Introdução
A educação é um campo em construção (SILVA, 2015), é complexa (APPLE, 2001) e dinâmica, tendo, em suas bases, concepções políticas que são inerentes ao processo político de cada época, repercutindo nas normatizações e nas diretrizes para a área. A escola pública, por sua vez, apresenta, em todo o seu percurso, diferentes histórias, memórias, posturas e nuances que são desencadeados no processo histórico e político, oriundo da política educacional e das concepções de sociedade que são postas no contexto global.
No cenário das mudanças, cabe levantar uma discussão sobre as percepções postas na Constituição Federal de 1988 e na Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, as quais apresentam uma concepção de educação democrática e inclusiva, oriunda de um anseio de construção coletiva de uma sociedade para todos, sendo que o projeto da educação é o caminho possível para direcionar as ações e as propostas planejadas pela política educacional (BRASIL, 1988; 1996).
A política educacional tem um espaço singular na organização da escola, sendo o caminho viável para a concretização dos anseios e dos objetivos políticos estabelecidos na concepção de sociedade posta nas configurações macro da política nacional e internacional. As repercussões da política educacional causam impactos na gestão escolar, no currículo e na avaliação da aprendizagem, redimensionando novas posturas e ações aos envolvidos, desvirtuando as proposições de construção de uma educação para todos, com características emancipatórias, democráticas e inclusivas, advindas dos preceitos constitucionais.
Diante das conquistas alcançadas na legislação, especificamente, na Constituição Federal de 1988, é possível perceber, na arena política, que movimentos e organizações sociais estiveram presentes na luta pelo avanço da educação em suas múltiplas dimensões, ocasionando um esforço coletivo para viabilizar os anseios de grande parte da população brasileira. Nesse contexto, organizações sindicais, políticas e entidades educacionais tiveram o protagonismo importante na configuração das lutas e das conquistas constitucionais.
Um grupo de profissionais, especialmente integrantes da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE); da Associação Nacional de Política e Administração da Educação (ANPAE); da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED) e do Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES), esteve em diálogo constante com a sociedade, profissionais da educação e lideranças políticas com a finalidade de apresentar os anseios da população em relação à concepção de educação, bem como os caminhos da política educacional, tornando, assim, a política como uma ação coletiva com característica complexa, dinâmica e dialógica.
Nessa arena de lutas e de tensões políticas, o espaço da participação na concretização de políticas educacionais tornou-se um aspecto relevante, uma vez que toda a comunidade é motivada para dialogar, refletir, apresentar ideias e mencionar os seus anseios diante das problemáticas apresentadas. A Constituição Federal de 1988 apresentou possibilidades de participação como pano de fundo de uma administração pública e democrática.
A concepção de educação postulada pelos educadores e movimentos em defesa da educação pública desde a década de 1930, com a divulgação do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, tem, em suas bases, a participação, o envolvimento de todos no processo de planejamento e avaliação das propostas realizadas, a concretização da gestão democrática que congrega com uma educação inclusiva e referenciada socialmente.
Outra dimensão defendida no contexto das pautas dos movimentos de educadores e pesquisadores é a concepção de educação cuja finalidade é contribuir com a emancipação dos estudantes, dando-lhes condições de efetivar um protagonismo estudantil por meio de suas experiências e suas visões de mundo. Assim, o objetivo da pesquisa foi conhecer as ações desenvolvidas pela gestão escolar e pelos profissionais da educação na perspectiva de contribuir com o protagonismo estudantil no Programa Parlamento Jovem Brasileiro (PJB).
A metodologia esteve pautada na abordagem qualitativa, tendo, como técnica de pesquisa, o estudo de caso (Yin, 2010). Desse modo, a pesquisa foi desenvolvida na Unidade Escolar Letícia Macêdo, no município de Anísio de Abreu, no estado do Piauí. Participaram da pesquisa cinco profissionais da educação, sendo três gestores (diretor e coordenadores pedagógicos) e dois professores. Além desses, participarem também 15 estudantes que estiveram envolvidos diretamente no PJB nos anos de 2014 a 2020.
A coleta de dados foi realizada por meio de dois formulários pelo Google Forms, devido ao isolamento social, ocasionado pelo Covid-19, no período de 12 a 17 de agosto de 2020 para os profissionais e de 12 a 18 de agosto de 2020 para os estudantes. Os dados foram analisados a partir da Análise do Conteúdo, na perspectiva de Bardin (2002), tendo, como categorias Programa Parlamento Jovem Brasileiro, Protagonismo Estudantil, participação e Gestão Escolar. O ponto de partida foi perceber a percepção dos gestores, dos professores e dos estudantes, traçando os caminhos percorridos na escola para o sucesso dos estudantes em relação à vivência no Programa, de modo que possibilitasse a reflexão acerca do protagonismo estudantil no âmbito escolar e como essas ações são percebidas, implementadas e vivenciadas.
O texto está estruturado em três partes que se completam, além da introdução e das considerações finais. Na primeira, dialoga-se acerca da gestão escolar, da participação e do protagonismo estudantil como dimensões importantes para a concretização de uma educação emancipatória. Na segunda parte, evidencia-se o Programa Parlamento Jovem Brasileiro, por meio das normatizações que o regulamentam. E, por fim, destacam-se as vozes dos participantes acerca das experiências no Programa Parlamento Jovem Brasileiro.
A gestão escolar, a participação e o protagonismo estudantil
A gestão escolar é a dimensão da estrutura educacional, a qual viabiliza o processo de organização pedagógica, financeira, administrativa, relacional e social das práticas educativas estabelecidas no chão da escola. Desse modo, os princípios da autonomia, da descentralização e da participação são defendidos pelos dispositivos legais, que regulamentam a educação nos âmbitos nacional, estaduais e municipais (BRASIL, 1988; 1996; 2014).
A organização pedagógica, financeira, administrativa, relacional e social constituise como um processo complexo, pois demanda decisões e compartilhamento do poder com a finalidade de concretizar os apelos e as diferentes visões que permeiam o espaço escolar. Nessa configuração, a participação dos diferentes segmentos é uma ação que mobiliza profissionais da educação, pais, estudantes e as comunidades local e escolar para a organicidade das práticas desenvolvidas no chão da escola.
