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Eccos Revista Científica

Print version ISSN 1517-1949On-line version ISSN 1983-9278

Eccos Rev. Cient.  no.61 São Paulo Apr./June 2022  Epub Feb 09, 2024

https://doi.org/10.5585/eccos.n61.20986 

Artigos

MATERIALISMO HISTÓRICO-DIALÉTICO E A TRANSFORMAÇÃO DA REALIDADE

EL MATERIALISMO HISTÓRICO-DIALÉCTICO Y LA TRANSFORMACIÓN DE LA REALIDAD

DIALECTICAL-HISTORICAL MATERIALISM AND THE REALITY TRANSFORMATION

Édio Luís Bressan, Mestre em Educação1 
http://orcid.org/0000-0002-0010-7188

Iria Brzezinski, Doutora em Educação2 
http://orcid.org/0000-0003-1708-9139

1Mestre em Educação, Pontifícia Universidade Católica de Goiás - PUC Goiás. Barra do Garças, Mato Grosso - Brasil.

2Doutora em Educação, Universidade de São Paulo - USP. Goiânia, Goiás - Brasil.


Resumo

O objeto deste artigo é o Materialismo Histórico-Dialético. O problema de pesquisa é analisar a possibilidade de esse método transformar a realidade. O objetivo é discutir a dialética como método, que busca a transformação da realidade. A pesquisa é bibliográfica e realizada com base nas ideias de teóricos que refletiram sobre os aspectos históricos do Materialismo Dialético. Os conceitos básicos desse método fundamentaram a pesquisa. Investigaram-se os contextos históricos, a arte do diálogo, as contradições e as ideias no interior da mente humana. No platonismo, a teologia condenou a dialética. Na Idade Moderna, a dialética foi considerada inútil. No Renascimento a organização democrática, desenvolveu a plenitude do homem. Foram analisadas, também, a dialética, a concepção de homem, de sociedade e de relações de produção. A práxis definida como a verdade sobre a realidade expressa nas ações dos homens, que transformam e produzem a própria história. A teoria e a prática tornam-se indissociáveis. A totalidade, o movimento, a qualidade e a luta dos contrários são conceitos dialéticos construídos nas relações sociais. As categorias da dialética são inacabadas e foram desenvolvidas na ciência moderna. A fidelidade do pesquisador conduz a pesquisa para atingir a estrutura do objeto. O método dialético suscita a realização de pesquisas que vislumbrem a transformação da realidade, por meio de mudanças reais e conscientes.

Palavras-chave contradições; dialética; método.

Resumen

El objeto de este artículo es el Materialismo Histórico-Dialéctico. El problema de investigación es analizar la posibilidad de que este método transforme la realidade. El objetivo es discutir la dialéctica como método, que busca transformar la realidad. La investigación es bibliográfica y realizada a partir de las ideas de teóricos que reflexionaron sobre los aspectos históricos del Materialismo Dialéctico. Los conceptos básicos de este método sustentaron la investigación. Se investigaron contextos históricos, el arte del diálogo, contradicciones e ideas dentro de la mente humana. Em el platonismo, la teologia condenaba la dialéctica. En la Edad Moderna, la dialéctica se consideró inútil. Em el Renacimiento, la organización democrática desarroló la plenitude del hombre. También se analizó la dialéctica, la concepción del hombre, la sociedade y las relaciones de producción. La praxis definida como la verdad sobre la realidad expressada em las acciones de los hombres, que transforman y producen su propia historia. La teoria y la práctica se vuelven inseparables. Totalidad, movimiento, cualidad y lucha de contrários son conceptos dialécticos construídos em las relaciones sociales. Las categorias de la dialéctica están inacabadas y se han desarrollado em la ciencia moderna. La fidelidad del investigador impulsa la investigación para lograr la estructura del objeto. El método dialéctico incentiva la realización de investigaciones que avizoran la transformación de la realidad a través de cambios reales y conscientes.

Palabras clave: contradicciones; dialéctico; método.

