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Educação e Filosofia

Print version ISSN 0102-6801On-line version ISSN 1982-596X

Educação e Filosofia vol.25 no.spe Uberlândia  2011  Epub Jan 31, 2024

https://doi.org/10.14393/revedfil.issn.0102-6801.v25nespeciala2011-06 

Dossiê: Descartes e o Grande Século

ASPECTOS DO LEGADO CARTESIANO NA TEORIA DA LINGUAGEM

Marcio Chaves-Tannús* 

*Professor Associado de Lógica, Filosofia da Ciência e Filosofia da Linguagem do Instituto de Filosofia e do Programa de Mestrado em Filosofia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). E-mail: mctannus@ufu.br


RESUMO

Desenvolveram-se no passado - e continuam sendo desenvolvidas no presente - várias tentativas, diversas entre si, de fundamentar uma posição única que julga ser possível identificar, em todas as línguas naturais, uma estrutura básica, sempre idêntica, e de natureza lógica. Se essa for uma meta passível de ser alcançada, então, será necessário admitir tanto a existência de princípios que regulem o funcionamento de tais línguas, como, também, que esses princípios sejam oriundos da Lógica. Com base em um texto do linguista francês Oswald Ducrot, intitulado Sobre um mau uso da lógica (D‘un mauvais usage de la logique), este trabalho pretende apresentar resumidamente duas das mencionadas tentativas. Elas foram elaboradas em épocas diversas e são diferentes os argumentos destinados a sustentá-las. A primeira é originária do século XVII francês e o seu alicerce teórico é a célebre dupla formada pela Lógica e pela Gramática de Port-Royal. Obras em que a influência de Descartes é um fato histórico bem estabelecido. A segunda é recente e o seu fundamento teórico é a Lógica Contemporânea. O objetivo e o pressuposto, enunciados acima e compartilhados pelas duas propostas, criam um vínculo entre a tradição cartesiana, presente em Port-Royal, e a concepção mais tardia, justificando, assim, a sua inclusão neste texto.

Palavras-chave: Lógica; Filosofia da Linguagem; Descartes; Port-Royal; Século XVII

RÉSUMÉ

On a developpé au passé - et on continue à développer au présent - plusieurs et diverses tentatives de fonder une position unique qui juge être possible d.identifier, dans toutes les langues naturelles, une structure basique, toujours identique et de nature logique. Si ceci est un but accessible, il faut donc admettre autant l’existence des principes qui règlent le fonctionnement de telles langues, autant que ces principes soient issus de la Logique. D.après un texte du linguiste français Oswald Ducrot, intitulé D’un mauvais usage de la logique, cette étude a l.intention de présenter en résumé deux des tentatives mentionées. Elles furent conçues en diverses périodes et les arguments destinés à les soutenir sont différents. La première est originaire du XVII siècle français et sa fondation théorique est le célèbre paire formé par la Logique et par la Grammaire de Port-Royal - oeuvres dont l.influence de Descartes est un fait historique bien établi. La deuxième est récente et son fondement théorique est la Logique contemporaine. L’objectif et la présupposition énoncés ci-dessus et partagés par les deux propositions, créent un lien entre la tradition cartésienne présente dans Port-Royal, et la conception plus tardive, en justifiant ainsi, son inclusion dans ce texte.

Mots clé: Logique; Philosophie du langage; Descartes; Port-Royal; XVIIe siècle

1- Introdução:

Este trabalho retoma, com algumas modificações e vários acréscimos, o que apresentei no congresso Ciência, Verdade e Consistência, com o título Questões de Lógica e Linguística. O referido evento ocorreu entre os dias 23 e 28 de agosto de 2009, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Ele foi organizado em conjunto pelo Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência (CLEHC - Unicamp) e pela Académie Internationale de Philosophie des Sciences (Bruxelas), tendo sido dedicado à comemoração dos 80 anos do Prof. Newton C. A. da Costa, que, na ocasião, foi homenageado com o título de Professor Emérito da Universidade Estadual de Campinas.

Meu intento é expor, de forma resumida, dois ensaios significativamente diferentes um do outro, ambos, porém, concebidos com o intuito de fundamentar uma posição única que pretende poder identificar em todas as línguas naturais uma estrutura básica, constante e sempre idêntica, e de natureza lógica. Um dos pressupostos subjacentes a essas e outras tentativas similares é a convicção de que no interior das línguas naturais encontram-se presentes e ativos certos princípios, oriundos da lógica, capazes de determinar, de modo exclusivo, o funcionamento de tais línguas.

