1 INTRODUÇÃO
A interminável discussão acerca da proibição/permissão uso de tecnologia móvel na escola tem sido inócua para crianças e adolescentes que já se habituaram ao seu uso. Esse cerceamento na sala de aula acaba por tornar obrigatórias novas e numerosas regras que permitam o acesso a tablets e celulares em outros ambientes, que não o vetado, para que haja condição de se cumprir a exigência. Alheios à incompreensão de pais e educadores, os estudantes permanecem afeitos ao porte e uso de smartphones nas escolas, apenas esperando momentos favoráveis para burlar a regra. Dada a irreversibilidade da situação por medidas anacrônicas, há docentes que passam a se interessar por recuperar a motivação de seus alunos.
Sensível aos anseios das comunidades dos municípios de seu entorno, a Universidade Metropolitana de Santos (UNIMES) desenvolve um projeto de pesquisa denominado Uma análise das políticas públicas no Ensino Fundamental: a utilização das Tecnologias de Informação e Comunicação nos currículos das escolas da Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS), vinculado ao Programa de Mestrado Profissional em Práticas Docentes do Ensino Fundamental. Entre outras atividades desenvolvidas, o grupo de pesquisa, por meio do curso de extensão intitulado Práticas Docentes no Ensino Fundamental, promoveu a formação dos docentes oriundos de toda a RMBS desafiando-os e acompanhando suas produções. Assim, o tema desse estudo encerra o exame dessas produções ao longo do curso de extensão como resposta a esses desafios.
O grupo teve suas pesquisas iniciadas em 2015 e até 2017 foram realizados levantamentos bibliográficos buscando produções acadêmicas brasileiras por meio das expressões: “Ensino no Ensino Fundamental”; “Práticas Docentes no Ensino Fundamental”; “Tecnologias de Informação e Comunicação” e “Formação de Professores”, nas bases: banco de teses e dissertações CAPES e SCIELO. Além destas pesquisas, também contribuíram para o aprofundamento do referencial teórico as pesquisas “Formação de Professores - TPACK e a Relevância das TIC no Processo de Ensino e Aprendizagem no Ensino Fundamental” (REIS, 2017) e “As Tecnologias de Informação e Comunicação como Fator Motivacional no Ensino Fundamental” (CRUZ, 2018b), ambas frutos de dissertações desenvolvidas no programa de mestrado profissional da Universidade ao qual o grupo de pesquisa está vinculado.
A busca por este tema se justifica pelas referidas pesquisas realizadas recentemente que têm revelado um baixo índice de aproveitamento escolar no Ensino Fundamental, a não ser no que se refere a TPACK (Technological Pedagogical Content Knowledge).
A representação da estrutura do TPACK, chamada também de Conhecimento Tecnológico e Pedagógico do Conteúdo, é uma extensão da teoria de Conhecimento Pedagógico do Conteúdo (PCK) elaborada por Lee Shulman em 1986 [...]. Sua teoria previa a interação e não apenas a junção entre os conhecimentos Pedagógicos e do Conteúdo. A teoria PCK envolve a compreensão de como representar e formular um determinado tema ou conteúdo de formas diversificadas, visando facilitar a aprendizagem dos alunos (REIS, 2017, p. 65).
Cruz (2018a) informa que a receptividade dos alunos para a implementação das TIC (Tecnologias de Informação e Comunicação) diz respeito, sobretudo, à autonomia, ao prazer e à motivação que o emprego da tecnologia pode oferecer. No entanto, é observada a limitação de seu uso, seja pela ausência de intencionalidade pedagógica na prática docente, seja pela indisponibilidade dos recursos sob todos os seus aspectos (atualização, acesso à internet etc.).
Com o objetivo de elucidar se as TIC podem potencializar a aprendizagem e o desenvolvimento de competências essenciais à formação dos alunos, em decorrência da desatualização das salas de informática de parcela considerável das escolas dessa Região e da limitação do acesso à internet, iniciou-se a formação de docentes para o aproveitamento do smartphone em sala de aula. Apesar do termo TIC (Tecnologia da Informação e Comunicação) ser comumente utilizado para designar um conjunto de recursos tecnológicos, incluindo os não digitais como o jornal ou a televisão, optou-se, neste estudo, pela designação TDIC (Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação), mais apropriada para caracterizar os equipamentos e as interfaces utilizados ao longo desse estudo e que vem sendo amplamente empregado por pesquisadores como Baranauskas e Valente (2018).
A questão que move esta investigação é indagar se o uso de tecnologia móvel por professores da região pode fazer parte do cotidiano das salas de aula, no Ensino Fundamental. Entretanto, apenas a utilização de tecnologia desprovida de qualquer significado para os alunos, não satisfaria as exigências do projeto de pesquisa. Nesse sentido, foram tomados como parâmetro para avaliação da qualidade das atividades oferecidas aos ou elaboradas pelos professores, os estudos de Cruz (2018a); Cruz (2018b); Silva (2016); Zabala (1998); Zabala e Arnau (2010); Moreira (2012); Freire (1996); Reis (2017); Gomes (2005); Almeida (2006); Almeida e Valente (2012); Lévy ( 2007); Schön (1992); D’Ambrosio (2002); Kenski (2008); Chizzotti (2000); Gil (2008); Moran, Masetto e Berhnes (2000); Melo e Mallmann (2015); Baranauskas e Valente (2018).