Abstract

The object of this article is dialectical-historical materialism. The research problem is to analyzed the possibility this method reality transform. The aimed is discuss dialectics as a social method, which seeks the reality transformation. The research is bibliographic and was carried out based on the ideas of theorists, who reflected on the historical aspects of dialectics materialism. The basic concepts of this method, substantiated the research. The historical contexts were investigated, the art of dialogue, the contradictions, the ideas at human mind interior. In Platonism the theology condemned dialectics. In the Modern age the dialectics went considered useless. In Renaissance the democratic organization, would develop full man. Were analyzed, too, the dialectics, the conception of man, of society and of production relations. The praxis was defined as truth about at reality, it is express in the actions of men, that transform and produce history itself. The theory and practice become inseparable. The totality, the movement, the quality and the struggle of opposites, are built dialectical concepts in social relations. The categories of the dialectics are unfinished and were developed in modern science. The researcher's fidelity conduct the research to attain the object structure. The dialectical method raises research that envisions the reality transformation, through real and conscious changes.

Keywords: contradictions; dialectical; method.

1 Introdução

O objeto deste artigo é o Materialismo Histórico-Dialético. O problema dessa pesquisa é analisar a possibilidade de esse método transformar a realidade. O objetivo é discutir a dialética, como método que busca a transformação da realidade. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica em teóricos como: Cheptulin (1982); Gadotti (1983); Kosik, (1995); Konder (2008) e Almeida (2018), entre outros, que refletiram sobre os aspectos históricos e o papel do pesquisador na perspectiva dialética. Os conceitos básicos do Materialismo fundamentam a pesquisa sobre o Método Dialético.

O artigo é dividido em quatro partes: no primeiro, abordaram-se os aspectos históricos da dialética, a partir do pensamento dos filósofos mencionados por Gadotti (1983), como Zenon de Eléa, Sócrates, Platão e Heráclito de Éfeso, que viveram antes de Cristo. Na Grécia Antiga, a dialética significava a arte do diálogo, que buscava descobrir as contradições, elevar a inteligência e racionalizar as ideias. Esse processo era feito por meio de perguntas e respostas. A realidade se revelava em movimento constante, no qual prevalecia a luta dos opostos. No platonismo1, a teologia condenou a dialética e, na idade Moderna, ela foi considerada inútil. No Renascimento, o homem nascia livre, porém, era tolhido pelas organizações. Gadotti (ibid.) referencia-se em Rousseau para afirmar que a organização democrática deveria desenvolver o homem em sua plenitude.

Na segunda parte, aborda-se a dialética como método que busca descobrir a verdade, busca a concepção de homem e de sociedade. Na produção material, o homem se produz e é produto da própria existência. As relações de produção na sociedade capitalista são evidentes; lamentavelmente, determinam o homem e independem do indivíduo. A práxis, referenciada por Gadotti (ibid.), foi definida por Marx, como a verdade sobre a realidade, encontrada nas atividades que o homem faz, nas ações que transformam sua vida e produzem a história. Na práxis, a teoria e prática são indissociáveis. O método dialético considera cada objeto com características únicas em movimento permanente e pleno de contradições.

Na terceira parte, as categorias do Materialismo Histórico-Dialético foram tratadas no período histórico da ciência moderna. Essas concepções foram vividas e construídas nas relações entre as pessoas em sociedade. A totalidade é uma categoria inacabada, que se apresenta como um todo coerente, que se modifica e busca compreender o objeto concreto. O conceito do movimento é material e abrange as práticas cotidianas. Ele modifica-se em movimento transformador e contínuo da realidade. A mudança qualitativa ocorre em processo que refaz o que já existe. A qualidade é o movimento circular, dinâmico e construído pelo homem. A luta dos contrários transforma a realidade mediante as forças opostas. O Materialismo Histórico-Dialético compreende a realidade viva, dinâmica, com conflitos e movimento.

Na quarta parte dissertou-se sobre a pesquisa, o objeto, o pesquisador e as estruturas sociais do Método Dialético. A pesquisa apresenta, investiga, compreende o objeto na totalidade e interpreta as atividades humanas na realidade social. As condições reais da vida humana para o Método Dialético, apoiam-se na matéria e nas ações intencionais dos homens, que determinam a consciência do homem e revelam as estruturas sociais.

O objeto do pesquisador faz parte do todo, interligado no conjunto da sociedade capitalista. O objeto e o sujeito são indissociáveis das condições materiais. O objeto é histórico, questionável e possibilita apreender o real. O conhecimento interpreta a realidade e define o objeto de pesquisa. O pesquisador é fiel à estrutura do objeto. O pesquisador reproduz a atividade de pensar, para desvelar e apropriar-se do real do objeto, que acontece pela prática revelada na partida e na chegada. Na chegada, elabora-se a visão complexa do real. O ponto de partida na pesquisa é da ordem da teoria.