A gestão da escola em meio aos seus inúmeros desafios apresenta, em sua base epistemológica, o objetivo de contribuir para a organização do espaço escolar, em uma perspectiva crítica e emancipatória, incluindo, nessa seara, todos os integrantes internos e externos. Na visão de Libâneo (2004, p. 56), a escola tem o compromisso de:
Reduzir a distância entre a ciência cada vez mais complexa e a formação cultural básica a ser provida pela escolarização. O fortalecimento das lutas sociais e a conquista da cidadania dependem de uma ampliação, cada vez mais, do número de pessoas que possam participar das decisões primordiais que dizem respeito aos seus interesses.
A participação, nesse contexto, é um elo que possibilita a experiência do compartilhamento das decisões, assim como a vivência da gestão democrática, concepção de gestão escolar defendida nos dispositivos legais, promovendo autonomia, mobilização social e estudantil e melhoria das propostas realizadas. A participação, na visão de Bordenave (1983, p. 72-73), pode ser entendida como um processo sócio-humano e suscetível de crescimento:
Ela pode ser aprendida e aperfeiçoada pela prática e a reflexão. A qualidade da participação se eleva quando as pessoas aprendem a conhecer a sua realidade; a refletir; a superar contradições reais ou aparentes; a identificar premissas subjacentes; a antecipar consequências; a entender novos significados das palavras; a distinguir efeitos de causas, observações de inferências e fatos de julgamentos. A qualidade da participação aumenta também quando as pessoas aprendem a manejar conflitos; clarificar sentimentos e comportamentos; tolerar divergências; respeitar opiniões; adiar gratificações. A participação é incrementada quando as pessoas aprendem a organizar e coordenar encontros, assembleias e mutirões; a formar comissões de trabalho; pesquisar problemas; elaborar relatórios; usar meios e técnicas de comunicação.
Como é possível perceber, a participação qualificada exige ação de todos os envolvidos, caracterizada como uma questão complexa, a qual requer atuação, compromisso, experiências e disposição para atuar em prol do coletivo e das decisões da maioria. A participação qualificada é a ação configurada nos princípios democráticos, os quais estão presentes nos dispositivos legais da educação. Assim, o desenvolvimento da participação na educação, em todos os níveis, deve ser percebido como uma configuração complexa, uma vez que ela tanto pode inibir e limitar aspectos de organização participativa, como pode estar condicionada a dimensões burocráticas (GUTIERREZ, 2004).
Em meio à complexidade da participação, pode-se afirmar que “participar faz referência à possibilidade de um indivíduo incorporar as práticas e as características de um grupo mais amplo, de forma a vir a ser reconhecido e aceito como parte ou membro dele” (GUTIERREZ, 2004, p. 7). Na perspectiva da educação, a participação é um princípio necessário para a conquista de espaço e de efetivação dos anseios dos diferentes segmentos.
No âmbito da atuação estudantil, a participação mobiliza diferentes características aos envolvidos, possibilitando a autonomia e o desenvolvimento na luta por suas ideias e favorecendo uma organização estudantil com os princípios da coletividade e da mobilização social. Desse modo, a gestão escolar, preocupada com o desenvolvimento social e com a formação integral dos estudantes, constrói espaços para a sua constante atuação.
Neste sentido, consoante com Silva e Santos (2019), as diferentes formas de mobilização e de participação dos estudantes nas decisões escolares congregam-se no grêmio estudantil, nas representações de turmas e na participação ativa no planejamento dos projetos e nas experiências de fortalecimento de causas e de lutas no cenário social. Para os pesquisadores (2019, p. 8):
No direcionamento da ação educativa do grêmio estudantil, o estudante percebe novos valores do ambiente educacional que lhe cabe por direito, em um exercício contínuo do protagonismo juvenil, expondo-se para as tomadas de decisões escolares, contribuindo para sua formação social.
Cabe fazer a ressalva de que a gestão escolar assume um papel importante para a abertura de um espaço político e ativo dos estudantes, mobilizando a sua organização, atuação e apoiando-os em todos os processos propostos. A gestão escolar, neste sentido, cumpre os princípios estabelecidos na Constituição Federal de 1988, quando sinaliza a educação como um direito social, possibilitando uma formação integral nas diferentes dimensões social, política, econômica, cultural e educacional, bem como segue as diretrizes do atual Plano Nacional de Educação, especificamente em sua meta 19, quando trata da criação dos grêmios estudantis.
O protagonismo estudantil é o itinerário formativo que pode contribuir para a conquista dos espaços sociais após a concretização da educação básica, oportunizando a experiência de atuação em diferentes dimensões, direcionando discussões e compreendendo os caminhos sociais e políticos que as decisões macro e micro determinam para a sociedade, uma vez que a leitura de mundo e as suas experiências na escola geram expectativas reflexivas concernentes ao alcance de atuações em diferentes campos sociais.
Na visão de Freire (2015, p. 45), as relações estabelecidas na sociedade são importantes para a constituição do ser político e social. Assim:
A partir das relações do homem com a realidade, resultantes de estar com ela e de estar nela, pelos atos de criação, recriação e decisão, vai ele dinamizando o seu mundo. Vai dominando a realidade. Vai humanizando-a. Vai acrescentando a ela algo de que ele mesmo é o fazedor. Vai temporalizando os espaços geográficos. Faz cultura. E é ainda o jogo destas relações do homem com o mundo e do homem com os homens, desafiado e respondendo ao desafio, alterando, criando, que não permite a imobilidade, a não ser em termos de relativa preponderância, nem das sociedades nem das culturas. E, à medida que cria, recria e decide, vão se conformando as épocas históricas. É também criando, recriando e decidindo que o homem deve participar destas épocas.
De um modo geral, a participação dos estudantes no contexto das reflexões e discussões sociais é o itinerário para a construção de pessoas ativas, abertas ao diálogo e às perspectivas contrárias as suas ideias, portanto, contribuir para ações desse porte é o caminho da educação e, consequentemente, da gestão escolar. Os estudantes necessitam de ações escolares que favoreçam a sua autonomia e o seu protagonismo no dinamismo na prática formativa (LÜCK, 2013).
