Introdução
Este trabalho resulta de um recorte de uma pesquisa desenvolvida pelo Fórum Gaúcho do Ensino Superior sobre Envelhecimento Humano (2017-2018), que investiga a temática do envelhecimento nos currículos dos cursos de graduação das áreas de Saúde e Humanidades e tem como objetivo analisar como os currículos têm incluído a abordagem do envelhecimento no plano das disciplinas para a formação inicial de profissionais de diferentes áreas do conhecimento. Este trabalho, de abordagem qualitativa, resulta de um recorte de uma pesquisa desenvolvida pelo Fórum Gaúcho sobre Envelhecimento Humano.
Entende-se que a rápida mudança do perfil demográfico da população brasileira, as conquistas recentes da afirmação dos direitos da pessoa idosa em escala internacional e as novas configurações familiares são alguns dos aspectos que trarão desafios significativos para o ensino superior e para a sociedade.
Assim, este artigo é fruto de uma pesquisa que surge das preocupações dos integrantes do Fórum, docentes das diferentes Instituições de Ensino Superior (IES) comunitárias do estado do Rio Grande do Sul, neste momento histórico de rápidas transformações demográficas da sociedade brasileira. A preocupação se sustenta nas exigências das IES de que sejam criados novas abordagens e novos currículos para os cursos de graduação, com o objetivo de atender as atuais e futuras demandas que serão apresentadas nesse contexto.
Fundamentação Teórica
Quinze anos após da promulgação da Constituição Federal de 1988, aprovou-se a Lei nº10741/2003, que instituiu o Estatuto do Idoso. De acordo com o artigo 3º dessa lei, assegura-se prioridade e preferência na execução de políticas públicas para o idoso. O atendimento e o cuidado da pessoa idosa passam pela família e pelos serviços de terceiros, sobretudo nas áreas de saúde e de educação.
De acordo com Búfalo (2013, p.196):
[...] compete aos profissionais das diversas áreas envolvidas nos serviços elaborarem estratégias para atender às demandas oriundas do fenômeno histórico sobre o envelhecimento da população no Brasil’. Para esse autor, é fundamental que os profissionais da saúde, da educação e de áreas afins, conheçam as possibilidades de atendimento da população que envelhece.
Importante ressaltar que as pessoas que pertencem a essa faixa etária recebem várias nomenclaturas: idosos, velhos, melhor idade, terceira idade e envelhecentes, o que demonstra “estratégias criadas para conviver com uma etapa da vida, a velhice, até então uma desconhecida como fenômeno populacional na história da humanidade” (Búfalo, 2013, p.198).
Cabe, então, definir o que entende por envelhecimento. Para isso, foram utilizados os estudos de Lima-Silva et al. (2012), que referem que o indivíduo amadurece ao longo de sua vida e passa por um conjunto de transformações biológicas e psicossociais; um processo natural, multifacetado e multidirecional. Dessa forma, cada indivíduo terá um processo de envelhecimento diferenciado, influenciado por fatores intrínsecos (genética e estilo de vida) e extrínsecos (acesso aos serviços de saúde e condições socioeconômicas).
A inclusão da temática do envelhecimento humano nos currículos de graduação contribui principalmente para a capacitação de recursos humanos nas áreas de saúde e de educação e para prestação de outros serviços aos idosos, conforme dispõe o Estatuto do Idoso (Brasil, 2010) garantindo o princípio da prioridade de atendimento.
O currículo do ensino superior vem sofrendo alterações em decorrência das atuais perspectivas do conhecimento no mundo contemporâneo e das diretrizes curriculares nacionais vigentes no ensino superior. Apesar disso, tem-se a impressão de que os currículos, sobretudo das áreas da saúde e da educação, possuem pouco espaço previsto para a formação inicial dos profissionais. Bulla (2002) destaca a importância atual dos estudos interdisciplinares na área da Gerontologia Social, considerando que o crescimento da população idosa demanda a existência de profissionais qualificados trabalhando na área. A autora também assinala a importância do intercâmbio entre as universidades, a fim de trocarem experiências que permitam enriquecer o trabalho desenvolvido e aprimorar o conhecimento em todos os âmbitos.
