Introdução
No movimento de constituição e organização da educação brasileira, evidenciam-se os diálogos transnacionais que possibilitaram a circulação de ideias e de sujeitos, de projetos, de materiais e práticas de ensino. Ana Chrystina Mignot e José Gondra (2007) situam a existência desse fenômeno desde a colônia, passando pelo Império, e enfatizam que os anos 20 e 30 do século XX foram marcados pelas tentativas de transformação da educação, tomando como exemplo as experiências realizadas no estrangeiro.
Dentre as estratégias utilizadas pelos educadores e reformadores do período, os autores destacam o espaço de divulgação das obras publicadas no exterior e das traduções, as missões de professores para observar escolas e sistemas de ensino, bem como as iniciativas para trazer educadores ao Brasil. Essas estratégias tinham como objetivo conhecer e se aproximar do novo, do diferente, do avançado, “do que havia de mais moderno em termos de educação” (MIGNOT; GONDRA, 2007, p. 08).
Nessa perspectiva, consideramos que estudar o movimento da Escola Nova no Brasil nas primeiras décadas do século XX, pode conduzir o pesquisador a variar a escala na pesquisa, transitando do nacional para o internacional, uma vez que se reconhece a Educação Nova como uma temática discutida e explorada internacionalmente. Conforme apreendemos a partir de Revel (1998, p. 38), a variação da escala pode permitir “passar de uma história para outra (e, por que não, para várias outras)”.
Assim, partimos da compreensão de uma história transnacional da educação1 que, para Struck, Ferris e Revel (2011), reflete a convicção de que processos históricos e sociais não podem ser apreendidos exclusivamente dentro de espaços costumeiros e delineados, como estados, nações, impérios ou regiões.
Rabelo e Vidal (2021) apontam que como parte de um movimento internacional pela educação nova foram criadas associações e instituições com feições internacionais nas primeiras décadas do século XX. Entre essas instituições, destacamos o Instituto Jean Jacques Rousseau (IJJR) de Genebra, Suíça. Sob o título de École des Sciences de l´Education, o Instituto foi criado no ano de 1912 pelo psicólogo e médico suíço Edouard Claparède (1873-1940). A escolha do nome do instituto, realizada pelo seu fundador, buscava homenagear o segundo centenário de nascimento de Rousseau, filósofo com importantes contribuições para o campo educacional.
O Instituto foi criado com o objetivo de promover novos horizontes e práticas para a educação em perspectivas modernas, ativas ou novas, conferindo-lhe um caráter científico. A defesa pela difusão de uma ciência pedagógica, pautada nos estudos da Psicologia experimental e da infância, nortearam as ações do Instituto que atuava, principalmente, por meio da formação de professores. Seus cursos de formação receberam estudantes e visitantes de diversos países, inclusive brasileiros, que a partir de suas viagens à Suíça, tinham o interesse de se aproximar daqueles que eram considerados pedagogos modernos, bem como de suas ideias e práticas.
Nessa perspectiva, este artigo tem como intuito investigar os vestígios das redes construídas entre o Instituto Jean Jacques Rousseau e intelectuais2 da educação brasileira, desde a sua criação até meados da década de 1930. Nosso interesse por esse recorte diz respeito à efervescência das ideias ligadas à Escola Nova no período no Brasil e da atuação do Instituto no sentido de promover a circulação de ideias e práticas pedagógicas.
Buscamos, assim, responder aos seguintes questionamentos: quais eram as informações noticiadas sobre o Instituto no Brasil? Existem menções aos brasileiros que realizaram viagens pedagógicas com destino ao Instituto? Quem são eles? Por outro lado, intelectuais vinculados ao IJJR estiveram no Brasil, qual espaço esse fato ocupou na imprensa e quem eram eles?
A partir desse objetivo, adotamos como fontes principais os jornais e as revistas disponibilizados na Hemeroteca Digital Brasileira3. Nas fontes hemerográficas, buscamos distinguir pistas que nos auxiliem a identificar os sujeitos, as instituições, as viagens e outros acontecimentos. Para tanto, nosso aporte teórico e metodológico baseia-se nas contribuições de diferentes autores. Carlo Ginzburg (2007) orienta-nos a partir do método indiciário; Mignot e Gondra (2007), Jean Houssaye (2007) ajudam-nos a discutir as viagens pedagógicas; Fuchs (2007), Roldán Vera e Fuchs (2021), Vidal e Rabelo (2020) e Rabelo e Vidal (2021) oferecem subsídios importantes para a compreensão das redes transnacionais entre outros.
Destacamos que a atuação do Instituto buscava a construção de uma rede de educadores de vários países do mundo no intuito da disseminação de um movimento internacional de transformação da educação, associado ao movimento da Escola Nova. A partir da análise do conceito exposto por Fuchs (2007), ressaltamos tratar-se de uma rede transnacional, criada a partir de estruturas institucionais com o objetivo de permitir trocas e transferências, informações, práticas, técnicas e ideias que operaram em diferentes espaços e criaram múltiplas identidades. Diante disso, nos dedicamos, na seção seguinte, à caracterização do IJJR.
