Introdução1
O objetivo desta pesquisa é conhecer e analisar o perfil dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes2. A necessidade de saber quem são esses estudantes e analisar o perfil deles surgiu quando nos dispusemos a analisar quais as possibilidades de avaliação do processo ensino e aprendizagem na Educação Profissional Técnica de Nível Médio, especificamente nos cursos técnicos subsequentes. Entre tantas questões a serem investigadas sobre o processo avaliativo, uma delas tornou-se imprescindível neste percurso: quem são os sujeitos de aprendizagem dos cursos técnicos subsequentes?
Nessa perspectiva, consideramos que para percorrer os caminhos da avaliação na educação profissional é imprescindível conhecer quem são os estudantes dos cursos subsequentes. Portanto, revelar suas necessidades e possibilidades sociais, econômicas, culturais e de aprendizagens torna-se fundamental na concepção que temos da avaliação como um instrumento de diagnóstico desses sujeitos, considerando os conhecimentos e experiências vivenciados por eles em múltiplos espaços, além da escola. Dessa forma é possível que a escola concretize a sua função social e proporcione um processo formativo estabelecendo relações “entre o vivenciado pelos alunos e o conhecimento escolar” (DAYRELL, 2009, p, 139).
Todavia, para pensar quais as formas de avaliação que atendam o processo formativo dos estudantes dos cursos subsequentes, é extremamente relevante, a priori, conhecê-los e afiançar uma análise da diversidade que caracteriza o perfil destes estudantes. Dayrell (2006) declara que a escola e seus profissionais devem conhecer os alunos com os quais trabalham, dentro e fora da escola, para melhor compreender quem eles são. Esse autor ainda salienta que à medida que os profissionais da educação conhecerem a singularidade e a diversidade de fatores que constituem o perfil dos estudantes, haverá mais possibilidades de planejar um percurso formativo com conteúdos escolares contextualizados e articulados com a realidade dos alunos.
Nesse sentido, esta pesquisa também tem o objetivo de contribuir com os estudos e conhecimentos sobre o perfil dos estudantes dos cursos subsequentes. Dessa maneira, buscamos compreender o perfil dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes como sujeitos socioculturais, que ao interagirem com a realidade social a transformam e também são transformados, a partir de uma visão dialética da realidade social.
Dayrell (2009, p. 140) explica que compreender os estudantes que trazem à escola um saber, uma cultura, o seu modo de ser, de pensar e agir, seus hábitos e valores a partir das experiências vivenciadas em diferentes espaços sociais, implica em concebê-los como sujeitos socioculturais, superando “a visão homogeneizante e estereotipada da noção de aluno, dando-lhe um outro significado”.
Dessa forma, esse autor ressalta que os estudantes trazem à escola a diversidade cultural decorrente de suas experiências e relações sociais diversas, no entanto essa diversidade não é considerada pelas instituições de ensino, sendo reduzida a diferenças quanto aos aspectos cognitivos e comportamentais que os alunos apresentam. Assim, a escola implementa a homogeneidade no processo de aprendizagem independentemente das experiências, expectativas, idade e origem social dos estudantes. No entanto, Dayrell (2009, p. 140) explica que é possível compreender os estudantes que chegam à escola considerando suas diferenças, como sujeitos socioculturais que possuem uma “historicidade, visão de mundo, sentimentos, emoções, comportamentos e hábitos que lhe são próprios”.
Para que seja significativa a contribuição deste estudo, especialmente para os envolvidos com a Educação Profissional de Nível Médio, realizamos uma busca detalha acerca da temática a ser investigada. A presente pesquisa consiste numa pesquisa bibliográfica de abordagem qualitativa, fazendo uso da análise de conteúdo. Para tanto, foi realizado um levantamento na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD e no Portal de Periódicos da Capes, em pesquisas que tratam da temática da educação profissional e juventude(s), bem como em plataformas que disponibilizam indicadores estatísticos educacionais atualizados sobre a educação profissional de nível médio. Na sequência, delinearemos o percurso metodológico realizado nesta pesquisa.
Percurso Metodológico
Ao envidarmos a busca de trabalhos que tratam sobre a educação profissional técnica de nível médio no Brasil, especificamente sobre o perfil dos estudantes dos cursos subsequentes, contribuiremos para ampliar as informações que expressam quem é esse sujeito, que mesmo tendo concluído a última etapa da educação da básica, busca qualificação em um curso técnico de nível médio.
Como já exposto na introdução, os procedimentos para a realização desta pesquisa bibliográfica se baseiam na metodologia de abordagem qualitativa, pois entendemos que esse enfoque permite ao pesquisador uma melhor compreensão do objeto a ser investigado.
Para fundamentar teoricamente a temática investigada, realizamos levantamentos bibliográficos nas produções disponíveis no repositório na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD). Nesta busca utilizamos o descritor “perfil dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes” e tivemos como resultado 26 (vinte e seis) trabalhos, sendo 19 (dezenove) dissertações e 7 (sete) teses, no período de 2010 a 2020. A análise dos títulos e também a leitura dos resumos destes trabalhos apontaram que 12 (doze) tratavam de fato da temática da qual nos ocupamos nessa pesquisa.
Os trabalhos mencionados no Quadro 1 apresentam informações sobre os estudantes dos cursos técnicos subsequentes, abrangendo todas as regiões do Brasil, o que possibilitará retratar de forma ampla o perfil desses estudantes. Quanto à produção científica referente às teses e dissertações que retratam esse perfil, constatamos que temos um árduo caminho de pesquisa a ser trilhado.
