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Educação

Print version ISSN 0101-465XOn-line version ISSN 1981-2582

Educação. Porto Alegre vol.46 no.1 Porto Alegre Jan./Dec 2023

https://doi.org/10.15448/1981-2582.2023.1.44731 

Outros Temas

A estética da existência como fato educacional

A esthetic of existence as educational fact

Estética de la existencia como un hecho educativo

Mauricio João Farinon1 

Doutor em Educação e mestre em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), em Porto Alegre, RS, Brasil. Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação – mestrado e doutorado – da Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC), em Joaçaba, SC, Brasil.


http://orcid.org/0000-0001-6693-6993

Deise Cristiane de Luca2 

Mestra em Educação e Tecnologia pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense (IFSul), em Pelotas, RS, Brasil. Doutoranda em Educação na Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC), em Joaçaba, SC, Brasil. Professora da Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC), em São Miguel do Oeste, SC, Brasil.


http://orcid.org/0000-0001-5792-9767

1Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC), Joaçaba, SC, Brasil.

2Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC), São Miguel do Oeste, SC, Brasil.


Resumo:

Este ensaio propõe significar a estética da existência como fato educacional. A noção foucaultiana de estética da existência encontra a noção gadameriana de fato, conduzindo a contextos inquiridor, de suposição e expectativa educacionais, em via diversa à noção de modelos ideais convertidos em formas estandardizadas de existência. Defendemos educação sob as bases da estética da existência, condição para a construção de um projeto belo de si, constituindo a vida como uma obra de arte na perspectiva do comum e de preservação da condição humana. Tematiza-se, em perspectiva bibliográfica, a estética da existência como resposta às relações de poder na esfera da governabilidade, mas, também, como condição das relações de poder sob o critério da liberdade.

Palavras-chave: educação; estética da existência; poder; liberdade

Abstract:

This essay proposes to mean the aesthetics of existence as an educational fact. The Foucauldian notion of aesthetics of existence finds the Gadamerian notion of fact, leading to the proposition of inquiring, educational assumption, and expectation contexts, in a different way to the notion of ideal models converted into standardized forms of existence. We advocate education on the basis of the aesthetics of existence, a condition for the construction of a beautiful project of the self, constituting life as a work of art in the perspective of the common and of the preservation of the human condition. From a philosophical perspective, the aesthetics of existence is discussed as a response to power relations in the sphere of governmentality, but also as a condition of power relations under the criterion of freedom.

Keywords: education; aesthetics of existence; power; freedom

Resumen:

Este ensayo propone significar la estética de la existencia como un hecho educativo. La noción foucaultiana de estética de la existencia se encuentra con la noción gadameriana de hecho, conduciendo a contextos inquiridor, de supuestos y expectativa educativas, de manera diferente a la noción de modelos de ideas convertidos en modos estandarizados de existencia. Defendemos la educación a partir de la estética de la existencia, condición para la construcción de un bello proyecto de sí, constituyendo la vida como una obra de arte en la perspectiva de lo común y de la preservación de la condición humana. Desde una perspectiva bibliográfica, se discute la estética de la existencia como respuesta a las relaciones de poder en la esfera de la gobernabilidad, pero también como condición de las relaciones de poder bajo el criterio de la libertad.

Palabras clave: educación; estética de la existencia; poder; libertad

Este ensaio se origina da confiança e esperança na educação como tempo e espaço da fecundidade humana, portanto, não restrito aos standards mercadológicos e lucrativos instituídos como princípios normatizadores do pensamento e das ações de cada ser humano. O contexto desperta angústia ou, talvez, fragilidade de utopias, pois parece impossível reconstruir algo já tão fortemente alicerçado em tais standards – o olhar diante da catástrofe pode gerar o sentimento de derrotismo.

No entanto, não podemos perder as energias do nosso pensamento e realizarmos o exame crítico frente às realidades, movimento fundamental para evitarmos o que Sen caracteriza, em seu A ideia de justiça, de "catástrofes causadas pela negligência humana" (2011, p. 78). Acompanhando o pensamento crítico, vem a capacidade de construir e fortificar os espaços, talvez pequenos, de deliberação e voz não interditada, condição para que as escolhas e as ações repercutam o grau de entendimento presente nas nossas razões. Nesse âmbito, propomos algo diferente do derrotismo e defendemos a impaciência construtiva a ser desenvolvida pela educação, aqui posta sobre as bases da estética da existência.

Ao tratarmos da estética da existência nos remetemos a Foucault e, com base nesse conceito, propomos significar a educação, defendendo-a como fato educacional. Apresentaremos algumas linhas gerais sobre esse conceito em Foucault, a fim de traçarmos um caminho que vai da dobra do indivíduo sobre si em práticas de espiritualidade à defesa própria deste ensaio: pela estética da existência enquanto construção de um projeto belo de si, via processos educativos, se torna possível preservar a condição individual e autônoma nos modos de existência e a vida democrática com base no comum. A tese avança na compreensão de que a comunidade não ocorre pelo replicar de projetos ou modos de vida padronizados e irrefletidos, os quais somente podem produzir a aglomeração ou classificação como pertencentes a determinada realidade ou grupo. A comunidade é a individualidade compartida em projetos de existência.