A educação centrada no protagonismo estudantil está vinculada ao paradigma da educação como caminho para a transformação social, congregando ações que estão presentes no diálogo, na atuação, no movimento, na escuta, na empatia, sinalizando que os itinerários formativos da juventude devem conter princípios de mobilização e experiências de cidadania (KILPATRICK, 1996). De um modo geral, a dinamicidade do processo formativo, envolvendo os estudantes, é a perspectiva para a construção do protagonismo e do desenvolvimento juvenil.
As políticas e os programas no Brasil têm incentivado a participação dos estudantes em diferentes frentes. Além das proposições sinalizadas no atual Plano Nacional de Educação, na meta 19, que trata da gestão democrática, sobre a importância do grêmio estudantil, como mecanismo de ação do estudante na concretização da gestão participativa, há programas, como o Parlamento Jovem Brasileiro, que incentivam os estudantes do ensino médio a desenvolverem projetos para serem discutidos na Câmara Federal, evidenciando o protagonismo do jovem como difusor de ideias para o avanço político e social do país.
Na próxima seção, dialoga-se acerca do PJB, apresentando os seus princípios e as suas normatizações, por meio da resolução número 12, de 18 de novembro de 2003, e do regimento interno aprovado pela Câmara Federal em 25 de outubro de 2004.
O Programa Parlamento Jovem Brasileiro: princípios, resoluções e normativas
O PJB foi idealizado no âmbito da Câmara Federal, com o objetivo de “possibilitar aos alunos de escolas públicas e particulares a vivência do processo democrático mediante participação em uma jornada parlamentar na Câmara dos Deputados, com diplomação, posse e exercício do mandato” (Art. 2; Resolução 12, 2003). De acordo com o regimento do Programa, em seu artigo 2, “o Parlamento Jovem Brasileiro reunir-se-á todos os anos, no segundo semestre, em data a ser definida anualmente pela Mesa da Câmara dos Deputados, ouvido o Colégio de Líderes”. Assim:
O programa é coordenado por uma Comissão Organizadora, que é formada por servidores do Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento (CEFOR), responsáveis por sua coordenação pedagógica, com o planejamento e a implementação das atividades da programação, e por servidores da Secretaria de Participação, Interação e Mídias Digitais (SEMID), responsáveis pela divulgação do programa e por todas as operações logísticas (BRASIL, 2020a, p. 6).
A resolução que regulamentou o PJB apresenta que o papel do Programa é contribuir para a atuação dos estudantes em questões que tratem de autonomia, da criatividade e do desenvolvimento intelectual, de modo que favoreça um processo de aprendizagem político, repercutindo em seu estado, seu município e em sua escola. Dessa forma, o PJB pode oportunizar a formação cidadã dos estudantes, na perspectiva de favorecer o protagonismo estudantil em suas múltiplas dimensões. Espera-se que a formação integral de um indivíduo crítico, autônomo, participativo e reflexivo, seja contemplada pela educação formal e, nesse contexto, o PJB incentiva a possibilidade de que diferentes escolas possam contribuir com experiências diferenciadas na vida dos estudantes. Neste sentido:
O Parlamento Jovem Brasileiro é um programa que busca contribuir para o desenvolvimento de uma das dimensões de nossa cidadania, que é o conhecimento sobre como se organiza a nossa democracia representativa, assim como a importância da participação e do controle social (BRASIL, 2020).
O PJB possibilita que os estudantes tenham um olhar para a realidade social que está em seu entorno e possam refletir sobre as possíveis soluções em relação aos entraves vivenciados. Cabe destacar que, com a criação de projetos políticos, os estudantes iniciam um projeto de reflexão sobre o papel dos governos, das organizações e dos cidadãos, enquanto entes participantes da democracia brasileira. A congregação dessas experiências torna-se importante para o itinerário formativo, descobrindo potencialidades em seus diferentes participantes, destacando-se o “domínio da linguagem, compreensão de fenômenos, enfrentamento de situações-problema, construção de argumentação e elaboração de propostas” (BRASIL, 2020).
O desenvolvimento de práticas educativas que busquem a participação e o protagonismo estudantil favorece a construção da autonomia dos envolvidos (MARTINS, 2002), sinalizando ações futuras e disseminando oportunidades para a compreensão da complexidade política no âmbito das decisões. Além desse aspecto, ficam em evidência “a preocupação com a gestão democrática e equânime do Estado na busca da qualidade e a conquista da gestão democrática como condição necessária para a autonomia e o protagonismo estudantil” (MARTINS, 2002, p. 22).
A concretização do Programa no âmbito da escola dá-se ao longo de três etapas. Na primeira, o estudante deverá elaborar um Projeto de Lei e apresentá-lo no ato de sua inscrição. Na segunda etapa, é feita uma seleção pela Secretaria Estadual de Educação dos projetos que estão nos parâmetros estabelecidos pelo Programa, de acordo com o número de vagas disponibilizadas no estado. Após a pré-seleção, na etapa estadual, os projetos são enviados à Câmara dos Deputados, com a finalidade de serem avaliados de acordo com os critérios estabelecidos no Guia do Programa de cada ano. O regimento do Programa, em seu artigo 3, apresenta que “o Parlamento Jovem Brasileiro será composto de 78 (setenta e oito) deputados, selecionados em cada Estado e no Distrito Federal, com o número de representantes proporcional às bancadas parlamentares de cada unidade da Federação”.
