INTRODUÇÃO
A morte é um fenômeno universal que permanece fruto de intenso debate, e, embora ainda exista uma tendência de evitação sobre o tema, em um processo de distanciamento do homem em relação à sua finitude, ela perdura como elemento importante de estudo no processo saúde-doença. Além de ser vivenciada no âmbito pessoal, a morte é um acontecimento frequente na vida dos profissionais de saúde em seu ambiente de trabalho, os quais nem sempre são adequadamente preparados, durante a formação acadêmica, para enfrentar o processo de morrer de seus pacientes1.
A forma como um indivíduo vivencia e maneja seus sentimentos em relação à morte pode traduzir uma habilidade ou inabilidade de conduzir mecanismos de enfrentamento e refletir as percepções em relação ao processo de morrer. Nesse contexto, o ser humano vivencia um estado de constante gerenciamento do terror, advindo do conflito entre o senso inato de autopreservação e a consciência da inevitabilidade e imprevisibilidade da morte, o que se dá pela adoção de sistemas simbólicos e crenças no intuito de mediar a dura realidade orgânica. Assim, a ansiedade da morte está atrelada a uma variedade de condições de adoecimento mental, como transtornos de ansiedade, transtorno obsessivo-compulsivo e fobias2.
Para os profissionais de saúde, a morte pode ser uma vivência cotidiana. No entanto, ainda é um tema pouco discutido, o que causa implicações diversas, como dificuldade na abordagem dos familiares do paciente quando há probabilidade de óbito, negação da real situação ao paciente como forma de “protegê-lo”, sentimento de impotência diante de situações em que a cura não pode ser alcançada e sensação de fracasso quando se perde um paciente. Sendo assim, é vital a inclusão de debates sobre terminalidade e comunicação de más notícias durante os cursos da saúde3.
A não aceitação do processo de doença apresentado pelo paciente no contexto do atendimento, segundo o estudo de Gambatto et al.4, pode revelar o despreparo dos profissionais de saúde nos momentos em que se exige uma postura menos negacionista e mais empática. A incapacidade de lidar com o adoecimento é revelada por trabalhadores com menor tempo de experiência laboral com os mecanismos de doença e morte, o que indica, de acordo com o estudo, a existência de uma lacuna na preparação desses profissionais. A falta de preparo repercute, logo, de forma direta no paciente, tendo em vista que a antipatia é transferida para o indivíduo doente, um fator importante para a não adesão ou descontinuidade do tratamento4.
Em consonância com isso, é notória a associação da prática médica com a hipermedicalização consciente dos pacientes, tendo em vista a desconsideração dos cuidados paliativos no contexto de adoecimento e das engrenagens atreladas aos processos de doença/morte. Isso elucida também as falhas durante a graduação, com consequências negativas para os pacientes, reflexo da escassez de disciplinas que abordem temas atrelados à prevenção quaternária nos diversos níveis de atenção à saúde5.
Prevenção quaternária aplica-se a evitar riscos a pacientes em virtude de tratamentos excessivos. Ela passou a ser estabelecida na contemporaneidade por médicos especialistas de saúde da família e da comunidade com o propósito de cuidar dos pacientes de forma integral e longitudinal, sobretudo nas situações em que se revelam os processos de morte e morrer6.
Assim, o cuidado, as experiências clínicas e a gestão emocional em situações críticas devem ser parte das habilidades desenvolvidas pelos profissionais que cotidianamente vivenciam as nuances do morrer, seja para fornecer amparo aos familiares, seja para evitar sentimentos de culpa. Uma vez que essas habilidades não tenham sido desenvolvidas - ou o tenham de forma superficial- durante a graduação, tanto estudantes em estágios finais de curso quanto profissionais recém-formados irão vivenciar consequências práticas dessa lacuna curricular7)-(9.
Apesar de não haver consenso em relação a quais habilidades deveriam ser abordadas no contexto do ensino de cuidados paliativos, acredita-se que o currículo possa ser dividido em manejo da dor e de sintomas, aspectos espirituais e psicossociais, e habilidades de comunicação. Assim, essa abordagem faz-se necessária, uma vez que o enfrentamento eventual da morte de um paciente provoca estresse e pode desencadear uma miscelânea de emoções e processos de adoecimento psíquico, como angústia, frustração e insegurança no profissional10),(11.
Portanto, a multiplicidade de visões e formas de sentir é o que caracteriza a consciência humana, contudo, de acordo com o contexto sociocultural em que está inserido, o homem pode ter percepções semelhantes (ou diferentes) em relação ao fim da vida, considerando sua idade, sua escolaridade, seu estado civil e suas experiências com a perda. Dessa forma, o presente estudo objetiva analisar a percepção de estudantes do curso de Medicina da Universidade Federal do Amapá (Unifap) em relação à morte, ao processo de morrer e ao luto.