A estética da existência em contexto de problematização

Ao ministrar as aulas no Collège de France, em 1983-1984, Michel Foucault (2020) chama atenção para o conceito de bíos como um dos elementos centrais do cuidado de si. Especificamente na aula de 22 de fevereiro de 1984, encontramos a definição do bíos como "a maneira de viver" (p. 111), colocando a preocupação com a vida enquanto "matéria ética e objeto de uma arte de si" (p. 112). Destacamos a concepção de bíos não restrita ao elemento funcional orgânico e vegetativo a partir do qual afirmamos que algo está vivo, mas enquanto projeto de existência que define a maneira de viver norteado pelo cuidado ético consigo mesmo, fundamental para o bem-viver em sociedade. Com origem no latim, a palavra matéria é derivada de mater, prefixo cujo sentido é mãe ou geradora, o que coloca a maneira de viver ou o modo de existência (bíos) como o tema gerador ou preocupação central da ética, movendo a filosofia ao longo da história, principalmente considerando o fato de sermos seres relacionais e a necessidade de sermos formados.

Ao tratar do bíos, e no resgate da tradição poética e filosófica, Foucault (2020) recupera a preocupação de dar forma e estilo à existência, enquanto projeto e obra belos. Estamos diante do conceito foucaultiano de estética da existência. Primeiramente, cabe alguns destaques às contraposições que um projeto educacional com ênfase na estética da existência pode enfrentar para, na sequência, tecermos uma proposição para a Educação. Enquanto contraposições, falaremos especificamente da estetização e do poder na perspectiva da governabilidade. Nas proposições, defenderemos a estética da existência como fato educacional

Primeira contraposição. O conceito de estética está intensamente distorcido pela incorporação de elementos de ordem plástica, os quais são como que fixados no corpo e conduzem mais a um ocultamento do que ao mostrar a si em projeto de si. A sobrecarga de cores, sons, palavras, imagens, a padronização dos costumes, valores e relações sociais, tendem a produzir o fenômeno da estetização, aqui posto enquanto plastificação dos corpos e o consequente afastamento do indivíduo em relação a si, em movimento de busca constante por estilos múltiplos.

Na estetização enquanto plastificação dos corpos ocorre a produção ininterrupta de estilos e novos padrões, os quais são, acompanhando Bauman (1998), livremente concorrentes e apresentados como cardápio capaz de seduzir em constante insatisfação. Bauman tem razão: essa quantidade inesgotável de estilos e padrões vem acompanhada da capacidade de se "regozijar com a sorte de vestir e despir identidades, de passar a vida na caça interminável de cada vez mais intensas sensações e cada vez mais inebriante experiência" (1998, p. 23). A produção da subjetividade, em uma espécie de indústria do sujeito, ocorre em função da habilidade e competência em adotar, incorporar ou se acoplar a quantos padrões, modelos, estilos julgar necessário e conveniente – é a liberdade da não identidade, pois nada é constitutivo de si ou de um projeto de existência. Essa proposta de liberdade é aprisionamento: potencialize-a e terá cada indivíduo sob controle devido à ausência de identidade e à ausência da existência enquanto bela arte de si.

Em segunda contraposição, à qual dedicamos maior espaço, a estética da existência é um modo de relação distinto das "técnicas e procedimentos pelas quais se empreende conduzir a conduta dos outros" (Foucault, 2010, p. 6). Portanto, é contraposição às relações de poder denominada por Foucault de governabilidade. Em paralelo com o estado de menoridade apresentado por Kant no texto "Resposta à pergunta: que é esclarecimento", Foucault traz à tona, nas duas primeiras aulas que compõem O governo de si e dos outros, o par obediência e ausência de raciocínio. A gravidade também é exposta em uma entrevista publicada sob o título "The subject and power", originalmente compondo a segunda edição da obra Michel Foucault: beyond structuralism and hermeneutics (Dreyfus & Rabinow, 1983), sob a ênfase no poder enquanto condução das condutas, ou seja, o poder age sobre a ação dos outros e, portanto, governa no sentido de estruturar o campo de ação.