A última etapa a ser vivenciada pelos estudantes é a jornada do parlamentar jovem, na qual os autores dos projetos selecionados são empossados como Jovens Deputados, tendo a possibilidade de passar 5 (cinco) dias na Câmara Federal, vivenciando a rotina de um deputado federal. O quantitativo de estudantes que se insere na última etapa do Programa é significativo e tem uma expressiva representação, a depender do estado. No quadro 1 (um), pode-se perceber esse quantitativo:
VAGAS PARA DEPUTADOS JOVENS - PJB | ||
---|---|---|
UNIDADE FEDERATIVA | BANCADA ESTADUAL NA CÂMARA DOS DEPUTADOS | NÚMERO DE DEPUTADOS JOVENS |
ACRE | 8 | 1 |
ALAGOAS | 9 | 1 |
AMAPÁ | 8 | 1 |
AMAZONAS | 8 | 1 |
BAHIA | 39 | 6 |
CEARÁ | 22 | 3 |
DISTRITO FEDERAL | 8 | 1 |
ESPÍRITO SANTO | 10 | 2 |
GOIÁS | 17 | 3 |
MARANHÃO | 18 | 3 |
MATO GROSSO | 8 | 1 |
MATO GROSSO DO SUL | 8 | 1 |
MINAS GERAIS | 53 | 8 |
PARÁ | 17 | 3 |
PARAÍBA | 12 | 2 |
PARANÁ | 30 | 5 |
PERNAMBUCO | 25 | 4 |
PIAUÍ | 10 | 2 |
RIO DE JANEIRO | 46 | 7 |
RIO GRANDE DO NORTE | 8 | 1 |
RONDÔNIA | 8 | 1 |
RORAIMA | 8 | 1 |
RIO GRANDE DO SUL | 31 | 5 |
SANTA CATARINA | 16 | 2 |
SÃO PAULO | 70 | 11 |
SERGIPE | 8 | 1 |
TOCANTINS | 8 | 1 |
TOTAL | 513 | 78 |
FONTE: Guia do PJB (2020, p. 13).
De um modo geral, é possível perceber, no PJB, potencialidades para o desenvolvimento dos estudantes, mesmo para os que não são pré-selecionados na etapa estadual e os selecionados na etapa final. Todo o processo é pertinente, permitindo desenvolver habilidades e competências, as quais retratam reflexões para a cidadania, o bem estar coletivo, a consciência acerca de questões problemáticas na sociedade, entre outras. Além disso, o Programa convoca os estudantes a serem participativos na proposição de medidas para sanar problemas que estão a sua volta, possibilitando-lhes serem autores de suas próprias histórias. Dessa forma, o programa favorece o protagonismo estudantil, possibilitando a atuação da juventude em questões que demandam reflexões, construções coletivas, defesas de projetos e de ideias.
Nesse cenário de construção de itinerários formativos, cabe destacar o papel dos diferentes segmentos, enfatizando a gestão escolar e os professores. Acerca dessa questão, Campos (2010, p. 111) menciona que:
Os professores não devem possuir apenas a capacidade de ensinar, mas também a de transformar o conhecimento científico em conhecimento a ser ensinado. Esse fenômeno no ensino denomina-se transposição didática, que significa a transformação do conhecimento científico em conteúdos de ensino. Para que isso ocorra, o professor cria e recria, inventa e reinventa o processo pedagógico. Os professores como profissionais são críticos e reflexivos dos conteúdos do trabalho docente, das situações didáticas, da organização das tarefas e da organização escolar.
A dinâmica escolar é complexa e requer distintas habilidades para o processo de ensino e de aprendizagem. Para a existência do protagonismo estudantil, é necessário o desempenho das habilidades de todos os envolvidos na construção do espaço escolar, viabilizando oportunidades criativas nas relações estabelecidas no âmbito das propostas educativas. É importante que a gestão escolar, os professores e os estudantes possam estar em constante diálogo e criem alternativas de envolvimento, de participação e de resolução dos conflitos.
Sobre a participação dos estudantes na escola, Munõz (2004, p. 91-92) afirma que:
Participar é tomar partido em alguma coisa. É fazer parte de alguma coisa. Participar é organizar-se com outros para ser responsáveis conjuntamente pelo máximo de aspectos que constituem a nossa vida. Participar é sentir-se soberano. Participar é algo político, um jogo democrático. Participar não é uma finalidade, mas um meio que nos ajuda a tomar consciência da realidade. Participar é ser protagonista e solidário ao mesmo tempo, para mudar a partir do compartilhar. Participar é a capacidade de dar e de receber. Participar é a capacidade de assumir dificuldades, incômodos e gozar a vida. Participar supõe enviar uma mensagem e acompanhá-la com alguma ação. Participar não é apenas decidir, mas trabalhar. Participar não é só falar, é também ouvir. Participar é acreditar que o projeto é importante.
O exercício da participação e do envolvimento no dia a dia das questões escolares é uma dimensão importante e necessária para ser vivenciada pelos estudantes, com a finalidade de incentivá-los a serem atuantes na escola e na sociedade. Neste sentido, a compreensão das dimensões política e social que permeiam o espaço escolar e as diferentes instâncias sociais é o caminho para a efetivação do protagonismo estudantil nas relações estabelecidas no âmbito da prática pedagógica.
Demo e Silva (2020) revelam que o protagonismo estudantil é uma dimensão favorável para atuação dos estudantes, porém, nas práticas educacionais da maioria das escolas, isso ainda não é uma realidade. Programas como o Parlamento Jovem Brasileiro, que permitem aos estudantes vivenciarem, no interior da escola, os benefícios de serem protagonistas, são catalisadores do processo de implementação dessa cultura nas escolas brasileiras, pois, propiciam aos estudantes a oportunidade de se localizar enquanto membros ativos e participantes de uma sociedade com a qual há uma relação de direitos e deveres. Para além dos currículos, o protagonismo estudantil deve chegar na ponta; facultando aos alunos, a possibilidade de aprenderem como autores (DEMO; SILVA, 2020).
As revelações das vozes dos participantes...
O público participante da pesquisa foi dividido em duas partes. A primeira, de profissionais da educação, sendo dois professores, dois coordenadores pedagógicos e o gestor escolar, totalizando cinco participantes. A segunda parte foi formada por estudantes, compondo um total de 15, os quais participaram ativamente no PJB na escola no período de 2014 a 2020.