MÉTODO
Realizou-se um estudo transversal, exploratório e descritivo com uso de método misto, qualitativo e quantitativo. Em diversos contextos, incluindo este estudo, as análises qualitativas e quantitativas podem somar-se para uma compreensão mais abrangente da realidade, uma vez que isoladamente talvez não sejam capazes de explicar o fenômeno12),(13.
O estudo foi produzido no contexto da disciplina optativa “Emoções no Processo Saúde/Doença/Morte”, ofertada semestralmente no curso de Medicina da Unifap. A disciplina apresenta carga horária de 60 horas, e a seleção dos alunos é realizada segundo lista de interesse disponibilizada pela coordenação do curso. Discentes do primeiro até o último semestre encontram-se aptos à matrícula. Entre os objetivos pedagógicos, destaca-se a compreensão dos seguintes aspectos: emoções, aspectos biopsicossociais no processo saúde, doença e morte; impactos da doença e da hospitalização, situações de sofrimento/morte na família, cuidados paliativos e desafios emocionais para o médico perante essas experiências existenciais, sob um aporte teórico interdisciplinar. A abordagem é eminentemente teórica, com professor responsável pertencente à área de psicologia, e é desenvolvida a partir da realização de seminários e explanações, não havendo momentos simulados.
O curso de Medicina da instituição tem seu conteúdo pedagógico dividido em semestres, do primeiro ao quarto ano, e em módulos (cujo componente avaliativo envolve metodologia tutorial e prática morfofuncional), como Habilidades Clínicas e Bioética (HCB) e Interação Ensino Serviço Comunidade (IESC), enquanto nos últimos dois anos há o Internato Médico (IM). A abordagem da morte e do processo de morrer, segundo o projeto pedagógico, é citada pontualmente nos componentes de HCB (quarto semestre), IESC (do primeiro ao quarto ano), assim como durante os dois anos do IM. A abordagem detalhada do tema consta inclusa apenas na ementa da disciplina optativa cuja população de alunos matriculados é foco de análise desta pesquisa.
A população do estudo compreendeu, pois, 67 alunos que realizaram a matrícula no período de agosto de 2019 a fevereiro de 2020 (compreendendo duas turmas), intervalo escolhido devido a um breve período anterior de descontinuidade da disciplina, de modo que a amostra final correspondeu à parte da população que respondeu aos critérios de inclusão, ou seja, preencheu o questionário enviado e concordou com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) disponibilizado.
O instrumento da pesquisa foi composto por um questionário misto anônimo, autoaplicável e on-line, com questões abertas e fechadas, formado por uma seção de variáveis sociodemográficas e de experiência com a morte e outra de percepções acerca da morte e do morrer: a primeira, com dez questões de múltipla escolha, e a segunda com sete questões discursivas. O instrumento foi elaborado pelos autores, com elementos adaptados dos estudos de Souza et al.14 e Marques et al.15. Para diminuir possíveis erros de interpretação, aplicou-se primeiramente o questionário de forma assistida a um grupo de 20 pessoas, que ressaltaram possíveis confusões semânticas e estruturais, as quais foram solucionadas, quando então se deu o processo final de aplicação, de outubro a novembro de 2020.
O questionário sociodemográfico e de experiência com a morte contém informações de idade, religião, estado civil e sexo; semestre atual; experiência de morte de pessoas significativas (pedia-se para especificar qual na pergunta posterior); participação em discussões sobre a morte e o morrer (sim ou não; e pedia-se para especificar se disciplina obrigatória, optativa ou aulas/simpósios/rodas de conversa na pergunta posterior); e experiência de morte de pacientes nas atividades de graduação (sim ou não).
O questionário aberto discursivo contém três grupos de perguntas:
Grupo 1 - sobre aspectos da percepção evocada da morte e as formas de enfrentá-la: “Qual é a sua percepção acerca da morte e qual é o significado dela para você?” e “Quais são as suas principais atitudes (estratégias de enfrentamento) diante da morte de um paciente ou de uma pessoa próxima?”.
Grupo 2 - sobre autopercepção de preparo em face das situações: “Você se sente preparado, como estudante e futuro profissional, para uma situação de morte de um paciente?” e “Você se sente emocionalmente preparado para lidar com um paciente durante o processo de morrer?”.
Grupo 3 - sobre os sentimentos evocados na forma de palavras em situações específicas: “Para você, quais sentimentos estariam mais fortemente ligados à morte?”, “Para você, quais sentimentos estariam mais fortemente ligados ao processo de morrer?” e “Para você, quaissentimentos estariam mais fortemente ligados ao luto?”.
Após a coleta, os dados foram tabulados no programa Microsoft Excel 2020 e tratados por meio da importação para o software SPSS, versão 20.0. Na tabulação, cada participante, ou seja, cada unidade de pesquisa, foi codificada de R1 a R54. Para as variáveis sociodemográficas e de experiência com a morte, realizaram-se estatística descritiva e tabelamento cruzado para relacionar variáveis (análise quantitativa).