Na concepção de Foucault, o poder é uma força não apenas repressiva em ato de dizer não, mas uma força que "permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber, produz discurso" em efeito contínuo, ininterrupto, adaptado e individualizado (2019, p. 45). Em O sujeito e o poder (1995) acrescenta: o poder incita, desvia, facilita ou torna mais difícil, amplia ou limita, torna mais ou menos provável. Considerados de modo imediato, a continuidade, ininterrupção, adaptação e individualização são características possíveis de serem identificadas com a educação enquanto formação humana, afinal, o processo formativo emancipador ou de autonomia ocorre ao longo da vida, prepara para nos orientarmos no mundo e potencializa as capacidades de cada indivíduo. No entanto, o âmbito aqui é outro: trata-se de jogos de forças contínuos para produzir a descontinuidade do indivíduo em relação a si, a fragmentação do eu; são estímulos ininterruptos visando a interrupção da capacidade de raciocinar; força que adapta cada indivíduo às realidades a fim de gerar conformismo e perda da capacidade de resistência e da capacidade criativa; produz a individualização como forma de controle das condutas pessoais, fragmentando do todo em vista da homogeneização (fragmenta para homogeneizar).

No poder enquanto governabilidade reconhece-se o outro polo de poder, mas esse reconhecimento está na esfera do controle, portanto, visa ter à mão, anular. No Foucault de Deleuze (2005), essa relação é destacada como o outro da violência, portanto, não fere de modo direto, não faz sangrar – é sutil:

não opera necessariamente através da violência e da repressão quando se dirige aos corpos. Ou melhor, a violência realmente exprime o efeito de uma força sobre qualquer coisa, objeto ou ser. Mas ela não exprime a relação de poder, isto é, a relação da força com a força (p. 38).

Não somos meros objetos ao estarmos em relações de poder ou sofrendo os seus efeitos. O problema está na defesa de não ser possível a coexistência de poderes. Partindo de tal premissa, cabe a ação efetiva para eficientemente desfazer um dos polos de poder. A consequência é uma problemática extrema: se o poder é exercido sobre outro poder a fim de anular sua força, quando esse exercício é levado a termo desfaz no indivíduo a sua condição de sujeito, assujeitando-o – e possivelmente de modo ininterrupto. Vejamos: enquanto cidadãos, somos portadores do poder da soberania, e para isso é necessário fazer uso de instrumentos que nos são próprios: a voz, o voto, a assembleia, a deliberação, os meios de comunicação, a educação, a representação. Tais instrumentos permitem a organização coletiva, contraposição a regimes opressores, efetivação de espaços de decisões comuns, exercícios de direitos e deveres. Reconhecendo a existência de uma força oposta, instala-se estratégias de governabilidade com finalidade de aplacá-la, eliminando sua capacidade de ação. Para isso há alguns mecanismos: vigilância constante, censura, fragilização de entidades de representação democrática, administração do tempo de trabalho, controle do tempo livre, tecnologização das relações humanas e culpabilização pelo fracasso vinculado ao critério de mérito. Primeiramente, tem-se as ações de poder para destituir o poder enquanto força de uma pessoa ou grupo para, em consequência, reduzir o outro a um objeto, a qualquer coisa, a uma massa amorfa.

Com isso é possível defender que o princípio do poder é a liberdade e ele sobrevive a partir da possibilidade de tensionamento que vem da liberdade. Então, longe de a liberdade ser um obstáculo, é a condição para o poder. Em O sujeito e o poder (1995, p. 224) há explicitamente a colocação da liberdade como precondição e suporte permanente do poder, sendo concebida como origem e estímulo para suas ações, pois nela sobrevive a chance do novo, perigoso à racionalidade do igual. Também, por sobreviver à divergência, perigosa à racionalidade da homogeneização. Ainda, por sobreviver à solidariedade, perigosa à racionalidade da competitividade e empresariamento. O campo de força é constante, cessando somente quando um dos polos da relação passa a ser controlado, a ponto de não representar mais resistência: com o fim da liberdade, tem-se o fim do poder.

Situação problemática: a liberdade é condição para a ação e quando o grau de submissão e controle a desfaz, elimina-se a condição de agente, restando a reprodução e o seguimento. Considerando ser possível o fim de uma relação específica de poder, para manter o domínio se busca "um substituto na coerção pura e simples da violência" (Foucault, 1995, p. 244). A violência encontra espaço devido a essa dinâmica, na qual não há mais proporcionalidade de força. Ou seja, o poder atua em relação à força; a violência atua em relação ao corpo. A agressão de um adulto sobre uma criança não é relação de poder, mas de violência, relação com qualquer coisa que não causa resistência. Agressões entre gêneros não são relações de poder, mas de violência, sob a classificação do outro enquanto objeto, qualquer coisa à minha mão. Não raro o professor comete violência em relação aos alunos, pois estes estão ausentes de força, o que os retira da condição de sujeitos e os coloca na categoria de objeto. As relações trabalhistas podem ser de violência, pois o trabalhador pode estar destituído de força diante do poder empresarial e corporativo: são qualquer coisa à mão de dirigentes.