TIPO DE TRABALHO | TÍTULO | AUTOR | ANO DE DEFESA | INSTITUIÇÃO/PROGRAMA | REGIÃO DA PESQUISA |
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Dissertação | Estudo Comparativo Entre o Ensino Médio Integrado e o Técnico Subsequente no IFTO-Câmpus Palmas: Formação, Empregabilidade, Sustentação | Noemi Barreto Sales Zukowski | 2013 | Universidade de Brasília - Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Gestão da Educação Profissional e Tecnológica | Palmas Tocantins Região Norte |
Dissertação | Impacto dos cursos técnicos integrados e subsequentes na vida profissional dos egressos: reflexos do primeiro quinquênio do IFBA-Campus Porto Seguro | Eladyr Boaventura Raykil | 2014 | Universidade Federal da Bahia - Pós-graduação em Administração | Porto Seguro Bahia Região Nordeste |
Dissertação | Permanência e evasão escolar: um estudo de caso em uma instituição de ensino profissional | Juarina Ana da Silveira Souza | 2014 | Universidade Federal de Juiz Fora - Programa de Pós-Graduação Profissional em Gestão e Avaliação da Educação Pública | São Gonçalo do Amarante Rio Grande do Norte Região Norte |
Dissertação | Qual o Efeito da Reforma da Educação Profissional Sobre a Formação dos Jovens no Curso Técnico em Eletrotécnica? Estudo de Caso do IFMT - Campus Cuiabá | Nelson Yoshio Ito Suzuki | 2016 | Universidade Federal de Pernambuco - Pós-Graduação Profissionalizante em Políticas Públicas | Cuiabá Mato Grosso Região Centro-Oeste |
Dissertação | Técnico subsequente: uma análise sobre o papel atual e perspectivas futuras da região RIDE | Milton Juliano da Silva Júnior | 2016 | Universidade de Brasília - Programa de Pós-graduação em Educação | Região RIDE: Distrito Federal, Goiás e Minas Gerais Região Centro-Oeste e Sudeste |
Dissertação | Evasão nos Cursos Subsequentes do IF-SC Campus Criciúma | Lee Elvis Siqueira de Oliveira | 2016 | Universidade do Extremo Sul Catarinense - Programa de Pós-Graduação em Educação | Criciúma Santa Catarina Região Sul |
Dissertação | Políticas Educacionais de Formação Profissional: Fatores que Contribuíram para a Evasão ou para a Permanência de Estudantes do Curso Técnico Subsequente em Logística oferecido pelo IFTO-Rede- e-Tec Brasil | Ana Lúcia Petrocione Jardim | 2016 | Universidade Federal do Tocantins - Programa de Pós-Graduação em Gestão de Políticas Públicas | Palmas Tocantins Região Norte |
Dissertação | Permanência e Evasão na Educação a Distância: Uma Análise dos Cursos Subsequentes do IFSULDEMINAS Campus Muzambinho | Simone Aparecida Gomes | 2018 | Universidade Federal de São Carlos - Programa de Pós- Graduação em Gestão e Organização de Sistemas Público | Muzambinho Minas Gerais Região Sudeste |
Dissertação | A Trajetória de Estudantes Adultos na Educação Profissional de Nível Médio: Compreendendo Diferentes Dimensões de uma Mesma Realidade | Daniela Fátima Mariani Mores | 2018 | Universidade Federal da Fronteira Sul - Programa de Pós-Graduação Profissional em Educação | Erechim Rio Grande do Sul Região Sul |
Dissertação | Os movimentos dos cursos técnicos subsequentes sobre os sentidos do trabalho: a (des)alienação dos trabalhadores- estudantes | Ana Paula de Almeida | 2019 | Universidade Federal de Santa Maria - Programa de Pós-Graduação Profissional em Educação Profissional | Ibirubá Rio Grande do Sul Região Sul |
Tese | O método de estudos de caso caos como estratégia na formação do perfil profissional de estudantes de um curso Técnico em Química | Mirele Sanches Fernandes | 2019 | Universidade Federal do Rio Grande do Sul - Programa de Pós- Graduação em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde | Porto Alegre Rio Grande do Sul Região Sul |
Dissertação | A avaliação da aprendizagem na educação Profissional e Tecnológica: uma proposta de formação a partir da percepção dos sujeitos dos cursos técnicos subsequentes do IFSC - Campus Caçador | Luciane da Costa Campolin | 2019 | Instituto Federal de Santa Catarina - Programa de Pós-Graduação em Educação Profissional e Tecnológica | Caçador Santa Catarina Região Sul |
Fonte: Elaborado pelas autoras deste artigo.
Também realizamos pesquisa no Portal de Periódicos da Capes, e utilizando a expressão “perfil dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes” tivemos como resultado 28 (vinte e oito) artigos, no período de 2010 a 2020. A leitura dos resumos destes artigos levou-nos a constatar que somente 5 (cinco) apresentaram informações pertinentes à temática da qual nos dedicamos nesta pesquisa. Apresentamos no Quadro 2 os artigos selecionados.
TÍTULO | AUTOR | PERIÓDICO | ANO |
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Novas perspectivas para a educação de jovens e adultos: um estudo andragógico no curso técnico de recursos pesqueiros | MENDES, Luciana do Nascimento; CHAGAS, Patrícia Carla Macedo. | HOLOS, v. 2, p. 196-205 | 2013 |
Repensando a Evasão Escolar: Uma Análise Sobre o direito à Educação no Contexto Amazônico | SILVA JÚNIOR, A. S.; FRANCISCO JUNIOR, W. E.; SILVA, J. C.; SILVA, J. M. | HOLOS, v. 2, p. 199-213 | 2017 |
Análise multinível da transição estudantil do curso técnico para o ensino superior | SALES, Paula Elizabeth Nogueira; HEIJMANS, Rosemary Dore; SILVA, Carlos Eduardo Guerra | Estudos em Avaliação Educacional, v. 28, n. 69, p. 896-925 | 2017 |
Trajetórias profissionais de técnicos de nível médio | DUARTE, Aline Fonseca Reggiani; ALVES, Shyrlleen Christieny Assunção | Revista Brasileira de Iniciação Científica, v. 4, n. 1, p. 128-151 | 2017 |
Avaliação dos Egressos do Curso Técnico de Administração do IFSC: Formação Profissional, Empregabilidade e Continuidade dos Estudos | DAGNON, Vanessa Edy Mondini; FRONTELI, Marcio Henrique; MARTINEZ, Christina Hipólito | Revista NUPEM, v. 12, n. 25, p. 105-123 | 2020 |
Fonte: Elaborado pelas autoras deste artigo.
