do campo:
[...] além de se preocupar com o cultivo da identidade cultural camponesa, precisa recuperar os veios da educação dos grandes valores humanos e sociais: emancipação, justiça, igualdade, liberdade, respeito à diversidade, bem como reconstruir nas novas gerações o valor da utopia e do engajamento pessoal a causas coletivas, humanas.
Assim, a população de jovens e adultos que vivem no campo precisa ter uma educação que respeite sua identidade cultural do campo e proporcione a justiça social e o exercício ético-político da cidadania, mantendo a luta pela garantia de todos/as à educação pública e de qualidade social.
Neste artigo apresentam-se inicialmente as informações gerais sobre os periódicos de Educação de Jovens e Adultos e Educação do Campo e, posteriormente: as estratégias metodológicas; os objetivos dos estudos; os temas e objetos de estudo; as palavras-chave; os referenciais teóricos e as categorias de análise dos artigos analisados. Por fim, os debates sobre a EJA e a Educação do Campo à luz dos artigos pesquisados.
Informações gerais sobre os periódicos de Educação de Jovens e Adultos e Educação do Campo
No total foram identificados 8 artigos, mas um foi descartado porque não se referia especificamente à Educação de Jovens e Adultos e sim à Educação do Campo. Por isso, foram somente analisados 7 (sete) artigos (Quadro 1).
A identificação de apenas 7 (sete) artigos que fazem a interface com a educação de jovens e adultos evidencia ser uma temática muito pouco trabalhada pelos pesquisadores. Encontram-se mais artigos voltados para a Educação de Jovens e Adultos ou para a Educação do Campo.
Nº | Título dos artigos | Autor(es) | Universidade | Periódicos | Edição | Ano |
---|---|---|---|---|---|---|
01 | Formação de educadores de jovens e adultos do campo: quase tudo por fazer | Marlene Ribeiro | Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) | Perspectiva (Florianópolis) | v. 31 n. 2 |
2013 |
02 | Educação de jovens e adultos e educação do campo: políticas públicas e os sentidos do direito à educação | Edna Castro de Oliveira; Custódio Jovêncio Barbosa Filho |
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) | Inter-Ação (Goiânia) | v. 36 n. 2. |
2011 |
03 | Estudo bibliométrico sobre educação do campo para jovens e adultos deficientes | Taísa Grasiela Gomes Liduenha Gonçalves; Maria Cristina Piumbato Innocentini Hayashi |
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) | Série-Estudos (Campo Grande, MS) |
n. 38 | 2014 |
04 | Ressignificando a alfabetização de jovens e adultos no Brasil a partir dos movimentos sociais do campo | Célio Alves Espíndola | Universidade Federal da Bahia (UFBA) | Revista da Faced (Salvador, BA) |
n. 10 | 2006 |
05 | A educação de jovens e adultos em áreas de reforma agrária: desafios da formação de educadores do campo |
Lourdes Helena da Silva; Vânia Aparecida Costa; Walquíria Miranda Rosa |
Universidade Federal de Viçosa (UFV) Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) |
Revista Brasileira de Educação (ANPED-Rio de Janeiro) |
v. 16 n. 46 |
2011 |
06 | Juventudes, Educação do Campo e Formação Técnica: um estudo de caso no IFMT | Ronaldo Eustáquio Feitoza Senra; Michèle Tomoko Sato; Geison Jader Mello; Arnaldo Gonçalves de Campos |
Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT) Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) |
Educação & Realidade (Porto Alegre) |
v. 42 n. 2 |
2017 |
07 | Educação do e no campo: problematizações acerca do currículo escolar e das políticas educacionais | Reginaldo Peixoto; Márcio de Oliveira; Eliane Rose Maio |
Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) Universidade Estadual de Maringá (UEM) |
Revista de Educação Popular (Uberlândia) | v. 15 n. 2 |
2016 |
FONTE: A autora (2020), a partir de informações dos Sites dos periódicos.