Pela natureza da questão da pesquisa que deveria envolver os currículos e a rotina das salas de aula das escolas públicas municipais da RMBS, tais como são interpretados pelos professores, bem como seu preparo para interferir nos mesmos utilizando TDIC (Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação), a metodologia adotada, no domínio da pesquisa qualitativa foi a pesquisa-ação.
[...] um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos do modo cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 1985, p. 14 apud GIL, 2008, p. 30).
A definição de Thiollent contempla o desenvolvimento do estudo, posto que ao se investigar a efetividade do uso dos smartphones em sala de aula, o que se concretizou foram exatamente propostas de desafios pelos pesquisadores aos professores participantes, para que, a partir de suas respostas, fossem todos envolvidos nesse processo de descoberta de modo colaborativo e participativo.
Ao examinar Chizzotti, constatou-se que o caso selecionado pode ser utilizado tanto para fundamentar esta situação quanto para propor uma ação de intervenção, podendo ser “considerado também como um marco de referência de complexas condições socioculturais que envolvem uma situação e tanto retrata em realidade quanto revela a multiplicidade de aspectos globais, presentes em uma dada situação” (CHIZZOTTI, 2000, p. 102).
É fato que esse estudo reflete um momento minimamente curioso da educação nacional, posterior à proliferação de salas de informática com computadores obsoletos, CDs e aparelhos de DVD, chamados educativos. Esses equipamentos nem foram totalmente dominados pelos professores e já não exercem fascínio sobre os alunos (considerados nativos digitais).
As circunstâncias de que se investe o problema de pesquisa é representativa da realidade de muitas escolas, situadas não somente nos arredores de onde ocorre este estudo, mas por todo o país, o que favorece a aproximação de situações similares, permitindo algumas inferências (CHIZZOTTI, 2000). Além disso, conforme o autor, os professores pesquisados “têm uma capacidade potencial de identificar suas necessidades, formular seus problemas e organizar sua ação” (2000. p. 105), facilitando o processo decisório para reorganizar a própria prática, a fim de aperfeiçoá-la.
Caracterizados os pesquisados por meio de questionários de múltipla escolha, a execução da pesquisa foi programada para se efetivar em três encontros. No primeiro encontro, além da confirmação dos dados obtidos por meio dos questionários, os professores foram desafiados a criar blogs por meio do aplicativo WordPress; desenvolver conceitos de geometria, utilizando o aplicativo GeoGebra e verificar a retenção de conceitos na memória, por meio do aplicativo Kahoot! No segundo encontro, os docentes foram instados a recuperar o conceito de sequência didática, doravante denominada SD, reconstruindo-o com a utilização de diversos gêneros textuais, utilizando a plataforma Renderforest (https://www.renderforest.com/pt/), o PowerPoint e o YouTube (https://www.youtube.com/) para a elaboração e o compartilhamento de animações em formato de vídeo. No último e terceiro encontro, a provocação oferecida foi a publicação de SD já desenvolvidas por eles em suas escolas, utilizando os recursos do Canva e das demais TDIC apresentadas nos encontros anteriores.
O registro deste estudo é iniciado pela descrição do desenho dos encontros, seguida da pormenorização da escolha das ferramentas utilizadas em cada um deles, a saber: WordPress, GeoGebra, Kahoot!, Renderforest, PowerPoint, YouTube e Canva. Passa-se, então, aos resultados obtidos e sua análise, para se chegar às considerações finais.
2 DESENHO DOS ENCONTROS PRESENCIAIS
Em cada um dos três encontros presenciais contou-se com um momento introdutório diferente. No primeiro, a exemplo do que é costume, houve uma apresentação expositiva pelos pesquisadores aos 93 educadores (47 professores e 46 gestores) reunidos no anfiteatro da Universidade para um acolhimento e uma explanação do projeto de pesquisa. Em seguida, os pesquisados foram separados em grupos de quatro componentes que ocuparam três salas, para a explicação das atividades que seriam desenvolvidas. No segundo encontro, com o número de docentes participantes reduzido em um terço, ocupando apenas duas salas, a participação de um pesquisador para atualizar os professores sobre o que lhes seria oferecido foi substituída por uma animação. No último e terceiro encontro, os docentes ocuparam somente uma sala, o que revelou desistências ou percalços ao comparecimento. Nesse encontro, foram recuperadas na memória dos participantes as atividades efetivadas nos anteriores, por meio da plataforma Canva, em clima de familiaridade.
Após a parte introdutória, em todos os encontros, seguiram-se as denominadas, pelos pesquisadores, estações que compreenderam os momentos de produção pelos docentes, fazendo uso do(s) aplicativo(s) apresentado(s). Todas essas produções foram postadas e compartilhadas em uma Sala denominada Projetos e Pesquisas no, Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) adotado pela Universidade. A criação de vínculos foi favorecida pelo acolhimento dos docentes na entrada, com um leve café da manhã; um breve intervalo para um lanche e uma despedida com música ao vivo no segundo encontro, e execução de canto por todos os presentes - docentes, pesquisadores, equipe de apoio, ao som de Heal the World (Cure o Mundo) de Michael Jackson, nas vozes do grupo vocal Roupa Nova.