A violência é exercida em contexto de recusa da individualidade ou de sermos portadores de subjetividade, no sentimento de que se está diante de algo, coisa entre outras coisas. Cabe agora a manutenção da obediência e submissão por outras vias, a da violência, um modo de relação que "age sobre um corpo, sobre as coisas; ela força, ela submete, ela quebra, ela destrói; ela fecha todas as possibilidades; não tem, portanto, junto de si, outro polo senão aquele da passividade" (Foucault, 1995, p. 243).

Em Román (2021) encontramos uma síntese do que Deleuze aborda em seu Foucault: "Enquanto as categorias da violência seriam, seguindo Deleuze, aniquilar, eliminar ou destruir, as "categorias de poder seriam dificultar, seduzir, indicar, incitar, desviar, tornar menos provável, limitar, torpedear" (p. 149-150). Os jogos de poder podem não aniquilar, mas abrem espaço para que isso ocorra. Por exemplo, e em referência a períodos ditatoriais, os jogos de poder vieram acompanhados ou foram seguidos por atos de violência. O exílio, a prisão, a tortura, o assassinato, eram atos de violência, agiam sobre indivíduos sem possibilidade de participar no jogo de poder, pois estavam destituídos de força. Conforme Besagio (2021), Atos Institucionais, decretos, cassações, proibições, foram estratégias do jogo de poder cuja consequência foi a paralização quase completa dos movimentos de denúncia, resistência, reivindicações. Aquelas ações políticas abriam a margem de legitimidade para identificar os "sujeitos subversivos e as situações que poderiam se constituir como ameaça, a partir das quais seria providenciada a imediata intervenção" (Besagio, 2021, p. 60-61) e, nesse caso, com o jogo de poder desfeito, a violência direta entrava em cena.

Por que discorremos sobre isso? Ao indicarmos, acima, o diálogo entre Foucault e Kant, foi posto o problema da obediência ausente de raciocínio, característico da governabilidade e menoridade. Ao refletir, à luz da resposta kantiana, sobre como algumas pessoas aceitam a menoridade, o poder e tutela de um sobre outro, não estamos somente diante da preguiça ou covardia daquele cujo poder tende a ser mais fraco ou, talvez, nem mais existir. Ser governado, o estado de menoridade e ausência de autonomia, pode ser resultado, e normalmente assim é, da desproporção ou anulação do poder. Em síntese, culpabiliza-se o indivíduo diante de uma situação sobre a qual ele pode estar distante de conseguir se livrar. O problema está somente no fato de nós permitirmos que a autoridade aja sobre nós? Ou o problema pode estar no modo como se age sobre os indivíduos a fim de gerar a governabilidade, via estetização e jogos de poder?

Não discordamos da noção kantiana e destacada por Foucault, referente ao modo de relação que temos conosco mesmos, caracterizada por "uma espécie de déficit na relação de autonomia consigo mesmo" (Foucault, 2010, p. 32). No entanto, a autonomia não é algo espontâneo e desde sempre disponível a cada um. Ela precisa ser instituída e desenvolvida, o que exige bons mestres, bons guias, capazes de relação formativa com os que estão sob seus cuidados. Se o cuidado de si é o modo adequado de relacionar-se com nós próprios, para isso se faz necessário estarmos também sob os cuidados de outros cujas preocupações favoreçam a autonomia por meio desse cuidado. Por cuidado Kant entende "as preocupações que os pais tomam para impedir que as crianças façam uso nocivo de suas forças" (1999, p. 11). Vejamos, tanto o poder quanto o cuidado agem sobre as forças de uma pessoa. O primeiro, para controlar ou desfazer. O segundo, para orientar no bom uso, seja no exercício da paternidade e maternidade como também no exercício da docência ou em outras instituições.

Nesse caso, o jogo de poder é fortificador das forças de liberdade, portanto, não é assujeitamento ou governabilidade, mas possibilita o cuidado de si, possibilita impedir, em si mesmo, o mal uso das próprias forças. A relação entre cuidado e força, em perspectiva formativa, viabiliza a tarefa de "dar à vida forma e estilo" (Foucault, 2020, p. 140), fazendo do bíos, da existência, uma obra bela (p. 141). É o que Foucault denomina de estética da existência, posto aqui como fato primordialmente educacional, com possibilidade de instituir novos modos de relação a partir de um projeto de vida bela a ser cultivada, tornada visível nos atos sociais, percebida em sua materialidade e inspiradora de modos de conduta nas outras pessoas.

É a defesa da contraposição: ao mesmo tempo em que os dispositivos de poder voltados à governabilidade tendem a criar e recriar estratégias para agir sobre a ação de modo a destituí-la de força e presença, também se fazem necessários processos educativos que levem à criação e desenvolvimento de modos de vida ou projetos de existência (bíos) a partir de estratégias de potencialização da liberdade. A estética da existência se constitui em espaço de criação do bíos em sua característica de liberdade, construindo as bases para que as relações de poder, normais em contextos sociais, encontrem sua própria alteridade: agora não mais, e conforme Foucault (1995, p. 247) para fazer o outro agir conforme eu quero que ele aja ou fazer com que ele acredite ser a minha ação algo correto e necessário. Mas, sim, para possibilitar a relação construtiva entre o poder e o exercício da "intransigência da liberdade" (p. 244). A construtividade dessa relação não se deve à promoção de antagonismos, mas de agonismos: "uma relação que é, ao mesmo tempo, de incitação recíproca e de luta; trata-se, portanto, menos de uma oposição de termos que se bloqueiam mutuamente do que de uma provocação permanente" (p. 245).