Na análise qualitativa dos dados, utilizou-se a análise de conteúdo de Bardin, composta de três etapas: pré-análise (leitura dinâmica do material, escolha e seleção do que foi coletado, constituição do corpus embasado nos princípios de exaustividade, representatividade, homogeneidade e pertinência, formulação de hipóteses e preparação do material), exploração do material (codificação do que foi coletado, estabelecimento de unidades de registro e de contexto, como palavras e temas, e categorização dos dados segundo critérios, como o semântico) e tratamento, inferência e interpretação (interpretar e inferir segundo o emissor, a mensagem e o canal de comunicação)16. Esse processo foi feito segundo o grupo de perguntas.
As respostas do grupo 1, à pergunta acerca da percepção de morte foram agrupadas de acordo com três subgrupos, divididos por categoria semântica, sendo correlacionadas aquelas que apresentavam proximidade conceitual e estariam relacionadas a uma interpretação semelhante em relação à morte e ao processo de morrer. Como no estudo de Oliveira et al.17, os subgrupos de definições foram a morte como um “processo espiritual” e como um “processo natural”. As definições que não se enquadravam nessas categorias ou respostas vagas e imprecisas foram alocadas para “outras”17. Quanto às estratégias de enfrentamento, foram analisadas e subdivididas considerando as 12 estratégias descritas por Skinner et al.18.
O modelo de Skinner et al.18 considera um sistema hierárquico, construído a partir de cem estratégias diferentes, agrupadas em famílias potenciais de enfrentamento, a saber: solução de problemas (planejar estratégias, análise lógica e esforço); busca por informação (ler, estudar, observar e perguntar); incapacidade de se ajudar (passividade, culpa e desânimo); escape (pessimismo, negação e procrastinação); autoconfiança (regulação emocional e comportamental); busca por suporte social (busca de contato e ajuda e reconhecimento); delegação (dependência, reclamação, autopiedade e lamentação); isolamento (afastamento social e evitação); acomodação (minimização e aceitação); negociação (barganha e assumir a perspectiva do outro); oposição (agressão, raiva e vingança). Uma vez categorizadas as respostas, elas foram analisadas em conjunto e relacionando seu comportamento com o de outras variáveis.
A primeira e a segunda perguntas do grupo 2 foram denominadas P1 e P2, respectivamente, para fins de facilitar sua representação nas tabelas, e sintetizou-se semanticamente as respostas em “não”, “sim” e “não sei”, de modo que puderam ser comparadas com as variáveis de experiência com a morte e o morrer.
As respostas para as perguntas do grupo 3 foram agrupadas segundo nuvem de palavras por meio do suplemento Pro Word Cloud do programa Microsoft Word 2020, visando identificar a percepção dos alunos sobre a morte, o morrer e o luto. A nuvem de palavras (word cloud) utiliza a representação visual no intuito de demonstrar a importância ou recorrência de determinado tópico, tema, palavra ou linguagem em um sujeito ou grupo de análise. A forma como as palavras são dispostas reflete simbolicamente as percepções evocadas. Assim, as tag clouds apresentam-se como modelo de word cloud com organização hierárquica em que as imagens geradas são posicionadas em ordem de importância (ou frequência), sendo o termo de maior relevância apresentado no centro da imagem, com uma fonte maior19.
Este estudo respeitou os preceitos éticos estabelecidos pela Resolução nº 466/2012 para pesquisas com seres humanos, sendo aprovado pelo Conselho de Ética em Pesquisa da Faculdade Estácio de Macapá: Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) nº 36933220.5.0000.5021.
RESULTADOS
Os questionários foram respondidos por 54 alunos do curso de Medicina da Unifap, com uma taxa de adesão de 80,6% (54/67), considerando a população utilizada no estudo.
A caracterização sociodemográfica demonstrou uma predominância da população feminina (55,6%), em relação à masculina (44,4%), do estado civil solteiro (88,9%), assim como da faixa etária de 21 a 25 anos (55,6%), com média de idade de =24,43±5,347, mediana de 24, mínima de 18 e máxima de 42 anos. A religião cristã católica representou a maioria percentual em relação às demais, com 38,9%, seguida pela protestante ou evangélica, com 31,5%. As características completas da amostra podem ser observadas na Tabela 1.
Variável | N | % |
---|---|---|
Sexo | ||
Feminino | 30 | 55,6 |
Masculino | 24 | 44,4 |
Estado civil | ||
Casado | 6 | 11,1 |
Solteiro | 48 | 88,9 |
Faixa etária | ||
≤ 20 | 4 | 7,4 |
De 21 a 25 | 30 | 55,6 |
De 26 a 30 | 14 | 25,9 |
>30 | 6 | 11,1 |
Religião | ||
Cristão católico | 21 | 38,9 |
Cristão protestante/evangélico | 17 | 31,5 |
Espírita | 2 | 3,7 |
Outra | 2 | 3,7 |
Sem religião | 12 | 22,2 |
Ano atual do curso | ||
Primeiro | 4 | 7,4 |
Segundo | 10 | 18,5 |
Terceiro | 26 | 48,1 |
Quarto | 12 | 22,2 |
Quinto | 2 | 3,7 |
Total | 54 | 100 |
Fonte: Elaborada pelos autores.