2 Aspectos históricos sobre a dialética

Argumentar, na Grécia antiga, segundo Gadotti (1983), era o modo específico utilizado para descobrir as contradições no interior da mente humana. Esse processo, realizado pelo raciocínio, foi denominado dialética.

Konder (2008) e Gadotti (ibid.) afirmam que a dialética, na Grécia antiga, foi considerada a arte do diálogo, porque as pessoas argumentavam entre elas. Os autores mencionam que Sócrates investigava, provocava a verdade e o discípulo descobria essa verdade no interior do homem.

Zenon de Eléa e Sócrates2, citados por Frigotto (2000), que viveram aproximadamente cinco séculos antes de Cristo, foram considerados os fundadores da dialética e esta era entendida como a arte do diálogo.

Para Platão, de acordo com Gadotti (ibid.), a dialética era método para elevar a inteligência e racionalizar as ideias. Esse método compreendia perguntas e respostas entre duas ou mais pessoas. Assim, o pensamento foi contemplado e debatido no coletivo, processo que suscitava o nascer do conhecimento.

Heráclito de Éfeso, conforme Iber (2013), considerou a realidade em constante movimento, no qual prevaleceu a luta dos opostos: a fome e a fartura; o abandono e o aconchego; a fé e a descrença; o frio e o calor; a vida e a morte; o bem e o mal. Os elementos contrários transformam-se pela contradição.

Para Konder (2008), Heráclito de Éfeso entendia a realidade como movimento ininterrupto, que transforma as realidades existentes.

Três séculos depois de Cristo, de acordo com Gadotti (1983), ressurgiu o platonismo e o debate em torno da dialética. A filosofia oficial era escrava da teologia e condenou a dialética por desconhecer a onipotência divina. No início da idade moderna a dialética foi julgada inútil.

Konder (2008) compartilha o pensamento de Rousseau, para afirmar que os homens nasciam livres e a natureza lhes dava a vida, a liberdade, porém, as organizações tolhiam essa liberdade e era necessário democratizar a vida social por meio de sujeitos coletivos.

Para Rousseau, citado por Gadotti, esses sujeitos promoveriam as mudanças sociais, porque “... as pessoas nascem livres e só a organização democrática da sociedade levará os indivíduos a se desenvolverem plenamente” (GADOTTI, ibid., p. 17).

Com o renascimento a dialética veio à luz e apresentou-se com caráter instável, dinâmico e contraditório da condição humana. Konder (ibid.) esclarece que, a concepção dialética:

... foi reprimida historicamente: foi empurrada para posições secundárias, condenada a exercer uma influência limitada [...]. Para sobreviver, precisou renunciar as suas expressões mais drásticas, precisou conciliar com a metafísica, porém conseguiu manter espaços significativos nas ideias de diversos filósofos de enorme importância (ibid., 2008, p. 9).

A dialética, na história, de acordo com o autor, ficava em segundo plano, de pouca influência social. Para a dialética existir, foi necessário renunciar as ideias radicais e fazer conciliações.

Konder (ibid.) cita o pensamento de Diderot para acrescentar que, na dialética, a pessoa busca compreender a própria existência, busca a autenticidade do ser humano que está em movimento, em transformação, em fluxo contínuo. O homem nasce para viver e realizar o seu trabalho, que provoca mudanças históricas no mundo material da sociedade capitalista e na divisão social do trabalho.

Essas características históricas formam a base para o Materialismo Histórico-Dialético, que emerge com Marx e Engels, em meados do século XIX, e será tratado no item 3, a seguir.

3 O Materialismo histórico-dialético: outro conceito para a sociedade

O pensamento de Marx e Engels, de acordo com Chaui (1995), foi denominado de Materialismo Histórico, porque as mudanças históricas ocorrem inseridas nas condições materiais e na divisão social do trabalho. Materialismo, porque na sociedade capitalista dividida em classes sociais, as relações de produção determinam a forma de ser e de pensar do homem. Histórico, porque a ação concreta depende dos seres humanos do seu tempo e é dialético, porque o processo histórico é movido por contradições.