Isso porque está na educação a possibilidade de aprender a ver o mundo sem preconceitos, permitindo uma visão diferenciada acerca da pessoa idosa e do processo de envelhecimento. A educação é uma grande e valiosa promotora de ação, fonte principal para que a sociedade conheça e aprenda a respeitar o processo de envelhecimento e a pessoa idosa, desmistificando essa fase da vida e suas características enquanto coorte etária.
Percebe-se então que a educação possui um caráter de transformação, ultrapassando a mera ideia de transmissão de informações. Nesse sentido, parafraseando Piconez (2002), a educação instrumentaliza crítica e criativamente, tendo em vista a inovação da realidade. Desta maneira, observa-se o quanto o processo educativo permite um estágio de mudanças, independentemente da idade (Santos, 2015, p.10).
A abordagem do envelhecimento nos currículos no ensino superior vem ganhando espaço no mundo contemporâneo, sobretudo em decorrência das mudanças do perfil demográfico e do conhecimento necessário para responder às demandas da sociedade. Desse modo, buscou-se compreender como as IES a partir das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) dos cursos de graduação, vem produzindo alterações nos currículos dos seus cursos.
Importante referir que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Brasil, 1997, p. 36, online) determina, no inciso II do Art. 53, que cabe às universidades: “fixar os currículos dos seus cursos e programas, observadas as diretrizes gerais pertinentes”, e as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação definidas pela Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, as quais visam proporcionar às IES um direcionamento para a implantação e a implementação dos projetos político-pedagógicos.
Na perspectiva de Moreira (1999) é difícil definir o conceito de currículo, pois ele abrange experiências de aprendizagem implementadas pelas IES que deverão ser vivenciadas pelos estudantes. Nele estão contidos os conteúdos que deverão ser abordados no processo de ensino e aprendizagem e a metodologia utilizada nos diferentes momentos de ensino.
O currículo do Ensino Superior deve contribuir para a construção da identidade dos alunos na medida em que ressalta a individualidade e o contexto social no qual estão inseridos. Além de ensinar um determinado assunto, deve aguçar as potencialidades e a criticidade dos estudantes.
Nas teorias de currículo (Moreira, 1999) existem três diferentes concepções: (1) Nas teorias tradicionais a ênfase é dada à aquisição de habilidades intelectuais por intermédio de práticas de memorização; (2) Nas teorias críticas argumenta-se que não existe educação neutra; as relações de poder são determinantes no processo de ensino e aprendizagem; e (3) Na perspectiva das teorias pós-críticas, o currículo é visto no emaranhado da cultura dos alunos e questiona o conceito de verdade inventado na modernidade.
Sem a preocupação de analisar qual concepção teórica predomina nos currículos das IES participantes da pesquisa, procurou-se identificar a estrutura e o espaço dado ao tema do envelhecimento humano. Assim, definiu-se o problema de pesquisa como sendo: Qual é a estrutura curricular dos cursos de graduação e quais são seus planos de ensino, para a formação profissional na perspectiva do envelhecimento humano?
Considerou-se ainda que o campo interdisciplinar da Gerontologia se “desenvolve no âmbito da evolução da educação de idosos, da formação de recursos humanos para lidar com a velhice, e na mudança das perspectivas das sociedades em relação aos idosos e ao envelhecimento” (Cachioni, 2008, p.92). A interdisciplinaridade vem sendo apontada como uma das características essenciais dos currículos do Ensino Superior no mundo contemporâneo, voltados para a formação inicial de profissionais que atuarão em diferentes contextos, tempos e espaços. A temática do envelhecimento, por ser relativamente nova na formação inicial de alunos de graduação, vai aos poucos sendo incorporada ao currículo. Por outro lado, instituições de Ensino Superior vêm buscando a via da interdisciplinaridade como proposta duradoura para a organização de seus currículos. As áreas de Educação e de Saúde se destacam, inclusive com publicações sobre suas experiências (Pombo, 2006; Vargas et al., 2008).