Em relação aos profissionais, todos têm formação superior (Licenciatura Plena em Educação Física; Licenciatura plena em letras/português; Pedagogia; Filosofia; Licenciatura em Letras - Língua Inglesa e Literaturas de Língua Inglesa). Quatro deles são profissionais efetivos e um é contratado pelo estado, por meio do processo seletivo. Todos os participantes trabalham na escola há mais de dois anos. Para efeito de indicação das vozes dos profissionais da educação, foram denominados de profissional 1 (P1), profissional 2 (P2), sucessivamente.
Sobre os perfis dos estudantes, nove participantes são do sexo masculino e seis, do sexo feminino, sendo que nove residem na zona rural e seis, na zona urbana. Do total dos 15 estudantes, seis afirmaram não ter sido selecionado em nenhuma das etapas do projeto, quatro foram selecionados na etapa estadual (pré-seleção); e cinco selecionados na última etapa, indo vivenciar no Congresso Nacional uma experiência importante para a sua formação cidadã. Para efeito de indicação das vozes dos estudantes, foram denominados de estudante 1 (E1), estudante 2 (E2), estudante 3 (E3), [...], estudante 15 (E15).
Como já indicado, foram aplicados dois questionários, os quais buscavam compreender as vivências e as ações desenvolvidas pela escola para o sucesso do protagonismo estudantil nas diferentes experiências dos estudantes, em particular no PJB. Em relação a esse aspecto, foi perguntado aos profissionais da educação as suas concepções sobre o protagonismo estudantil e a sua relevância para a formação dos estudantes.
Compreendendo que o estudante é o ator principal no processo ensinoaprendizagem, capaz de ir atrás do conhecimento e de participar na tomada de decisões, de dar sua opinião...ser participativo, dessa forma, contribuirá e muito para sua formação integral (P1).
O protagonismo estudantil acontece quando é despertado no estudante o sentimento de pertencimento pela escola ou comunidade, levando-o a buscar meios de fazer a diferença dentro ou fora do ambiente escolar (P2).
É colocar o aluno como centro de todas as etapas do processo de ensino, tendo um papel ativo, contribuindo para a formação de cidadãos autônomos e comprometidos socialmente (P3).
Um conjunto de atitudes que envolvem mobilização na busca de interesses de um coletivo e que nesse processo acontece a auto formação que contribui à formação integral do indivíduo (P4).
Na minha concepção, o protagonismo estudantil é quando o estudante consegue transformar a sua realidade através de ações e conhecimentos construídos na escola. Em outras palavras, seria dar “voz” ao estudante para que ela possa transformar o mundo ao seu redor. O protagonismo estudantil contribui para a formação integral dos estudantes, uma vez que ele não termina a etapa escolar apenas com conhecimentos teóricos e preparados para testes ou mercado de trabalho. O protagonismo permite que o estudante desenvolva o senso crítico e amplie sua visão, na ideia em que ele é o protagonista de sua história (P5).
A presença dos estudantes nos diferentes processos na escola configura-se como uma dimensão necessária para consolidar o protagonismo estudantil. Como sinalizado pelos participantes, por meio da abertura para a atuação dos estudantes no âmbito do planejamento e da vivência de experiências múltiplas, pode-se evidenciar a formação integral, permitindo a alusão de uma consciência crítica, política, social e cultural. Essas práticas escolares são defendidas por Munõz (2004), quando indica que a participação por meio de debates, intervenções e votações expressa o orgulho do protagonismo, mas, sobretudo, a vivência da cidadania.
A consolidação do protagonismo estudantil é uma ação necessária para a indicação da qualidade da educação (MUNÕZ, 2004), uma vez que uma das tarefas da escola/educação é preparar para a atuação na sociedade em suas múltiplas dimensões. Na concepção de Munõz (2004, p. 94), “possibilitar espaços e oportunidades de mútua educação continuada entre crianças, jovens e adultos, enfatizando a participação” e “estimular a criação de órgão de órgãos de representação infanto-juvenil” favorecem a proposta da gestão democrática, defendida nos dispositivos legais (CF/1988; LDB/1996; PNE 2014/2024).
Os profissionais da educação, participantes da pesquisa, sinalizaram que as práticas curriculares que são propostas para a promoção do protagonismo estudantil coadunam com os anseios dos estudantes.
A escola promove vários eventos ao longo ano letivo, como quermesse, jogos esportivos, feiras de ciências e linguagens... que têm contribuído para o protagonismo juvenil (P1).
A promoção de projetos interdisciplinares, bem como o incentivo à participação em eventos extra escolares (P2).
A escola promove uma gestão democrática, assegurando a participação dos alunos nas reuniões, discussões e decisões da escola. Os alunos participam dos conselhos escolares e planejam juntamente com a escola alguns trabalhos e projetos que são desenvolvidos no decorrer do ano (P3).
Criação de identidades como líderes de turma, grêmio estudantil, realização de projetos culturais como feiras, saraus etc. (P4).
A escola desenvolve projetos científicos, artísticos e culturais, tais como Simpósios, Feira de Ciências, projetos interdisciplinares e principalmente o incentivo dos estudantes a participar de concursos de redação (P5).
As ações apontadas pelos profissionais trazem à tona as diferentes estratégias desenhadas para a concretização da efetivação do protagonismo estudantil, por meio da atuação ativa nos diferentes espaços e momentos. Para Gutierrez (2004, p. 15), “a participação pode ser vista de duas formas distintas: enquanto prática pedagógica, ou como conteúdo de uma disciplina/atividade”. O incentivo à participação, como princípio da prática pedagógica, é o caminho para a construção da autonomia dos estudantes e o desenvolvimento de ações pertinentes ao processo de ensino e de aprendizagem.
No contexto da gestão escolar, os participantes destacaram que o PJB:
A meu ver, é um programa de fundamental importância para o engajamento dos jovens, pois, através dele, o estudante amplia sua visão sobre a cidadania e o processo legislativo. Ademais, o programa permite que o estudante explore e desenvolva suas habilidades de escrita (P1).
O programa é muito importante, pois valoriza as ideias e habilidades dos alunos, incentivando uma participação ativa na política e no processo democrático (P3). Toda a escola atua na conscientização da importância de uma democracia participativa. Professores e gestores estimulam a participação no programa, sendo de suma importância. São atividades extra e voluntária dentro do espaço escolar. Uma verdadeira aula prática de democracia (P4).