O questionário de experiência com morte e morrer evidenciou que 85,5% (n = 46) dos participantes tiveram experiência prévia de perda de pessoa significativa, de modo que 56,5% (n = 26) mencionaram somente uma experiência, enquanto 21,7% (n = 10) apresentaram duas; 15,2% (n = 7), três; e 6,5% (n = 3), quatro ou mais experiências. Entre o total de perdas (80), 42,7% (n = 35) perderam os avós (um ou mais); 18,7% (n = 15), o(a) tio(a); e 11,2% (n = 9), amigo(a). As demais foram de primo(a), bisavós (um ou mais), pai, sogro e outros. No que tange à experiência de morte de pacientes durante as atividades da graduação, ela foi presente em 37% (n = 20) dos participantes.
Da amostra, 87% (n = 47) participaram de discussões sobre morte e morrer: 70,2% (n = 33) na disciplina optativa ofertada pelo curso, 19,2% (n = 9) em aulas/simpósios/rodas de conversa extracurriculares e 10,6% (n = 5) em disciplina obrigatória específica do curso.
A análise qualitativa das percepções e dos significados da morte possibilitou subdividir os relatos naqueles que definiram a morte como um processo natural, representando 55,6% (n = 30), como em “Uma etapa obrigatória no viver”, “Única certeza em vida” e “Natureza seguindo seu curso”; e naqueles que definiram como um processo espiritual, 29,6% (n = 16), não necessariamente religioso, como em “A morte é uma passagem de uma fase para outra. Morrer não significa o fim de tudo” e “Vejo a morte como uma etapa, o fim do corpo físico, mas não o fim da alma. Para mim a morte é uma separação provisória”, ou envolvendo elementos religiosos específicos, como em “Passagem da vida terrena para a celestial” e “Processo natural pelo qual todos irão passar. Exceto os que estiverem vivos na hora da vinda de Cristo Jesus”; e “outras”, em 14,8% (n = 8), como em “Entendo a morte como algo difícil de ser plenamente compreendido” e “Algo obscuro”.
Para a pergunta sobre estratégias de enfrentamento, 7,4% (n = 4) afirmaram não ter estratégia; 24,1% (n = 13) utilizam solução de problemas, como em “Tentar entender a dor de cada um e a maneira com quem lida com aquele momento”; 1,9% (n = 1) mencionou incapacidade de se ajudar, como em “Primeiro eu desconto minha raiva e choro tudo que tenho pra chorar. Depois fico uma semana parecendo um zumbi querendo morrer também [...]”; 3,7% (n = 2) adotam o escape, como em “Não pensar muito” e “me conectando às atividades mundanas, sem muitos reflexos sobre a finitude e fugacidade da vida [...]”; 22,2% (n = 12) citaram a autoconfiança, como em “Tentar controlar o excesso dos meus sentimentos diante das pessoas” e “Tento ser resiliente e pensar que morrer faz parte do ciclo da vida e todos irão passar por esse momento”; 13% (n = 7) utilizam a busca por suporte social, como em “Procurar apoio nas pessoas próximas pois é um processo difícil. Sentir outras pessoas para saber que não está só no processo” e “Eu me apego às minhas crenças”; 5,6% (n = 3) buscam o isolamento, como em “Distanciamento” e “Recolhimento e reflexão”; 20,4% (n =11) preferem a acomodação, como em “Refletir e aceitar a morte e o processo de morrer como algo inerente a minha vontade”; e 1,9% (n = 1) recorre à submissão, como em “lembrar dos bons momentos vividos”.
No que tange à pergunta “Você se sente preparado, como estudante e futuro profissional, para uma situação de morte de um paciente?” (P1), 51,9% (n = 28) responderam que não, diretamente, como em “Não, afinal cada contexto é único, nem sempre é possível agir racionalmente frente aos pacientes e às diferentes situações” e “Não”, ou indiretamente, como em “Tolo o homem que se julga preparado para lidar com a morte” e “Preparado nunca estamos. É sempre um momento difícil [...]”. Além disso, 35,2% (n = 19) responderam que se sentem preparados, diretamente, como em “Sim” ou “Sim. Eu sou boa em comunicação interpessoal. Nunca dei a notícia de uma morte, mas sei os passos do protocolo Spikes”, ou indiretamente, como em “Teoricamente sim, não sei se numa situação real iria deixar o lado emocional interferir no profissional, mas creio que não [...]”. Ademais, 13% (n = 7) relatam não saber, como em “Não sei dizer” e “Não sei, só saberei quando passar por essa situação”.