A alteridade do poder está no próprio poder, quando exercido em termos agônicos, de forças que se incitam sem se bloquear, mas lutam enquanto espaços de provocação para que ocorra o emergir das forças criadoras e criativas tanto de si quanto de contextos. A estética da existência, a criação bela de si a partir técnicas da vida ou a partir da preocupação sobre como viver, é a experiência agônica por excelência. Afirmamos isso pois, ao darmos atenção às práticas espirituais de cultivo das emoções, de leituras e escritas, de diálogo, de reflexão, do exame de condutas, de imaginar a si, fazemos a experiência do incitamento, nos sentimos provocados, no emergir das forças, a construirmos um projeto de existência e à sua materialização em uma obra bela.

Se as relações de poder são normais em uma sociedade, isso não significa afirmar

nem que aquelas que são dadas são necessárias, nem que de qualquer modo o `poder’ constitua, no centro das sociedades, uma fatalidade incontornável; mas que a análise, a elaboração, a retomada da questão das relações de poder, e do `agonismo’ entre relações de poder e intransitividade da liberdade é uma tarefa política incessante [ênfase adicionada]; e que é exatamente esta a tarefa política inerente à toda existência social [ênfase adicionada] (Foucault, 1995, p. 246).

A urgência é contratualista devido ao esforço em encontrar os espaços institucionais ou no cotidiano da vida para as elaborações do poder, de modo a fazer dele um modo de relação potencializadora da liberdade. Ao mesmo tempo, a urgência está fora do âmbito contratual, incidindo sobre a estética da existência que acompanha a relação de poder do mestre com o discípulo e, também, a relação de poder de si sobre si: uma pedagogia.

Não poderia a vida ser uma obra de arte?

A estética nos provoca educacionalmente em, ao menos, duas direções: a educação da sensibilidade e a tarefa de fazermos da educação e da existência obras belas. Na primeira, encontramos a filósofa e educadora brasileira Nadja Hermann; Foucault nos orienta na perspectiva da beleza direcionada à existência e, por que não, para pensarmos a educação comprometida com a beleza da existência. Hermann e Foucault se encontram: é preciso fazer da existência bela uma obra visível aos canais da sensibilidade, não enquanto proposta de modelos ideais, mas matéria movedora da imaginação e criatividade na criação de si.

Esse é o âmbito no qual a estética reivindica sua condição formativa. E o faz por movimentar os elementos estagnados pela centralidade nas categoriais da lógica e da objetividade próprios da herança científica moderna e que perpassam os processos educativos de modo determinante. Acompanhando Hermann (2010), a estética "se relaciona com nossa capacidade de apreender a realidade pelos canais da sensibilidade" (p. 31), movimentando "o sentimento, a sensibilidade, as emoções e o corpóreo" (p. 15), assim como a imaginação (cf. p. 61). Isso ocorre, por um lado, pela presença efetiva da literatura, música, artes plásticas, cinema, filosofia, nos currículos e/ou nas práticas pedagógicas e, ao mesmo tempo, ocorre no drama da existência humana, quando desenvolvemos nossa capacidade de nos colocarmos junto ao outro, em uma demora não caracterizada pela tentativa de ter à mão ou de manipulação. O drama da existência humana é o ponto crucial que nos interessa ao lermos a concepção de estética defendida por Hermann, articulando a apreensão da realidade e o movimento dela derivante: a sensibilidade diante do mundo – o ato de sentir o mundo – torna possível um modo de relação consigo mesmo, definido enquanto espaço de criação de si.

A realidade natural não está diante de nós para ser mostrada, por mais que, ao percebê-la, se torna também possível mover a sensibilidade, a emoção, a imaginação e a criação. São as realidades humanas, os dramas da existência, que se mostram aos nossos sentidos, pois vêm acompanhado pelo aparecimento de seu sujeito no ato de mostrar a sua obra. Mas não é um movimento unilateral daquele que percebe, sendo também um movimento de quem mostra – o que farei surgir aos olhos dos outros?; o que minha vida manifesta? Talvez essas perguntas possam desencadear a preocupação com a technè da vida, technè tou biou, a preocupação sobre como viver, postas por Foucault como próprias da estética da existência. O resgate feito por Foucault (2020, p. 141) referente à cultura grega põe em evidência esse elemento ético-estético, na necessidade de termos sempre em mente

a maneira de ser e de se conduzir, o aspecto que sua existência faz aparecer aos olhos dos outros e aos seus próprios, também o vestígio que essa existência pode deixar e deixará na lembrança dos outros depois da sua morte, essa maneira de ser, esse aspecto, esse vestígio foram um objeto de preocupação estética.