3 PRIMEIRO ENCONTRO PRESENCIAL
Nesse encontro, foram utilizados como recursos digitais o WhatsApp, o WordPress, o GeoGebra e o Kahoot! (https://kahoot.com/). O encontro foi dividido em três estações: criação de blogs com o WordPress, elaboração de quiz gamificado com o aplicativo Kahoot! e desenvolvimento de conceitos matemáticos com o aplicativo GeoGebra. Os participantes foram separados em três salas de forma que todos passassem por todas as estações. O WordPress caracteriza-se por apresentar interface intuitiva; multiplataforma (web e app); ser acessível por meio de uma conta Google (o que otimiza o cadastro na plataforma) e versão gratuita que permite a criação de blogs.
Na atividade proposta para a criação dos blogs, os professores foram orientados a se organizar em grupos no WhatsApp. Cada grupo formado deveria dar andamento à discussão de como e com que assuntos o grupo poderia criar um blog. Os docentes que ainda não utilizavam o WhatsApp sentiram-se muito satisfeitos, enquanto os já usuários, satisfaziam-se auxiliando os colegas a utilizar o aplicativo.
A escolha da criação de um blog vai ao encontro das expectativas de muitos autores em relação à interatividade que se pode estabelecer entre todos os envolvidos nos processos formativos. De acordo com Gomes (2005, p. 313), a criação de um blog “pode, e deve, ser um pretexto para o desenvolvimento de múltiplas competências [...] associadas à pesquisa e selecção de informação, à produção de texto escrito, ao domínio de diversos serviços e ferramentas da web”. A autora considera que a economia e a simplicidade da utilização dos espaços de discussão garantidos pelos blogs têm incentivado usuários da internet que ainda estão construindo a sua prática.
Um blog pode ser para o seu autor um simples arquivo de links úteis enriquecido com comentários ou descrições do seu teor. Pode também constituir um registo digital das reflexões e/ou emoções do seu autor ou apresentar-se com um espaço de troca de ideias e confronto de perspectivas, procurando o escrutínio público e incentivando a participação dos bloggers que o visitam (GOMES, 2005, p. 312).
A segunda estação, nesse encontro, tinha como proposta a exploração de Formas Geométricas no Contexto do Mundo Digital e contemplava o GeoGebra, um aplicativo educativo desenvolvido para todos os níveis de ensino da Matemática, contemplando geometria, álgebra, tabelas, gráficos, estatística e cálculo. Assim como o WordPress, o GeoGebra caracteriza-se por apresentar interface intuitiva; multiplataforma (web e app); ser acessível por meio de uma conta Google (o que otimiza o cadastro na plataforma) e versão gratuita.
Inicialmente os participantes foram orientados sobre como obter o aplicativo e também apropriaram-se de alguns comandos básicos relacionados às configurações do mesmo, sendo incentivados a explorar livremente os recursos disponíveis, especialmente aqueles referentes aos conceitos de ponto, segmento de reta e polígono. Em seguida, foi proposto que eles construíssem cinco diferentes figuras planas na malha quadriculada. Posteriormente, os participantes foram orientados sobre as possibilidades que o GeoGebra oferece em relação aos conceitos relacionados às medidas dos segmentos dos polígonos, perímetro e áreas das figuras e medida de ângulos, permitindo aos alunos iniciarem sua Educação Matemática com ênfase também em geometria e estatística cujos conceitos aproximam-se mais de seu cotidiano.
A escolha do GeoGebra deveu-se exatamente à universalidade de suas aplicações considerando o conhecimento anterior do aluno. As tarefas vão se complexificando de acordo com as possibilidades que o aluno passa a apresentar, em consonância com a avaliação do professor. Nesse sentido, é possível perceber uma aproximação entre o aplicativo; a Etnomatemática1 de D’Ambrósio (2002) e a autonomia, em Freire (1996).
É evidente a dimensão política da Etnomatemática. Etnomatemática é a matemática praticada por grupos culturais, tais como comunidades urbanas e rurais, grupos de trabalhadores, classes profissionais, crianças de uma certa faixa etária, sociedades indígenas, e tantos outros grupos que se identificam por objetivos e tradições comuns [...]. A dignidade do indivíduo é violentada pela exclusão social, que se dá muitas vezes por não passar pelas barreiras discriminatórias estabelecidas pela sociedade dominante, inclusive e, principalmente, no sistema escolar (D’AMBROSIO, 2002, p. 9).
A referência ao caráter cultural e subjetivo da matemática como manifestação humana, resgata o bem-querer e o respeito ao aluno, tão caros a Paulo Freire:
A resistência do professor, por exemplo, em respeitar a ‘leitura de mundo’ com que o educando chega à escola, obviamente condicionada por sua cultura de classe e revelada em sua linguagem, também de classe, se constitui em um obstáculo à sua experiência de conhecimento. [...] No fundo, o educador que respeita a leitura de mundo do educando, reconhece a historicidade do saber, o caráter histórico da curiosidade, desta forma, recusando a arrogância cientificista, assume a humildade crítica, própria da posição verdadeiramente científica (FREIRE, 1996, p.46).
A exploração do GeoGebra gerou entre os pesquisadores a expectativa de que os professores pudessem efetuar a transposição didática em suas salas de aula, quando de seu retorno às escolas, o que de fato, ocorreu.
A terceira estação desse encontro contemplou a aplicação de um quiz (questionário) com o aplicativo Kahoot! abordando questões acerca do tema Figuras geométricas espaciais. O Kahoot! apresenta interface intuitiva; multiplataforma (web e app) e pode ser acessado utilizando uma conta Google, otimizando o cadastro na plataforma. Foi concebido para a área da Educação e conta com uma comunidade de educadores que compartilham suas produções e permitem que outros professores editem seus questionários.