A dialética de Marx, de acordo com Gadotti (1983), parte dos fenômenos sociais aparentemente isolados para buscar o fundamento do homem. O homem produz a si mesmo pelo modo de produção material e constrói sua história pelo trabalho. A atividade de trabalho é a relação que se estabelece entre o homem e o mundo.

Almeida (2018) compartilha do pensamento de Gadotti e menciona que o método do Materialismo Histórico-Dialético considera o homem produto de sua existência. A história dos homens é resultado da construção social por meio do trabalho.

Essa construção social pelo trabalho, para Konder (2008), é a atividade pelo qual o homem se cria em si mesmo e humaniza a natureza.

Gadotti utilizou-se do pensamento de Marx para expressar que o Materialismo Histórico-Dialético deu significado ao trabalho físico, material e social. O trabalho alienado ocorreu a medida em que a sociedade capitalista dividiu-se em classes.

A dialética, segundo Frigotto (2000), situa-se na história e estabelece o processo de conhecer a realidade. Esse processo ocorre por meio das relações contraditórias, dos conflitos entre os opostos, do movimento e das normas que constroem, desenvolvem e transformam os fatos sociais.

Gadotti menciona que, com Marx e Engels, a dialética adquiriu status filosófico: Materialismo Dialético e Científico e Materialismo Histórico. A dialética emergiu com Marx, da realidade materialista encontrada na produção social da vida. As relações de produção determinam a vida do ser humano; são necessárias e independem da vontade do indivíduo.

Chauí explica que:

...o conjunto das relações de produção [...] correspondem as determinadas formas de consciência social. O modo de reprodução de vida material determina o desenvolvimento da vida social, política e intelectual em geral. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser; é o seu ser social que inversamente, determina sua consciência (1995, p. 414).

A autora esclarece que, a sociedade se edifica por meio das relações de produção, na divisão social do trabalho. Essas relações estão inseridas nas condições materiais; porém, é o ser social que determina a consciência humana. O modo de produção de vida material, observa Marx, tem:

... uma relação social que reveste a forma fantástica de relação entre coisas (...). Os trabalhos privados só se manifestam como divisões do trabalho social pelas relações que a troca estabelece entre os produtos do trabalho e, indiretamente entre os produtores (1983, p. 363).

De acordo com o autor, é na produção de vida material, na troca das mercadorias, que ocorrem as relações sociais, edificadas na relação entre as coisas. As relações humanas são inseparáveis das relações de produção. As características sociais do trabalho são os aspectos dos meios de produção.

Na produção social da vida, de acordo com Konder (2008), é a primeira vez na história que os ideais de igualdade, de coletividade se revelam de forma prática, a fim de superar a divisão social do trabalho e tornar-se princípio respeitado pelos sujeitos que vivem em sociedade.

Este princípio, para o método Materialismo Histórico-Dialético, conforme Almeida pressupõe-se o conceito de mundo que permite apreender a realidade. Esse modo de pensar a sociedade é definido como práxis que significa a “... unidade entre teoria e prática em busca de novas sínteses no conhecimento, na realidade histórica” (ALMEIDA 2018, p. 31).

O Materialismo Histórico-Dialético como “práxis”, declarado por Frigotto (2000), representa a teoria e a prática que se tornam inseparáveis com a finalidade de alcançar mudanças conscientes e reais na sociedade. Estas mudanças que ocorrem pela práxis de acordo com Vázquez, se apresentam como:

... atividade material, transformadora e ajustada a objetivos. Fora dela, fica a atividade teórica que não se materializa, na medida em que é atividade espiritual pura. Mas, por outro lado, não há práxis como atividade puramente material, isto é, sem a produção de finalidades e conhecimentos que caracteriza a atividade teórica. Isso significa que o problema de determinar o que é a práxis requer delimitar mais profundamente as relações entre teoria e prática (1977, p. 208).

Para o autor, a atividade material do homem é indissociável da consciência humana. A teoria pela teoria é irrealizável e é a condição fundamental para a práxis verdadeira. Na prática encontra-se a verdade. A consciência humana interpreta o mundo, visando a transformar a realidade social. As condições materiais determinam as relações sociais do homem. A práxis transforma as necessidades humanas, que passam do plano teórico ao prático. Essas necessidades condicionam e fundamentam a teoria e prática. A consciência intervém e transforma resultado ideal em real.