O Instituto Jean Jacques Rousseau
A história do Instituto Jean Jacques Rousseau remete à trajetória de seu fundador Édouard Claparède (1873-1940), formado pela Faculdade de Medicina de Genebra (1897) e que se dedicou ao campo da psicologia, seguindo os passos de seu primo Théodore Flournoy (1854-1920). Flournoy foi o criador da extraordinária cadeira de Psicologia Experimental na Faculdade de Ciências de Genebra, e Claparède tornou-se assistente em seu laboratório de psicologia em 1900, iniciando assim o seu caminho na área (BOVET, 1932). Claparède publicou diversas obras, dentre as quais destacam-se seus livros Psicologia da criança e Psicologia experimental, publicado inicialmente em 1905 e que contou com várias revisões; e a Educação Funcional de 1931.
Segundo Martine Ruchat (2008), a ideia da criação de um Instituto de ciências da educação começa a tomar forma a partir de 1911. A partir do exposto pela autora, apreendemos que desde a sua idealização, o Instituto se constituiria como um espaço da Educação Nova, em que a psicologia teria um papel fundamental na transformação da educação. Este último aspecto é ressaltado por Claparède (1912, p. 20); para ele, “a psicologia [...] poderia fornecer à pedagogia uma base realmente científica”4, especialmente, enquanto uma ciência experimental, cujos métodos já começavam a ser introduzidos na educação5 e que se mostrava frutífera.
Assim, o Instituto Jean Jacques Rousseau começou a funcionar em outubro de 1912, na cidade de Genebra, Suíça, com o nome em homenagem ao bicentenário de nascimento do filósofo e cidadão daquela cidade. De acordo com Hofstetter (2012), a ambição do Claparède era a criação de um instituto que combinasse pesquisa, treinamento, documentação e propaganda em favor da educação.
Essas dimensões são elencadas pelo intelectual em seu texto Un institut des sciences de l´éducation et les besoins auxquels il répond publicado em 1912. Nesse sentido, Claparède apresenta o papel do IJJR como um Institut psycho-pédagogique que seria, em primeiro lugar, uma escola, mas que congregaria outras funções. O projeto envolveria a publicação de um periódico voltado para a discussão de questões relativas à educação, a edificação de uma biblioteca especializada e de um museu escolar. Ao apresentar o que deveria vir a ser o instituto, Claparède aponta que a criação do IJJR contribuiria com a resolução de duas lacunas na educação: a da preparação psicológica e pedológica insuficiente dos educadores e a da falta de ações para garantir o progresso e o desenvolvimento da ciência da educação6 (CLAPARÈDE, 1912).
Para a direção do instituto, Claparède convidou Pierre Bovet (1878-1965), então professor de filosofia na Faculdade de Letras de Neuchâtel. Bovet também foi o editor do periódico publicado pelo Instituto L’Intermédiaire des Educateurs que passou a circular também a partir de outubro de 1912.
Vidal e Rabelo (2020, p. 17) apresentam o Instituto como uma “instituição com ambição internacional e pautada pelo desejo de renovação educacional [que] espraiava sua atuação e envolvia estudantes estrangeiros”. Localizado na Place de la Taconerrie, 5, o Instituto atraiu para os primeiros semestres de funcionamento, entre 1912 e 1913, trinta e dois estudantes de diversos países. Além de suíços, havia homens e mulheres vindos da Rússia, Romênia, Bélgica, Estados Unidos, Portugal, Espanha, Países Baixos, Ásia Menor, Grécia, Alemanha, Polônia, Palestina e Brasil. O nome do brasileiro Francisco Lins aparece como estudante matriculado para o semestre de verão naquela turma (IJJR, 1913).
O programa geral do curso fornece informações detalhadas sobre a organização do curso em seus primeiros anos. As disciplinas do programa seriam divididas em um ciclo de quatro semestres. Os semestres funcionariam de forma semelhante ao da Universidade de Genebra: com um semestre de inverno, de 22 de outubro a 22 de março, e um de verão, de 6 de abril a 6 julho. O primeiro programa era dividido em três partes: L’Enfant, l’Education, L’Enseignement (a criança, a educação e o ensino), com a divisão das matérias que compunham cada seção e a síntese dos principais conteúdos. Sobre esse programa, Bovet (1932, p. 20) menciona que este “não parava de assustar nossos amigos”, devido à complexidade e extensão das matérias.7
A formação oferecida era destinada a alunos maiores de dezoito anos, sem a exigência de um diploma específico, mas que demonstrassem possuir “cultura suficiente”. Os candidatos deveriam apresentar seu pedido de admissão no curso acompanhado de uma carta na qual indicariam seu currículo e a carreira a qual se destinavam. O comitê diretor propunha um plano de estudos para cada aluno, de acordo com seus desejos e aptidões. Além das aulas, o Instituto promovia conferências, reuniões e excursões e estimulavam os alunos a desenvolverem experiências e pesquisas, enfatizando que o Instituto era também um centro de pesquisa.
O IJJR assumia como símbolo a figura de uma criança ao lado de um adulto, representando um mestre e seu aluno. Enquanto a criança está em pé, o adulto está sentado e, embora o adulto esteja em primeiro plano, a imagem centra-se na figura da criança que aponta para a janela. Enquanto o adulto tem a sua frente um livro, o aluno parece ser atraído para algo que está fora do ambiente em que se encontram e o olhar do professor acompanha o olhar do aluno. A imagem reflete elementos da filosofia do Instituto, o conhecimento científico atrelado ao reconhecimento da importância das experiências, do contato com a natureza e da percepção de que a criança deve estar no centro da educação. Consoante com esse pensamento, Bovet (1932) destaca que o lema oficial do instituto - em latim, discat a puero magister - expressava a necessidade de o professor aprender a partir do contato com o seu aluno.