Assim, este trabalho busca comunicar os resultados do estudo realizado, com a finalidade de ampliar o debate acerca da formação de recursos humanos para trabalhar com a população idosa, em ambientes diversos das políticas de saúde e de educação e nos diferentes espaços da sociedade.
Procedimentos Metodológicos
A pesquisa, de abordagem quantitativa e qualitativa, adotou procedimentos metodológicos para a construção dos dados empíricos de abordagem descritiva. Optou-se por uma amostra representativa e intencional, abrangendo 14 Instituições de Ensino Superior (IES). Os critérios para a inclusão foram: (1) ser uma organização de ensino superior e integrante do Fórum Gaúcho; e (2) ser uma IES na qual esteja lotado um representante do Fórum Gaúcho no Estado do Rio Grande do Sul (RS) e que tenha algum envolvimento com ações voltadas ao envelhecimento.
Um questionário semiestruturado foi disparado para pró-reitores de ensino, coordenadores de cursos e professores de graduação, das áreas de saúde e de educação de todas as IES que fazem parte do Fórum Gaúcho através da ferramenta gratuita online do Google Docs. Os dados de pesquisa foram obtidos de forma voluntária e anônima, respeitando princípios éticos tanto no envio como na análise e divulgação dos resultados. As respostas, tabuladas com auxílio de software e tratamento estatístico simples, serviram de base empírica para a descrição e a análise dos resultados de pesquisa.
Antes, porém, foi enviada uma mensagem eletrônica aos reitores das instituições do Fórum esclarecendo sobre os objetivos da pesquisa e a importância da participação deles, além de solicitar o engajamento na divulgação entre os pares.
Os dados gerados pelas respostas dos participantes da pesquisa foram organizados em forma de gráficos, que se configuram como “figuras que servem para a representação do dado e que quando utilizados com habilidade, podem evidenciar aspectos visuais dos dados de forma clara e de fácil compreensão” (Marconi; Lakatos, 2006, p.38). Este estudo partiu das realidades concretas de cada Instituição envolvida com o envelhecimento no âmbito acadêmico e perpassa suas diversidades, estabelecendo, como ponto de chegada, possibilidades inovadoras de transformação e expansão dessas realidades.
O universo empírico da pesquisa é confrontado com aspectos teóricos dos currículos do ensino superior e do envelhecimento humano na perspectiva da formação inicial em Saúde e Educação e de dados secundários sobre o perfil sociodemográfico do Rio Grande do Sul, unidade da federação com maior percentual de pessoas acima de 60 anos de idade (17,6%), índice que supera os estados do Rio de Janeiro (16,3%), Minas Gerais (15,2%), São Paulo (14,8%) e Paraná (14,5%). Esses percentuais estão disponíveis na base de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e integram os dados da projeção populacional para o ano de 2018 (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2018).
De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Contínua), realizada pelo IBGE, a quantidade de pessoas idosas cresceu em todas as unidades da federação, o que foi constatado no período entre 2012 e 2017. Nessa metodologia do IBGE (PNAD Contínua), os estados do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro foram os que apresentaram o maior índice de crescimento demográfico da população idosa.
Resultados e Discussão
Buscamos construir dados empíricos a partir da amostra para saber quais cursos de graduação oferecem disciplinas obrigatórias ou eletivas regularmente sobre a temática. A Figura 1 mostra que, nas IES analisadas, a área da saúde oferece disciplinas que tratam do assunto envelhecimento em dezoito cursos e área de humanidades as oferece em nove cursos. Assim, levando em consideração o total de cursos, a área da saúde oferece o dobro de disciplinas se comparada com a área de humanidades.
Havia interesse em saber os conteúdos do currículo desses cursos de graduação para a compreensão do espaço dado ao envelhecimento na formação dos profissionais das áreas de saúde e de humanidades. A pesquisa identificou 162 disciplinas, obrigatórias ou eletivas, que, nos planos de ensino, dedicam espaço e tempo ao envelhecimento humano. No Quadro 1 estão transcritos os nomes das disciplinas.