Gadotti vale-se do pensamento de Feuerbach (1977) para afirmar que essas mudanças, pela “práxis”, ocorrem pela verdade sobre pensar a realidade; a realidade e o poder são características do pensamento. Discutir o pensamento real e irreal, suprimido da práxis, é questão para a doutrina filosófica.

As ideias de Marx são citadas por Alves (2010) que percebe a verdade sobre a realidade e conceitua a práxis como as atividades livres, universais, criativas e autocriativas, mediante as quais o homem se cria e se refaz. As atividades específicas tornam o homem diferente de todos os outros.

A “práxis”, é entendida por Vázquez (1977) como a fundamento do homem, que transforma e cria a realidade por meio do trabalho. A atividade produtiva define o homem, que é o produto do trabalho. Essa atividade é fundamental, universal e humana. O trabalho é a atividade racional a fim de produzir os valores de uso e é a condição natural da vida humana. O trabalho é o processo entre a natureza e o homem. Esse processo realiza, regula e controla a ação do homem. O homem enfrenta e transforma a natureza, ao mesmo tempo se modifica.

O homem que se modifica, é ser único, pleno de contradições, com características particulares. Para Gadotti, na dialética, inexistem conceitos universais. A dialética estuda as leis gerais do universo e as leis comuns dos aspectos da realidade. A dialética examina a natureza física, o pensamento e a realidade viva da sociedade.

Alves (2010) se vale dos ensinamentos de Vázquez (1971) e afirma que, para os materialistas, a única realidade é a matéria em movimento. “A sua riqueza e complexidade pode compor a pedra, o reino animal e vegetal, e produzir efeitos surpreendentes como a luz, o som, a emoção e a consciência” (ALVES, ibid., p. 1). Segundo o autor, o mundo é movimento contínuo ativo, inquieto e movediço. Nesse mundo, o homem evolui pela ação concreta, ao visar transformações.

A ciência como produto da ação do homem é conceituada por Gamboa (2000) como a categoria histórica inserida no movimento contínuo, em prol de modificar a realidade social. A produção científica media o homem e a natureza, em uma relação ativa entre o sujeito e objeto, que veicula a teoria e a prática. O processo cognitivo e transformador da natureza, é definido como a “práxis” humana. A “práxis” humana exige que as teorias orientem as ações dos homens, a fim de transformar a sociedade capitalista. O Materialismo como concepção científica, pressupõe o mundo como realidade material, na qual o homem se conhece, age e provoca mudanças. Esse método está fundamentado em conceitos e categorias que serão abordados no próximo tópico.

4 Algumas categorias do materialismo histórico-dialético

As categorias da dialética, conforme Cheptulin, ocupam a tarefa de estudar o conhecimento humano e:

... refletem além disso, as propriedades e os aspectos universais da realidade objetiva, o que faz com que o conteúdo das categorias revele-se mais rico do que o das leis [...]. A diferença entre as leis e as categorias concerne igualmente às formas do reflexo. As leis da dialética, assim como as leis de qualquer outra ciência, são juízos, enquanto que as categorias são uma forma particular de conceitos (1982, p. 345).

Para o autor, tais categorias possibilitam desenvolver a aptidão para pensar com lisura. Estas categorias possibilitam formular os “imperativos”, aos quais se subordinam o exercício de pensar. O ato de pensar de maneira dialética constitui “... os princípios do pensamento dialético, do método dialético do conhecimento e da transformação criativa da realidade. O conhecimento desses princípios eleva o nível do pensamento, alarga suas possibilidades criativas” (id., ibid., p. 2).

Estas categorias fundamentam o Materialismo Histórico-Dialético e sustentam este método. Para ser dialético, de acordo com Frigotto, é necessário “dar conta da totalidade, do específico, do singular e do particular. Isto implica dizer que as categorias [...] são construídas historicamente” (2000, p. 73). Este autor assegura que o Materialismo Histórico-dialético é vivido e construído na relação entre os sujeitos. São as individualidades que se cruzam no coletivo e na pluralidade do ser humano que se encontram na totalidade social.