As duas propostas, objeto desta conferência, foram descritas e analisadas, de uma maneira exemplar, pelo linguista francês Oswald Ducrot, em um trabalho intitulado D’ un mauvais usage de la logique (Sobre um mau uso da lógica) 1. São tentativas elaboradas em épocas diversas e, embora compartilhem uma meta comum, são diferentes o ponto de partida, o enfoque e a trajetória percorrida para alcançá-la. A primeira é originária das “Gramáticas Gerais” dos séculos XVII e XVIII, sobretudo na França, e o seu alicerce teórico é a célebre dupla, formada pela Lógica e pela Gramática de Port-Royal. Obras em que a influência de Descartes é um fato histórico bem estabelecido e que não será aqui objeto de minhas considerações. A segunda é posterior e o seu fundamento teórico é a Lógica Contemporânea. A meta e o pressuposto compartilhados criam um vínculo entre a tradição cartesiana, presente em Port-Royal, e a proposta mais tardia, justificando, assim, a sua inclusão neste texto. A base e a referência, mas não o limite, de minha exposição será o artigo de Ducrot citado logo acima, no início deste parágrafo.

Ainda na parte introdutória de seu trabalho, antes de dar início à descrição e à análise das duas propostas a serem examinadas, Ducrot menciona e distingue duas noções preliminares, por ele denominadas função lógica e estrutura lógica de uma linguagem. De acordo com o seu texto podemos, e seria mesmo necessário, admitir que toda língua natural tenha, ou possa ter, ao lado de várias outras, também, uma função lógica. A razão por ele fornecida é a presença, com certeza inevitável, em qualquer língua natural, de um elevado número de enunciados ditos “declarativos”, de afirmações e de negações susceptíveis de serem tidas por falsas ou verdadeiras e de atuarem como componentes de raciocínios - como premissas ou como conclusão de argumentos - cuja possibilidade de existência pressupõe a delas.

A descrição linguística completa e correta dos enunciados declarativos exigiria, assim, que se levassem em conta tais fatos, suficientes para permitir a identificação da existência, eventualmente potencial, de uma função lógica dentro de toda e de qualquer língua natural a ser considerada. Porém, por não acreditar que a função lógica de uma língua seja a única, ou a mais importante dentre as suas funções, Ducrot duvida que se possa a ela atribuir uma estrutura lógica. Ele duvida que possamos comprovar que toda a organização interna de uma língua natural seja comandada pelo objetivo único de tornar viável o raciocínio. Para ele, a sequência de seu próprio texto, ponto de apoio para a minha exposição, teria a exata finalidade de justificar a sua dúvida.

2- Primeira Proposta:

Aquilo que em minha introdução chamei “dois ensaios”, “duas tentativas” ou, ainda, “duas propostas”, para fundamentar a existência de uma estrutura lógica nas línguas naturais, Ducrot prefere chamar de “... duas formas que a crença em uma estrutura lógica da linguagem pode assumir.” (cf.: p. 130, no original ou p. 310, na tradução). A primeira forma consistiria, segundo ele, em acreditar que os princípios que regem a organização interna dos enunciados de uma língua natural sejam determinados, e apenas possam ser esclarecidos, pelas necessidades do pensamento lógico. Para tanto, postula-se preliminarmente que, para cada classe de elementos significativos do discurso, para cada classe de palavras, por exemplo, haja um tipo correspondente de elementos intelectuais, componentes do julgamento que cada enunciado necessariamente expressaria.

Seguindo uma tradição que podemos recuar até a época clássica da filosofia grega, a rigor até Platão, mas que foi difundida, sobretudo, através da recepção crítica da obra lógica de Aristóteles, os autores da Gramática de Port-Royal estabelecem que um julgamento completo deva consistir sempre em afirmar alguma coisa de algo, isto é, em atribuir uma propriedade a uma substância. Poder-se-á, então, concluir que a forma canônica do correspondente enunciado é composta de três elementos: do nome de uma substância que é o sujeito do enunciado, do nome de um atributo que é o predicado do enunciado e do elemento que liga o sujeito ao predicado, a cópula verbal, acompanhada ou não da partícula de negação. Conforme uma conhecida notação abreviada, criada na Europa da Idade Média e particularmente adequada às línguas de origem latina, a forma canônica de um enunciado seria, então, para o caso afirmativo, S é p, onde “S” é o sujeito, “p” o predicado e “é” a cópula verbal. 2