Não é somente um elemento subjetivo próprio de cada ser humano e desencadeador de autoconhecimento, nos termos de um saber de si. Estamos diante de algo, se não maior, ao menos na mesma escala de importância: o saber dos outros sobre mim, a matéria moral constituidora de memória. Nosso estar no mundo faz aparecer dados muito particulares do meu modo de conduzir-me, gerando efeitos longínquos em termos de tempo e espaço, por isso a preocupação com a estética da existência, a necessidade de práticas de cuidados que gerem a arte visível da bela vida.

Junto com a preocupação em "elaborar condutas que se mostrassem admiráveis aos olhos de terceiros", está o fato de não ser uma preocupação "atrelada a um código uniforme" (Pinho, 2017, p. 113). O centro está na "escolha pessoal" (Foucault, 1995, p. 260), o que também é um problema ético-político, pois envolve o exercício do sujeito moral. Ou seja, é necessário que a escolha seja derivada de um processo de deliberação. Ao realizar as investigações sobre assuntos aos quais cabem escolhas, o critério para as ações não se reduz ou, até mesmo, se distancia das determinações de códigos uniformes. É a abertura de espaço para a relação consigo enquanto criação de si submetida ao exercício ético do sujeito moral. Longe de negar a necessidade de códigos, poder-se-ia afirmar a urgência maior na arte da vida, na estética da existência. Afinal, Foucault destaca sua surpresa frente ao fato de que

em nossa sociedade, a arte tenha se transformado em algo relacionado apenas a objetos e não a indivíduos ou à vida; que a arte seja algo especializado ou feita por especialistas que são artistas. Entretanto, não poderia a vida de todos se transformar numa obra de arte? Por que deveria uma lâmpada ou uma casa ser um objeto de arte, e não a nossa vida? (Foucault, 1995, p. 261).

Não raro somos sufocados por modelos de conduta, modos de viver estandardizados e, junto a isso, sufocados pela ideia de ser necessário seguir tais modelos, ausentes de escolha pessoal. Fonte e potência de angústia, pois, a existência não é uma obra própria, mas resultado de ideais de pertencimentos ou classificações que não geram identidade. O fascínio de Foucault em relação à vida como obra de arte é manifesto de modo direto na entrevista de 1995, indicando não somente uma temática de investigação histórica, mas enquanto tarefa pedagógica de formação no conhecimento da verdade, o que exige um modo de condução, o exercício entre mestre e discípulo ou, na linguagem atual, entre professor e aluno. Isso se expressa, por exemplo, quando afirma recear "até que ponto fazemos o que realmente fazemos, se vivemos como realmente vivemos, por conhecermos a verdade sobre o desejo, a vida, a natureza, o corpo" (Foucault, 1995, p. 261). A construção desse conhecimento é tarefa que perpassa as instituições educativas em suas ações pedagógicas, mas não com fim somente de erudição e, sim, como condição para modos de viver valorosos, para criarmos modos de vida que tenhamos razões para viver. Nesse sentido, a indagação foucaultiana também nos remete a uma transcendência do habitar humano comum, sob a preocupação em tornar o conhecimento a base para os modos de estar no mundo ou de se orientar no mundo. É o cuidado de si à luz do conhecimento, um zelo que incide em nossa technè tou biou.

Então, a vida pode ser uma obra de arte. Mas, para o ser, faz-se necessário formar-se, o exercício em característica reflexiva do verbo formação, a ocorrer sobretudo a partir dos processos pedagogicamente conduzidos. Educa-se, hoje, para fins de produção e renda, promovendo o esvaziamento da capacidade de relação com o mundo a partir dos canais da sensibilidade, a fragilização da ação no mundo à luz de conhecimentos e da reflexão necessários para formar eticamente a nossa matéria moral. À luz do sentido de estética e de estética da existência constitui-se o contexto de inquirição, suposição e expectativa da educação – vamos ao fato educacional.

A estética da existência como fato educacional

Para abordarmos a estética da existência como um fato educacional, faz-se necessário, primeiramente, localizarmos o sentido do termo fato. Na teoria gadameriana, fato é "um conceito hermenêutico, ou seja, algo sempre referido a um contexto de suposição ou expectativa, a um contexto de compreensão inquiridora de tipo complicado" (Gadamer, 2001, p. 36). Com base nessa definição, para que tenhamos um fato, são necessárias duas condições. O primeiro refere-se ao contexto de suposição e expectativa. Enquanto suposição, nos colocamos diante de algo sustentador, como que um alicerce sobre o qual algo está sendo construído. Indica a referência a algum elemento que é importante termos em consideração, no sentido de uma tradição na qual nos inserimos ou da qual nos apropriamos e que nos orienta nos modos de presença no mundo. Enquanto expectativa, nos perguntamos sobre o que é possível esperar, uma vez posta tal base sustentadora – é a pergunta por aquilo a ser feito, o que é preciso realizar, para onde somos remetidos.