Por possuir uma interface gamificada, divertida e permitir a elaboração de perguntas no formato múltipla escolha, foi possível perceber a motivação dos professores para participar desta atividade e se interessarem por aprender a desenvolver novos questionários, para aplicar em sala de aula. O aplicativo permite que alunos participem online por meio de computadores, tablets ou smartphones.
A escolha do Kahoot! aparentemente, um teste de memorização que culmina com vencedores e vencidos, atraiu inicialmente a atenção dos pesquisadores apenas por seu caráter lúdico, tão ao gosto dos alunos. No entanto, a depender de como se elaboram as questões, as regras do jogo e, ainda, de como se organizam os grupos (autônoma ou heteronimamente2), é possível que se construam competências relativas aos conteúdos atitudinais, no entendimento de Zabala e Arnau (2010). Os conteúdos atitudinais, apreendidos em meio a grande vinculação afetiva, referem-se à assunção de posturas (atitudes) que interferem nas relações interpessoais, pois dizem respeito a valores, normas, preferências, sentimentos e crenças, por exemplo. Não há como relacionar-se sem competência atitudinal. Tanto o diagnóstico da presença dessa competência quanto sua construção avultam-se em um jogo como o Kahoot!, permitindo as interferências adequadas.
4 SEGUNDO ENCONTRO PRESENCIAL
No segundo encontro com os professores, conforme mencionado anteriormente, foi apresentada uma animação pela plataforma Renderforest, propositalmente interrompida duas vezes, para que houvesse interação presencial com os docentes. Na primeira interrupção foi proposta uma brainstorm a respeito de termos ou frases que comporiam uma SD. Por meio dessa atividade, foi possível apurar que os participantes dominavam vocabulário pertinente a esse conceito. A segunda interrupção objetivou o reconhecimento dos diversos gêneros textuais apenas por suas representações imagéticas. Entre os gêneros apresentados constaram: convite, receita culinária, charge, tirinha, hashtag, ofício, textos legais, soneto, preenchimento de envelopes, e-mail, filme, peça teatral, hipertexto etc.
Os professores deveriam elaborar uma SD e havia uma expectativa de que optassem pelos gêneros textuais apresentados, no entanto, a unanimidade das escolhas recaiu sobre o Renderforest, utilizado como estratégia para envolvê-los na atividade. O Renderforest permite a criação personalizada de animações em formato de vídeo, combina recursos de imagem, texto e música e é gratuito para animações de até 3 minutos.
Embora a equipe não estivesse totalmente preparada para a orientação quanto ao uso desse recurso, dada a surpreendente escolha, estabeleceu-se um trabalho colaborativo entre pesquisadores e professores e todas as necessidades foram satisfeitas. O que se presenciou foi a concretização do que Paulo Freire (1996, p. 50) denominou “disponibilidade para o diálogo”. Os professores ansiosos por conhecer o funcionamento do Renderforest empenharam-se em pesquisar a plataforma, juntamente com os pesquisadores promotores do encontro que não se acreditavam com suficiente desenvoltura para “ensinar” a usá-la.
Me sinto (sic) seguro porque não há razão para me envergonhar por desconhecer algo. Testemunhar a abertura aos outros, a disponibilidade curiosa à vida, a seus desafios, são saberes necessários à prática educativa. Viver a abertura respeitosa aos outros e, de quando em vez, de acordo com o momento, tomar a própria prática de abertura ao outro como objeto da reflexão crítica deveria fazer parte da aventura docente (FREIRE, 1996, p. 50-51).
A mesma situação ainda ilustra a formação do profissional reflexivo, ao referir-se à reflexão na ação e à reflexão sobre a reflexão na ação3, como as entendeu Schön (1992 apud NÓVOA, 1992, p. 83):
Existe, primeiramente, um momento de surpresa: um professor reflexivo permite-se ser surpreendido pelo que o aluno faz. Num segundo momento, reflete sobre esse fato, ou seja, pensa sobre aquilo que o aluno disse ou fez e, simultaneamente, procura compreender a razão por que foi surpreendido. Depois, num terceiro momento, reformula o problema suscitado pela situação [...] Num quarto momento, efetua uma experiência para testar a sua nova hipótese.
A partir de então, tendo-se explorado o Renderforest para atender aos anseios dos professores, passaram a ser desenvolvidas as SD de acordo com o entendimento que os docentes haviam manifestado quando da prática de brainstorm. Assim mesmo, os pesquisadores compartilharam, no AVA, links contendo informações a respeito de SD, em que eram empregados diversos gêneros textuais sobre diferentes suportes, respeitando-se o desenvolvimento individual da competência leitora dos docentes, a saber: Animação, texto escrito, mesa redonda em vídeo, entrevista em texto escrito, entrevista em vídeo e blog4.
Além do Renderforest, os professores ainda poderiam utilizar o PowerPoint, a cujo uso estavam habituados. O PowerPoint, popularmente utilizado por alunos e professores, possui versão online e off-line, multiplataforma (software, aplicativo e web), permite criar apresentações com transições e animações, além de ser gratuito na versão web. O acréscimo a essa experiência formativa, foi a possibilidade de publicar suas produções no YouTube, para compartilhá-las, não só com os demais colegas da sala em que se encontravam, mas também com colegas das escolas de onde eram oriundos e com seus alunos. O YouTube é uma das plataformas mais populares para o compartilhamento de vídeos; é gratuito; apresenta interface intuitiva; multiplataforma (web e app) e também permite acesso via conta Google.