Para ilustrar o esquema S é p, Ducrot fornece-nos, como exemplo, o enunciado A mesa é grande. Ele acrescenta que Arnauld e Lancelot, os autores da Gramática de Port-Royal, bem sabiam que um grande número de enunciados reais, das línguas de fato existentes, não foram e não são, pelo menos à primeira vista, construídos em conformidade com esse modelo, presumivelmente imposto pelas necessidades do pensamento lógico. Vejamos o caso, bastante frequente, dos enunciados, tais como O cão corre, nos quais o elemento de ligação aparentemente está ausente. A resposta de Arnauld e Lancelot, que, também ela, remonta a Aristóteles, consiste em afirmar que O cão corre seja tão só uma forma contraída, mas equivalente, de O cão é corredor, enunciado em que os três componentes canônicos estão de novo visivelmente presentes. Um outro caso que os autores de Port-Royal consideram diz respeito aos enunciados latinos, tais como pluit (“chove”), em que, além da cópula verbal, também o sujeito está aparentemente ausente. A resposta é que, nesse caso, o sujeito está subentendido e que chove equivaleria a, por exemplo, Deus chove, que, por sua vez, equivale a Deus é chovedor, como já havíamos anteriormente visto 3

Ducrot conclui da análise desses casos, que ele reuniu em um único exemplo, que a atitude que ele denomina “logicista” é reducionista e constrange a distinguir duas classes de enunciados nas línguas naturais: os que satisfariam as exigências do pensamento lógico e os “marginais”, aparentemente ilógicos. Na sequência, ele abordará mais dois exemplos - retirados, eles também, da mesma fonte do anterior - com o objetivo de ilustrar de que maneira características sintáticas, próprias à língua francesa, são tratadas como casos particulares de necessidades preestabelecidas e de natureza supostamente lógica.

O exame do próximo exemplo é precedido da informação de que o gramático Vaugelas (1585 - 1650) teria observado que enunciados, tais como O vento soprava com violência ou O vento soprava com uma violência que fazia medo podem ser encontrados no francês e são considerados, pelos usuários nativos da língua, como corretos. Mas que, por outro lado, não encontraríamos um enunciado como *O vento soprava com violência que fazia medo que é tido como agramatical. A língua francesa exigiria, pois, que se coloque um artigo antes dos substantivos qualificados por uma oração relativa. Ducrot acrescenta que os autores da Gramática de Port-Royal teriam, então, tentado demonstrar que essa norma da sintaxe do francês seria apenas uma das possíveis aplicações de uma regra mais geral e de natureza lógica. Vejamos como. Para Arnauld e Lancelot todo substantivo - que não seja um nome próprio -, se tomado isoladamente, designaria sempre um conceito, ou seja, por si só, ele jamais designaria uma extensão, um conjunto de seres ou coisas. Violência seria, portanto, o nome de um conceito e, como tal, não remeteria nunca a ocorrências particulares que qualificaríamos de violentas. Para eles, os substantivos poderiam, no entanto, remeter a seres ou coisas, se estivessem acompanhados de um demonstrativo (este rei, esta violência), de um artigo (o rei, a violência) ou de um indefinido (certos reis, certas violências, todos os reis, todas as violências). Isso posto, teríamos já pronta a primeira etapa da demonstração. Ducrot relata, ainda, a existência de outras construções sintáticas, das quais não falará, mas que, segundo os gramáticos de Port-Royal, permitiriam aos substantivos a remissão aos conjuntos - eventualmente unitários - de seres ou coisas.

Na próxima etapa, Arnauld e Lancelot tratarão das orações relativas. Para eles, uma oração relativa qualificaria sempre seres ou coisas. Quando se diz, por exemplo, O vento soprava com uma violência que fazia medo, a sensação de medo teria sido provocada por aquela violência particular a que se refere a frase. Considerando o exposto no parágrafo antecedente, pode-se concluir que substantivos qualificados por uma oração relativa - excluindo-se naturalmente o caso das construções sintáticas mencionadas há pouco - deveriam estar acompanhados de um artigo, um demonstrativo ou um indefinido. Com isso, pode-se inferir a norma enunciada por Vaugelas de uma regra derivada do significado atribuído - por razões avaliadas, pelos gramáticos de Port-Royal, como lógicas e necessárias - ao substantivo e à oração relativa. O trecho abaixo reproduzirá as observações finais de Ducrot a respeito:

Também aqui, os gramáticos de Port-Royal se chocam com objeções factuais. Eles dão como exemplo de enunciado recalcitrante a expressão É granizo que cai. Para se desembaraçar dessa objeção, eles são obrigados a dizer que as expressões que não obedecem à regra são irregularidades ou sobrevivências, que a língua transporta consigo, mas que não se submetem ao seu mecanismo profundo. O que me parece contestável aqui não é o recurso à noção de exceção (da qual Port-Royal faz, aliás, um uso bastante moderado), pois, honestamente, não se pode fazer gramática, procurar regularidades, se não nos damos o direito de reconhecer exceções, que se abandonam a uma explicação de ordem histórica, psicológica ou sociológica. O que me parece contestável é fazer da lógica o juiz do que é regular e irregular, sendo o regular aquilo que é justificável por uma explicação lógica e não aquilo que se pôde colocar em relação com hábitos, com mecanismos gerais da língua estudada. 4