A partir da organização das informações e conhecimentos dos materiais analisados, selecionamos 11 (onze) indicadores acerca do perfil dos alunos dos cursos técnicos subsequentes:
número de matrículas e motivos pelo interesse na formação técnica;
matrículas por região e dependência administrativa;
terminalidade da educação básica;
etnia (cor e raça);
gênero e faixa etária;
condições socioeconômicas;
evasão;
dificuldades enfrentadas no percurso formativo;
tempo de afastamento dos estudos;
área de formação mais procurada pelos estudantes;
atuação na área de formação técnica e continuidade dos estudos no ensino superior.
Consideramos necessário, ainda, a realização da análise das publicações do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) e acesso à Plataforma Nilo Peçanha, pois disponibilizam indicadores sobre a Educação Profissional de nível médio no Brasil.
No que diz respeito aos pressupostos teóricos para realizarmos as análises dos indicadores, as contribuições de autores como Dayrell (2003, 2006, 2009), Raitz (2003), Groppo (2004), Camarano e outros (2004), Barber-Madden e Saber (2010), Leão, Dayrell e Reis (2011), Dubar (2012), Dayrell, Carrano e Maia (2014), Brenner e Carrano (2014), Sposito, Souza e Silva (2018) e Vanzuita, Raitz e Garanhani (2020), entre outros, foram expressivas. Esses pesquisadores desenvolvem pesquisas que ultrapassam uma concepção homogênica e determinista com relação aos jovens, ao contrário, compreende-os em sua diversidade como sujeitos socioculturais. A seguir serão discutidos e analisados os indicadores selecionados sobre o perfil dos estudantes.
Resultados da Pesquisa: análise dos indicadores
A Educação Profissional Técnica de Nível Médio é regulamentada pela Lei nº 11.741/2008 (BRASIL, 2008) e também pela Resolução CNE/CP nº 01/2021 (BRASIL, 2021), do Conselho Nacional de Educação e Câmara de Educação Básica, que além de especificarem as formas de oferta, normatizam as cargas horárias correspondentes, organização curricular, avaliação, formação docente, entre outros.
Os cursos técnicos subsequentes constituem uma tentativa de transcender a separação entre trabalho manual e trabalho intelectual, pois buscam romper com a formação que prepara simplesmente para executar um trabalho, possibilitando aos estudantes aprimorar a sua leitura de mundo para atuar com autonomia e criticidade em seu contexto social e profissional (CIAVATTA, 2005).
No entanto, para que o estudante possa ter uma formação que rompa com o treinamento para o trabalho enfatizando seu aspecto operacional e escoimado de conhecimentos, possibilitando o seu desenvolvimento integralmente como sujeito histórico na sociedade, é necessário que o processo formativo seja compreendido “por um lado, como uma necessidade social e, por outro lado, como meio pelo qual a categoria trabalho encontre espaço na formação como princípio educativo” (RAMOS, 2005, p. 125).
A partir da organização das informações e conhecimentos dos materiais analisados, selecionamos onze (11) indicadores acerca do perfil dos alunos dos cursos técnicos subsequentes que serão discutidos a seguir.
a) Número de matrículas e motivos pelo interesse na formação técnica subsequente
Quanto ao indicador número de matrículas, o Censo da Educação Básica 2019 (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2020) divulgou que as matrículas na Educação Profissional Média no Brasil, em 2019, totalizaram 1.914.749, sendo que na forma subsequente ao ensino médio apresentam 962.825 matrículas, correspondendo à metade das matrículas totais da Educação Profissional (50,2%). Constatamos uma progressão significativa das matrículas nos cursos subsequentes em relação às demais ofertas da Educação Profissional de Nível Médio, no período de 2010 a 2018, com acréscimo de 36,0%. Considerando esses dados, apresentamos na sequência os motivos da procura expressiva pelos cursos técnicos subsequentes.
Destacamos algumas pesquisas que apresentam esses motivos: Bernardim (2014) constatou em estudo com 3.888 estudantes dos cursos técnicos subsequentes que 93,0% escolheram a formação profissional como um dos motivos para a realização de um curso técnico. Silva Júnior (2016) verificou que 41,0% dos estudantes do nível médio subsequente consideram como motivação principal a característica do curso de preparar para a prática profissional. Loponte (2015) e Duarte e Alves (2017) declaram que a escolha pelo curso técnico de nível médio pode ser motivada por diversas razões, entre elas a inserção no mundo de trabalho.
Percebemos que os estudantes buscam a educação técnica profissional para ampliar suas oportunidades profissionais, objetivando uma melhor qualidade de vida. Moura (2007) destaca que o ensino técnico de nível médio representa uma opção para os jovens possuírem, já no ensino médio, uma qualificação profissional que contribua para o seu desenvolvimento pessoal e profissional, colaborando com a “formação de cidadãos capazes de compreender a realidade social, econômica, política, cultural e do mundo do trabalho para nela inserir-se e atuar de forma ética e competente, técnica e politicamente” (MOURA, 2007, p. 20).
Dayrell (2007, p. 1122) também afirma que a escola representa para muitos estudantes a “valorização do estudo como uma promessa futura, uma forma de garantir um mínimo de credencial para pleitear um lugar no mercado de trabalho”. No entanto, a formação técnica não constitui garantia da inserção profissional imediata, pois as significativas transformações que ocorrem no contexto social e profissional acarretam o aumento das taxas de desemprego, principalmente dos jovens mais vulneráveis, delimitando o seu espaço e possibilidades no mundo trabalho.
Dessa forma, essas dificuldades levam os jovens a usarem estratégias peculiares que abalam os modos convencionais de inserção na vida profissional (PAIS, 2005). Destarte, salientamos que a inserção profissional pode ser compreendida como um processo individual, coletivo, histórico e socialmente inscrito, e que assume contornos específicos, dependendo das experiências, escolhas e expectativas profissionais vivenciadas pelos indivíduos na sociedade (ROCHA-DE-OLIVEIRA, 2012).