Nas ciências modernas, revela Gadotti foram desenvolvidas as categorias da dialética que fundamentam o Materialismo Histórico-Dialético, dentre as quais, tratar-se-á, a seguir, das seguintes:

  • a) Tudo se relaciona. Esta é a categoria da totalidade.

  • b) Tudo se transforma, configurando a categoria do movimento.

  • c) Em terceiro lugar, destacar-se-á a categoria da mudança qualitativa.

  • d) Finalmente, será considerada a categoria a unidade e a luta dos contrários.

a) Categoria totalidade

Kosik (1995) afirma que, Marx (1923) tornou a categoria da totalidade um conceito primordial ao Materialismo Histórico-Dialético:

[tais} ... conceitos centrais da filosofia, em que se revelam os aspectos essenciais da realidade, têm um estranho destino: jamais se mantêm como monopólio espiritual da filosofia que pela primeira vez deles se serviu e os justificou, mas se transformam paulatinamente em propriedade comum (1995, p. 42).

Esta categoria, segundo o autor, alcançou repercussão no século XX e busca responder à questão “O que é a realidade?”. A partir desta questão, a totalidade tornou-se conceito científico ou demanda metodológica, pois, para o Método Dialético, o conhecimento da realidade implica indagar o que é real, porque:

... na realidade, totalidade não significa todos os fatos. Totalidade significa: realidade como um todo estruturado, dialético, no qual ou do qual um fato qualquer (classes de fatos, conjuntos de fatos) pode vir a ser racionalmente compreendido. Acumular todos os fatos não significa, ainda, conhecer a realidade, e todos os fatos (reunidos em seu conjunto) não constituem, ainda, a totalidade (KOSIK, 1995, p. 43-44).

Os acontecimentos da realidade, para o autor, representam conhecimento quando entendidos de maneira dialética, ou seja, como elementos primordiais da totalidade. Esta categoria não representa o método que almeja catalogar os elementos da realidade, sem restrições, até esgotar “todas” as características. A totalidade representa o conhecimento sobre a realidade como teoria que compreende o “concreto” e sua “estrutura”.

Nessa categoria, explicita Gadotti (1983), a natureza apresenta-se como um todo coerente. As partes se encontram inter-relacionadas e o todo se cria em si mesmo na interação das partes. Em uma totalidade concreta, os fenômenos e os objetos estão ligados por ações recíprocas.

Cada totalidade, de acordo com Konder (2008), é única e se modifica de forma diferente a depender do seu caráter. Conhecer a realidade significa aceitar a totalidade e a atividade humana como processo inacabado.

Essa totalidade, para Netto, é “... dinâmica e seu movimento resulta do caráter contraditório de todas as totalidades, que compõem a totalidade inclusiva e macroscópica. Sem as contradições, as totalidades seriam totalidades inertes, mortas” (2011, p. 57),. Tudo está relacionado, nada é isolado, as ações se interconectam de forma universal e de modo dinâmico. Os opostos se interpenetram em realidade única. De acordo com Gohn, a realidade:

... enquanto dialética, implica o reconhecimento da necessidade de sua apreensão como um todo, um todo estruturado que se desenvolve e se recria. O conhecimento dos fatos ou dos conjuntos dos fatos da realidade significa conhecer o lugar que eles ocupam na totalidade, o próprio real (2005, p. 256).

A realidade para o Método Dialético, conforme a autora, reconhece a necessidade de apreender a totalidade que se refaz, pois, para conhecer os fatos, é preciso conhecer os espaços e os lugares em que os objetos pertencem na totalidade, na própria realidade. O real, no pensamento dialético, são os fatos, os processos, as estruturas e a gênese que se inter-relacionam.

O pensamento dialético, conforme Kosik, tem princípio na hipótese de que a sapiência humana procede em movimento circular, que emerge do “abstrato” e “relativo”. Esse conhecimento como:

... processo de concretização, procede do todo para as partes e das partes para o todo [...], da totalidade para as contradições e das contradições para a totalidade; e justamente nesse processo de correlações em espiral no qual todos os conceitos entram em movimento recíproco e se elucidam mutuamente, atinge a concreticidade (1995, p. 50).