Nos próximos parágrafos, apresentarei o terceiro e último exemplo, servindo-me, para tanto, da versão comentada de Ducrot, de um trecho da Gramática de Port-Royal, dedicado à explicação das regras de concordância do particípio, na língua francesa. Nessa passagem, Arnauld e Lancelot tentam justificar, de uma perspectiva dita lógica, a ocorrência, no particípio francês, de duas formas diversas de concordância, ilustradas cada uma delas em um dos enunciados subsequentes: La soupe que j’ai mangée e J’ai mangé la soupe. 5 Ducrot reapresenta a solução elaborada pelos gramáticos de Port-Royal em um resumo, articulado em três etapas e um comentário, cuja tradução citarei a seguir:

  • 1) É natural que o determinante seja colocado após o determinado (por ex., que o adjetivo seja colocado após o nome ao qual ele se refere) e, por outro lado, que o determinante concorde com o determinado. (Note-se que nem Port-Royal, nem tão pouco os gramáticos do século XVIII apresentam essas regras como propriamente lógicas, mas somente como ‘naturais’ entendendo por isso que elas constituam a única representação possível, no significante linguístico, da subordinação lógica do determinante ao determinado).

  • 2) É portanto natural que se tenha ao mesmo tempo a ordem e a concordância La soupe que j’ai mangée, se se admite que, nesse caso, mangée (comida / tomada) seja uma espécie de adjetivo, com significado passivo, que determina o substantivo soupe.

  • 3) Não é anormal, enfim, que se tenha J’ai mangé la soupe (sem concordância e com mangé (tomado) à frente) se se admite que aqui mangé seja um gerundivo, isto é, o nome mesmo do verbo ativo, e que ele designa a ação de tomar. A frase se compreende então como ‘eu possuo a ação de tomar a sopa’ (= ‘essa ação doravante me pertence’).

Não procurarei discutir essa descrição, nem tão pouco as precedentes. É preciso apenas notar a atitude intelectual que ela ilustra. O linguista - antes de qualquer consideração do dado linguístico - acredita poder estabelecer certas necessidades, sejam elas puramente lógicas (exemplos 1 e 2) ou ligadas à tendência a manifestar de maneira natural as relações lógicas (último exemplo). Em seguida, ele analisa os fatos linguísticos, de modo que eles apareçam como casos particulares das necessidades estabelecidas. Isso ocorre mediante reduções (exemplo 1), listas de exceções (exemplo 2) ou cisões (cf. a distinção de dois particípios diferentes no exemplo 3). 6

Antes de passarmos às linhas conclusivas desta seção, creio ser de certa utilidade tecer alguns comentários que me possibilitarão formular uma hipótese, de caráter explicativo, relativa ao item três do trecho supracitado. Consideremos, de início, que o particípio presente do verbo francês manger (comer / tomar) seja mangeant (comendo / tomando) e que o gerundivo (“o nome do verbo ativo”) seja formado pelo particípio presente, antecedido da preposição en, o que resulta, para o verbo em questão, en mangeant. Ora, se houvesse uma forma do “nome do verbo ativo” tal que, a usando, nos referíssemos a um momento anterior ao que nos havíamos referido usando o particípio presente, seria então “natural” que, ao usá-la, recorrêssemos ao particípio passado, ou seja, a mangé (comido / tomado). É provável, pois, que os gramáticos de Port-Royal, além de outras razões que alegaram, tenham tido isso em mente quando afirmaram ser o particípio passado mangé um gerundivo.

De qualquer forma, independentemente da pertinência de minha hipótese, parece inevitável que ocasionalmente se tenha a impressão de que as explicações de Arnauld e Lancelot - embora geralmente engenhosas e mesmo, por vezes, surpreendentemente engenhosas - sejam construídas para satisfazer pressupostos que nos impõem consequências nem sempre coincidentes ou compatíveis com o que se pode verificar no prosaico âmbito dos fatos. E o pressuposto nuclear, que norteia tanto o trabalho dos autores de Port-Royal, como o de um considerável número de gramáticos do século XVIII, por eles influenciados, é o de que a disposição dos elementos significativos de cada um dos enunciados de uma língua natural reproduziria sempre, de modo inelutável, ainda que nem sempre imediatamente visível, a organização interna dos pensamentos em nosso espírito ou, como usualmente diríamos hoje, em nossas mentes.

Tal postulado não só possibilita a aceitação, que de fato ocorreu, do caráter arbitrário do signo lingüístico, 7 mas dele decorrem, além disso - desta vez em evidente dissonância com a linguística saussuriana - dentre outras, duas importantes consequências. A primeira é a possibilidade da afirmação de que, nas mencionadas línguas, haja uma coincidência entre o que é lógico e o que é natural. A segunda é a concepção de uma sintaxe necessariamente motivada, não arbitrária.