Considerando a inserção profissional dos jovens, Vanzuita, Raitz e Garanhani (2020) verificaram que os estudantes enfrentam várias barreiras para entrar no mundo do trabalho, tais como: falta de experiência profissional, contexto socioeconômico instável, necessidade de investir na qualificação profissional, campo de atuação competitivo, entre outros. Contudo, o número de matrículas na educação profissional de nível médio e os resultados das pesquisas revelam que os estudantes mantêm expectativas em relação à sua inserção profissional no mundo do trabalho, com a realização dos cursos de formação técnica, mesmo que haja possibilidades dessas expectativas não serem atendidas em decorrência das condições existentes no contexto social.
b) Número de matrículas por região e dependência administrativa
Na busca por conhecer os cursos subsequentes e, consequentemente, obter mais informações sobre o perfil dos alunos que o frequentam, constatamos que a região Sudeste do Brasil, em 2018, liderou a oferta com 420.098 alunos matriculados, representando 46,9% do total de matrículas realizadas nesta oferta. Verificamos que as regiões Sul, Sudoeste e Centro-Oeste totalizam 69,1% do total de matrículas, enquanto as regiões Norte e Nordeste, 30,9%. Infelizmente as desigualdades não ficam restritas somente ao percentual de matrículas (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2020).
Conforme os dados divulgados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2019), a média de anos de estudo de pessoas de 25 anos de idade ou mais nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul mantiveram resultado acima da média nacional, que é de 9,3 anos; no entanto, as regiões Norte e Nordeste ficaram abaixo desta média. Apesar dos cursos técnicos ofertados na forma subsequente terem apresentado um número expressivo de matrículas em 2019, as políticas educacionais não se concretizam de forma equânime para superar as desigualdades quanto ao acesso à educação nas regiões brasileiras.
No Relatório do 2º Ciclo de Monitoramento das Metas do Plano da Educação - 2018 (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2019), o indicador Matrículas por Dependência Federativa também apresenta informações pertinentes à oferta dos cursos técnicos subsequentes. Constatamos um percentual expressivo de matrículas em 2017 na rede privada, com 55,3% do total, seguida pelas redes estadual (27,3%), federal (15,7%) e municipal (1,4%). Os dados indicam um percentual significativo de matrículas na rede privada. Diante dessa situação, buscamos levantar informações sobre essa realidade.
Lima e Cordão (2017) argumentam que o crescente número de matrículas da educação profissional na rede privada é decorrente de uma série de ações do Governo Federal com os sistemas estaduais e com a iniciativa privada, especialmente em parceria com o denominado “Sistema S”.3 Entre essas ações destaca-se o não recolhimento de tributos ao fundo público das entidades que compõem o “Sistema S” e o repasse de recursos orçamentários do governo a essas entidades para a oferta de cursos profissionalizantes aos trabalhadores.
Em 2008, o Governo Federal assinou um decreto garantido um aumento progressivo de vagas gratuitas, para a formação técnica, nas instituições que compõem o “Sistema S”. Nos limites desta pesquisa não vamos entrar na discussão sobre a utilização de recursos públicos pelas entidades que compõem o “Sistema S”, pois outros pesquisadores já se dedicaram com maestria à discussão desta temática.
Assim, compreendemos que o percentual expressivo de matrículas no setor privado é devido ao recebimento de recursos públicos para oferta de cursos profissionalizantes gratuitamente. Lima e Cordão (2017) afirmam que o “Sistema S” dispõe de uma numerosa rede de escolas profissionais equipadas com laboratórios e centros tecnológicos espalhados pelo Brasil, para atender as demandas de formação profissional técnica de nível médio.
c) Terminalidade da Educação Básica
Na pesquisa de Almeida (2019) encontramos informações sobre o indicador terminalidade da educação básica. Essa pesquisadora constatou que 31,2% dos estudantes dos cursos subsequentes são egressos da modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) e do Exame Nacional de Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja) e que 68,8% concluíram o ensino médio regular na rede pública. Essa autora destaca que os estudantes egressos do EJA e Encceja apresentaram dificuldades na conclusão do ensino médio por não o concluir de forma regular. Na mesma direção, Mores (2018) verificou que 26,4% dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes são oriundos da EJA e da habilitação para o magistério, e 73,6% são egressos do ensino médio regular.
Quanto à terminalidade da educação básica, as pesquisas apontam que os estudantes provenientes de famílias em condições econômicas vulneráveis têm muito mais dificuldades de concluí-la comparados aos jovens com melhores condições socioeconômicas (SPOSTITO; SOUZA; SILVA, 2018). Esse indicador expressa a diversidade quanto à terminalidade do ensino médio, e também representa que a desigualdade e a dificuldade na sua conclusão acentuam a vulnerabilidade de muitos estudantes na continuidade de seu percurso formativo. Sobre essa situação, Raitz (2003) e Dayrell (2009) alertam que o tratamento homogêneo adotado pela escola reforça as desigualdades de origens sociais desses alunos e impulsiona as injustiças sociais.
Diante da diversidade de experiências e dificuldades em concluir a educação básica durante o processo formativo, no curso técnico, além de a escola intervir na aprendizagem de conhecimentos e atitudes relacionadas à formação profissional, provavelmente precisa retomar conteúdos que não foram devidamente aprendidos em etapas anteriores. A necessidade de inserir conteúdos relativos à Educação Básica, nos cursos subsequentes, está prevista na Resolução CNE/CP nº 01/2021 (BRASIL, 2021), para garantir o desenvolvimento do perfil profissional.
Brenner e Carrano (2014) afirmam que os estudantes são diferentes, por isso é necessário que a escola os conheça. É desta forma que poderá contribuir para esses estudantes superarem as suas dificuldades a partir do momento em que valorizar os seus saberes e compreender as suas necessidades, possibilidades, expectativas e diferentes experiências vividas em seus contextos sociais. Nessa perspectiva, a escola pode fazer a diferença na vida desses jovens.
d) Etnia - cor e raça
Os cursos técnicos na forma subsequente, conforme o Censo da Educação Básica 2019 (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2020), no que se refere ao indicador cor e raça dos estudantes que se autodeclararam há predominância da preta e parda (50,7%), seguida da branca (48,1%) e indígena (1,2%), com um percentual significativo de estudantes matriculados que não declararam cor e raça (38,0%).
Segundo a Plataforma Nilo Peçanha (REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA, 2019), na rede federal, o total de matrículas (187.627) dos cursos técnicos subsequentes é composto pelas seguintes cor e raça: indígena (1,1%), amarela (1,7%), branca (27,0%), preta e parda (70,2%) e não declarada (38,1%). Dessa forma, constatamos que em relação à cor e raça, o perfil predominante dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes é da preta e parda, sendo de 50,7% em toda a rede e de 70,2% na rede federal.