Houve uma orientação para preparar as SD com PowerPoint, incluindo os recursos de transição e animação dos objetos incorporados nos slides. Em seguida, poderiam salvar o arquivo como vídeo do Windows media (.wmv) - recurso disponível no próprio PowerPoint. Como material de apoio, também foi incluído na sala um tutorial sobre como publicar vídeos no YouTube. Ao final da atividade, os professores compartilharam suas produções em um fórum, no AVA, e as apresentaram para o grupo de sua sala, o que foi o mote para a escolha do YouTube.
Entre tantas críticas ao uso da tecnologia, encontra-se a provocação do isolamento. Nos grupos que se reúnem presencialmente, há sempre alguém com um smartphone ou tablet em mãos. No entanto, por irreversível que seja esta situação, é preciso compreendê-la como parte desse momento histórico. Examinando Lévy (2007), é possível divisar um novo papel para os que insistem no confronto com as TDIC:
Ora, neste começo de século, os intelectuais se deparam com o início de uma mutação cultural de grande amplitude. A maioria dos produtos e dos procedimentos simbólicos da humanidade é digitalizada ou, ao menos, representada por documentos digitais, e disponível on-line sob a forma de textos, imagens, sons, músicas e equipamentos variados. Além disso, nós já dispomos de uma miríade de automatismos manipuladores de símbolos capazes de se coordenarem em rede para filtrar, interpretar e transformar, à vontade, os dados digitais (LÉVY, 2007, p. 13).
Para além da comodidade e da rapidez do acesso à informação promovida pelas TDIC, há vídeos presentes no YouTube, que agregam os mais diversos interesses, inclusive relativos a práticas em sala de aula, e permitem comentários de quem a eles assiste, o que se constitui em feedback, para os autores. Não raro, nos comentários ocorrem trocas de informações que podem caracterizar precariamente as interações tão oportunas nas relações a distância. Assim, “Os ambientes digitais oferecem novos espaços e tempos de interação com a informação e de comunicação entre os mestres e aprendizes. [...] Interagir com as informações e com as pessoas para aprender é fundamental” (KENSKI, 2008, p. 11, 12). Consideradas as ponderações da autora, evidenciam-se as razões pelas quais o YouTube participou das ferramentas, nesse encontro: agrega incontável diversidade de interesses e pode possibilitar a interatividade.
5 TERCEIRO ENCONTRO PRESENCIAL
Antes de apresentar a proposta de trabalho para esse encontro, o grupo de pesquisadores recuperou os encontros anteriores, dada a possibilidade de algum dos presentes não ter comparecido a algum deles.
A TDIC empregada nessa estação foi o Canva, uma aplicação multiplataforma desenvolvida para a criação de imagens de alta qualidade, com interface intuitiva que utiliza o formato de “arrastar e soltar”. Esta plataforma oferece inúmeros layouts voltados para diversas áreas (Educação, Marketing, Saúde...) e designs variados (infográficos, apresentações, redes sociais) totalmente editáveis. A versão gratuita é completa e permite, via conta Google, o trabalho em equipe. Nesse encontro os participantes também puderam contar com um tutorial de utilização do Canva, disponibilizado no AVA.
A título de exemplo, os pesquisadores apresentaram uma SD utilizando um dos inúmeros recursos oferecidos no Canva. A proposta era que os professores reescrevessem SD já realizadas, utilizando uma das TDIC entre as exploradas nos três encontros, e a publicassem no fórum disponível no AVA.
Para escolher o Canva, foram discutidos os conceitos de estética e de arte na cibercultura. Partiu-se do entendimento de estética tal como tem sido concebida relacionada à beleza sensível, despojada das diversas nuances que grandes pensadores têm lhe conferido (como, por exemplo, associada à ética), para inferir-se que a valorização de um layout multimodal criado com elementos estandardizados seria decorrente de uma profunda imersão na cibercultura. No entanto,
Na ótica de Freire, transposta para o contexto de uso das TDIC, o sujeito passa a ser autor produtor de suas obras, mobilizando letramentos na leitura e construção de conhecimento, com o uso de linguagens midiáticas em práticas multimodais ou hipermodais; participando criticamente do mundo digital como leitor ativo, produtor e emissor de informações provenientes de textos construídos com palavras, gráficos, sons e imagens dispostos em um mesmo plano; dominando as regras que regem a prática social da comunicação midiatizada pelos instrumentos e símbolos da sociedade digital (BUZATO, 2009 apud ALMEIDA; VALENTE, 2012, p. 69).
Maior ainda que suas possibilidades estéticas o mais louvável potencial do Canva traduz-se pela oportunidade de se realizarem trabalhos colaborativos, o que resgata o já amplamente observado pelos estudiosos da aprendizagem sociointeracionistas. Há que se ressalvar a diferença entre aprendizagens cooperativas e colaborativas:
Uchôa e Uchôa (2012) afirmam que na aprendizagem colaborativa os estudantes são responsáveis pela própria aprendizagem e aprendizagem dos outros membros e constituem a base da produção do conhecimento. [...] Na produção cooperativa os esforços dos participantes são divididos, cada um com sua parcela de responsabilidade em que a contribuição de todos gera o resultado final. Ao passo que a colaboração pressupõe a intervenção e a participação de todos de maneira mais livre, não hierárquica e crítica, a todo o momento, durante todo o processo de produção do conhecimento (MELO; MALLMANN, 2015, p. 522).