O incentivo à participação dos estudantes em programas, como o PJB, é papel da escola e de seus diferentes profissionais, uma vez que contribui para a construção do protagonismo juvenil, bem como favorece o envolvimento da juventude em questões políticas e sociais que fazem parte do dia a dia da população, e, muitas vezes, são despercebidas pela falta de conhecimento, como é o caso das legislações. Na visão de Gutierrez (2004, p. 14), práticas curriculares com esses desenhos, possibilitam “a construção da consciência de forma autônoma para o exercício pleno da cidadania”.
As vozes dos profissionais, especialmente dos professores, que lidam diariamente com os estudantes e os processos de ensino e de aprendizagem, evidenciam que há algumas dificuldades enfrentadas no processo de orientação para a vivência do PJB:
São inúmeras as dificuldades, principalmente o fato de muitos alunos não se disporem a estudar no contraturno, além disso, há também o fato de a maioria dos professores não ter disponibilidade de tempo e a gestão não colaborar na flexibilização de horários. Muitas vezes, para superar tal dificuldade, os alunos são levados para estudar na casa do próprio professor. Exigências de mais tempo de estudo e trabalho fora de carga horária, encontros... (P2)
As principais dificuldades estão relacionadas à falta de interesse de alguns estudantes sobre temáticas referentes à política brasileira e até mesmo sobre democracia. Eu tento superar essas dificuldades através das aulas iniciais, as quais eu busco discutir e demostrar a relevância dessa temática para uma sociedade democrática (P5).
Conforme assinalado pelos professores, diferentes aspectos prejudicam a efetivação de uma construção consubstancial de práticas pedagógicas. Pelos depoimentos dos envolvidos, a questão do tempo, do espaço e o papel da gestão escolar são expressões que soam como artefatos que desfavorecem a atuação mais efetiva no processo de construção dos projetos dos estudantes. Desse modo, reflete-se sobre a importância da existência de escolas de tempo integral, as quais apresentam estrutura, tempo e espaço físico para a consolidação de ações próprias que deem suporte às diferentes práticas pedagógicas.
O despertar para a consciência da relevância da participação e da presença dos diferentes segmentos na política e na compreensão de seu processo organizativo é o caminho para cativar os jovens ao engajamento e à perspicácia de criação de projetos para resolução dos conflitos/problemas sociais, uma vez que “a participação é uma habilidade que se aprende e se aperfeiçoa” (BORDENAVE, 1983, p. 46), com a construção de alternativas que deem condições de sua existência, pois a participação é um ato político (FREIRE, 2015), que repercute na vida cotidiana de todas as pessoas.
As vozes dos estudantes revelam que as ações desenvolvidas na escola possibilitam a participação em diferentes atividades que compreendem múltiplos aspectos, importantes ao engajamento e ao desenvolvimento do estudante.
Sim, sempre participei de concursos de redação, da organização dos eventos escolares, reuniões, dentre outros (E1).
Sim. Apresentações em atividades lançadas pela escola como: palestras, dinâmicas, apresentações com temas, feira de ciências etc. (E2).
Sim. Além das atividades referentes ao desenvolvimento de projetos para o PJB, participei de feiras de ciências e gincanas de matemática (E9).
Sim. Do PJB, da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro, Jovem Senador (E10).
Sim. Desde quando entrei no Ensino Médio procurei me dedicar ao máximo a todas as atividades propostas pela escola. Além das atividades cotidianas, que são comum [sic] a todas as escolas, eu tive a oportunidade de participar de diversas atividades. Dentre elas, as que mais me destaquei foram nos concursos de produção textual, tais como Parlamento Jovem Brasileiro, Jovem Senador, Olimpíada de Língua Portuguesa etc. Além disso, no período que cursei o Ensino Médio, a escola contava com o apoio do Programa de Ensino Médio Inovador – ProEMI, o qual permitiu que a instituição realizar [sic] diversos eventos artísticos, científicos e culturais. E durante esse período pude atuar como monitor através do programa Jovem de Futuro (E14).
Sim. Jovem Senador, Olimpíada Piauiense de Português, olimpíada de língua portuguesa. Câmara mirim (E15).
Conforme já apontado, a participação e o envolvimento dos estudantes são relevantes para a formação de indivíduos socialmente ativos e participativos, preparados para usufruir a plena cidadania (GUTIERREZ, 2004). Ademais, cabe ao grupo gestor, bem como aos professores, o incentivo à participação dos estudantes. Os aspectos sinalizados pelos estudantes evidenciam a forma dinâmica de organicidade da política escolar, a qual contribui para que os estudantes se envolvessem nos processos escolares, favorecendo a aprendizagem e as múltiplas possibilidades de engajamento juvenil.
Em relação ao processo de engajamento juvenil, tendo a escola como campo de ação, os depoimentos dos estudantes evidenciaram as suas percepções sobre os esforços institucionais para garantir oportunidade de atuação e o sucesso nas atividades.
Com certeza, a escola além de ter me proporcionado ótimas oportunidades, ainda ajudou a me abrir para conhecer coisas novas, a saber me posicionar perante a sociedade (pensar fora da caixinha). (E1).
Sim, pois a mesma sempre nos atualizava sobre as oportunidades destinadas a jovens protagonistas em programas para as escolas, além de atividades, até mesmo em sala de aula, que nos estimulavam a ser um protagonista (E2).
Sim, porquanto foi na escola que eu fui estimulado a participar de programas estudantis que me proporcionaram uma grande evolução intelectual e como cidadão. Ao me apresentar possibilidades que iam muito além da sala de aula, a escola abriu todo um leque de possibilidades para a minha vida acadêmica e mesmo profissional, pois participar de programas como o PJB acabou agregando ao meu conhecimento coisas que raramente são aprendidas em sala de aula (E9).
Sim, através do incentivo por parte dos professores e da oferta de oportunidades que auxiliam o desenvolvimento pleno de habilidades de escrita, oratória e sociais, tabu para a grande maioria do corpo discente (E13).