3- Segunda Proposta:

A segunda, das duas formas que “a crença em uma estrutura lógica da linguagem pode assumir”, consistiria na convicção de que o valor semântico de determinados elementos de uma língua - palavras, frases, expressões etc. - coincide com o seu valor lógico, com a função lógica que eventualmente exerçam, quando se infere uma conclusão de premissas estabelecidas. Consideremos, a título de ilustração, o caso mais simples de apenas dois modelos de enunciados. Diz-se que há inferência lógica entre eles, quando podemos, independentemente de qualquer circunstância empírica particular, concluir um do outro. Assim, dados dois enunciados semanticamente bem formados, de um deles que tenha a forma Alguns x são y, poderemos concluir corretamente, e sempre, um outro que tenha a forma Alguns y são x. De Alguns homens são mortais, por exemplo, podemos concluir Alguns mortais são homens, e, assim sucessivamente, para cada nova substituição de x e y que nos permita gerar enunciados semanticamente bem formados. 8

Para Ducrot, o valor lógico de um enunciado é dado por suas “propriedades lógicas”, pelo conjunto dos modelos de inferência em que ele pode participar, como premissa ou conclusão. Essas propriedades, entretanto, dependeriam da ocorrência, no enunciado, de certas palavras, tais como alguns, todos, se, e, ou etc., que determinariam o comportamento lógico dos enunciados em que ocorrem, fixando assim tanto o número, como a forma das inferências nas quais o enunciado pode participar. Dever-se-ia, portanto, admitir que um enunciado em que não ocorra pelo menos uma dessas palavras seja desprovido de função lógica na língua a que pertence. Ora, nas línguas naturais que melhor conhecemos em nossa ambiência cultural, no português, por exemplo, as referidas palavras estão ausentes de um número considerável de enunciados declarativos 9 e da maioria daqueles que expressam perguntas, pedidos, súplicas, comandos, dúvidas etc. Fato, por si só, suficiente para impossibilitar a identificação da estrutura lógica, passível de ser detectada em um dos subconjuntos das línguas citadas - aquele cujos elementos são dotados de uma função lógica -, com a estrutura do conjunto todo em que esses elementos estão inseridos.

Ducrot opta, entretanto, por uma outra estratégia e prefere opor, à segunda das propostas que esta comunicação resumidamente expôs, um outro tipo de argumento. Para ele, os elementos daquela classe de palavras que seriam supostamente capazes de determinar o conjunto do comportamento lógico dos enunciados em que aparecem, não possuiriam, pelo menos em algumas das línguas a que pertencem, um valor lógico constante. Para comprová-lo, ele deverá proceder a um detalhado e esclarecedor exame - que reproduzirei apenas parcialmente - de importantes aspectos do comportamento semântico do conectivo e e da expressão formada pela conjunção das palavras se e então, todas três pertencentes à classe das chamadas “palavras lógicas”. Os exemplos a que recorre foram retirados do francês, mas a sua validade pode, com certeza, ser estendida sem qualquer dificuldade a vários outros idiomas.

Respeitando a ordem adotada no trabalho de Ducrot, comecemos com o conectivo e. Analisando seu primeiro exemplo, o autor chama a nossa atenção para o fato de as propriedades lógicas do conectivo parecerem ser, em um primeiro momento, bastante simples. Assim, do enunciado A mesa é grande e quadrada, poder-se-ia concluir a uma só vez A mesa é grande e A mesa é quadrada. O e possibilitaria, portanto, inferir de X é y e z tanto X é y, como X é z. O que dizer, porém, de um enunciado como A bandeira é azul e vermelha? Afirma-se, nesse caso, que a bandeira tem não apenas uma das duas cores, mas ambas a um só tempo, o que inviabiliza a conclusão separada de A bandeira é azul ou de A bandeira é vermelha. Um outro exemplo, para mostrar que não se trata de uma exceção, seria o do enunciado Pedro ficaria contente de ter uísque e água, o que naturalmente pode não significar que ele ficaria contente se tivesse somente um dos dois. O último exemplo envolvendo o conectivo é Pedro e Paulo virão sós, que tanto pode significar que os dois virão juntos, mas sem outra companhia, ou que cada um deles virá só. A primeira alternativa inviabilizaria a inferência nos moldes do primeiro exemplo.