É indiscutível a presença da estética em ambientes educacionais. Fundamentar a escolha das ferramentas selecionadas, para pesquisadores em busca dos porquês de tudo o que ocorre na escola trouxe um grande conforto. Outrossim, para maior comodidade em relação à execução de todas as atividades, o único conceito pertinente à prática em sala de aula referenciado foi o de SD a respeito de cujo vocabulário os professores mostraram domínio. Também foi disponibilizado, no AVA, um subsídio teórico relativo ao tema.
Posto isso, passamos ao exame dos trabalhos efetuados pelos professores.
6 ANÁLISE DOS RESULTADOS
A respeito do WordPress, apesar do grande envolvimento dos professores na atividade, apenas um grupo criou e alimentou seu blog. Outros dois grupos criaram seus blogs apresentando a mesma postagem, com títulos diferentes. Houve um grupo que apresentou um blog criado por um dos professores em 26 de junho de 2009; mais um que somente acessou o WordPress sem criar o blog; outro ainda que registrou um endereço inexistente de seu blog e por fim, um grupo que apresentou a página da escola no Facebook.
Conforme observou Almeida (2006, p. 4), “as potencialidades já ressaltadas da tecnologia digital não são suficientes para garantir a aprendizagem, tampouco indicam que uma única tecnologia seja adequada a todas as situações educacionais”. Esta situação permite algumas observações, como, por exemplo, a de que nem todos os grupos sentiram-se desafiados a participar da atividade, posto que alguns dos professores sequer faziam uso do smartphone para outros fins, além da telefonia. Parece que esses grupos deixaram-se dominar por essa dificuldade agravada pela oscilação da conexão com a internet no local onde se desenvolveu o encontro, a exemplo do que habitualmente ocorre nas escolas. Outro fator que pode ter interferido no aproveitamento da criação do blog foi o cansaço. Nesse encontro, além da criação do blog, os professores ainda vivenciaram a exploração do GeoGebra e do Kahoot!. Por fim, é possível que a entrega de um produto final a qualquer preço, como ainda se cobra na escola tradicional acabou por sobrepor-se ao esforço a ser despendido na resolução de um problema, motivo da origem de postagens totalmente alheias ao que se propôs nesse encontro.
As postagens referentes ao segundo encontro, revelaram-se mais condizentes com os propósitos a que se destinavam: criação de SD. A primeira delas cujo público era a comunidade escolar foi elaborada com a utilização do Renderforest5 e resumia os passos para se criar um conselho de escola.
A produção seguinte revelou domínio do Renderforest pelos professores que, no entanto, não elaboraram uma SD. Apenas manifestaram seu receio a respeito do uso do celular em sala de aula, propondo, como solução para a dúvida a respeito do sucesso de uso desse recurso, as metodologias ativas.
Outra SD apresentada no YouTube foi a denominada “Quem sou eu?”6, que prevê a produção de um texto autobiográfico a partir da exploração de contos de fadas, composto por diversas etapas: levantamento dos contos conhecidos (conhecimentos prévios sobre o assunto); resgate, por meio da leitura, dos contos apresentados; definição e apresentação dos personagens a serem trabalhados (Chapeuzinho Vermelho, Rapunzel, Branca de Neve); estudo das características dos personagens; apresentação de biografias; conhecimento e descrição dos personagens sorteados; construção de biografias dos personagens; construção da própria biografia para ser exposta em mural. As fases da SD foram bem delimitadas e ficou evidente o entendimento desse conceito pelas professoras, mas não foi utilizada qualquer TDIC para o desenvolvimento da atividade com os alunos. Observe-se que o uso social da linguagem foi subutilizado no momento em que as autobiografias ficaram expostas em um mural. A atividade poderia ter culminado, por exemplo, com a edição de um livro com cópias e evento para autógrafos. Seria um excelente apelo aos pais resistentes, para que compareçam à escola.
Entre as mais completas SD destaca-se a que explora a água. Criada em PowerPoint e postada no YouTube7, apresenta a relação de atividades que devem ser desenvolvidas com os alunos, a saber: vídeo, tempestade de ideias, debate e produção textual, com todas as referências necessárias para a execução de cada atividade. O grupo demonstrou domínio tanto das ferramentas tecnológicas quanto do conceito de SD.
Uma forma original de apresentar a SD, criada no Renderforest, foi com um convite para a turma participar da história de João e o pé de feijão. Ao final do conto, expõe-se a receita do bolinho de feijão, que por se tratar de fritura, certamente não seria exequível por crianças. No final da apresentação, há a criação de um convite para os pais comparecerem à feira de ciências a fim de conhecerem os minichefs. Existem desenhos na animação que não se relacionam com o assunto tratado, como por exemplo, o de uma panqueca para ilustrar o bolinho. Além do problema conceitual explicitado pela troca de gastronomia por ciências, na receita, a farinha de trigo é chamada simplesmente de trigo, o que para cozinheiros iniciantes pode ocasionar graves confusões. Observa-se, assim, um indicativo de que não existe um cuidado com a linguagem dirigida às crianças.
Simples e objetiva, a SD “A cigarra e a formiga” solicitava dos alunos, do primeiro ano do Ensino Fundamental, a reescrita do conto sob a forma de poema. Entretanto, talvez essa tarefa ainda não seja possível com alunos do primeiro ano.