Sem dúvidas a referida escola contribuiu muito para meu protagonismo. Quando eu ingressei nessa instituição eu não tinha muitas perspectivas, queria apenas terminar "os estudos" assim como pensam grande parte dos jovens da minha região. No entanto, conheci professores que me mostraram o quanto é prazeroso e importante o processo de aprendizagem. A partir de então eu comecei a me dedicar cada vez mais e aproveitar todas as oportunidades que surgiam. É importante destacar que todos os professores e agentes dessa escola contribuíram muito para meu protagonismo, entretanto, a professora de Língua Portuguesa da 1ª série foi a que mais me motivou através de suas práticas pedagógicas. A maneira que ela ensinava e se preocupava era diferente. Ela conseguia explorar nossas habilidades, sem que percebêssemos. Na verdade, foi ela que me orientou e esteve ao meu lado durante toda a minha jornada no Ensino Médio (E14).
Os depoimentos dos estudantes mostram que a participação é o elemento gerador para a concretização do protagonismo. As experiências expostas pelos estudantes vão ao encontro da perspectiva defendida por Munõz (2004, p. 91), quando este salienta que “participar é ser protagonista e solidário ao mesmo tempo, para mudar a partir do compartilhar”. Os destaques dos estudantes relevam a importância da atuação dos diferentes profissionais para assegurar uma educação que faça sentindo e construa itinerários formativos propícios ao engajamento e ao protagonismo estudantil.
De acordo com os discentes, a promoção do protagonismo estudantil está interligada ao incentivo de práticas que extrapolem a sala de aula, está vinculada ao participar, ao ouvir e ser ouvido, ao fazer, enfim, a ser autor de suas próprias histórias. A construção de propostas pedagógicas que tenham como centro a escuta aos estudantes é uma dimensão propícia para a efetivação da concepção de gestão democrática, bem como à consolidação de ações que tenham como centro os anseios dos estudantes. Na visão deles, para a concretização do protagonismo são necessárias distintas propostas, destacando-se:
Além do conteúdo didático já aplicado, acredito que as aulas práticas ajudam muito, bem como a apresentação de seminários, onde o aluno é posto como protagonista mesmo. A responsabilidade por organizar eventos escolares, que, de certa forma, é uma capacitação. A participação da escola em concursos estaduais e nacionais, que estimulam os alunos a se destacarem, dentre muitas outras atividades (E1).
Redações e atividades como o PJB, onde os jovens podem expressar a sua visão do mundo e elaborar soluções para os problemas que os cercam (E7).
Eventos de cunho social, ambiental, econômico etc. Incentivando, assim, sempre perspectivas diferentes e bem promissoras provindas do público jovem (E8).
Programas de estímulo à leitura; ao pensamento crítico; à produção científica; à participação político-social, tanto no ambiente escolar quanto fora dele; e atividades que deem destaque àqueles alunos mais aplicados (E9).
Atividades que coloquem os alunos como líderes, atividades que façam com que os alunos se coloquem a frente, dando, talvez, sua própria opinião (E10)
A meu ver, para que o protagonismo estudantil seja alcançado, é necessário que a escola mostre aos discentes que a educação vai além da sala de aula. É fundamental que a escola desenvolva projetos que mostrem ao discente que o conhecimento que ele constrói na sala de aula é aplicável não somente para exames e vestibulares, mas na sua vida como todo. Alguns exemplos de atividades que podem favorecer para o protagonismo estudantil são os programas e concursos extracurriculares, a realização de eventos artísticos culturais, o desenvolvimento de projetos interdisciplinares com aplicação prática, entre outras ações (E14).
A participação não é um fenômeno natural, é algo cultural que pode ser aprendido, incentivado e melhorado (BORDENAVE, 1983). Dessa forma, o sucesso da participação dos estudantes é fruto de uma ampla articulação entre todos os envolvidos no contexto de ensino e de aprendizagem. O processo de participação, de escuta e de envolvimento é complexo (BORDENAVE, 1983) e repercute diretamente no modo de visão de um projeto de sociedade, sendo necessário que os construtores de políticas, de planejamento escolar e educacional, de avaliação de políticas e de aprendizagem congreguem em suas bases epistemológicas a participação como princípio norteador e dinâmico para o sucesso do paradigma em construção.
A vivência do PJB na escola repercute nas experiências dos envolvidos, tendo diferentes sujeitos que se engajam para o sucesso das propostas. Esse aspecto pode ser observado nos depoimentos dos estudantes, quanto ao papel dos educadores na orientação para o PJB. Desse modo, foi destacado que:
Mesmo não tendo sido selecionada, o auxílio deles foi de suma importância para que eu concluísse o meu projeto. Tanto em pesquisas, como em revisões, dúvidas, estavam sempre dispostos a ajudar (E1).
Sempre nos estimularam a tentar, a fazer as atividades, nos ensinando e direcionando (E2).
Acredito que o fator mais importante tenha sido uma orientação próxima e individualizada (E3).
Sempre me dando dicas, me ajudando nas correções, indicando material e me motivando (E7)
Oferecendo apoio teórico, sugerindo melhorias para o projeto e proporcionando oportunidades para que eu pudesse expor minhas ideias e debatê-las com os professores e com outros participante do PJB (E9).
Oferecendo a oportunidade de debates, instigando o pensamento crítico, auxiliando desde a diagramação do PL a correções ortográficas, através de incentivos via WhatsApp, acreditando que éramos capazes, enfim de todas as formas cabíveis (E13).
A todo momento, eles estiveram auxiliando na produção do projeto, além de nos incentivarem durante a produção (E15).
A participação e o protagonismo são como uma via de mão dupla, isto é, na medida que depende do envolvimento do estudante, também é fruto da dedicação dos professores e gestores para garantir espaço, tempo e sucesso nas proposições dos estudantes. Nesse cenário, a atuação de todos é um arranjo político e social, no qual repercutem as ações vivenciadas, isso porque “a gestão democrática é condição necessária para a autonomia e o protagonismo estudantil” (MARTINS, 2002, p. 22). Na visão de Campos (2010, p. 111), “o professor cria e recria, inventa e reinventa o processo pedagógico”, com a finalidade de desenvolver uma costura pedagógica, a qual torne possível o sucesso dos estudantes em suas empreitadas.