Ainda quanto a esse indicador, tanto os dados disponibilizados pelo Censo da Educação Básica 2019 (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2020), quanto pela Plataforma Nilo Peçanha (REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA, 2019), verificou-se que há um percentual expressivo (38,0%) que não declararam a sua etnia. Nesse sentido, acreditamos que temos um indicativo de possível pesquisa para levantar as razões de os alunos dos cursos técnicos subsequentes não declararem a sua etnia.
No Anuário Brasileiro da Educação Básica 2019 (TODOS PELA EDUCAÇÃO; MODERNA, 2019), constatamos que o indicador Escolaridade média da população de 18 a 29 anos, por raça e cor, em 2018, indicou que há uma diferença de quase 2 anos entre esses grupos étnicos: brancos, 12,1 anos e pretos e pardos, 10,8.
O Plano Nacional de Educação-Linha de Base (PNE) estabelece que para o decênio 2014-2024, especificamente a meta 8 (oito), tem por finalidade reduzir a diferença entre a escolaridade média existente atualmente entre os grupos étnico-raciais (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2015). Dessa forma, é importante que as instituições de ensino, em especial as que ofertam ensino técnico de nível médio, possam estabelecer nas suas formas de ingresso ações afirmativas e critérios sociais e raciais que oportunizem a equidade, reduzindo as desigualdades étnico-raciais quanto ao acesso e permanência na educação profissional.
Podemos dizer que os estudantes se constroem como sujeitos socioculturais a partir das suas características pessoais, experiências e oportunidades proporcionadas pelo contexto familiar e social, inclusive pela efetividade de políticas públicas. Os contextos diferenciados nos quais os estudantes vivem, restringem ou ampliam as suas possibilidades e também estabelecem vulnerabilidades diferenciadas (CAMARANO et al., 2004).
e) Faixa etária e gênero
Segundo a Plataforma Nilo Peçanha (REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA, 2019), o indicador faixa etária dos estudantes mostra predominância significativa de estudantes entre 20 e 29 anos de idade, representando 52,6% das matrículas. Entre as pesquisas que contribuem para indicar a faixa etária dos estudantes, Almeida (2019) constatou que 45,8% dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes, do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IF-RS), campus Ibirubá, estão na faixa etária de 22 a 30 anos. Silva Júnior (2016) verificou que nos cursos técnicos subsequentes que fazem parte da Rede Federal de Educação Profissional Científica e Tecnológica na Região de Integração para o Desenvolvimento Econômico do Distrito Federal e entorno (RIDE-DF) a média de idade é de 29 anos.
Em consonância com a Lei nº 12.852/2013 (BRASIL, 2013), que estabelece as diretrizes das políticas públicas da juventude, são considerados jovens aqueles que apresentam entre 15 e 29 anos de idade. No entanto, os jovens não devem ser identificados considerando apenas a sua faixa etária ou vistos cronologicamente, mas a partir da diversidade que os constituem, por meio de suas características pessoais, suas condições de vida, estilos de vida, etnia, gênero, nas experiências e relações sociais vividas além do contexto escolar. Dessa forma, o indicador faixa etária não deve ser concebido como absoluto e universal para compreender a juventude na sociedade contemporânea, pois fatores históricos e sociais também fazem parte da sua constituição (GROPPO, 2004).
Nessa mesma perspectiva Dayrell, Carrano e Maia (2014, p. 112) consideram que a juventude faz parte de processo totalizante e apresenta aspectos inerentes quanto às experiências vividas em seu entorno social, por isso não deve ser considerada somente como “uma etapa com um fim predeterminado e muito menos como um momento de preparação que será superado quando se entrar na vida adulta”. Portanto, é necessário compreender esses jovens estudantes considerando as suas diversidades e pluralidades culturais, seus saberes, suas visões de mundo, seus valores e as expectativas que trazem à escola.
Na Plataforma Nilo Peçanha (REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA, 2019), o indicador sexo dos estudantes demonstra que do total dos alunos matriculados, 48,0% são do sexo feminino e 52,0%, do masculino. Entre as pesquisas que contribuem para delinear o indicador sexo dos estudantes dos cursos subsequentes, destacamos: Fernandes (2019), que constatou que no curso técnico em Química, de uma escola técnica pública do Rio Grande do Sul, 76,4,% são do sexo feminino e 23,6,%, do masculino; Raykil (2014), que em pesquisa com os egressos dos cursos técnicos do Instituto Federal da Bahia, campus Porto Seguro, verificou que 58,4% são do gênero feminino e 41,5% do gênero masculino; Casagrande e Henriques (2012), que em pesquisa com os egressos do Curso Técnico em Química pós-médio do Instituto Federal de Minas Gerais (IF-MG) verificaram a predominância do sexo feminino (61,0%). Esses autores declaram que a presença predominante do sexo feminino nos cursos técnicos expressa o interesse e participação das mulheres em áreas que eram preferencialmente masculinas.
Diante da significativa predominância feminina nos cursos técnicos, buscamos compreender a sua participação em cursos profissionalizantes e, consequentemente, no mundo do trabalho. Sposito, Souza e Silva (2018) apresentam informações relevantes sobre a atuação feminina no contexto social. Essas autoras explicam que ao longo da última década houve um envolvimento crescente das jovens em atividades laborais e, em contrapartida, a redução do tempo médio semanal dessas jovens no desempenho de atividades domésticas.
Sposito, Souza e Silva (2018) salientam que, além da inserção significativa das mulheres em atividades laborais no mundo do trabalho, a participação feminina no orçamento doméstico tornou-se imprescindível diante das novas configurações das uniões conjugais, e também que as relações assimétricas de gênero nessas uniões estão mais horizontalizadas.
f) Condições socioeconômicas
Ao acessar o indicador renda familiar dos estudantes na Plataforma Nilo Peçanha (REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA, 2019) é possível constatar que 36,1% dos alunos dos cursos técnicos subsequentes que declararam renda familiar recebem até meio salário mínimo, 66,5%, até um salário mínimo e 84,1% recebem até um salário mínimo e meio. Gomes (2018), em pesquisa realizada com estudantes dos técnicos subsequentes, ofertado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS), Campus Muzambinho, constata que os estudantes entrevistados são trabalhadores de baixa renda, perfazendo uma jornada de trabalho de 30 a 40 horas semanais.