Coerente com essa proposta, a partir de novembro de 1913, foi implantada a Maison des Petits, escola de aplicação do Instituto. A história da escola remete a realização de um curso prático sobre o método Montessori, ministrado por Teresina Bontempi no Instituto. Inicialmente, foi alugada uma grande sala que passou a receber vinte alunos, número que aumentou nos anos seguintes, fazendo com que fossem necessários novos professores e a aquisição de um espaço maior.
Hofstetter (2012, p. 88), apresenta o IJJR como “capital da escola ativa e da educação nova” e acrescenta que “nos anos pós-guerra, a instituição se destacou no cenário internacional como uma encruzilhada para a educação nova”8. Para a autora, foi a partir dos escritos de Ferrière sobre a escola ativa que se propagou a nova concepção de infância e de educação.
O IJJR - que funcionou, inicialmente, como instituição independente - passa a integrar a Faculdade de Ciências e de Letras da Universidade de Genebra em 1929 e o programa geral de 1930 destaca que o seu caráter internacional teria atraído estudantes de mais de quarenta países. Nesse sentido, ressalta-se ainda a relação do Instituto com a Ligue Internationale pour l´Éducation Nouvelle (LIGUE) e o Bureau International d´Éducation (BIE).
A LIGUE foi criada a partir do Congresso de Calais, no ano de 1921, considerado o primeiro Congresso Internacional da Educação Nova. A revista Pour l´Ére Nouvelle - edição francesa de responsabilidade da Liga, sob a direção de Adolphe Ferrière -, em seu primeiro número de janeiro de 1922, apresenta a criação da Liga como fruto da iniciativa da New Education Fellowship (RABELO; VIDAL, 2021) e do Bureau International des Ecoles Nouvelles.9
O BIE, por sua vez, foi fundado no ano de 1925 pelo próprio Instituto e teve como primeiro diretor Pierre Bovet. De acordo com Bovet (1932), desde 1912, Claparède já planejava a sua criação. Vidal e Rabelo (2020, p. 18) afirmam que o propósito do BIE era “estimular a cooperação intelectual, a solidariedade internacional e a renovação educacional”. Ainda de acordo com as autoras, foi a atuação do BIE que viabilizou a realização do Congresso da NEF/LIEN de Locarno10 no ano de 1927.
Situado no entrecruzamento das redes de instituições, organizações e sujeitos, o IJJR passou por transformações ao longo dos anos de sua existência e, após integrar a Universidade de Genebra em 1929, tornou-se Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação em 1975. Seu caráter internacional permitiu que diversos educadores, de diferentes países, participassem de seus cursos de formação, ao mesmo tempo em que intencionava que suas ideias e práticas circulassem para além das fronteiras suíças. E mais, além de Claparède e Bovet, outros nomes relevantes para a educação internacional, à época, eram vinculados ao Instituto, a exemplo de Adolphe Ferrière e Jean Piaget.
Nessa perspectiva, realizamos nossa pesquisa a partir da abordagem transnacional, destacando as interações internacionais viabilizadas e as redes de educadores construídas (ROLDÁN VERA; FUCHS, 2021). Nos tópicos seguintes, buscamos encontrar e compreender alguns dos vestígios das relações construídas com o Brasil nas primeiras décadas do século XX, nos dois sentidos da travessia.
Daqui para lá: educadores Brasileiros no Instituto Jean Jacques Rousseau
Com o intuito de alcançar o nosso objetivo neste estudo, procedemos inicialmente a realização da pesquisa na Hemeroteca Digital Brasileira. Utilizamos como recorte temporal o período entre 1910 e 1940, uma vez que o repositório permite a pesquisa em intervalos de 10 anos. Os descritores pesquisados foram: Instituto Jean Jacques Rousseau e Instituto Rousseau.
Antes de nos dedicarmos à apresentação dos resultados encontrados, precisamos evidenciar que reconhecemos as limitações e as potencialidades do uso de fontes provenientes de repositórios digitais para a pesquisa e escrita da história. (AZEVEDO; PESSOA; MEDEIROS NETA, 2019). A pesquisa em repositórios digitais exige dedicação, tempo e atenção, mas demanda um tempo infinitamente inferior ao que seria destinado a visita de acervos presenciais, ao folhear com cuidado os jornais em busca dos vestígios desejados.
Notadamente, a possibilidade do acesso a fontes localizadas em diferentes estados e países, sem a necessidade de deslocamento, viabiliza a construção de um número maior de pesquisas e provocam nos pesquisadores novas perguntas e novos modos de fazer história. Por outro lado, como afirmam Brasil e Nascimento (2020, p. 203), embora o trabalho do historiador diante do arquivo digital deva exigir o mesmo rigor metodológico, “esse cuidado muitas vezes é escamoteado ante a profusão de fontes, a agilidade da busca, a velocidade do acesso e a facilidade do armazenamento”.
Outro aspecto que precisa ser considerado na pesquisa a partir de repositórios digitais que contam com programas de identificação11 de caracteres é que estes podem conter erros. Nem sempre os descritores utilizados serão identificados nas fontes, fornecendo a totalidade das ocorrências reais. Esta, sem dúvida, é uma das principais limitações da pesquisa que realizamos. Entretanto, os resultados encontrados configuram-se como pistas relevantes para o alcance de nosso objetivo.