As produções correspondem ao período de 2006 a 2017, sendo encontradas duas produções no ano de 2011, os demais anos, 2017, 2016, 2014, 2013 e 2006 tiveram apenas uma produção (Quadro 2). Esse período evidencia ser uma produção recente e pouco estudada. É importante destacar que a busca das produções se deu pelo descritor “Educação de Jovens e Adultos e Educação do Campo” e não pelo recorte temporal. Desta forma, o período emergiu no processo de análise das produções.
Ano | Quantidade |
---|---|
2017 | 01 |
2016 | 01 |
2014 | 01 |
2013 | 01 |
2011 | 02 |
2006 | 01 |
FONTE: A autora (2020), a partir de informações dos Sites dos periódicos.
Os autores são constituídos por 9 mulheres e 7 homens e estão vinculados às seguintes Instituições: Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Universidade Estadual de Maringá (UEM) - Região Sul; Universidade Federal do Espírito Santo (UFES); Universidade Federal de São Carlos (UFSCar); Universidade Federal de Viçosa (UFV); Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) e Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) - Região Sudeste; Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT) e Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) - Região Centro-Oeste; e Universidade Federal da Bahia (UFBA) - Região Nordeste. Assim a única região não contemplada foi a região Norte, que evidencia uma assimetria regional.
Todos os periódicos analisados possuíam apenas uma produção sobre o tema em estudo. Esses periódicos estão localizados na região Sudeste, Sul, Nordeste e Centro-Oeste. Não foi encontrado artigos em periódicos na região Norte. O escopo de todos os periódicos é da área da educação (Quadro 3).
Periódico | Local | Escopo |
---|---|---|
Perspectiva | Florianópolis | Educação |
Inter-Ação | Goiânia | Educação |
Série-Estudos | Campo Grande | Educação |
Revista da Faced - Entreideias | Salvador | Educação |
Revista Brasileira de Educação | Rio de Janeiro | Educação |
Educação & Realidade | Porto Alegre | Educação |
Revista de Educação Popular | Uberlândia | Educação |
FONTE: A autora (2020), a partir de informações dos Sites dos periódicos.
As estratégias metodológicas dos artigos pesquisados
Nos estudos realizados predomina a pesquisa bibliográfica, seguida do estudo de caso, sendo um etnográfico. Entre as técnicas nas pesquisas de campo foram mencionados: o grupo focal, a análise documental, a observação in loco e participante, a aplicação de questionário e de entrevistas semiestruturadas e visitas in loco. Apenas um artigo destacou ter realizado análise de conteúdo de Bardin e outro ter efetivado a Bibliometria, que permite analisar a produção científica de uma área de conhecimento ou tema específico a ser investigado (Quadro 4).
Nº | Metodologia | Técnicas |
---|---|---|
01 | Pesquisa bibliográfica | - |
02 | Estudo de caso | Grupo focal Análise documental Observação in loco |
03 | Pesquisa bibliográfica | Bibliometria |
04 | Pesquisa bibliográfica | - |
05 | Pesquisa de campo qualitativa | Questionários Entrevistas semiestruturadas Análise de conteúdo de Bardin |
06 | Estudo de caso etnográfico | observação participante visitas in loco |
07 | Pesquisa bibliográfica | - |
FONTE: A autora (2020), a partir de informações dos Sites dos periódicos.
Objetivos dos estudos analisados
Ribeiro (2013) objetiva no estudo analisar as três temáticas: educação de jovens e adultos, formação de educadores e educação do campo, cada uma com as suas especificidades que precisam ser articuladas na unidade de formação de educadores de EJA do campo.
Edna de Oliveira e Custódio Barbosa Filho (2011) visam explorar aproximações entre a educação de jovens e adultos (EJA) e a educação do campo, como campos de conhecimento em construção, e de lutas que integram os jovens e adultos trabalhadores a quem têm sido negadas as condições para a efetivação do direito à educação.