O segundo refere-se ao contexto de compreensão inquiridora. O já pensado e o ainda a ser pensado somente se tornam claros no movimento de perguntas que geram pro-curas. A potência do contexto inquiridor é levar a termo o processo de compreensão cujo caminho é o da pro-cura, ou seja, de se colocar a favor do cuidar. Perguntar é lançar-se na profundidade, aqui exposto enquanto movimento de cuidar de algo ou em vigilância no processo de compreensão da realidade. Perguntar, então, nos faz procurar, e não é detalhe que todo aquele que pergunta, na ânsia pelo conhecimento, é curioso. Em ambas as palavras – procura e curioso – temos a expressão cura: o ato de zelar, de cuidar. Na primeira, com o prefixo pró, nos colocamos a favor da cura; na segunda, adotamos a característica de cura, enquanto modo de ser vigilante e cuidadoso.

Coloquemo-nos em contexto de suposição e expectativa, mas iniciando com uma inquirição: para que educação escolar e universitária? Ou, de modo geral, para que educação? Essas inquirições ganham cada vez mais urgência em tempos neoliberais e neoconservadores, na suposição de educação enquanto processo histórico e social a partir do qual qualificamos o saber crítico, a liberdade e a autonomia. Nessa perspectiva de qualificação especificamente espiritual e não restrito ao produtivo-instrumental, a estética da existência encontra seu potencial educativo: possibilita projetos alternativos de existência, os quais não estão no mundo para entrarem em choque, mas para constituírem linguagem.3 Disso deriva um caráter sociológico e educacional. Sociologicamente, é muito distinto dizer que os encontros sociais ocorrem a partir das alternativas próprias de cada projeto de existência construído a partir de si ou, por outro lado, encontros em repetições existenciais padronizadas. Mas isso é educacional, pois a sala de aula (para ficar na esfera escolar) pode ser marcada pela tendência de desfazer as individualidades em nome daquilo que a sociedade espera de cada um na solitária esfera profissional-produtivo.

Essa é a compreensão prévia de ser humano como obra: algo que não está dado de antemão como uma essência a ser realizada, mas exige a elaboração de um plano a ser executado, constantemente revisto e qualificado. A noção de essência a ser realizada é um contexto de suposição ainda fortemente presente. Sob o império da OCDE, do Banco Mundial, sob os princípios neoliberais, nos é imposta uma essência: somos capital humano. A educação em suas dinâmicas curriculares, em suas políticas e processos, se orientam, talvez sem a devida reflexão, por esse princípio e concepção. A suposição de que somos capital humano define a submissão da educação aos processos mercadológicos na centralidade da produção de bens e serviços, estabelecendo, inclusive, um contexto de expectativa: que esse capital seja de alto valor competitivo. Damião e Delgado (2023) se referem ao capital humano fazendo uso de uma expressão provocadora: um modo de existência inteiramente novo, construído via educação. Diríamos nós: um modo de existência produzido pela educação a partir desse contexto de suposição estabelecido por aqueles organismos internacionais. A noção de estética da existência inverte esse pressuposto antropo-mercadológico da educação e a existência humana passa a ser projeto criado por cada indivíduo na dinâmica histórica e de acordo com valorações racionalmente ou razoavelmente constituídas, sentidas como constituidora da identidade, defensora do mundo comum, gerando modos de viver que temos condições para valorizar.

No capital humano o contexto de suposição impõe atender ao modelo prévio de desenvolvimento de habilidades necessárias ao modo de ser capital: resiliência e não compromisso político por mudanças; trabalhar em equipe, mas se empresariando o suficiente para competir e vencer; domínio dos números e das tecnologias digitais, em detrimento da capacidade de refletir e entender criticamente o mundo; adaptabilidade às exigências, sem potencial de resistências; satisfação nos domínios e procedimentos técnicos, sem satisfação no conhecimento. Frente a tais habilidades é preciso criar outro fundo de suposição, no qual o ser humano possa compreender a si para construir um projeto de existência que não seja adaptação a um modo ou tipo de existência previamente (im)posto. Amartya Sen (2013) tem razão ao propor a necessidade de um deslocamento da noção de capital humano para a noção de capacidade humana. Ao contrário da primeira, centrada no aumento da possibilidade de produção, a segunda "concentra-se no potencial – a liberdade substantiva – das pessoas para levar a vida que elas têm razão para valorizar e para melhorar as escolhas reais que elas possuem" (2013, p. 372).