Ainda nessa perspectiva, assumimos a necessidade de problematizar o uso da imprensa como fonte histórica, tomando-a como parcial e fragmentada. Nicolete e Almeida (2017, p. 207) ressaltam que, diante da imprensa periódica, “resta aos historiadores se equilibrar numa inconsútil rede de aspirações e conspirações para reconstruir os estilhaços e os fragmentos de um espelho partido, buscando se aproximar do real”. Nesse sentido, destacamos que nossa pesquisa é norteada pelo paradigma indiciário, uma vez que os dados se configuram como pistas que permitem ao pesquisador encontrar conexões e remontar a realidade da qual não seria possível um conhecimento direto (GINZBURG, 2007).
Assim, na primeira década de funcionamento do Instituto, escassas foram as informações encontradas na Hemeroteca. Apenas nos Archivos Brasileiros de Psychiatria, Neurologia e Medicina Legal do Rio de Janeiro (1913) identificamos o seguinte texto
Escola das Sciencias da Educação (Instituto J. J. Rousseau) Genère
Fundado por Ed. Claparede e S. Bonet começou a funccionar de 21 de outubro de 1912 a 21 de Outubro de 1913 o primeiro anno do curso de Sciencias de Educação na Suissa. A Escola recebe alunos de ambos os sexos, maiores de 18 annos, uma vez que provem preparo prévio e aptidões para o estudo, devendo os candidatos, no acto da inscripção, além da taxa da matricula, apresentarem attestado de idoneidade moral e designarem a carreira especial a que se destinam. Segundo o aproveitamento e aulas frequentadas os discípulos poderão obter simples certificados ou um diploma. O Instituto se propõe a ser, além de uma escola, um centro de pesquizas e informações, formando para tal uma bibliotheca, um laboratório e uma revista pedológica (ARCHIVOS BRASILEIROS ...,1913, p. 151-152).
O texto que integrava uma seção intitulada “Revista das Revistas” e assinado por Plínio Olinto, trazia ainda informações sobre a organização do curso e as disciplinas a serem lecionadas. A partir da organização da seção, conclui-se que os dados apresentados podem ter sido extraídos de uma revista a qual o autor do texto teve acesso, embora este não faça uma menção direta. A ausência de informações na imprensa brasileira sobre o Instituto no período pode estar relacionada ao fato de que ocorria na Europa, entre os anos de 1914 e 1918, a Primeira Guerra Mundial o que pode ter dificultado a circulação de informações.
Embora não tenhamos encontrado na Hemeroteca indícios da viagem de brasileiros ao Instituto nesse período, além dos documentos do Instituto, a pesquisa desenvolvida por Santos (2020) traz importantes contribuições acerca da temática. A autora investigou a viagem oficial do educador mineiro Francisco Lins à Europa no período de 1911 a 1917. Francisco Lins participou da primeira turma do Instituto, sendo o único brasileiro entre outros estrangeiros. Entre as fontes utilizadas pela autora em sua pesquisa, destacam-se periódicos que não se encontram disponíveis no repositório da Biblioteca Nacional, a exemplo do Jornal do Comércio de Minas Gerais.
A partir da década de 1920, identificamos mais informações que apontam para as viagens tanto de brasileiros para estudar e conhecer o Instituto, quanto as de professores do Instituto ao Brasil. Do mesmo modo, encontramos indícios da relação do Instituto com o Brasil associada a atuação junto a Liga das Nações que também possuía sua sede em Genebra. Assim, entre os anos de 1922 e 1923, notícias veiculadas em jornal do Rio de Janeiro e de Pernambuco referem-se a Conferência Internacional de Esperanto, convocada pelo Instituto e sediada na Liga, para a qual o Brasil foi convidado.
O Jornal “Diário de Pernambuco” de 06 de abril de 1922, apresentava na seção Telegrammas “Congresso de Esperanto - Rio, 5 - O ‘Instituto Jean Jacques Rousseau’, na Suissa, convidou o Brasil a fazer-se representar no Congresso de professores de esperanto a reunir-se em Genebra, no dia 18 do corrente” (DIÁRIO DE PERNAMBUCO, 1922, p. 1). O Jornal “O Imparcial” do Rio de Janeiro, por sua vez, em edição do dia 19 de abril de 1923, ilustra, em sua primeira capa a notícia sobre o 7º Congresso Brasileiro de Esperanto com representantes do governo e dos estados. A reportagem cita o incentivo oferecido pela Liga das Nações e a recomendação pela disseminação do ensino do Esperanto por todos os países e que a Conferência realizada no ano anterior teria sido convocada pelo Instituto contando com a participação de 28 países, entre eles, o Brasil.
O período entre guerras foi permeado por novas ideias pedagógicas associadas com um movimento pacifista. Conforme apontado por Carvalho (2007, p. 278), é possível compreender o movimento internacional de difusão da educação nova como um movimento pacifista “que apostava no poder de uma nova educação na formação de um novo homem e na construção de uma nova sociedade”. Nessa perspectiva, é possível compreender o entrelaçamento das ações do Instituto e da Liga das Nações. Acrescenta-se ainda a Ligue Internationale pour l´Éducation Nouvelle, uma vez que essas instituições compartilhavam o mesmo espaço (Genebra) e se voltavam para o campo da educação com finalidades semelhantes (RABELO; VIDAL, 2021).