Gonçalves e Hayashi (2014) focam o estudo na produção científica acadêmica brasileira sobre a Educação do Campo (EC) e a Educação de Jovens e Adultos (EJA) como subsídio para estabelecer a relação com a Educação Especial (EE) visando reconhecer a existência de pesquisas que retratem a preocupação da escolarização de jovens e adultos do campo com deficiência.
Espíndola (2006) por meio de uma retrospectiva histórica, analisa como se deu a relação entre os programas de alfabetização de adultos e alfabetizandos desde os anos 60 a 2006.
Silva, Costa e Rosa (2011) analisam os resultados do Programa de Estudos Educação de Jovens e Adultos em Áreas de Reforma Agrária em Minas Gerais, tendo por foco: os processos educativos gestados no Projeto “Educação, Campo e Consciência Cidadã”, de maneira que evidencie conquistas, demandas e desafios enfrentados pelos sujeitos da EJA nos processos formativos vivenciados.
Senra et al. (2017) descrevem o processo de certificação da qualificação profissional que envolve diretamente a juventude camponesa.
E, por fim, Reginaldo Peixoto, Márcio de Oliveira e Eliane Maio (2016) discutem o currículo para as escolas do e no campo, ou seja, para as escolas que hoje, no Brasil, são pensadas para crianças, jovens e adultos, que estão ligados à educação da terra.
Temas e Objetos de Estudo
Entre os temas de estudos sobressai o de políticas públicas com o estudo de questões que envolvem: o direito à educação, programas/projetos de alfabetização e currículo. Há dois estudos sobre a produção acadêmica e um sobre formação e destaca-se o que trata de pessoas com deficiência, por realizar a interface entre a Educação de Jovens e Adultos, Educação do Campo e a Educação Especial.
Ressalta-se entre os objetos de estudo o Programa Projovem Campo Saberes da Terra e o Projeto “Educação, Campo e Consciência Cidadã, que trabalham a educação de jovens e adultos na perspectiva da educação do campo.
Nº | Tema | Objeto de estudo |
---|---|---|
01 | Formação de educadores de jovens e adultos do campo | Produção acadêmica |
02 | Políticas públicas e o direito à educação | Programa Projovem Campo Saberes da Terra |
03 | Escolarização de jovens e adultos do campo com deficiência. | Produção acadêmica |
04 | Alfabetização | Programas de alfabetização de jovens e adultos |
05 | Programa de Estudos Educação de Jovens e Adultos em Áreas de Reforma Agrária | Projeto “Educação, Campo e Consciência Cidadã” |
06 | Juventude e formação técnica | Projovem Campo: saberes e fazeres da terra |
07 | Curículo escolar e políticas educacionais | Políticas educacionais |
FONTE: A autora (2020), a partir de informações dos Sites dos periódicos.
Palavras-chave dos artigos pesquisados
Entre as palavras-chave a maioria destacou a Educação de Jovens e Adultos e a Educação do Campo. Somente em dois artigos é mencionado apenas a Educação do Campo, tendo um destacado a juventude. Em um artigo é mencionada a formação de professores e em outro a qualificação profissional.
Nº | Palavras-chave |
---|---|
01 | Educação de Jovens e Adultos. Formação de professores. Educação do campo. |
02 | Educação de jovens e adultos. Educação do campo. Políticas públicas. |
03 | Educação Especial. Educação do Campo. EJA. Bibliometria. |
04 | Educação de Jovens e Adultos. Alfabetização. Letramento. Movimentos Sociais do Campo. |
05 | Educação de Jovens e Adultos. Formação de educadores de EJA. Projeto “Educação, Campo e Consciência Cidadã”. |
06 | Juventude. Qualificação Social e Profissional. Educação do Campo. |
07 | Educação do e no Campo. Currículo. Diversidade Cultural. Formação de Professores/as. |
FONTE: A autora (2020), a partir de informações dos Sites dos periódicos.