Para a pergunta “Você se sente emocionalmente preparado para lidar com um paciente durante o processo de morrer?” (P2), 50% (n = 27) afirmaram que não estão preparados, como em “Não me sinto preparada para lidar com a finitude e reconheço que preciso de uma capacitação mais enfática para enfrentar as diversas situações clínicas” e “Não, pois ainda não lidei diretamente com a morte de um paciente [...]”; 35,2% (n = 19) consideram-se preparados, com em “Me sinto preparada para gerar conforto em um momento delicado como esse [...]”; e 14,8% (n = 8) não sabem, não têm certeza ou dependeria da situação.
A tabulação das respostas às perguntas P1 e P2 em relação à experiência com a morte e o ano do curso pode ser visualizada na Tabela 2. Ressalta-se que, na presença ou ausência de experiência de morte de pessoa significativa, a autopercepção de despreparo predominou sobre a de preparo em P1 (50% ausência e 52,2% ausência), enquanto em P2 54,3% se consideraram despreparados mesmo na presença de experiência prévia. O despreparo esteve presente na participação ou não em atividades prévias sobre o tema (dos que nunca haviam participado, despreparo foi descrito em 57,1% para P1 contra 57,1% em P2, e dos que haviam participado previamente, despreparo foi mencionado em 51,1% para P1 e 48,9% em P2), semelhante também observado na experiência de morte de pacientes e nas respostas dos participantes independentemente da definição de morte adotada.
Variável | P1 | P2 | ||||
---|---|---|---|---|---|---|
Não (%) | Sim (%) | Não sei (%) | Não (%) | Sim (%) | Não sei (%) | |
Experiência de morte de pessoa significativa | ||||||
Não | 4 (50,0) | 3 (37,5) | 1 (12,5) | 2 (25,0) | 4 (50,0) | 2 (25,0) |
Sim | 24 (52,2) | 16 (34,8) | 6 (13,0) | 25 (54,3) | 15 (32,6) | 6 (13,0) |
Participação de discussões sobre morte e morrer | ||||||
Não | 4 (57,1) | 2 (28,6) | 1 (14,3) | 4 (57,1) | 1 (14,3) | 2 (28,6) |
Sim | 24 (51,1) | 17 (36,2) | 6 (12,8) | 23(48,9) | 18 (38,3) | 6 (12,8) |
Experiência de morte de pacientes na graduação | ||||||
Não | 19 (55,9) | 10 (29,4) | 5 (14,7) | 19 (55,9) | 9 (26,5) | 6 (17,6) |
Sim | 9 (45,0) | 9 (45,0) | 2 (10,0) | 8 (40,0) | 10(50,0) | 2 (10,0) |
Definição de morte | ||||||
Espiritual | 9 (56,2) | 5 (31,2) | 2 (12,5) | 10 (62,5) | 5 (31,2) | 1 (6,2) |
Outra | 5 (62,5) | 2 (25,0) | 1 (12,5) | 5 (62,5) | 2 (25,0) | 1 (12,5) |
Processo natural | 14 (46,7) | 12 (40,0) | 4 (13,3) | 12 (40,0) | 12 (40,0) | 6 (20,0) |
Ano atual do curso | ||||||
Primeiro | 4 (100,0) | 0 | 0 | 4 (100,0) | 0 | 0 |
Segundo | 5 (50,0) | 4 (40,0) | 1 (10,0) | 5 (50,0) | 3 (30,0) | 2 (20,0) |
Terceiro | 14 (53,8) | 7 (26,9) | 5(19,2) | 14 (53,8) | 8 (30,8) | 4 (14,4) |
Quarto | 4 (33,3) | 7 (58,3) | 1 (8,3) | 4 (33,3) | 6 (50,0) | 2 (16,7) |
Quinto | 1 (50,0) | 1 (50,0) | 0 | 0 | 2 (100,0) | 0 |
P1: “Você se sente preparado, como estudante e futuro profissional, para uma situação de morte de um paciente?”; P2: “Você se sente emocionalmente preparado para lidar com um paciente durante o processo de morrer?”.
Fonte: Elaborada pelos autores.
Para a pergunta “Para você, quais sentimentos estariam mais fortemente ligados à morte?”, as palavras “tristeza, “angústia”, “medo” e “saudade” apresentam destaque, por sua frequência de aparecimento, evidenciada pela tag cloud representada na Figura 1.
Para a segunda pergunta - “Para você, quais sentimentos estariam mais fortemente ligados ao processo de morrer?” , além das três palavras também evidentes na primeira, apresentam destaque também as palavras “esperança”, “impotência”, “sofrimento”, “ansiedade” e “dor”, suas frequências fazem-se aparentes na tag cloud da Figura 2.
Para a terceira e última pergunta - “Para você, quais sentimentos estariam mais fortemente ligados ao luto?”, além das palavras em evidência nas imagens anteriores, apresentam destaque as palavras “negação”, “solidão”, “aceitação”, “dor”, “impotência” e “angústia”, com suas frequências de citação evidenciadas na tag cloud representada na Figura 3.