A estética promove a cura não somente na educação, mas nas condições para vivermos humanamente em sociedade. Somos desafiados ao ato de cuidar daquilo que é o central: o ser humano em sua condição humana. O diagnóstico de Nussbaum (2015) sobre a realidade cancerígena que assola a educação é provocativa na busca por curas: a geração do vazio na condição humana e um "suicídio gradual [e, talvez, universal] por encolhimento da alma" (p. 83). Essas palavras de Tagore, citadas por Nussbaum, denunciam a mecanicidade dos viveres e a eliminação das energias criativas necessárias para a imaginação político-democrática. Somado a isso, o encolhimento da alma pode ser posto nas mesmas linhas da "desertificação do espírito" (Ordine, 2016, p. 634). Considerando o esvaziamento das artes e das humanidades nos currículos escolares e a consequente miniaturização do ser humano à característica de autômato técnico-produtivo, o encolhimento e a desertificação se constituem em um grande standard dos nossos tempos. No entanto, o deserto cresce, o que torna urgente o processo de cura em seu movimento de zelo e cuidado, a fim de evitar a desertificação enquanto processo, seja subjetivamente quanto das instituições educativas. Educacionalmente precisamos curar (zelar e cuidar) o ser humano, o que exige resgatar as instituições educativas das amarras impostas pelos organismos e diretrizes internacionais, a fim de serem recolocadas nas vias do comum ou da república.

Considerações finais

A defesa da estética da existência como fato educacional nos possibilita compreender o ser humano como obra em obra, portanto em constante inacabamento, envolvendo deliberação e tomada de decisão sobre si em vista da constituição de um projeto de existência sob a perspectiva do mundo comum. Derivam-se disso algumas lições. Primeiro, o fato de precisarmos concordar com Hannah Arendt em sua noção de que os seres humanos nascem em um mundo pré-existente. O que colocamos em pauta nesse ato final do texto é, conforme a filósofa, a possibilidade de o mundo – cultural, político, institucional, financeiro – destruir esse que nasce. O modo mais sutil de o fazer é inserir a criança em um contexto de suposição desconecto do espaço da surpresa e da criação de si em um mundo comum, de modo a soar estranho ou inaceitável a opção por, ou constituição de estilos de vida alternativos às tendências hegemônicas da tradição familiar, do contexto local, da prioridade na busca pela profissão com fins lucrativos.

A segunda lição é a fecundidade do humano promovida pela fertilidade educacional. Fértil é o espaço no qual os diversos elementos não encontram obstruídos os caminhos de encontro e interrelação. Dentro de um contexto fértil, estando possibilitado o encontro e a relação entre diferentes elementos, o que ocorrerá é total possibilidade, insuficiência da previsibilidade, falência do controle. Na fertilidade, ocorre algo inesperado, é a fecundidade: novidade arendtiana, falibilidade levinasiana do contexto. Ao ser direcionada para as realidades escolares, uma sala de aula será fértil quando proporciona o encontro de linguagem entre os diferentes indivíduos. Como terceira lição trazemos o confronto entre a maximização do autointeresse e a minimização da solidariedade. A estética da existência não é constituição solitária ou cega às realidades humanas. Juntamente com o conhecimento de si, há o conhecimento de mundo e o quanto somos vinculados reciprocamente. A instituição da comunidade não ocorre a partir de elementos naturais (clima, geografia, alimentação) ou antropológicos (etnia, cultura, religião), mas, e agora concordando com Gadamer em seu A razão na época da ciência, a partir do princípio ético da solidariedade: é ela que nos torna reciprocamente vinculados e torna possível não colocar o autointeresse como razão social.

A defesa da estética de a existência, enquanto construção de um projeto belo de si, via processos educativos, ser a possibilidade da individualidade em mundo comum é, muito mais de que uma tese teórica, uma urgência prática e a via privilegiada da formação humana. Na condição de fato educacional, não ocorre a estruturação da educação, mas sua dinamização processual. A educação não pode se colocar fora do elemento estético se quiser encontrar o ser humano enquanto mundo e fazer parte do mundo humano.

3Por linguagem entendemos o encontro expressivo das experiências de si no mundo, o falar por si mesmo em oposição ao acontecer da repetição. Linguagem tem o caráter de encontro das experiências que cada um faz e são postas em comunicações compreensivas, portanto, não dominadora ou manipuladora. A linguagem se constitui, assim, quando desvelamos a nós mesmos, no surgimento de si, e colocamos o que se revela em jogo nas relações sociais. A educação deveria, dado seu caráter formativo, constituir linguagem: o encontro comunicativo nos pressupostos da estética da existência.

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Recebido: 23 de Maio de 2023; Aceito: 09 de Outubro de 2023; Publicado: 27 de Novembro de 2023

Endereço para correspondência Mauricio João Farinon Universidade do Oeste de Santa Catarina Rua Getúlio Vargas, 2125 Flor da Serra, 89600-000 Joaçaba, SC, Brasil mauricio.farinon@unoesc.edu.br

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