No terceiro encontro, a primeira postagem foi efetuada por duas gestoras que utilizaram o Canva no formato de infográfico para ilustrar a SD que lhes pareceu ter sido elaborada pelos pesquisadores, para ser desenvolvida com os pesquisados, nos encontros oferecidos no curso de extensão. Relacionaram o curso de extensão com o programa de mestrado da Universidade desde a apresentação do projeto passando pela questão norteadora e ilustrando os recursos tecnológicos aplicados em cada encontro presencial. Durante a apresentação para o grupo, foi possível perceber o entusiasmo e o interesse em ingressarem no programa de mestrado da Universidade.
Em seguida, uma professora apresentou uma rica SD com o tema “Os Quilombos - Uma ideia de liberdade”, utilizando para isso o aplicativo Canva. Depois de explorarem o Dia da Consciência Negra, os alunos elaboraram um curta metragem sobre os quilombos. De acordo com a professora, a SD foi iniciada pela apresentação da temática como importante refúgio para os africanos escravizados no período colonial. O objetivo da pesquisa a ser efetuada pelos alunos era obter conhecimentos sobre os atores da época e as características dos quilombos, incluindo o de Palmares. Foram oferecidas orientações sobre a elaboração do roteiro, dos cenários, os papéis, o storyboard que contém os desenhos das cenas, a renderização ou edição e o produto final. O trabalho foi realizado com as três classes de nono ano do Ensino Fundamental de uma escola municipal localizada em São Vicente, mas não nos foi apresentado. Embora a professora não tenha oferecido detalhes do desenvolvimento da atividade, a natureza da escolha mostrou o caráter inovador do estudo proposto. Há de se concordar com Zabala (2010), quando anuncia a substituição do perfil propedêutico da escola, por uma função com caráter orientador “que facilite a cada um dos alunos o acesso aos meios para que possam se desenvolver conforme suas possibilidades, em todas as etapas da vida, formando pessoas com competências imprescindíveis para o desenvolvimento pessoal, interpessoal, social e profissional” (ZABALA; ARNAU, 2010, p. 22). Supondo-se que houve necessidade de pesquisa para a criação de cada uma das fases mencionadas pela professora para a realização do filme; de diversas reuniões em grupos com propostas de acordos; do compromisso com o produto final, não há dúvida de que esta produção favorece a construção das competências apontadas por Zabala (2010). No entanto, não foi possível distinguir se a atividade promoveu uma aprendizagem significativa, como a definiu Auzubel (apud Moreira, 2012) já que os interesses dos alunos bem como os conhecimentos anteriores dos aspectos relacionados ao andamento do trabalho não foram revelados.
A terceira SD8 compartilhada também utilizou como recurso tecnológico o Canva, no layout de apresentação e demonstrou uma prática relacionada ao ensino da geometria para alunos do quinto ano do Ensino Fundamental. A apresentação da temática para os alunos se deu por meio do levantamento de questões em sala de aula sobre conhecimentos em geometria, leitura do livro As Três Partes, de Edson Luiz Kozminski, DVD Salto para o futuro, utilização do aplicativo GeoGebra e exercícios de fixação do livro EMAI (Educação Matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental).
Embora a SD revele o domínio do conceito e do recurso tecnológico da professora, mais uma vez a culminância da atividade se dá com exercícios no livro didático. Cabe uma reflexão a respeito do uso social da Matemática.
A SD seguinte, “Explorando as frutas na alfabetização”9, aplicada aos alunos dos segundos e terceiros anos do Ensino Fundamental foi apresentada com o Canva. As professoras iniciaram o trabalho elaborando uma lista de frutas. Solicitaram às crianças que falassem o nome de frutas conhecidas e iam complementando com o nome de outras frutas não citadas. Posteriormente os alunos participaram de um bingo de frutas. Cada criança escolhia oito das frutas citadas na lista elaborada em conjunto com a professora e criava uma cartela com o nome e a ilustração de cada fruta escolhida. Ao final do bingo, todos eram premiados com uma deliciosa salada de frutas. Na aula seguinte, foi explorada a receita da salada e os alunos puderam vivenciar as características desse gênero textual, pela leitura e pela escrita. Em outra aula, a professora retomou a receita da salada de frutas, explorando o valor nutricional de cada uma delas e fez a leitura em conjunto com os alunos de textos sobre a importância do consumo de frutas para a saúde. Outra atividade proposta nessa SD foi a chamada “Experimentando frutas desconhecidas”, em que, a cada semana, a professora oferecia uma fruta diferente para que os alunos provassem. Em nova aula, as professoras apresentaram aos alunos o vídeo com a música ‘Pomar’, do grupo Palavra Cantada. Destacou-se o fato de que elas conseguiram incorporar o vídeo na apresentação do Canva, recurso que não havia sido demonstrado. E para encerrar essa SD, as professoras efetuaram com seus alunos a reescrita da música, completando lacunas que deveriam ser preenchidas com o nome das árvores de acordo com a fruta descrita, elaborando um texto coletivo e também um texto de memória. As professoras relataram com muito entusiasmo esta prática, conseguiram reescrever a SD com o novo recurso aprendido no curso.
Mesmo com todas as TDIC apresentadas no decorrer dos encontros presenciais, uma professora ainda utilizou o PowerPoint com o recurso simples de apresentação de slides. Esta SD trabalhou o tema “Brinquedos e brincadeiras de sempre”, com alunos do primeiro ano do Ensino Fundamental. Os recursos utilizados em sala foram: livro, atividades de leitura e escrita, apreciação de pintura, entrevista com as famílias e elaboração de cartazes para compartilhar o conhecimento construído com as demais turmas da escola. Tratava-se de uma SD completa e bem elaborada que se tornou inacessível pela ausência de TDIC que permitisse a sua socialização.