Cabe destacar que a articulação de todos os entes é o que vai proporcionar uma aprendizagem significativa, fazendo valer os princípios evidenciados nos dispositivos legais. No processo de desenvolvimento dos projetos, todos são importantes e todas as experiências vivenciadas anteriormente contribuem para o favorecimento de novas estratégias que despertam para a visão política e social dos anseios dos envolvidos. De acordo com Lück (2013), o protagonismo é um princípio que ancora a gestão escolar, os profissionais da educação, os estudantes e a comunidade local, logo é pela participação que se entende o desenvolvimento crítico, político e social para a construção da formação integral dos estudantes.
Em meio a essa dinamicidade, os estudantes que conseguiram alcançar a última etapa do PJB revelaram que:
Foi de total importância não somente para ganho de conhecimento, mas também pessoal. Aprender mais sobre a política, e também lutar pelos nossos direitos como cidadão (E2).
Uma relevância imensurável. Conhecer e atuar como um agente transformador do país é exercer, de fato, sua cidadania (E8).
A me tornar mais comunicativa, socialmente uma cidadã que se preocupa com a sociedade (E11).
Essa experiência contribuiu de forma bastante significativa para minha formação cidadã, política e social, uma vez que pude entender na prática a rotina de um Deputado Federal, sua importância para sociedade e compreender como funciona todo o processo legislativo. Além disso, o PJB permitiu a convivência com jovens de todos os estados brasileiros de diferentes culturas e regiões. E o mais interessante é que cada um deles tinha uma proposta de melhoria para o Brasil. Sem dúvidas, esse programa é essencial para o processo democrático brasileiro, já que aproxima e amplia a visão do estudante sobre a política brasileira (E14).
Eu tive uma experiência incrível, evolui as minhas ideias sobre o que é política. Firmei novos conceitos e destruí preconceitos. Conheci o Brasil inteiro em único lugar e me apaixonei por ele. Percebi que a educação precisava de mudanças e com o incentivo dos meus professores eu tive a coragem de seguir carreira em um curso de licenciatura (E15).
Por meio do exposto pelos estudantes, pode-se notar a relevância da participação na última etapa do PJB, uma vez que, nessa realização, há uma congregação de saberes, de culturas e de experiências que enriquece os olhares e as sistematizações da compreensão de mundo e de política. A atuação como um deputado jovem favorece a percepção dos problemas político, social, econômico, assim como salienta a responsabilidade coletiva dos anseios para a construção de um país melhor.
Com os depoimentos apresentados, foi possível notar que o PJB cumpre com as expectativas dos estudantes, permitindo-lhes uma experiência enriquecedora e favorecendo-lhes a formação de múltiplos aspectos da cidadania. Nesse constructo, “participar é algo político, um jogo democrático” (MUNÕZ, 2004, p. 92), o qual confere espaço de protagonismo aos jovens, sinalizando o despertar para a vivência da política e da construção de uma sociedade justa e igualitária. O PJB, desse modo, contribui com a efetivação da democracia brasileira, com a participação na escola, comungando com a necessidade de ações como essas nas distintas experiências no chão da escola.
Considerações finais
O Programa Parlamento Jovem Brasileiro tem a finalidade de contribuir e incentivar politicamente os jovens à participação nos debates e nos processos democráticos. O Programa favorece a participação dos jovens na política, dando voz e vez com a finalidade de que possam refletir e discutir sobre os dilemas políticos e sociais. Com base no exposto, a participação e o protagonismo são ferramentas para o desenvolvimento da plena cidadania e o PJB contribui em diversos aspectos para o alcance desse mérito, sendo destaque a conscientização quanto ao seu lugar no espaço social.
As vozes dos profissionais da escola e dos estudantes revelaram a importância de projetos como o PJB, mostrando que o Programa agregou valores e habilidades aos envolvidos. Ele, juntamente com todas as ações desenvolvidas no chão da escola, possibilitou aos estudantes a oportunidade de serem protagonistas de suas próprias histórias e ideias, bem como vivenciar aspectos inerentes ao processo de cidadania. As ações realizadas na escola para a implementação do PJB favoreceram o protagonismo dos estudantes, apesar da complexidade do processo, como foi possível observar nos depoimentos.
Os depoimentos dos envolvidos revelaram que as ações e os esforços da escola vão ao encontro aos anseios dos estudantes. A conjuntura pedagógica e profissional da instituição faz valer a necessidade de participação dos estudantes, proporcionando condições para o sucesso da participação e do engajamento juvenil. Nas leis que regulam o ato educativo, no âmbito da educação formal, o protagonismo estudantil ganhou um significativo espaço, no entanto, na prática, o fôlego dos estudantes e dos profissionais é tomado pelas inúmeras burocracias, especialmente as cobranças governamentais. Contudo, programas como o PJB são saídas que permitem vislumbrar a possibilidade de práticas pedagógicas que propiciam a vivência plena do processo escolar e juvenil, na condição de protagonista.
Com base nos resultados apresentados, fica evidenciada a necessidade de engajamento das diferentes esferas sociais para a promoção de um aprendizado significativo. As práticas pedagógicas no chão da escola devem possibilitar o protagonismo dos estudantes e, por sua vez, devem ser apoiadas e incentivadas por entidades políticas e sociais. A articulação entre essas esferas pode contribuir para a construção de um projeto de sociedade igualitário e participativo.
Por fim, salienta-se a necessidade de incentivo a programas e projetos que favoreçam a articulação com os saberes das escolas e dos diferentes segmentos que a compõem, possibilitando que os estudantes tornem-se protagonistas de ações sociais, articulando os saberes, as práticas e as ideias escolares com a política, com a finalidade de incentivá-los a atuarem em meio aos dilemas sociais e políticos, como papel da escola e dos princípios educacionais. As políticas educacionais são possíveis caminhos para a construção de novas estratégias que congreguem os anseios sinalizados, basta perceber a importância das práticas que acontecem no chão da escola para dinamizar as políticas, orientando-as como itinerários formativos. Eis, portanto, o desafio!