Essa pesquisadora ainda concluiu que em sua maioria os estudantes são os principais responsáveis pelo próprio sustento e, ainda, contribuem para o sustento da sua família. Souza (2014) também constatou que a renda familiar dos estudantes do curso técnico subsequente de Redes de Computadores, ofertado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN), Campus São Gonçalo do Amarante, é menor que dois salários mínimos. Sobre as condições socioeconômicas das famílias dos estudantes, Sposito, Souza e Silva (2018) constataram que esses estudantes são os principais responsáveis pela manutenção da renda familiar.
Analisando o Relatório do 2º Ciclo de Monitoramento das Metas do Plano da Educação - 2018 (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2019) verificamos que as desigualdades sociais estão associadas à escolarização medida em anos de estudo, ou seja, o nível da renda da família dos estudantes influencia em seu acesso e permanência na escola, refletindo nas taxas de conclusão da educação básica. No entanto, as desigualdades sociais não influenciam somente as taxas de conclusão da educação básica. Estudantes com renda familiar mais elevada apresentam melhores condições de inserção no mundo do trabalho. Essa condição resulta em menores taxas de desemprego e também menor proporção de atividades laborais de baixa remuneração desses estudantes quando comparados com os provenientes de famílias com renda mais baixa (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2019).
A situação socioeconômica da maioria dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes os submete à difícil empreita de conciliar estudos e trabalho. A pesquisa realizada com jovens de classe econômica baixa que estudam e trabalham mostrou referências negativas associadas à dupla jornada. A expressão desta realidade pode ser constatada com os termos utilizados pelos estudantes como: “‘cansativo’, ‘difícil’, ‘necessidade’, ‘muita responsabilidade’, ‘estressante’, ‘ruim’, ‘correria’ e ‘conciliar’” (FISCHER et al., 2003, p. 977). Sobre os sentidos do trabalho na sociedade contemporânea, Dubar (2012) declara que, mesmo depois de mais de um século da abolição da escravidão, o trabalho para muitos não constitui uma fonte de prazer e também não é visto de forma positiva.
Nessa perspectiva, Raitz e Baldissera (2012) alertam que, no Brasil, as pesquisas revelam que os jovens atribuem diversos sentidos à palavra trabalho, no entanto, o sentido de necessidade, de trabalhar para a sobrevivência individual ou familiar é mais enfatizado quando se analisa os motivos que os levam à inserção no mundo trabalho.
Leão, Dayrell e Reis (2011) declaram que a condição socioeconômica dos jovens os conduz a uma inserção precoce no mundo do trabalho, os condicionando a conciliar estudos e trabalho, e que tal fato interfere no percurso formativo, sendo um entre os diversos motivos que os levam a vivenciar uma trajetória irregular na escola, influenciando na conclusão do curso ou no seu desempenho escolar. Para esses estudantes, as suas experiências laborais não constituem uma opção, mas uma questão de sobrevivência.
As políticas públicas deveriam garantir que o direito à educação seja efetivado independentemente do nível de renda familiar da qual os estudantes provêm, mas, infelizmente, os dados estatísticos expressam que esse direito está longe de se tornar realidade para as famílias brasileiras. Ainda sobre a realidade dos estudantes, Dayrell (2003) declara que as condições socioeconômicas, gênero, etnia, origem familiar, entre outros aspectos, constituem dimensões que interferem na produção de vida dos estudantes e, consequentemente, na sua permanência na escola.
g) Evasão escolar
Quanto ao indicador evasão, a Plataforma Nilo Peçanha (REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA, 2019) aponta que o índice de evasão dos cursos técnicos subsequentes é de 29,8%. Segundo os pesquisadores que estudam sobre essa temática, os fatores que a conduzem são bastante variados e podem ser tanto de ordem interna quanto externa à instituição de ensino. Sposito, Souza e Silva (2018) alertam que as taxas de abandono constituem indicadores importantes para compreendermos as trajetórias educativas dos estudantes. Diante dessa situação, apresentamos nesta pesquisa algumas informações que podem responder o porquê dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes evadirem, interrompendo os seus percursos formativos.
Em relação ao tema da evasão escolar dos estudantes dos cursos subsequentes, relatamos os resultados das seguintes pesquisas: Júnior e outros (2017) apontaram como principais causas motivadoras da evasão dos estudantes as dificuldades econômicas (65,0%) e a conciliação entre estudo e profissão (35,0%); da mesma forma, Oliveira (2016) apresenta como o principal motivo de evasão a dificuldade de conciliar estudo e trabalho (70,5%), assim como Jardim (2016), que verificou que 91,1% da evasão é motivada pela mesma dificuldade.
Pesquisa realizada por Dore, Sales e Castro (2014) sobre a evasão na Educação Técnica de Nível Médio da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica de Minas Gerais adverte que as características individuais, os fatores referentes ao contexto familiar e institucional e também a incompatibilidade de horário do estudo e do trabalho podem influenciar na evasão dos estudantes na educação profissional.
Segundo Dayrell (2009), o trabalho e os estudos podem se sobrepor ou, ainda, mostrar importâncias diferentes em consonância com o ciclo de vida e as condições sociais dos estudantes, levando-os a viver o dilema entre a garantia pela sobrevivência e a possibilidade de a escola fazer parte do seu projeto de vida.
Dessa forma, é fundamental que as instituições de ensino conheçam as causas que motivam a evasão dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes e também considerem as condições sociais, econômicas e culturais em que estão inseridos, para que possam, por meio de ações pedagógicas e de assistência estudantil, considerando as novas configurações do mundo do trabalho, implementar estratégias de permanência e êxito efetivas para que esses estudantes não interrompam o seu processo formativo.
h) Dificuldades durante o percurso formativo
Em pesquisa com professores inseridos nos cursos técnicos de nível médio, Zukowski (2013) averiguou os seguintes fatores que provocam dificuldades para os alunos concluírem o curso: faixa etária acima dos 40 anos, tempo de afastamento dos estudos, déficit em conhecimentos de português e matemática, conciliação entre trabalho, estudo e família. Ainda em relação a esta questão, Campolin (2019) constata que 82,0% dos estudantes conseguem conciliar trabalho e estudo, mas devido a esta condição, o tempo dedicado aos estudos extraclasse é restrito aos finais de semana.