Outra produção, “Gêneros Textuais”, elaborada no PowerPoint e postada no YouTube, não se constituiu em SD, posto que apenas apresentava alguns gêneros textuais e propunha aos alunos que pesquisassem a respeito de outros gêneros, para expor aos colegas. Evidenciou-se o desconhecimento do conceito de SD, pelo grupo que, surpreendentemente, era composto por gestores. Há, também, uma postagem denominada SD “A lebre e a tartaruga” que igualmente não faz jus à sua designação (SD), já que consiste em um vídeo com a história que lhe dá o título, mais uma solicitação aos alunos para que completem as palavras lebre e tartaruga com as letras iniciais e finais.
“Tabuando no Therê” foi outra SD apresentada por uma das professoras neste encontro. O recurso aplicado para compartilhar as atividades também foi o Canva. De acordo com a descrição da professora, trata-se de um torneio cujo principal foco é aprender a tabuada de forma dinâmica, envolvendo novos desafios (individuais e coletivos) a cada semana. O torneio se inicia quando a professora distribui filipetas com um conjunto de contas de multiplicação para serem resolvidas. Os alunos que respondem com maior rapidez são eleitos os líderes da sala e podem escolher outros alunos para formar sua equipe e excluir os que não se saem bem! Em outro momento, os alunos utilizam o laboratório de informática e estudam por meio de jogos matemáticos. Os alunos que não conseguem responder com rapidez e agilidade vão ficando fora da competição. Trata-se de uma constatação de que o uso da tecnologia por si só não é capaz de garantir que os alunos efetivamente aprendam, pois “se ensinar dependesse só de tecnologias, já teríamos achado as melhores soluções há muito tempo. Elas são importantes, mas não resolvem as questões de fundo. Ensinar e aprender são os desafios maiores que enfrentamos em todas as épocas [...]” (MORAN et al., 2000, p. 12).
A atividade desta última apresentação, que propunha uma competição acirrada entre os alunos teve início nas salas de aula da professora e foi assumida posteriormente por toda a escola, constando inclusive no seu Projeto Político Pedagógico.
Não foi somente esta a apresentação/postagem surpreendente. Houve quem difundisse um endereço eletrônico inexistente e, ainda, propaganda do próprio trabalho ou de pacote completo de metodologias, como o MindLab-Programa Mente Inovadora.
As apresentações decorrentes dos encontros foram as descritas e comentadas. Ao se observarem todas as apresentações, pelo filtro da óptica de Paulo Freire (1996) e de tantos outros educadores que o acompanham nas referências desse estudo, pode-se depreender que as expectativas dos pesquisadores não foram totalmente satisfeitas, apesar dos esforços envidados para que os docentes desenvolvessem novas posturas diante das atividades propostas aos alunos. O ambiente de um curso de extensão, menos formal do que o do ensino e o da pesquisa a que se dedica a Universidade favorece a espontaneidade dos participantes, o que se constituiu em vantagem, dada a possibilidade de maior interação entre pesquisadores e pesquisados.
Evidenciou-se o intenso interesse dos professores pelas TDIC em detrimento do aprofundamento de um único conceito de sua área de atuação: a SD. Mesmo havendo conteúdo sobre o assunto registrado em diversos gêneros textuais, a leitura não atraiu parcela considerável dos participantes, dado o fato de que apenas 7 grupos dos 23 que iniciaram o curso corresponderam minimamente às solicitações dos pesquisadores, já que a SD descrita por Zabala (1998) diante do que se presenciou, é infinitamente complexa.
Também há que se observar que o maior número de produções e com melhores atributos ocorreu no segundo encontro em que o apresentador humano foi substituído por uma animação no Renderforest. Estarão os professores melhor habituados à convivência com animadores virtuais?!
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao se reconstruir a extensão universitária, transformando um de seus cursos em ambiente propício à pesquisa, recuperam-se as identidades de ambas (extensão e pesquisa) como meios de fortalecimento e atualização do ensino, consolidando-se sua indissociabilidade. O que se colhe nos cursos de extensão torna-se objeto de pesquisa para aperfeiçoar o ensino oferecido.
Muitos comportamentos encontrados em salas de aula virtuais ou presenciais foram desvelados no decorrer dos encontros. Em relação aos pesquisados, notaram-se, por exemplo, o interesse desmedido por novidades de TDIC ou o recidivo ímpeto para entregar tarefas.
Entre os pesquisadores, a vivência do professor reflexivo que teve a necessidade de pensar sobre e na ação, o que, embora não se tenha mostrado tenebroso, sinalizou a necessidade de caracterizar com a maior precisão possível os conhecimentos anteriores dos alunos, para obter com sucesso a almejada aprendizagem significativa. A compensação pelo empenho investido nos encontros traduziu-se pela conquista do interesse de inúmeros participantes pelo mestrado, ou seja, pelo aprofundamento dos estudos, por contraditório que pareça.
Enfim, ao se intentar encerrar esse estudo, percebe-se que as conclusões a que ele permitiu que se chegasse, constituem novos problemas de pesquisa. Vale dizer, que pelo seu caráter mobilizador, dialeticamente ele poderá se alongar indefinidamente.