Ao abordar o discurso por uma educação internacional articulada com a Liga das Nações, Roldán Vera e Fuchs (2021) corroboram com essa análise, ao acentuar que “a principal tarefa da educação internacional e das relações internacionais que a sustentavam consistia em educar as próximas gerações no espírito de paz e harmonia entre os povos” (ROLDÁN VERA; FUCHS, 2021, p.05).
Nos anos seguintes, as menções sobre o Instituto presentes na imprensa brasileira centravam-se nas ações de intelectuais brasileiros e estrangeiros. Assim, ocupa destaque nas páginas dos jornais do Rio de Janeiro a viagem da educadora Laura Jacobina Lacombe (MIGNOT, 2017) para estudar no Instituto. O Jornal do Brasil, de 05 de abril de 1925, traz uma notícia intitulada “Curso Jacobina”12, na qual aponta que a escola feminina
[...] resolveu enviar este anno a Europa uma de suas directoras, a jovem professora, senhorita Laura Lacombe, para acompanhar nos meses de inverno em Genebra, os cursos do Instituto J. J. Rousseau em Genebra, que é hoje sem contestação o centro do movimento chamado “educação activa”, destinado a transformar no mundo inteiro a mentalidade dos professores e dos alumnos das novas gerações (CURSO JACOBINA, 05/04/1925, p. 13).
A notícia menciona ainda que a professora teria levado consigo uma carta de apresentação do Diretor de Instrução Pública do Rio de Janeiro, Antônio Carneiro Leão. Em seu retorno, previsto para maio do mesmo ano, Laura Lacombe deveria vir acompanhada de uma ex-aluna do Instituto para integrar o corpo docente da Escola Jacobina. Entretanto, não encontramos indícios que este último dado se efetivou. Sobre o retorno da educadora, o Jornal Correio da Manhã (26/05/1925, p. 05) apontava que a sua chegada estava prevista para o dia 05 de junho do mesmo ano. A partir de sua volta, a educadora realizou conferências também noticiadas pela imprensa, a exemplo da realizada no dia 09 de julho, na Escola Politécnica, a convite da Associação Brasileira de Educação apresentando o trabalho intitulado “Observação sobre o ensino na Suissa” (JORNAL DO BRASIL, 07/07/1925, p. 11).
Outra brasileira, Antônia Ribeiro de Castro Lopes, professora da Escola Normal de Campos, Rio de Janeiro, também teve o Instituto como destino13 em 1930. No Jornal Correio da Manhã (RJ), de 01 de agosto de 1931, encontramos o texto, assinado pela educadora, intitulado Bureau Internacional de Educação (1931, p. 3), em que aponta que “seria uma manifestação egoística se não desse publicidade das vantagens que auferi no curso do Bureau Internacional de Educação, em Genebra, como participante que delle fui em 1930”.
A partir do seu relato, evidencia-se a relação do BIE com o Instituto, bem como compreende-se, do exposto por Rabelo e Vidal (2021), que a criação do BIE contribuiu para consolidar as redes construídas e as ambições internacionais do Instituto. Ao apresentar algumas informações sobre a instituição e sobre o curso, Antônia Ribeiro acrescenta
Compareceram ao curso do anno passado 89 representantes de 18 paízes, predominando os ingleses e alemães. Representavam a Asia 2 chinezes e [ilegível] índio; a América 2 norte-americanos e 1 brasileiro: a modesta signatária dessas linhas, que depois de longos annos de trabalho e economia, realizou finalmente o seu sonho - fazer nas aulas do professor Clapárede, no Instituto J. J. Rousseau, em Genebra, o aperfeiçoamento de seus estudos pedagógicos (BUREAU INTERNACIONAL..., 01/08/1931, p. 03).
Nesse sentido, Mignot (2007, p. 257) aponta que “o Instituto Jean-Jacques Rousseau exercia um fascínio todo especial sobre os educadores brasileiros, nas décadas de 1920 e 1930”. Houssaye (2007, p. 305), por sua vez, aponta o Instituto como epicentro do movimento da Educação Nova e Genebra como a “Meca da pedagogia”. Assim, compreendemos a escolha dessas educadoras em suas viagens à Suíça, bem como o interesse que despertavam os seus relatos em seu retorno.
De lá para lá: educadores do Instituto Jean Jacques Rousseau no Brasil
As menções e os relatos de brasileiros como viajantes e estudantes no Instituto respondem, em parte, os questionamentos que suscitaram a construção de pesquisa. Resta-nos, ainda, identificar intelectuais que percorreram itinerários semelhantes, mas no outro sentido da travessia. Desse modo, seguindo os mesmos critérios de pesquisa já enunciados, identificamos nas fontes disponíveis na Hemeroteca, informações sobre a visita e atuação de educadores relacionados ao Instituto no Brasil.
Maria Helena Bastos (2019) realiza um estudo semelhante ao que nos propomos neste trabalho. A autora, ao investigar a circulação de brasileiros no Centre Internacional d’Études Pédagogiques/CIEP, em Sèvres/França, também se volta para a presença de professores do CIEP no Brasil. Embora o recorte do trabalho de Bastos difira do nosso, uma vez que contempla o período de 1945 a 1971, é possível observar similitudes.