Referenciais teóricos dos periódicos analisados
Os principais referenciais mencionados nos periódicos pesquisados destacam-se no campo da Educação de Jovens e Adultos: Maria Clara Di Pierro, Mariângela Graciano, Osmar Fávero, Maria Margarida Machado, Sonia Maria Rummert, Luiz Eduardo Wanderley, Sonia Meire Santos Azevedo de Jesus, Joana Célia dos Passos, Vera Maria Massagão Ribeiro e Jaqueline Moll. E na Educação do Campo e Movimentos Sociais: Roseli Caldart, Miguel Arroyo, Maria da Glória Gohn e Mônica Castagna Molina.
Os autores mais mencionados foram Paulo Freire e Vanilda Pereira Paiva, seguidos de Miguel Arroyo, Roseli Caldart e Sonia Maria Rummert.
Esse referencial aponta existir coerência nos referenciais estudados, seja na Educação de Jovens e Adultos e na Educação do Campo.
Paulo Freire por ser base teórica da Alfabetização de Jovens e Adultos e também ser visto por alguns autores como referencial também da educação do campo, não poderia deixar de estar presente nos estudos realizados. As principais obras citadas de Paulo Freire foram: “Educação como prática da liberdade”, “Pedagogia do oprimido”, “Educação e mudança” e “Que-fazer teoria e prática em educação popular”. A presença de Vanilda Paiva está relacionada à questão da Educação de Jovem e Adulto na perspectiva da educação popular. A referência foi a um único livro, “Educação popular e Educação de Adultos”.
Categorias de análise dos artigos analisados
Nos artigos analisados identificamos 8 categorias: práxis, sendo mencionada em três artigos, exclusão da escola, exclusão na escola, educação, educação do campo, também mencionada em dois artigos, bibliométrica, relação entre os saberes e currículo. Apenas uma apresenta categoria metodológica, a análise bibliométrica, as demais se configuram como categorias analíticas, que tem por base determinado referencial teórico, sendo utilizadas nas análises dos dados na pesquisa. (Quadro 7).
Nº | Principais Categorias |
---|---|
01 | Práxis e relação entre os saberes |
02 | Exclusão da escola e exclusão na escola |
03 | Bibliométrica |
04 | Educação |
05 | Educação do campo e práxis |
06 | Práxis |
07 | Educação do campo e currículo |
FONTE: A autora (2020), a partir de informações dos Sites dos periódicos.
A Práxis e a Relação entre os saberes tem por base a Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire.
Embasada na experiência e obra do educador Paulo Freire (1981), de que destaco a Pedagogia do Oprimido, a articulação trabalho-educação, na educação do campo, parte da experiência de vida e da cultura dos agricultores para chegar à escola, sendo confrontadas - experiência e cultura - com os conhecimentos histórico e socialmente produzidos sobre o tema abordado em aula. A síntese que resulta dessa troca entre os saberes e os conhecimentos vai permitir uma intervenção qualificada sobre a realidade, tornando-se práxis, transformando-a, portanto. (RIBEIRO, 2013, p. 498-499, grifo nosso).
A práxis tem o sentido de reflexão-ação, teoria e prática, no sentido de possibilitar a transformação social.
A exclusão da escola e exclusão na escola são categorias desdobradas do conceito de exclusão.
[...] a noção de exclusão desdobrada nas categorias exclusão da escola e exclusão na escola [pode] dar unidade teórica a toda uma série de fenômenos correntemente conhecidos como não acesso à escola, evasão, reprovação e repetência [...]. A exclusão escolar na forma de exclusão da escola compreende tanto o não acesso à escola quanto o que [...] se denomina evasão da escola (FERRARI, 1999 apudOLIVEIRA, E.; BARBOSA FILHO, 2011, p. 425, grifo nosso).
A categoria bibliométrica apresenta-se como um método de estudo.
“A análise bibliométrica é um método flexível para avaliar a tipologia, a quantidade e a qualidade das fontes de informação citadas em pesquisas” e ressaltam que “o produto da análise bibliométrica são os indicadores científicos dessa produção” (SILVA, HAYASHI, C.; HAYASHI, M., 2011apudGONÇALVES; HAYASHI, 2014, p. 132, grifo nosso).