Humanidades | Saúde |
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Longevidade, vida e sociedade | Saúde do idoso |
Avaliação psicológica | Atividade física para a terceira idade |
Cidadania e inserção social | Educação física e envelhecimento humano |
Desenvolvimento humano | Enfermagem clínica e cirúrgica |
Ética e Ética Organizacional | Envelhecimento humano |
Informática | Exercício físico e doenças neurológicas |
Interfaces do envelhecimento | Fisioterapia e Atenção à Saúde V |
Relações interpessoais | Fisioterapia em geriatria e gerontologia |
Psicologia da vida adulta e do envelhecimento | Fisioterapia na saúde do idoso |
Estágio básico | Ginástica e ginástica de academia |
Intervenção no contexto de trabalho | Internato em medicina de família e comunidade |
Metodologia do serviço social | Nutrição no cuidado |
Pedagogia em organizações sociais e empresariais | Políticas de saúde |
Pesquisa e educação no cotidiano escolar e não escola | Práticas corporais e envelhecimento |
Prática educativa I | Saúde coletiva |
Psicogerontologia | Saúde do idoso |
Psicologia da saúde | |
Relações interpessoais | |
Psicologia da vida adulta e do envelhecimento |
Fonte: Elaborada pelos autores (2018), com base na pesquisa realizada em 2017.
Utilizando essa lista das disciplinas ofertadas para a formação de profissionais da área de saúde e de humanidades, é possível perceber que a área da saúde privilegia temas como corpo, bem-estar e declínio biológico enquanto a área de humanidades prioriza temas como sociedade, relações humanas e o cotidiano.
Tem-se como hipótese que esse cenário resulta das Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Superior (DCN) que orientam a elaboração dos currículos dos cursos de graduação, devendo ser adotadas e implantadas por todas as Instituições de Ensino Superior (IES). As DCN também buscam auxiliar as IES na elaboração e implantação de seus projetos político-pedagógicos e foram instituídas por meio de resoluções do Conselho Nacional de Educação (CNE) e da Câmara de Educação Superior (CES). Desde as últimas duas décadas do século passado, o Ministério da Saúde (MS) e o Ministério da Educação (MEC) conduzem políticas e ações nacionais de educação para a saúde e vêm estimulando a implantação das diretrizes dos cursos de graduação da área da Saúde, com participação ativa no processo de revisão das DCN.
Os currículos do Ensino Superior vem sofrendo alterações em decorrência das novas perspectivas do conhecimento no mundo contemporâneo. Apesar disso, tem-se a impressão de que os currículos, sobretudo das áreas da Saúde e da Educação, têm pouco espaço previsto para a formação no âmbito da Geriatria e da Gerontologia. Dessa forma, salienta-se a relevância acadêmica do referido estudo considerando-se que a pesquisa se constitui como um elemento fundamental tanto para a formação como para a constituição de pesquisadores, na medida em que possibilita a integração entre a graduação e a pós-graduação, além de contribuir para aumentar os padrões de excelência acadêmica das universidades.
Para Neri (2009), a educação tem um papel importante na mudança de crenças e atitudes frente ao envelhecimento; ou seja, a educação pode ser, a longo prazo, uma forma eficiente, embora lenta, de modificação das distorções cognitivas associadas ao modelo biomédico. Dessa forma, faz-se importante refletir sobre o que dizem as diretrizes nacionais dos cursos de graduação em nosso país. As Diretrizes Curriculares Nacionais (Brasil, 1997) dos Cursos de Graduação estão embasadas em vários documentos e são atualizadas no decorrer do processo de regulação pelo Ministério da Educação.
Segundo uma pesquisa realizada por André e Almeida (2017) que buscou conhecer quem é o professor que atua nos cursos de Licenciatura, entender sua profissionalidade e investigar as condições em que realiza o trabalho docente, o reconhecimento ou não da função social do ensino está ligada ao desenvolvimento da atividade e à sua natureza, e, no caso do professor de Ensino Superior, os saberes específicos estão muito vinculados com o poder sobre a ação que desenvolvem.