DISCUSSÃO
Falar sobre morte atualmente é, ainda, um tabu, o que pode ocorrer porque, a partir do fim da vida do outro, percebe-se a finitude de si mesmo. Não abordar esse assunto, contudo, seja direta ou indiretamente, dificulta sua aceitação ou a desconstrução do caráter evitativo relacionado ao processo. A evitação, voluntária ou não, acaba se tornando uma problemática heurística, principalmente para os profissionais de saúde que lidam com essa realidade diariamente em seu ambiente de trabalho20.
Durante a graduação em saúde, um modelo de ensino mecanicista (e tecnicista) pode, muitas vezes, inviabilizar uma análise aprofundada das nuances do morrer e da aplicação do conhecimento no enfrentamento da morte de futuros pacientes. Paralelamente, a educação tem como foco o cuidar e, especialmente, o curar, com a morte significando a falha terapêutica e profissional. Para evitar sentimentos de frustração, os profissionais formados por esse modelo criam barreiras que os afastam dessa realidade, mesmo estando presente em suas rotinas, e ignoram que o paciente no fim de sua vida necessita tanto de seus cuidados quanto de sua solidariedade e empatia20)-(22.
Apesar da importância da participação em disciplinas e/ou discussões em que são abordadas técnicas de comunicação de más notícias e aspectos subjetivos e afetivos dos cuidados paliativos, essa participação não se converte necessariamente em preparo cognitivo para o enfrentamento do processo23. No presente estudo, dos alunos que participaram de discussões sobre o tema, apenas 36,2% e 38,3% se sentem preparados para lidar com a morte e o morrer, respectivamente. Isso pode revelar uma lacuna na aplicação da prática dos tópicos desenvolvidos na teoria, o que gera insegurança e percepção de despreparo, mesmo na presença de domínio cognitivo aparente, o que pode predominar nos primeiros anos do curso de Medicina, quando as atividades se concentram em aspectos teóricos básicos, muitas vezes dissociados de correlação contextual e clínica24.
Desse modo, nem sempre apenas a teoria em sala de aula será suficiente para preparar esses futuros profissionais, considerando que o cotidiano e o contato com pacientes darão a responsabilidade do cuidar do outro. Nessa conjuntura, a pesquisa esclareceu que os discentes que tiveram experiência de morte na graduação apresentam, em sua maioria, um maior preparo em relação àqueles que não foram imersos nessa situação. Logo, a associação entre teoria e prática, mesmo que em ambientes simulados nos primeiros semestres, é fundamental para a qualificação acadêmica e para a garantia de plenitude na execução futura da atuação profissional23. Essa conciliação condiz com a necessidade de as instituições educadoras ofertarem não só as habilidades técnicas, mas também as habilidades interpessoais para o cuidar com sensibilidade, durante o processo de doença e adoecimento, do paciente e de sua família23)-(25.
Além disso, o conhecimento em morte e morrer que a educação irá proporcionar na formação do aluno traz também grandes benefícios em sua vida pessoal. A aproximação com a morte faz com que a vida seja mais valorizada e melhora os relacionamentos interpessoais. Espera-se que sejam profissionais com uma visão mais humanizada e capazes de oferecer maior conforto, e que tenham sentimentos mais positivos ao lidarem com o final de vida dos pacientes26.
Na pesquisa, 52,2% dos alunos que já tiveram experiência de morte de pessoa significativa não se sentem preparados para lidar com a morte, e 54,3% afirmaram que não sabem lidar com o processo de morrer. Segundo Costa et al.26, o contato com a morte em âmbito familiar pode dificultar a relação médico-paciente no momento da morte/morrer, principalmente se o paciente demonstra características semelhantes às do ente falecido. No estudo realizado por Perboni20, é relatado que, devido às lembranças que a morte pode propiciar aos estudantes, estes tendem a se afastar dos pacientes em fase terminal para evitar as recordações referente à sua perda pessoal.
Proporcionalmente, os acadêmicos do quarto e quinto ano se mostraram mais seguros em lidar com situações de morte e o processo de morrer dos pacientes, se comparados aos alunos dos anos anteriores, embora o tamanho da amostra limite uma análise mais detalhada. O primeiro ano demonstrou maior insegurança, de modo que 100% dos discentes relataram não se sentir preparados para lidar com a morte/morrer do paciente. Esse cenário pode se justificar, segundo Limpawattana et al.27) pelo fato de o aluno não ter a experiência de viver com pessoas idosas e ainda principalmente por nunca ter vivenciado de perto o fim da vida. Devem-se considerar também o menor contato e as experiências vividas na rotina clínica entre os alunos que estão nos primeiros anos do curso, se comparados aos que estão nos anos finais.
No entanto, considerando que o contato com a morte e o processo de morrer seja uma das formas de preparar os alunos para lidar com essas situações, no presente estudo, dos acadêmicos que tiveram experiência de morte de pacientes na graduação, 45% não se sentem preparados para lidar com a morte e 50% não sabem lidar com o processo de morrer do paciente. Esse resultado se assemelha ao citado no estudo de Praxedes et al.21, em que docentes e discentes de Enfermagem relataram que sentem dificuldade de lidar ainda com a morte e o morrer, mesmo sendo uma realidade cotidiana. Os autores consideram que o assunto é ainda pouco abordado na graduação, o que pode acarretar a dificuldade21, enquanto o estudo de Thiemann et al.28 aponta que experiências clínicas com a morte/morrer podem desencadear ansiedade da morte, uma emoção desagradável provocada pela reflexão da morte de si e dos outros, podendo resultar em futuros profissionais que evitam lidar com essa situação.