A categoria educação é entendida como processo de desenvolvimento do ser humano. Nesta perspectiva no processo educacional deve-se partir do próprio ser humano, buscando estratégias para se perceber seus desejos, suas expectativas, suas angústias e necessidades como um todo (ESPÍNDOLA, 2006).
A educação do campo se configura em duas dimensões: marca de identidade do campo, e ligada aos movimentos sociais e aos sujeitos do campo.
A expressão educação do campo, mais que uma simples mudança de nomenclatura - rural para campo - constituiu um dos traços marcantes da identidade de um movimento nacional construído com a mobilização da população do campo (SILVA; COSTA; ROSA, 2011, p. 150, grifo nosso).
Educação do campo trata-se de uma educação dos e não para os sujeitos do campo. Feita sim através de políticas públicas, mas construídas com os próprios sujeitos dos direitos que as exigem [...] identifica uma reflexão pedagógica que nasce das diversas práticas de educação desenvolvidas no campo e ou pelos sujeitos do campo (CALDART, 2002, p. 18, 22).
Por fim, a categoria currículo com conceito mais amplo do que os conteúdos escolares, considerando a filosofia e as práticas educacionais.
Currículo não como um rol de conteúdos, mas como o produto de uma filosofia educacional em que as práticas pedagógicas são pensadas como ações para a emancipação humana (ou não) (PEIXOTO; OLIVEIRA, M.; MAIO, 2016, p. 79, grifo nosso).
Os debates sobre a EJA e a Educação do Campo à luz dos artigos
Nesta seção apresentam-se os principais resultados dos artigos analisados, tomando-se como referência a interface entre a EJA e a educação do campo e as especificidades do objeto de cada estudo realizado.
Política da EJA, Educação do Campo, a Alfabetização e o Currículo
Edna de Oliveira e Custódio Barbosa Filho (2011) analisam que a educação do campo em interface com a EJA desafiam as políticas sociais, no sentido de responder às demandas de sujeitos que, no campo e na cidade, permanecem à margem do exercício da cidadania, não tendo acesso aos seus direitos sociais.
Os autores apontam alguns desafios do estudo entre os quais a avaliação e a qualificação profissional que coloca em questão a qualificação social e profissional no estado pesquisado.
Edna de Oliveira e Custódio Barbosa Filho (2011) destacam a importância da estratégia da pedagogia da alternância, no projeto pesquisado, o Projovem Campo Saberes da Terra, mas apontam como dificuldades que:
[...] os sujeitos que efetivamente buscaram o programa constituíram grupos diversos de camponeses em atividades agrícolas, em grande parte meeiros e assalariados e outros que não trabalham em atividades agrícolas. Umas das grandes dificuldades identificadas para o exercício da organização do tempo-escola e do tempo-comunidade e para o desenvolvimento dos planos de pesquisa foi a não vinculação dos educandos(as) a unidades familiares agrícolas que lhes permitissem a experimentação com a terra (OLIVEIRA, E.; BARBOSA FILHO, 2011, p. 427).
Apesar das dificuldades, houve por parte dos educadores do Programa a recriação do tempo-comunidade, sendo construídos espaços apropriados - como o da horta na escola - em articulação com a comunidade e a gestão da escola, com vistas a desenvolver o plano de pesquisa no tempo-comunidade, na perspectiva da qualificação social e profissional.
Assim, os autores avaliam em relação ao programa pesquisado, que responde às expectativas e alimenta novas realizações, na medida em que visa sua ampliação para o ensino médio.
Espíndola (2006) analisa que a prática da educação do campo tem sido discutida na área da educação, sendo, sobretudo, destacadas as dificuldades do ensino e sua inadequação ao contexto sociocultural a que se destina. O ensino idealizado e proposto pelas áreas urbanas é o que tem sido aplicado, sem nenhuma adaptação para o meio rural, nem considerando a realidade do campo, o que apresenta como consequência, o insucesso escolar.