O estudo se refere à uma instituição criada a partir da perspectiva da internacionalização, com o objetivo de promover pesquisas e formação de professores, acolhendo professores de vários países, entres estes, brasileiros. Observa-se ainda a intenção de reformar os métodos pedagógicos por meio das classes nouvelles e a presença da psicologia da criança. A autora aponta a circulação de modelos pedagógicos entre Brasil e França. Tomando como exemplo o estudo desenvolvido por Bastos (2019), destacamos a relevância de pensarmos os movimentos de renovação educacionais brasileiros, que compreendam a circulação dos sujeitos a partir da perspectiva transnacional.
Nesse sentido, evidenciamos que, em fevereiro de 1929, houve a divulgação, em jornais do Rio de Janeiro e de Minas Gerais sobre a chegada de uma “embaixada pedagógica” para atuar em Belo Horizonte. As reportagens (Figuras 1, 2 e 3) referem-se à contratação de uma equipe de professores estrangeiros para atuar na Escola de Aperfeiçoamento de Belo Horizonte. Entre as contratações, destacam-se os professores vinculados ao Instituto de Genebra: Léon Walther, Louise Artus Perrelet e Hélène Antipoff (RUCHAT, 2008; CAMPOS, 2010). De acordo com estes jornais, a comitiva teria sido organizada pelo Dr. Alberto Álvares, oficial de gabinete do então secretário do interior de Minas Gerais, Francisco Luiz da Silva Campos.
Sobretudo a reportagem da figura 3, aponta para o delineamento das redes de instituições e de intelectuais: temos a ABE, o IJJR, o BIE, a Escola de Aperfeiçoamento, os educadores brasileiros e os estrangeiros -entre esses alguns foram também alunos do Instituto. Destacamos ainda a centralidade da estratégia das viagens pedagógicas como promotora dessa trama.
Vale destacar a relação que esses professores contratados tinham com o Instituto. A professora Louise Artus Perrelet integrou o primeiro grupo de professores do IJJR. Apresentada como professora das Escolas Secundárias de Genebra, lecionava “desenho a serviço da educação” no Instituto. Léon Walther é citado como aluno em 1914 por Bovet (1932) e consta como professor responsável pelo curso de orientação profissional no programa de 1922, e de tecnopsicologia14, estudo psicológico da organização do trabalho industrial, no programa de 1924-1925. Hélène Antipoff, por sua vez, fez parte da primeira turma do Instituto e, como aluna, ficou responsável pela educação das crianças na Maison des Petits. Antipoff retorna ao Instituto em 1925, como assistente do laboratório de psicologia e atuando como professora.
A partir da pesquisa, observamos que estes professores não apenas atuaram junto a escola da capital mineira. Léon Walter, por exemplo, é mencionado diversas vezes como convidado para ministrar conferências sobre temas diversos. Em 22 de fevereiro de 1929, na sede da ABE, o professor realizou a palestra sobre A obra do Bureau Internacional d´Éducation (JORNAL DO BRASIL, 23/02/1929). Em 14 de setembro de 1929, a convite da Associação Brasileira de Educação Profissional, falou sobre “Orientação Profissional” na Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro (CORREIO DA MANHÃ, 14/09/1929).
Durante o mês de agosto de 1929, Léon Walter realizou um curso a convite da Associação Comercial de São Paulo sobre “Psycotechnica industrial”. O curso, que iniciaria no dia 09 do referido mês, seria composto por cinco conferências com as seguintes temáticas: Introdução - definição e methodologia da technopsychologia; A seleção do operário; O estudo dos movimentos profissionaes; A adaptação dos instrumentos de trabalho ao operário; e A fadiga profissional (PROFESSOR LEON..., 08/08/1929, p. 14).
Outra notícia do mesmo jornal indica que o professor realizaria uma série de conferências, desta vez por convite do Governo do Estado de São Paulo, no Museu Agrícola e Industrial do Estado, sobre a “Organização scientifica no trabalho industrial”. Seriam 06 palestras entre os dias 27 de agosto a 06 de setembro de 1929 (DIÁRIO NACIONAL..., 25/08/ 1929, p. 02). A Associação Comercial do Rio de Janeiro também convidou o professor para uma conferência com o título Psychologia do Trabalho Industrial, no dia 12 de setembro do mesmo ano, na Sociedade Nacional de Agricultura (JORNAL DO BRASIL, 13/09/1929).
Evidencia-se que o interesse por ouvir os professores vindos do Instituto era compartilhado por diferentes associações dos Estados. Entre estas, destaca-se mais uma vez a ABE que, em dezembro de 1929, promoveu um simpósio sobre a Escola de Aperfeiçoamento de Belo Horizonte, no qual Hélène Antipoff abordaria a psicologia infantil e Louise Perrelet faria uma conferência especial sobre desenho e modelagem (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA..., 1929a).
Assim como Léon Walther, a professora Louise Perrelet realizou conferências e a imprensa brasileira acompanhava seus passos. Nessa perspectiva, concordamos com Zicman (1985) que aponta a potencialidade dos jornais como fontes que permitem a reconstituição histórica e que, para alguns períodos, é a única fonte possível. Do mesmo modo, Bastos (2015, p. 21, grifos da autora) considera a imprensa como um “corpus documental de vastas dimensões” e “um excelente observatório”.