Às dificuldades aventadas no parágrafo anterior, os adeptos da proposta que ora nos ocupa responderiam, via de regra, de uma entre duas maneiras usuais. A primeira seria a resposta dos que preferem dizer que há, na língua em questão, vários conectivos homônimos e que somente um, dentre eles, autorizaria a inferência no padrão acima descrito. Com isso, estaria resguardada a ideia de um conectivo com valor lógico constante. A outra seria a dos que teriam se decidido por analisar de modo diverso enunciados em que o valor semântico do conectivo não é o mesmo. Assim, A mesa é grande e quadrada seria um enunciado composto de dois outros, a saber, A mesa é grande e A mesa é quadrada, enquanto que em A bandeira é azul e vermelha teríamos só um enunciado com um atributo único, porém composto de duas palavras: azul e vermelha. 10 Com esse procedimento foi possível, mais uma vez, manter constante o valor lógico do conectivo que opera a ligação entre dois atributos diferentes. Ducrot recusa cada um desses dois tipos de resposta, por não crer que eles sejam adequados ao propósito de se obter uma boa descrição das línguas naturais.

Ainda que suficiente para explicitar algumas das inegáveis variações no valor lógico do conectivo, a análise dos parágrafos anteriores não abrange - e certamente não pretendeu abranger - a totalidade dos tipos de enunciados em que ele possa ocorrer. Enunciados nos quais poderíamos, então, repertoriar o conjunto de suas propriedades lógicas e semânticas. É com um resultado análogo e, provavelmente, com uma expectativa similar que Ducrot analisará a expressão se, então. A expressão que pode exprimir, nas línguas naturais, entre outras, a relação que se considera ser nada menos que o próprio objeto da Lógica. Para isso, ele se utilizará de exemplos nos quais a presença da palavra então, por razões de economia e estilo, permanece implícita. O primeiro deles ilustrará o caso em que o valor lógico real coincide com o valor postulado como único e constante pelos adeptos da posição criticada, ou seja, o caso em que o significado atribuído pela Lógica à relação de consecução é idêntico ao significado da expressão linguística que a exprime.

Como de fato, no enunciado Se o tempo estiver bom, eu sairei, o valor semântico da palavra se 11 parece coincidir com o significado dado pela Lógica à relação de consecução que ela pode expressar. Para testar se isso realmente ocorre, Ducrot aplicará a esse enunciado, assim como aos outros dos demais exemplos, a chamada lei da contraposição. De acordo com essa conhecida lei da Lógica, duas proposições condicionais quaisquer são logicamente equivalentes, quando a primeira tiver a forma Se p, então q e a segunda Se não-q, então não-p. Ora, se o valor lógico da expressão se, então coincidisse sempre, nas línguas naturais, com o da relação de consecução, na Lógica, o significado de um enunciado que tenha a primeira forma deveria ser sempre idêntico ao de um outro que tenha a segunda. Ao aplicá-la ao enunciado do nosso primeiro exemplo, obteremos, após alguns pequenos ajustes necessários, o resultado Se eu não saio, é porque o tempo não está bom, cujo conteúdo equivale ao do enunciado inicial e confirma a coincidência entre o valor lógico da expressão se, então e o da relação que ela, nesse caso, realmente expressa. O mesmo teste, todavia, mostrará que a coincidência que aqui se verificou estará ausente em vários outros tipos de enunciados, que também contenham, mesmo que apenas implicitamente, o par de palavras se, então.

Consideremos, para iniciar, o caso de Se quiseres vir, tens o direito. Aplicando a esse novo exemplo a mesma lei, obteremos como resultado Se não tens o direito de vir, é porque não queres, um enunciado cujo conteúdo, de modo algum, equivale ao do anterior. A fim de comprovar que não se trata de um caso excepcional, Ducrot completará a sua sequência de exemplos com mais dois outros, começando com Se tens sede, há cerveja na geladeira. Aplicando a esse outro enunciado o mesmo teste, teríamos Se não há cerveja na geladeira, é porque não tens sede, resultado absurdo o suficiente para evidenciar que a aplicação da lei, que deveria - como no primeiro exemplo - manter inalterado o conteúdo de origem, uma vez mais modifica-o, e novamente o faz de uma maneira quase grotesca. Para terminar, passemos a Se ele vier, eu não o receberei, bem como ao resultado Se o recebo, é porque ele não veio, que Ducrot pertinentemente denomina de “surrealista”. Com isso, teríamos mostrado, para a dupla se, então que o uso que dela se faz, nas línguas naturais, não confirma a suposição de que ela tenha um valor lógico constante e idêntico ao da relação de consecução que ela pode expressar. Às dificuldades adicionais expostas no parágrafo anterior, os adeptos da concepção ora examinada opõem, conforme o relato de Ducrot, um expediente com o qual já nos havíamos deparado. Refiro-me à opção por analisar, de maneira diversa, enunciados nos quais o valor semântico do conectivo não era o mesmo. De modo análogo, cada tipo de mudança no conteúdo do par se, então mereceria uma análise particular que lhe fosse presumivelmente adequada. Assim, o enunciado Se queres vir, tens o direito deveria, por exemplo, ser visto como uma forma contraída de Tens o direito de vir, e, se quiseres vir, utilizarás esse direito. Aplicando a esse último a lei da contraposição, poderíamos, com as necessárias adaptações, obter Se não tens o direito de vir, é porque não queres, 12 o mesmo enunciado que havíamos anteriormente descartado, por avaliar que ele não teria preservado o conteúdo de origem. Procedendo de forma similar seria possível encontrar uma solução para cada exemplo recalcitrante e salvar a ideia de um valor lógico constante para a dupla se, então. Ao concluir a parte de seu trabalho reservada à “segunda proposta”, Ducrot observa que as versões aqui criticadas do “logicismo”, por exigirem uma significativa alteração dos fatos, não poderiam apresentar-se como impostas por eles.