As Diretrizes Curriculares Nacionais (Brasil, 2001) para os cursos da área da saúde foram elaboradas para orientar a elaboração dos currículos visando, sobretudo, a consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS). De acordo com o documento, os profissionais da saúde devem possuir formação generalista, humanista, crítica e reflexiva, e serem aptos a atuar em todos os níveis de atenção à saúde do sistema de saúde vigente no país, enquanto que as Diretrizes Curriculares Nacionais (Brasil, 2001) para os cursos de educação dão ênfase à formação inicial de professores que atuarão no contexto escolar e não escolar. De acordo com o documento, o projeto pedagógico do curso de Pedagogia teve de ser construído com uma matriz curricular estruturada em três núcleos: de estudos básicos, de aprofundamento e de diversificação de estudos.
A formação em saúde do idoso aparece de forma diversificada nos conteúdos das disciplinas específicas da área da saúde e nos estágios exigidos pelas IES. Os conteúdos que se sobressaem dizem respeito à ética, às relações interpessoais, às intervenções no trabalho, ao desenvolvimento humano, às práticas educativas, à longevidade, à família, à vida adulta e à velhice, aspectos biopsicossociais do envelhecimento.
Carvalho e Hennington (2015) realizaram uma pesquisa de revisão em periódicos nacionais e internacionais e constataram que, a partir dos anos de 2006, houve um aumento do número de publicações que se referem às reformulações que ocorreram nas políticas direcionadas à questão do envelhecimento humano. Enfatizam que o enfoque das políticas passou a ser a saúde e a atenção básica e que isso leva à necessidade de discutir a formação dos profissionais. A partir dessa constatação, as autoras afirmam em seu artigo que a “implementação das diretrizes curriculares teve papel importante na avaliação dos diversos cursos superiores da área por parte do Ministério da Educação, sendo este um fator que contribui para a maior atenção da academia em relação ao tema” (Carvalho; Hennington, 2015, p.419).
De acordo com os dados obtidos através da pesquisa, observou-se que das 162 disciplinas identificadas, 63,5% delas possuem abordagem interdisciplinar e 36,2% possuem também um enfoque disciplinar. Três hipóteses foram levantadas para tentar explicar o resultado encontrado: (a) a temática do envelhecimento nos currículos do Ensino Superior tem sustentação teórica interdisciplinar; (b) saúde e educação da pessoa são tomados como campos complexos que dizem respeito a problemas teóricos e à diversidade de práticas sociais; e (c) o currículo do Ensino Superior vem sendo tensionado na perspectiva da diversidade biológica e cultural da pessoa idosa, sendo que homens e mulheres participam de um processo enquanto espécie e sujeito sociocultural.
As ementas dos cursos, transcritas pelos respondentes nos questionários, estão sustentadas por um texto teórico que se mostra diversificado e multifacetado em termos de concepções, dimensões e caracterização do estudo sobre o tema do envelhecimento humano. De forma ampla, mais de 70% das disciplinas têm como objetivo a formação inicial (geral) do aluno sobre o assunto “envelhecimento humano”, a fim de entender o paradigma da velhice nos aspectos biopsicossociais.
De acordo com Cachioni (2003), no estudo sobre professores que lecionam nas universidades para a terceira idade, os escassos conhecimentos gerontólogos dão origem a falsas avaliações sobre a velhice e se traduzem em preconceitos sobre essa etapa da vida, resulta em formas de tratamento, práticas e políticas inapropriadas em relação aos idosos.
Existem estudos que reforçam não só a importância de se apresentar os conteúdos sobre envelhecimento aos jovens em formação, mas também de trazer a pessoa idosa para dentro das universidades e, assim:
[...] ao abrir suas portas para as diversas coortes etárias, possibilita a mudança de imagens sociais construídas sobre a velhice por parte dos jovens universitários e dos idosos. É importante a interação entre todas as idades e o respeito de suas peculiaridades. No ato da troca de experiências entre jovens e idosos ocorre uma interdependência fundamental para a construção de legados (Lima-Silva et al., 2012, p.262).
Outros estudos demonstram a fragmentação existente na área da saúde e a falta de disciplinas específicas para tratar a questão do envelhecimento humano nesses cursos. Um estudo realizado na Espanha mostrou que apenas 4% dos cursos de Educação Física oferecidos em 26 universidades do país oferecia alguma disciplina obrigatória relacionada à velhice, enquanto que 39% dos cursos de medicina ofereciam pelo menos uma disciplina sobre envelhecimento (Diaz et al., 2011).