A partir dos jornais, acompanhamos os rastros de Louise Perrelet na educação brasileira até 1933. Ela realizou, no Rio de Janeiro, conferências a convite do Rotary Club, da ABE, da Associação dos Professores Primários do Distrito Federal e da Diretoria de Instrução Pública entre 1930 e 1932 (JORNAL DO COMMERCIO, 1930a; 1930b; 1932; ESSA ADMIRÁVEL..., 24/05/1931; UM CURSO..., 17/11/ 1932).
Após encerrar o seu contrato de dois anos com o Governo de Minas Gerais, foi convidada para dirigir um curso de aperfeiçoamento para professoras primárias na Escola Nacional de Bellas Artes do Rio (A NOITE, 28/02/1931). O curso teria duração de três meses e abordaria desenho, modelagem e jogos educativos. Sobre as aulas do curso, o Diário de Notícias (RJ) publicou uma série de reportagens escritas por Cecília Meirelles (DESENHO..., 1931).
Nesse mesmo jornal, encontramos o texto cuja autoria podemos atribuir à Getúlio Frota Pessoa sob o título Essa admirável M me Artus - A fulguração de uma vida ao serviço da criança. O texto traz diversos elementos sobre a vida e o percurso profissional da educadora, além de mencionar seu livro editado pelo Instituto Le dessin au service de L´éducation, prefaciado por Pierre Bovet, e uma invenção Chromofone Artus que transformava o som em cor. Repleto de elogios, o texto se propõe a fazer uma síntese de quarenta e dois anos de magistério da educadora e apresentar aspectos sobre a sua perspectiva da educação e o seu método de desenho (ESSA ADMIRÁVEL..., 24/05/1931).
Destacamos ainda uma outra menção à educadora em texto de Ilka Labarthe para a Revista A Escola Primária (1931). De acordo com a autora, Artus Perrelet, após dois anos, de “contacto com o problema educacional no Brasil e de sentir a imperiosa necessidade de ‘jogos educativos’ adaptados à nossa mentalidade, às nossas producções e necessidades, creou os ‘Jogos Educativos Brasileiros’ que a Casa Villas Bôas & Cia, editou em hora feliz” (A ESCOLA PRIMÁRIA, 1931, p. 111). O regresso da educadora para a Suíça é noticiado pelo jornal A Nação (RJ) de 20 de julho de 1933. De acordo com o jornal, por questões de saúde ela retornaria à Suíça e não voltaria mais ao Brasil. A reportagem traz ainda informações de que a sua auxiliar, Regina Frota Pessoa, viajaria com ela para estudar no IJJR.
Embora com poucas ocorrências no período, Hélène Antipoff também figura nos jornais em notícias relativas à sua atuação na educação. O jornal Correio da Manhã (RJ) de 27 de novembro de 1929, fazia menção à conferência que a educadora realizaria sobre “A psychologia na obra da educação” como parte de uma série de conferências da educação primária realizada na capital mineira (CONFERÊNCIAS..., 1929).
“O Jornal” (RJ), por sua vez, traz na edição de 10 de setembro de 1930 a notícia intitulada ‘A próxima visita do professor Clapared ao Brasil’. Hélène Antipoff é apresentada como a “discipula do eminente psychologo suisso” a quem o jornal procurou para a realização da reportagem sobre a chegada de Claparède e que trazia traços biográficos do educador. A reportagem menciona ainda a professora Louise Perrelet e pontua que ‘Claparède tem, pois, no Brasil alguns interpretes autorizados do seu pensamento” (A PRÓXIMA..., 10/09/1930, p. 3).
Essa afirmação remete-nos ao papel desempenhado (ou esperado) por esses professores na educação brasileira: traduzir para a realidade brasileira as ideias, os métodos e as práticas desenvolvidas enquanto professores do Instituto, como colegas e discípulos de Claparède. No entanto, vale a ressalva de que educadores, discursos, práticas, objetos e modelos pedagógicos transformam-se quando se mobilizam por diferentes lugares (ROLDÁN VERA; FUCHS, 2021). Podemos tomar como exemplo, a afirmação de Bovet (1932, p. 23) quando, ao se referir à disciplina de desenho ministrada por Artus Perrelet no IJJR, considera que talvez tenha sido apenas “na Holanda e no Brasil que Mme. Artus conseguiu mostrar todo o seu potencial”.15
Em outra nota identificamos que, em julho de 1930, Antipoff visitou a Liga Brasileira de Hygiene Mental no Rio de Janeiro e foi convidada para retornar em setembro do mesmo ano como parte de um curso sobre psicologia organizado pela instituição (LIGA BRASILEIRA..., 1930). O mesmo jornal noticia a sua conferência na Liga sobre os testes de inteligência, realizada no dia 20 daquele mês. De acordo com a reportagem, Claparède dirigiu a seção dessa conferência (ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ..., 21/09/1930, p. 04). A chegada do educador ao Brasil e sua visita a ABE já havia sido noticiada na edição de 16 de setembro. O fundador do Instituto Jean Jacques Rousseau estaria no Rio de Janeiro para uma série de conferências.