Assim, a educação do campo deve ter como ponto central as especificidades inerentes aos sujeitos e ao ambiente do campo, superando o quadro de exclusão e de desigualdades, da população do campo.
O autor destaca que o campo carece ainda de outras propostas, além das que estão sendo implantadas, para que de que de fato assuma a identidade do campo. Explica que a educação precisa ter como sustentação valores que tenham os seres humanos como centro da proposta educacional, bem como ser reconhecida por práxis pedagógicas voltadas para o campo, mediadas pelas diversas reflexões teóricas e que atente para os problemas vivenciados por homens e mulheres do campo.
Desta forma, faz-se necessária a criação de estratégias que visem à alfabetização, na concepção proposta por autores como Freire, Soares, Gohn, entre outros garantindo uma educação com qualidade social.
Levanta o autor a questão: como fazer essa educação? Compreende ser necessário que os programas de alfabetização de adultos contemplem as necessidades das pessoas analfabetas adultas, as concepções de educação para a cidadania, propostas pelos Movimentos Sociais e as propostas de educação do campo.
O Projeto analisado por Silva, Costa e Rosa (2011) é o da Educação, Campo e Consciência Cidadã. O estudo revela que formação dos grupos de EJA, os enfrentamentos vivenciados coletivamente e a materialidade da sala de aula, têm se mostrado como espaços e processos importantes na sustentação do direito desses sujeitos à alfabetização e escolarização.
As autoras apontam algumas dificuldades entre as quais: as exigências próprias do mundo do trabalho; as atividades produtivas intensificadas no período de colheita ou plantio; as distâncias de suas moradias; as locomoções oriundas da idade avançada, da falta de meios de transportes, além da precariedade de condições das estradas, principalmente nos períodos de chuva. Destacam, ainda, situações como: os educandos vivenciarem processos de despejo; de transformação do acampamento em assentamento; de adaptação à nova moradia que, pelas distâncias de outras casas e de convivência comunitária, dificultam a presença em sala de aula, entre outras.
As autoras ressaltam a importância do projeto analisado porque se constitui em lócus privilegiado de realização dos processos de alfabetização e escolarização dos educandos, bem como a sala de aula assume um significado de conquista de direito, simbolizando a certeza de que por meio da organização e da luta se torna possível efetivar os direitos.
A sala de aula favorece um novo vigor na realidade do campo ao estimular os moradores a trocarem experiências, dialogarem sobre a vida, os problemas da localidade, do município etc. que se constituem em processos educativos.
Silva, Costa e Rosa (2011) apontam como desafios do Projeto Educação, Campo e Consciência Cidadã, em relação à interface de suas ações na educação de jovens e adultos com a educação do campo:
a) a educação de jovens e adultos se efetivar como direito dos povos do campo e como parte das lutas e das conquistas de direitos que têm como protagonistas os movimentos sociais e sindicais. A EJA, neste aspecto, constitui um instrumento importante de enfrentamento e de afirmação de ações e de políticas educativas que incluam os sujeitos do campo na busca de valorização de sua história, cultura e cidadania;
b) a problematização da dimensão política da educação, por meio de práticas educativas emancipatórias, capazes de priorizar a relação entre educação e cultura. A construção de uma educação de jovens e adultos exige um diálogo efetivo com a educação do campo, compartilhando reflexões e práxis, deslocando o olhar de uma educação de jovens e adultos urbanizada para a EJA do campo;
c) a necessidade de avançarmos em pesquisas e produções acadêmicas que dialoguem e articulem busquem os dois campos, assumindo a interface entre educação de jovens e adultos e a educação do campo.
Reginaldo Peixoto, Márcio de Oliveira e Eliane Maio (2016) discutem acerca dos principais aspectos da educação do e no campo, como o currículo, os sujeitos sociais e as políticas educacionais que dialogam com as práticas pedagógicas e a formação de professores.