A escola pode intervir para que os estudantes superem as dificuldades enfrentadas durante o percurso formativo. Isso implica em compreender como eles constroem a vida fora do ambiente educacional, considerando as múltiplas dimensões de suas demandas, expectativas e experiências sociais, conforme salientam Leão, Dayrell e Reis (2011). As pesquisadoras Raitz e Baldissera (2012) também alertam que os processos educativos devem contemplar a formação humana, intelectual, conhecimento tecnológico, artístico e emocional, considerando os múltiplos espaços sociais e a diversidade de aspectos e experiências que os estudantes vivem paralelamente à escola.
Diante desses aspectos apresentados, constatamos que para a permanência e o êxito dos estudantes é necessário que todos os atores envolvidos no percurso formativo considerem os conhecimentos que os alunos trazem à escola, realizem ações para que eles possam superar as dificuldades e defasagens e estabeleçam relações entre os conteúdos escolares e sua prática profissional e social.
i) Tempo de afastamento dos estudos
Sobre o indicador tempo de afastamento dos estudos dos alunos dos cursos técnicos subsequentes, encontramos nas pesquisas os seguintes dados: para Mendonça e Vasconcellos (2018), a maioria é egressa do ensino médio há mais de dez anos; segundo Oliveira (2016), 44,2% estão fora da escola há mais de dois anos; e de acordo com Mendes e Chagas (2013), alguns alunos concluíram o ensino médio há um ano e outros pararam de estudar há mais de 13 (treze) ou 25 (vinte e cinco) anos.
Além da discrepância quanto à terminalidade do ensino médio, também verificamos que, apesar da predominância significativa de estudantes entre 20 (vinte) e 29 (vinte e nove) anos de idade, a faixa etária dos alunos que buscam os cursos técnicos subsequentes é bastante heterogênea, variando entre 20 (vinte) e 60 (sessenta) anos ou mais. Conhecer o perfil identitário dos estudantes permite que as instituições de ensino percebam esses alunos durante o processo formativo, considerando que as suas diversidades são expressas pela etnia, faixa etária, condições sociais, gênero, condições econômicas, dentre outras.
Dayrell (2009) alerta sobre a importância de a escola superar a visão homogeneizante da noção de aluno, pois nesta visão todos são considerados igualmente alunos, independentemente da idade, etnia, gênero etc., e buscam a escola com as mesmas expectativas e projetos de vida. No entanto, para oferecer um processo formativo que colabore com a formação humana ampla desses estudantes, é prioritário que as instituições de ensino considerem que os estudantes possuem uma história, valores, experiências e relações sociais que acorrem além dos muros da escola.
j) Área de formação mais procurada pelos estudantes dos cursos técnicos
Outro indicador importante é conhecer qual a área de formação que os estudantes dos cursos subsequentes têm mais interesse. O Anuário Brasileiro de Educação Básica 2019 (TODOS PELA EDUCAÇÃO; MODERNA, 2019) relata que as áreas de formação mais procuradas pelos estudantes dos cursos subsequentes são Ambiente e Saúde (46,9%), Gestão e Negócios (19,9%) e Controle e Processos Industriais (14,4%).
Sobre a escolha profissional, Martins e Carrano (2011) ressaltam que as instituições de ensino devem promover ações que colaborem para que os estudantes possam elaborar seus projetos de vida profissional e pessoal. É nesta perspectiva que as instituições de ensino precisam considerar que não estão diante de alunos com perfil homogêneo, mas sim jovens que são sujeitos histórico-socioculturais que trazem à escola seus conhecimentos, valores, opiniões, formas de pensar, dificuldades e também projetos de vida e profissionais distintos. Mesmo que esses aspectos não façam parte do currículo escolar, devem ser considerados no processo formativo, pois na sociedade contemporânea a aprendizagem também acorre além dos muros da escola.
Além disso, as instituições de educação profissional necessitam, na oferta dos cursos, avaliar “as necessidades dos arranjos produtivos locais e a capacidade que estes têm de empregar profissionais que são formados, evitando provocar frustrações e competições, em vez de contribuir para gerar oportunidades de trabalho” (RAGATTIERI; CASTRO, 2010, p. 214).
k) Atuação na área de formação técnica e continuidade dos estudos no ensino superior
A inserção dos egressos dos cursos técnicos em atividades laborais em sua área de formação constitui mais um indicador que compõe o perfil dos estudantes dos cursos subsequentes. A análise das investigações realizadas neste estudo demonstra que a maioria dos egressos desses cursos está em atividades laborais correlatas à área de formação, conforme podemos constatar a seguir.
Mondini, Fronteli e Martinez (2020) verificaram que 61,9 % dos egressos trabalham na área do curso realizado. Casagrande e Henriques (2012), ao investigarem os egressos do Curso Técnico em Química pós-médio do Instituto Federal de Minas Gerais (IF-MG), campus Barbacena, mencionam que 70,0% dos egressos estão colocados na área profissional que realizaram o curso técnico. Suzuki (2016) conclui que o curso técnico subsequente colaborou para a inserção dos egressos no mundo de trabalho, pois 66,6% declararam que atuam parcial ou totalmente na área. Aguiar e Silva Neto (2018) também relatam que os egressos do Curso Técnico de Finanças do Instituto Federal de Roraima (IF-RO) ocupam cargos que têm relação com a formação recebida.
Sobre a inserção no mundo trabalho, Rocha-de-Oliveira (2012) explica que os estudantes constituem um grupo não homogêneo que apresenta diferenças sociais, culturais, étnicas e econômicas. Além de diferentes expectativas e aspirações relacionadas ao campo profissional, decorrentes das influências externas vividas no contexto social. Neste sentido, Ragattieri e Castro, (2010, p. 214) declaram que as instituições de educação profissional precisam realizar o acompanhamento dos egressos para “conhecer de que forma essa aprendizagem se concretiza na sua trajetória pessoal e profissional”.