4- Conclusão:

A ideia de que, subjacente a toda língua natural, haja uma estrutura que de algum modo reflita as leis que regeriam a correta construção de nossos raciocínios, caracteriza e fundamenta as duas concepções que nos ocuparam no decorrer deste trabalho. Para a primeira - atribuída aos autores da Gramática de Port-Royal e seus seguidores - seria possível verificá-lo, na medida em que a organização dos elementos de um enunciado reproduziria a dos componentes do pensamento que ele veicula. Essa suposta identidade seria, então, o fundamento alegado pelos autores - e pelos defensores - da proposta de Port-Royal. 13 Opinião que seguramente não poderemos imputar aos adeptos da proposta mais recente. Mas a questão, relativa ao embasamento teórico da segunda posição examinada, só será colocada por Ducrot no final de seu trabalho. E a resposta que ele nos fornece é de natureza apenas hipotética. Para ele, em suas origens, a Lógica não estaria verdadeiramente preocupada com os enunciados, mas somente com as proposições que seriam os julgamentos que certos enunciados veiculam. Seu interesse teria se concentrado no estudo das relações de inferência entre as proposições e o seu principal objetivo teria sido o de formular as leis que permitissem aferir a correção dos raciocínios humanos. Para atingi-lo, a solução que Ducrot julga ter sido a mais natural foi a construção de uma linguagem que satisfizesse duas condições, a saber:

  • 1) Cada proposição é expressa por uma e somente uma fórmula dessa linguagem.

  • 2) A linguagem deverá possibilitar a enunciação de regras do seguinte tipo: se uma proposição é expressa por uma fórmula do tipo X, pode-se sempre inferir dela a proposição expressa por uma fórmula do tipo Y. Assim, pois, para descrever as leis da inferência entre proposições, faz-se corresponder fórmulas às proposições e define-se, entre as fórmulas, uma relação paralela à relação de inferência existente entre as proposições (esse procedimento não é outro, senão o procedimento de toda formalização: o conjunto de fórmulas é tomado como modelo no qual se conservou a relação intuitiva de inferência entre proposições). A criação de uma tal linguagem artificial é necessária para explicitar as leis de inferência entre proposições e para dar-lhes uma formulação precisa. 14

Isso posto, Ducrot estará em condições de formular, no trecho que citarei a seguir, a resposta que, segundo o seu próprio parecer, deveria ser vista como o fecho de uma hipotética explicação. De acordo com ele:

Tudo isso não teria consequências para a linguística e não haveria conduzido àquilo que chamei de logicismo, se não se tivesse produzido o seguinte fato: a linguagem artificial, utilizada para traduzir as proposições, é uma parte da linguagem natural. A linguagem da qual se serve Aristóteles, para exprimir os diferentes tipos de julgamentos possíveis e para formular as regras do raciocínio, nada mais é que um subconjunto da língua ordinária, que compreende expressões como Alguns homens são mortais, Alguns mortais são homens... etc. Ora, é evidente que nessa parte da linguagem ordinária, escolhida por permitir formular as regras da inferência, os morfemas lógicos dos quais falamos (e, se, alguns etc.) têm um valor lógico claramente definido (essa parte da linguagem foi justamente escolhida por conduzir a esse resultado). De maneira que se pôde ser tentado a pensar (é isso que chamei de logicismo) que esse subconjunto da linguagem ordinária, que serve para explicitar as regras da inferência, é verdadeiramente o protótipo da língua e, em particular, que os morfemas lógicos devam possuir, na totalidade da língua, as propriedades que eles possuem nesse subconjunto artificialmente delimitado. 15

Ducrot termina o seu trabalho afirmando que teria, tão só, pretendido questionar a vã tentativa de transformar as línguas naturais em línguas lógicas, como se existisse, oculta no âmago de cada língua natural, uma estrutura única, sempre idêntica, constante e de natureza lógica.