Ao discutir o currículo compreendem que a sua construção ocorre com a participação de todos os sujeitos: pais, mães, responsáveis, alunos, movimentos sociais, pois a participação é essencial para uma escola emancipatória e de qualidade, que traduza a cultura e o modo de viver desses sujeitos.
Nesse sentido, a educação do e no campo deve ser pensada a partir das práticas sociais, históricas e culturais do seu povo, respeitando a diversidade de etnias e culturas existentes. Por isso, o conteúdo científico, bem como o cultural, precisam estar articulados superando os conhecimentos escolares tradicionalmente mantidos pelos livros didáticos e pelos currículos vigentes no Brasil.
Os autores trazem para debate a política educacional para as escolas do campo, que devem considerar a condição de trabalho e a formação dos professores. Apontam para a necessidade de uma formação inicial e continuada que vá ao encontro da realidade do campo e dos seus sujeitos.
Formação de Professores e Qualificação profissional
Ribeiro (2013) ao focar para o estudo da formação de professores aponta a carência de políticas para a Educação de Jovens e Adultos e denuncia o histórico descomprometimento do Estado com a EJA que explicam a inexistência de uma formação específica para essa modalidade de categoria profissional. Retrata a situação precária de atuação dos docentes em classes de EJA nos cursos noturnos com turmas do ensino regular para complementar a carga horária, bem como a rotatividade em razão da ausência de concursos públicos para o preenchimento de vagas. Os baixos salários e as precárias condições de trabalho não são atrativos aos profissionais para buscarem qualificação profissional.
A autora ainda explica que o campo é reconhecido como o lugar do outro, pela diversidade de populações e culturas que nele habitam, e também pelo preconceito em relação ao camponês e ao trabalho com o qual ele se sustenta. Isso explica o fato de não se ter uma política consistente para a formação de educadores do campo. Por isso, a reivindicação do movimento de educação do campo é a da formação de educadores do campo e no campo, cuja formação precisa incluir o conhecimento a respeito da situação histórica da terra, com debate de questões que focalizem as tensões e conflitos que envolvem o latifúndio, o agronegócio, a agricultura familiar, entre outros.
Ribeiro (2013) destaca que a prioridade da formação de jovens e adultos que vivem no campo associa-se, diretamente, a uma formação qualificada de educadores que sejam identificados com a educação do campo. Explica que:
[...] não basta ter escolas no campo, é necessário que elas se tornem, efetivamente, do campo, incorporando as demandas dos movimentos sociais que lutam pela terra de trabalho, orientados por uma proposta popular de desenvolvimento em que estejam articuladas as instâncias sociais, econômicas e culturais (RIBEIRO, 2013, p. 497-498).
Assim, não se trata apenas de formar indivíduos para uma determinada área do ensino ou mesmo de conteúdos, métodos e disciplinas, há necessidade de considerar os princípios e as finalidades que sustentam a formação do educador do campo que é constituinte de um sujeito histórico coletivo. A formação de educadores do campo, então, precisa estar engajada no contexto histórico e cultural dos sujeitos do campo.
Senra et al. (2017) analisam o Projeto Projovem Campo: saberes e fazeres da terra do Campus São Vicente/IFMT, que compreende serem os sujeitos do campo possuidores de conhecimentos e saberes significativos, que devem ser valorizados e dialogados com o conhecimento científico acumulado pela humanidade.
Os autores destacam entre os desafios do projeto que a execução e gestão do programa estão a todo o tempo em correlações de forças entre o estado e a sociedade.
O Projeto foi além dos aparatos burocráticos para a concretude de uma Educação do Campo ao viabilizarem que muitos jovens e adultos continuassem seus estudos, passassem em concursos públicos, se apropriassem das cooperativas e associações de produção rural familiar, repensando o projeto de desenvolvimento de cada comunidade, assentamento e território camponês.