Por fim, apresentamos o indicador continuidade dos estudos em nível superior. Dentre as pesquisas que contribuem para o conhecimento deste indicador, destacamos: Suzuki (2016), que demonstra que 33,3% dos egressos do curso técnico em eletrotécnica deram continuidade à formação obtida e ingressaram no curso superior de engenharia elétrica; já Sales, Heijmans e Silva (2017) afirmaram que dos 1.570 respondentes, 62,0% ingressaram no ensino superior após a conclusão do curso técnico; Kaykil (2014) verificou que dos egressos que declararam não estar trabalhando após a conclusão do curso técnico, 100% estão realizando cursos em universidade federais; Casagrande e Henriques (2012) confirmaram que 57,0% dos egressos do Curso Técnico em Química deram continuidade aos seus estudos em nível superior em áreas correlatas ao curso técnico em que se formaram.
Infelizmente nem todos os estudantes conseguem dar continuidade nos estudos em nível superior. Em 2018, apenas 21,8% da população entre 18 (dezoito) e 24 (vinte e quatro) anos estavam matriculadas no ensino superior (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2019). Diante dessa realidade, percebemos a necessidade de políticas públicas equitativas que proporcionem aos estudantes, além do acesso e permanência nos estudos, melhores condições de vida em seu contexto social.
Sobre a continuidade dos estudos, Bernardim (2013) afirma que, mesmo com a expansão ocorrida nos últimos anos, é iminente a necessidade de ampliar o acesso da população, especialmente dos pobres, os que mais necessitam da verticalização escolar como possibilidade de efetivar a mobilidade social. Para Ferreira, Raitz e Vanzuita (2016), a transição do ensino médio para o superior constitui um momento complexo para os estudantes, marcado por fatores individuais, como a adaptação às novas experiências que serão vivenciadas no ambiente universitário, e também por fatores contextuais.
Nos estudos realizados durante esta pesquisa, verificamos que a educação profissional de nível médio é procurada por muitos jovens, tanto para sua inserção no mundo do trabalho, quanto pela continuidade dos estudos. Também verificamos que os estudantes dos cursos técnicos subsequentes, em sua maioria, já são trabalhadores e anseiam por compreender como as suas atividades laborais articulam-se com os conteúdos escolares (RAGATTIERI; CASTRO, 2010). Nesse sentido, destacamos a necessidade das instituições de educação profissional, especialmente as que ofertam cursos na forma subsequente, conhecerem quem são esses sujeitos que, mesmo tendo concluído o ensino médio, retornam à escola. Assim, essas instituições terão a possibilidade de assumir o seu papel de indutoras de mudanças sociais na vida desses estudantes e da comunidade.
Também nesta pesquisa constatamos que o perfil dos estudantes dos cursos subsequentes é marcado pela assimetria dos indicadores que retratam quem são esses estudantes. A compreensão da diversidade do perfil desses estudantes, bem como a valorização de suas experiências, conhecimentos, valores, expectativas, implica em concebê-los enquanto sujeitos histórico-socioculturais, como já mencionado em todo o texto.
Considerações Finais
Para a realização desta pesquisa bibliográfica foram analisados 16 (dezesseis) trabalhos acadêmicos entre dissertações, teses e periódicos, além disso buscou-se indicadores estatísticos educacionais atualizados com o objetivo de conhecer o perfil dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes.
As informações coletadas a partir da análise dos trabalhos selecionados deram origem a 11 (onze) indicadores que foram discutidos nesta pesquisa e revelaram que o perfil dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes, em sua maioria, é constituído de sujeitos entre 20 (vinte) e 29 (vinte e nove) anos, de etnia parda ou preta e do sexo feminino.
Muitos são trabalhadores em condições socioeconômicas desfavoráveis e necessitam conciliar estudo e trabalho. Tais condições, muitas vezes, não contribuem para que esses estudantes concluam o seu processo formativo. No entanto, quando o fazem, apesar das dificuldades vividas durante o percurso de inserção laboral, têm possibilidades de atuação profissional na área de formação e continuidade dos estudos em nível superior.
Também conferimos que grande parte é egressa do ensino público e que a terminalidade da educação básica é marcada pela diversidade entre o ensino médio regular e outras modalidades de ensino. Analisamos que esses estudantes optam pelo curso técnico subsequente porque acreditam que a formação obtida nesses cursos lhes propicia melhores condições para inserção no mundo do trabalho.
Os indicadores discutidos nesta pesquisa, no que se refere ao perfil dos estudantes, foram analisados a partir dos pressupostos teóricos fundamentados nos estudos que discutem sobre a categoria juventude ou juventude(s). Nesse sentido, foi possível examinarmos que o perfil identitário desses estudantes é marcado pela heterogeneidade e diversidade, ultrapassando uma visão homogeneizante sobre os jovens, apesar de considerar também sua unidade.
As condições de vida e as diferentes experiências vividas nos contextos sociais expressas pelas condições socioeconômicas, culturais, as diferenças étnicas, de gênero, de idade, de localização geográfica, dentre outros aspectos, caracterizam a diversidade no perfil desses estudantes. Todavia, analisar o perfil desses estudantes a partir de sua diversidade e pluralidade contribui para atendê-los em suas necessidades formativas, possibilitando uma formação que extrapole o treinamento operacional e colabore para que estabeleçam relações entre conteúdos escolares e sua prática social e profissional.
Frente a esses aspectos, revelamos que os cursos técnicos ofertados na forma subsequente apresentaram uma progressão significativa, com acréscimo de 36,0% em relação às matrículas entre 2010 e 2018. Apesar desse crescimento na matrícula de curso técnico subsequente no Brasil, entre os concluintes do ensino médio apenas 8,0% dos estudantes realizaram o curso técnico profissional, enquanto a média dos países participantes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 40% (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA; MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2019).
Além de contribuir para ampliar as investigações e conhecimentos sobre o perfil dos estudantes dos cursos técnicos subsequentes, esta pesquisa também consiste em subsídios para início de um novo percurso investigativo que analisará as possibilidades de avaliar esses estudantes durante sua trajetória formativa considerando as singularidades e diversidades que os constituem na produção de sua existência como sujeitos socioculturais. Portanto, ainda temos um árduo caminho de estudos à frente!