REFERÊNCIAS

A versão original foi publicada em MARTINET, J. (Dir.). De la théorie linguistique à l’ enseignement de la langue. Paris: PUF, 1974, p. 129 - 143. Uma tradução recente para o português, de minha autoria, acaba de ser publicada em Educação e Filosofia, v. 23, n. 46, jul. / dez. 2009, p. 309-321. [ Links ]

Note-se que a atual terminologia gramatical brasileira inclui no que ela denomina “predicado” o elemento de ligação, reservando para o atributo o nome “predicativo”. [ Links ]

Por se tratar, no modelo S é p, da forma declarada canônica de um enunciado, os casos de expansão são tidos como previstos e, por princípio, aproblemáticos, uma vez que se supõe que a redução ao modelo de base possa sempre ser operada, sem dificuldades e, sobretudo, sem perdas. [ Links ]

Cf. p. 133, no original, ou p. 312 - 313, na tradução. [ Links ]

Literalmente traduzidos: A sopa que eu tenho tomada e Eu tenho tomado a sopa. A tradução usual para o português seria: A sopa que eu tomei e Eu tomei a sopa. [ Links ]

Cf. p. 134 - 135, no original, ou p. 313 - 314, na tradução. [ Links ]

Observe-se que postular a identidade entre a disposição natural dos elementos significativos de um enunciado e a organização, na mente humana, dos componentes do pensamento que esse enunciado veicula não implica afirmar sequer uma semelhança necessária entre, por exemplo, a matéria fônica de uma palavra e o seu referente. [ Links ]

É preciso, contudo, estar atento para o fato de que a correção da inferência independe do valor de verdade dos enunciados que a compõem. [ Links ]

Para exemplificá-lo, basta recorrer a qualquer enunciado afirmativo ou negativo que não contenha outro elemento, além daqueles previstos na forma canônica S é p. [ Links ]

A rigor, duas palavras, ambas com a função de atributo, mas reunidas em uma única unidade semântica. [ Links ]

O complemento então permanece subentendido. [ Links ]

Ou seja, Não queres vir e, por isso, não utilizarás o direito que terias, se quisesses. [ Links ]

Trata-se de um pressuposto que, se fosse verdadeiro, seria também suficiente, pois, como se sabe, todo raciocínio pode ser corretamente expresso na forma de um único enunciado. [ Links ]

Cf. p. 140, no original, ou p. 318, na tradução. [ Links ]

Cf. p. 140 - 141, no original, ou p. 319, na tradução. [ Links ]

1- A versão original foi publicada em MARTINET, J. (Dir.). De la théorie linguistique à l’ enseignement de la langue. Paris: PUF, 1974, p. 129 - 143. Uma tradução recente para o português, de minha autoria, acaba de ser publicada em Educação e Filosofia, v. 23, n. 46, jul. / dez. 2009, p. 309-321.

2- Note-se que a atual terminologia gramatical brasileira inclui no que ela denomina “predicado” o elemento de ligação, reservando para o atributo o nome “predicativo”.

3- Por se tratar, no modelo S é p, da forma declarada canônica de um enunciado, os casos de expansão são tidos como previstos e, por princípio, aproblemáticos, uma vez que se supõe que a redução ao modelo de base possa sempre ser operada, sem dificuldades e, sobretudo, sem perdas.

4- Cf. p. 133, no original, ou p. 312 - 313, na tradução.

5- Literalmente traduzidos: A sopa que eu tenho tomada e Eu tenho tomado a sopa. A tradução usual para o português seria: A sopa que eu tomei e Eu tomei a sopa.

6- Cf. p. 134 - 135, no original, ou p. 313 - 314, na tradução.

7- Observe-se que postular a identidade entre a disposição natural dos elementos significativos de um enunciado e a organização, na mente humana, dos componentes do pensamento que esse enunciado veicula não implica afirmar sequer uma semelhança necessária entre, por exemplo, a matéria fônica de uma palavra e o seu referente.

8- É preciso, contudo, estar atento para o fato de que a correção da inferência independe do valor de verdade dos enunciados que a compõem.

9- Para exemplificá-lo, basta recorrer a qualquer enunciado afirmativo ou negativo que não contenha outro elemento, além daqueles previstos na forma canônica S é p.

10- A rigor, duas palavras, ambas com a função de atributo, mas reunidas em uma única unidade semântica.

11- O complemento então permanece subentendido.

12- Ou seja, Não queres vir e, por isso, não utilizarás o direito que terias, se quisesses.

13- Trata-se de um pressuposto que, se fosse verdadeiro, seria também suficiente, pois, como se sabe, todo raciocínio pode ser corretamente expresso na forma de um único enunciado.

14- Cf. p. 140, no original, ou p. 318, na tradução.

15- Cf. p. 140 - 141, no original, ou p. 319, na tradução.

Recebido: 18 de Julho de 2011; Aceito: 24 de Agosto de 2011

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