Os autores ressaltam que o projeto se apropriou de concepções e princípios de uma Educação do Campo emancipatória e transformadora e no processo educativo respeitou os tempos de aprendizado dos educandos. Assim, ao considerar o tempo-escola e tempo-comunidade contribuiu para que os educandos do campo concluíssem os estudos e tivessem uma educação significativa.
A Senra et al. (2017) explicam que os educandos apesar de relatarem a preferência pela parte prática das aulas reconhecem a importância da conexão entre a teoria e a prática, que ocorre no desenrolar dos eixos temáticos, o que possibilitou a identificação dos mesmos com o processo educativo.
Interface da EJA e Educação do Campo com a Educação Especial
Gonçalves e Hayashi (2014) ressaltam que apesar de as políticas públicas fazerem referência ao direito à educação para jovens e adultos com deficiência que vivem no campo, essa realidade ainda é pouco discutida nas produções científicas acadêmicas brasileiras. Consideram que as produções analisadas constituem ponto de partida para as diferentes situações enfrentadas na construção de uma Educação de Jovens e Adultos para pessoas com deficiência que vivem em áreas rurais.
As autoras apontam a necessidade de pesquisas que envolvam a questão da escolarização da pessoa jovem e adulta com deficiência, por existir lacuna de estudos sobre a aquisição do conhecimento para pessoas com diferentes situações de deficiência.
Assim, é urgente que as pesquisas acadêmicas rompam com o silêncio e problematizem as dificuldades enfrentadas por jovens e adultos com deficiência que vivem no campo, em relação ao direito à educação, à escola e ao atendimento educacional especializado.
Considerações Finais
A pesquisa revela que são poucos os periódicos que tratam a interface entre a Educação de Jovens e Adultos e a Educação do Campo, apesar de estarem relacionados ao se olhar para a população da EJA que vive no campo.
A produção é recente, iniciada em 2006, mas elaborada de 2011 a 2017, o que evidencia ser um tema ainda pouco estudado.
Os periódicos contemplam a maioria das regiões do Brasil com exceção da região Norte, que apesar ter um trabalho significativo de pesquisas na educação do campo e na alfabetização de jovens e adultos, não aparece em produções de periódicos elaborando a interface entre os dois campos de saber.
A assimetria regional também aparece entre os autores, não tendo representante da região norte. Predomina as mulheres nos estudos pesquisados.
Todos os periódicos são da educação, o que evidencia a importância desta área para o debate da temática em estudo.
O tema de maior destaque é a política educacional, mas os outros temas também são relevantes: a alfabetização e a formação de professores que são nós críticos seja na educação de jovens e adultos como na educação do campo. A interface entre a Educação de Jovens e Adultos, Educação do Campo e Educação Especial também hoje se torna fundamental e necessária pela demanda da população deficiente da EJA e que vive no campo.
Na metodologia predomina a pesquisa bibliográfica, mas na pesquisa de campo há uma diversidade de técnicas utilizadas, sendo valorizadas as entrevistas e a observação. Tanto as palavras-chave quanto as referências apresentadas nos artigos são pertinentes ao estudo realizado. Destaca-se a presença de Paulo Freire como uma das principais referências nesta interface entre a EJA e a Educação do Campo.
Identificaram-se 8 categorias na análise dos dados nos artigos pesquisados, sendo apenas uma com dimensão metodológica.
Os principais resultados dos estudos pesquisados apontam para a necessidade da interação entre a educação de jovens e adultos e a educação do campo, tendo os sujeitos do campo e seu contexto cultural o ponto de referência desta educação, superando o paradigma filosófico e curricular vigente urbanocêntrico.
Educação direcionada à emancipação crítica e política dos sujeitos do campo, engajada politicamente com a luta pelo direito de todos à educação com qualidade social e, por isso articulada aos movimentos sociais. Educação que modifique tanto as práticas pedagógicas, o currículo e a formação de professores e de qualificação profissional e social, sendo voltada para os homens e mulheres do campo como os principais atores sociais.