Uma das formas de enfrentamento da morte e de sua aceitação é o significado religioso que ela recebe. Estudos demonstram que, para alguns profissionais, a morte é aceita mais facilmente quando uma doutrina religiosa é seguida, já que a religião ressignifica a morte como uma passagem para outro plano. Dessa forma, essa concepção gera conforto pelo pensamento de continuidade da existência, tornando o fenômeno - outrora desconhecido - explicável20),(29. Neste estudo, 29,6% (n = 16) dos entrevistados atribuíram à morte um significado espiritual, porém ao serem questionados sobre estarem preparados, nos âmbitos profissional e emocional, para lidar com a morte e o processo de morrer, 56,2% e 62,5%, respectivamente, responderam que não sentem aptos. Esse resultado, em parte, contradiz o pressuposto de que o preparo para lidar com o assunto guarda relação significativa com a religiosidade (e espiritualidade), o que, embora possa ser reflexo do tamanho da amostra, ainda pode se sustentar em nível intrapessoal.
De modo amplo, a análise das percepções e dos significados da morte elucidou predominância da visão natural, de que esse processo é inerente ao ser humano e, assim, inevitável. Vista como evento cotidiano, é frequente que os indivíduos se tornem examinadores externos do falecimento. O pensamento espiritual, desvinculado de conexões diretas com a religiosidade, apesar de ter sido proporcionalmente menos citado, relevou um pensamento heterogêneo dos alunos quanto à espiritualidade, sendo adotado ora como um ideal de transição entre o mundo material e o espiritual, em que o corpo físico perde a sua vitalidade, mas a alma é elevada para um patamar sagrado, ora correlacionando-se com ideais religiosos e dogmas pessoais, em consonância com a variabilidade conceitual do fenômeno30.
Em relação às crenças como fator primordial para o entendimento e a significação da morte, em que é inserida uma série de explicações para esse acontecimento, entende-se que a convicção religiosa interfere na habilidade de confrontamento de conjunturas que abarcam a morte, como foi relatado por alguns discentes deste estudo. A função religiosa é, em parte, socializar e dirigir o enlutamento como mecanismo para lidar com o terror31.
O entendimento ambíguo e receoso sobre a morte mostrou-se a percepção mais atípica do grupo deste estudo, apesar de o medo ser a resposta psicológica mais corriqueira diante dessa situação. Vislumbrar o falecimento como um elemento obscuro releva outros medos associados ao processo da perda humana, como o medo de ficar sozinho, medo de espíritos, medo do sofrimento, medo da hospitalização. O medo da morte atinge de forma ampla os seres humanos, todavia compreendê-la no sentido implexo revela a predominância do receio em relação à busca de uma compreensão mais positiva, seja a partir de aspectos espirituais ou não, quando se tem uma visão natural do processo de falecimento32.
Segundo Lazarus e Filkman, o “enfrentamento” compreende o complexo de estratégias materializadas pelo sujeito no intuito de encarar as conjunturas de dor e sofrimento33. No que tange às estratégias de enfrentamento da morte, uma parte considerável dos entrevistados demonstraram procurar visualizar esse processo como inato aos indivíduos, de forma a aceitá-lo, o que converge com o fato da predominância do entendimento natural a respeito da morte33.
Divergente da fuga e do prolongamento, o enfrentamento representa uma postura imprescindível para a superação ou elaboração de uma perda essencial. Uma minoria elucidou de forma clara a incapacidade de promover uma autoajuda quando o cenário é o falecimento de um sujeito próximo, somada à dificuldade de se restabelecer emocionalmente, com alta carga depressiva e ideais pessimistas. Nos cenários em que o indivíduo tem capacidade diminuta de enfrentar a perda, o luto é designado como “luto complicado” ou “luto patológico”. Trabalhar, portanto, uma expectativa de elaboração ou de reconhecimento dos aspectos positivos da vida, apesar da perda, é um ponto favorável para esse enfrentamento34)-(36.
Quanto ao processo de enfrentamento da morte como estudante e futuro profissional da saúde, a pesquisa evidenciou uma distinção clara em relação à superação nos casos em que a morte é de alguém próximo, tendo em vista o despreparo dos discentes ante o falecimento de um paciente. A falta de reação presente nos acadêmicos deve-se, em parte, ao entendimento errôneo da morte como imprecisão e falha da medicina, sem entendê-la como parte integrante da vida. A responsabilização da morte sobre a medicina, um fracasso em um tratamento, acarreta ansiedade e alta cobrança individual na figura do médico, constructo que pode ser iniciado e perpetuado na graduação, em que são estabelecidas pressões para ter uma compreensão insensível sobre a perda da vida35),(36.