Tendo em vista as menções encontradas que demonstram a articulação da ABE com estes educadores, optamos por pesquisar em sua Revista outros indícios da relação do Instituto com o Brasil. Entre estes indícios, destacamos que na Revista Schola16, nº 1 de janeiro de 1930, encontramos, em meio às ações desenvolvidas no ano anterior, a informação de que a Associação “aproveitando a passagem pelo Rio, dos professores Thédoro Simon e Léon Walter, contratados pelo Governo de Minas Geraes para orientação do seu magistério, deles obteve que fizessem no Rio conferencias sob os auspícios da A.B.E” (SCHOLA, 1930a, p. 26). Nessa mesma edição, encontramos ainda menções ao BIE, citando a comunicação entre as duas instituições, e sobre a Escola de Aperfeiçoamento de Belo Horizonte.
No número 8 de novembro do mesmo ano, a Revista traz a notícia intitulada “Professor Edouard Claparede”, que relata a chegada do intelectual ao Rio de Janeiro em 13 de setembro de 1930. Claparède é apresentado como “legitimo representante da cultura europeia, o notável educador suisso é hoje conhecido no mundo inteiro pelos seus trabalhos sobre psychologia” (SCHOLA, 1930b, p. 260). Nessa reportagem, encontramos indícios de suas relações construídas com professores que atuavam no Brasil no período. De acordo com o texto, “o professor Claparède veiu com o fim de conhecer o Brasil, sobre o qual lhe fizeram enthusiasticos refferenciais as suas colaboras de Genebra, Sras Helene Antipoff e Artus Perrelet, hoje professoras contractadas na Escola de Aperfeiçoamento de Bello Horizonte” (SCHOLA, 1930b, p. 260).
A revista informa que, durante sua permanência no Rio de Janeiro, o intelectual fez uma série de conferências organizadas pela ABE sobre questões relacionadas à psicologia aplicada. Os resumos dessas conferências seriam publicados na revista posteriormente. Em consonância com essa proposta, destacamos no número seguinte o texto intitulado A 1ª conferencia do Professor Claparède - o sentido de inferioridade, ao qual foram destinadas cinco páginas no periódico (SCHOLA, 1931).
No texto exaltam-se a importância e a atenção que obteve a conferência do intelectual para os sócios da ABE e para outros interessados na temática da psicologia aplicada à educação. De acordo com o texto, “antes da hora marcada já se encontrava repleto o grande salão da A. B. E., com todos os nossos valores pedagógicos e psychologicos. Não podia ter o Professor Claparède melhor auditório no Rio, nem mais attento e ancioso por ouvi-lo e mais capaz de comprehendel-o”. O trecho exorta não apenas o “famoso mestre”, mas também a capacidade intelectual dos seus ouvintes.
Por fim, a imprensa brasileira noticia ainda a chegada prevista de outro educador ligado ao Instituto ao Brasil. Desde 1928, Laura Lacombe já havia informado que o professor Adolphe Fèrriere viria à América do Sul (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA..., 29/11/1928, p. 08). O Jornal do Comércio (RJ) informava que Ferrière chegaria ao Brasil em 04 de novembro de 1930. Embora Ferrière integrasse o corpo docente de professores do IJJR, a intencionalidade de sua viagem referia-se, sobretudo, ao seu papel na Ligue Internationale pour l´Éducation Nouvelle.
Considerações Finais
Este estudo teve como objetivo investigar os vestígios das redes construídas entre o Instituto Jean Jacques Rousseau e Intelectuais da Educação brasileira a partir de fontes hemerográficas. A pretensão inicial de nos debruçarmos especificamente sobre o acervo da Hemeroteca Digital Brasileira foi ampliada a partir do acesso a alguns números da Revista da Associação Brasileira de Educação (1930 e 1931).
Deparamo-nos com dois itinerários de viagens pedagógicas: educadores brasileiros viajando para estudar no Instituto e professores do Instituto chegando ao Brasil contratados para atuarem no país ou convidados para conferências e visitas. Ao mesmo tempo em que se delinearam as redes entre instituições (o IJJR, a Liga das Nações, a ABE, o BIE e a LIEN), as tramas foram expostas a partir dos viajantes, Francisco Lins, Laura Lacombe, Antônia Castro, Claparède, Ferrière, Leon Walther, Artus Perrelet e Hélène Antipoff. Do mesmo modo, identificamos que, para além das participações do eixo Rio-São Paulo, Minas Gerais assume um papel preponderante na circulação desses sujeitos, de suas ideias e práticas.
As intenções por vezes diferentes desses intelectuais e das organizações as quais estavam filiados se unem no intuito de conferir à educação, brasileira e internacional, uma perspectiva nova, pautada na cientificidade da pedagogia constituída com as contribuições da psicologia. Assim, podemos situar a circulação das ideias da Escola Nova a partir de um movimento internacional no qual o Instituto ocupou um papel de centralidade. A partir de cada um desses sujeitos e das instituições, bem como de seus entrelaçamentos, é possível aprofundar a pesquisa. Seguir os rastros de cada intelectual na história da educação brasileira, mas, sobretudo, identificar os pontos de contato, se constituem em nossos próximos passos.
Cientes da necessidade da conclusão deste texto e da impossibilidade de discutir e analisar cada uma das diversas informações aqui apresentadas, destacamos que essas refletem a potencialidade das pesquisas que envolvem a temática abordada e os possíveis desdobramentos a partir das redes construídas entre o Instituto Jean Jacques Rousseau e o Brasil. Nesse sentido, ressaltamos que o nosso estudo traz contribuições para as discussões realizadas no âmbito da História da Educação a partir da perspectiva transnacional.