Os dados empíricos da amostra sinalizam que os cursos de Enfermagem de todas as universidades pesquisadas, oferecem disciplinas voltadas ao envelhecimento humano em sua grade curricular, uma exigência das DCN do curso. Com relação aos cursos de Psicologia, sete universidades ofertam disciplinas específicas voltadas à problemática do envelhecimento humano. Os cursos de Fisioterapia de cinco universidades ofertam disciplinas que tratam da temática e dentre os cursos de Serviço Social não foram encontradas ofertas obrigatórias de disciplinas com ênfase na temática do envelhecimento dentre as IES gaúchas.
Esta pesquisa, ao analisar as disciplinas com a temática do envelhecimento encontradas, averiguou que as bibliografias básicas e complementar que sustentam as disciplinas são amplas, diversificadas e entrelaçadas a diferentes campos do saber e áreas de conhecimento. Nas áreas da Saúde e da Educação, figuram autores que produziram obras de sustentação teórica que contribuem com conceitos, metodologias e saberes sobre Geriatria e Gerontologia. Direito, ética, vida pós-moderna, economia, família, mobilidade urbana, organizações de atendimento ao idoso, rede de proteção social e turismo são alguns dos exemplos que complementam os títulos das referências.
Considerações Finais
Os resultados dessa pesquisa não podem ser tomados como conclusivos, tampouco como a síntese geral dos currículos do ensino superior voltados à formação dos profissionais que atuarão no atendimento à pessoa idosa, pois são representativos de um momento histórico e expressam uma tendência de mudança na formação inicial dos profissionais das duas áreas de conhecimento. Os currículos de graduação lentamente incorporam o assunto e os planos de ensino analisados revelam lacunas e ainda estão distantes da real necessidade da sociedade.
É preciso registrar também, que as diretrizes curriculares do MEC para os cursos de graduação não são suficientes para fomentar a mudança na formação inicial dos profissionais da saúde e da educação. Concluiu-se que é imperativo o ensino como projeto orgânico voltado para todas as idades e gerações, do materno-infantil à velhice, na articulação entre as duas grandes áreas: Geriatria e Gerontologia.
Os dados construídos nesta pesquisa poderão subsidiar os diálogos acadêmicos das IES que se propõem a pautar o assunto na formação inicial dos estudantes de Saúde e Educação nos Núcleos Docentes Estruturantes dos cursos de graduação. Importante ressaltar, conforme já mencionado, que o Rio Grande do Sul possui o maior percentual de população idosa entre os estados da federação. Cabe assim ao Fórum Gaúcho a tarefa de propor, refletir e produzir conhecimentos necessários à consolidação de práticas de ensino voltadas à pessoa idosa. Existe a necessidade de se entender a velhice sob múltiplas dimensões: biológica, social, cultural e psicológica.
É possível que os dados da pesquisa sinalizam a implantação de disciplinas ou de conteúdos programáticos de disciplinas de cursos de graduação das IES pesquisadas de maneira gradual, porém de forma mais intensa nos últimos 15 anos.
A interdisciplinaridade como princípio organizador dos currículos de graduação mostra-se uma característica essencial em termos de mudança ou de tendência. A temática do envelhecimento, por ser relativamente nova na formação de alunos de graduação, vai, aos poucos, sendo incorporada ao currículo do ensino superior e as Diretrizes Curriculares Nacionais servem de orientação e de recomendação frente ao currículo de graduação.
Por último, espera-se que este trabalho contribua para ampliar o debate na perspectiva da formação humana e científica daqueles que trabalham ou pretendem trabalhar no atendimento à população idosa, de forma qualificada e na perspectiva dos direitos humanos da pessoa idosa.
Compreende-se ser fundamental que se estimulem ações educativas, as quais podem ser desenvolvidas não só nas universidades, como também nas escolas e na sociedade de maneira geral, para todas as faixas etárias e de forma continuada, em busca da construção de uma nova cultura sobre o processo de envelhecer.