Os sujeitos que se consideraram preparados para esse cenário citaram os fatores comunicação interpessoal e protocolo de Spikes como mecanismos reacionários perante a morte de um paciente, o que demonstra um esclarecimento mais amplo e concreto no que tange à preparação para essa vivência nos âmbitos acadêmico e profissional. Todavia, poucos são os estudantes que se julgam aptos a enfrentar o processo de morte ao se relacionarem com o paciente, o que revela o impacto do distanciamento em relação ao paciente e da visão de uma medicina totalmente assertiva na barreira estabelecida pelos estudantes quanto à compreensão da morte36.
No que tange às sensações relacionadas à morte, ao processo de morrer e ao luto, os sentimentos relatados na pesquisa referem-se à postura diante uma perda, tendo em vista a lacuna emocional presente quando um sujeito próximo falece, assim prevalecendo emoções negativas, as quais envolvem o rompimento de um ciclo de convivência. Nos cenários em que ocorre a perda de um ente mais jovem ou antecipadamente, explica Parkes, isso pode ser um ponto-chave para determinar um luto mais complicado e, por conseguinte, permeado de emoções negativas, uma vez vai de encontro às expectativas naturais atreladas à vida humana37. Por ser um processo consideravelmente doloroso e guardar relações intrínsecas com a qualidade do cuidado, o conhecimento das estratégias e das fases do luto pode ser importante na definição de mecanismos apropriados de reorganização mental, emocional e até mesmo social38),(39.
Ressalta-se que a tristeza e angústia constituem sensações comuns quando um sujeito se depara com o falecimento do ser humano, tendo em vista que as perdas não se limitam somente ao ente querido, mas também englobam perdas relacionadas à dinâmica e à distribuição de papéis na família, e promovem uma desorganização amplificada em diversas questões, nos âmbitos econômico, social e familiar, ou seja, quem perde algo ou alguém vive a tristeza da ausência e tem que se adequar a uma nova conjuntura. Nesse cenário, a saudade surge como um elemento para minimizar a perda, no sentido de reviver na memória os momentos que fizeram parte da relação com o indivíduo falecido. A confirmação desses fatos foi clara no estudo, no qual os participantes associaram a morte com quatro principais sentimentos: tristeza, angústia, medo e saudade, comuns no processo de perda de um ente querido ou de um paciente. Quando a morte ocorre nos âmbitos estudantil e profissional, essa tristeza representa um fator de impotência diante da situação da doença e da morte quando se concretiza, o que somado à falta de preparo tende-se a prolongar, como foi revelado pela presente pesquisa34),(36),(37.
Este estudo apresenta limitações. Primeiramente, a escolha como população de discentes da disciplina optativa limita as generalizações das conclusões deste estudo para todos os estudantes do curso. Apesar de ter alcançado significativa adesão da população, o que possibilita a extensão das conclusões para esse grupo, o tamanho da amostra em termos absolutos limitou as análises por tabelamento de grupos e a realização de estatísticas de associação.
CONCLUSÃO
Este estudo objetivou analisar a percepção de estudantes do curso de Medicina da Unifap em relação à morte e ao processo de morrer. Observou-se, mediante as respostas analisadas, que a percepção evocada da morte na população tende a uma conceituação dela como um processo natural, uma certeza e etapa inevitável e obrigatória do viver, embora um caráter espiritual, de aspectos heterogêneos (religioso ou não dogmático), também preencha o imaginário dos estudantes. Tentativas de racionalização do processo, com elaboração de estratégias e planejamento, a regulação emocional e comportamental, distração e aceitação foram reações frequentes diante da morte e do morrer.
Mesmo em um cenário de experiência de morte de pessoas significativas e participação em discussões sobre morte e morrer, ainda houve predominância da percepção de despreparo emocional, com percepção ainda maior na perda de uma pessoa, quando comparada com a ausência de perda, embora menor percepção na participação de discussões, quando comparada com a não participação. A história de perda de paciente na graduação revelou percepção igual de preparo e despreparo, para o ponto de vista acadêmico e profissional, e percepção maior de preparação no ponto de vista emocional, enquanto, na ausência dessa experiência, a percepção global de despreparo foi maior. Ademais, o sentimento despreparo foi comum no primeiro ano, o que só se reverteu para os últimos anos do curso. A análise do inconsciente evocado também demonstrou que, das emoções mais fortemente relacionadas à morte, ao morrer e ao luto, os relatos se manifestaram principalmente por emoções como tristeza, angústia e saudade.
Dessa forma, percebe-se que os próprios discentes reconhecem suas inseguranças, ao demonstrarem percepção de despreparo para vivenciar e lidar como nuances do morrer na prática profissional. Faz-se elementar, portanto, que o assunto seja mais frequentemente abordado durante a formação, de maneira contínua, a partir de abordagens teóricas e práticas, desde o início da graduação.