Conhecer a realidade de modo dialético, acentua o autor, representa procedimento circular de “mútua compenetração” e esclarecimento das noções, em que a abstração unilateral e isolada dos elementos cognoscíveis, são ultrapassados pela ligação dialética. “Se a realidade é um todo dialético e estruturado, o conhecimento concreto da realidade não consiste em um acrescentamento sistemático de fatos a outros fatos, e de noções a outras noções” (id., ibid.). Compreender esta categoria implica perceber que os elementos inter-relacionam entre si e na totalidade. Entretanto, também a totalidade interage com os elementos. Apreender o real nesse todo é perceber a união das ligações, os acontecimentos, os procedimentos, sua origem e seus fundamentos, porque “... ao todo dialético pertence a criação do todo e a criação da unidade, a unidade das contradições e a sua gênese” (id., ibid., p. 51).

Já, Almeida (2018) esclarece que o método no Materialismo Histórico-Dialético tem a finalidade de compreender o objeto na sua totalidade, em sua natureza.

As relações constitutivas na totalidade, em consonância com Netto (2011), são tomadas na sua diversidade. As relações são indiretas e mediadas pelos níveis de complexidade e pela estrutura particular de cada totalidade.

Desenvolver o homem na sua totalidade, de acordo com Gadotti (1983), somente ocorrerá se superar a alienação do indivíduo. O método é o caminho que o indivíduo escolhe, estuda a realidade objetiva e analisa os elementos contraditórios dessa realidade. É na totalidade que se dá o movimento.

Esse movimento, na categoria totalidade, registra Cury (1986), busca articular o processo particular com os outros processos diversificados. Eliminar a totalidade significa tornar os processos particulares independentes. Esses processos conduzem as pessoas ao individualismo, que suprime a cooperação e a coletividade.

Konder (2008, p. 42) utilizou-se das ideias de Marx para expressar que a totalidade é a sociedade e, para compreendê-la, é necessário compreender as suas classes sociais. Interpretar esta totalidade, significa estudar os elementos que formam a sociedade capitalista.

b) Categoria movimento

O movimento autotransformador do homem, argumenta Konder (2008), é movimento material que abrange as formas de trabalho, os meios de produção, as organizações, as práticas da vida. A história do homem, é marcada por superações dialéticas. Por exemplo, a paz supera a guerra, porque, para a dialética, os extremos sempre se inter-relacionam.

Para Gadotti, “... a dialética considera todas as coisas em seu devir. O movimento é qualidade inerente a todas as coisas. A natureza, a sociedade não são entidades acabadas, mas em contínua transformação, jamais estabelecidas definitivamente, sempre inacabados” (1983, p. 25). O pensamento, desvela o autor, deverá transformar-se, superar-se, modificar-se ou rejeitar a sua forma, em benefício de penetrar na riqueza das conexões e movimentos. Pelo pensamento, “todas as coisas” se modificam de modo contínuo e o movimento é qualidade inseparável “das coisas”.

c) Categoria mudança qualitativa

Os pensadores que defendem a dialética afirmam que a qualidade se concretiza de maneira “... objetiva, afastada e independente da consciência humana e que elas são relações e propriedades universais das formações materiais, formas universais do seu ser” (CHEPTULIN, 1982, p. 211).

Gadotti afirma que a mudança “... não se realiza num processo circular de eterna repetição, uma repetição do velho. Como é gerado o novo?” (1983, p. 26). Para o autor, as coisas se elevam de modo progressivo. A água que supera seu estado líquido para materializar-se de modo qualitativo. De maneira gradativa, uma aldeia se torna uma cidade. Nada é destruído, tudo é reconstruído para outra qualidade.

A categoria da qualidade representa aspecto fundamental do processo de movimento e evolução da matéria, porque as transformações são atuantes e influenciam a qualidade, que se constitui como ruptura em constante movimento, denominado e “... que representa o processo de passagem da matéria de um estado para outro e é acompanhado pela ruptura da continuidade” (CHEPTULIN, 1982, p. 216).

A qualidade só se transforma neste movimento mediante a superação. De acordo com Konder:

... não podemos ter uma visão correta de nenhum aspecto estável da realidade humana se não soubermos situá-lo dentro do processo geral de transformação a que ele pertence (dentro da totalidade dinâmica de que ele faz parte), também não podemos avaliar nenhuma mudança concreta se não reconhecermos a mudança de um ser (2008, p. 52-53).

A realidade humana, consoante o autor, é marcada por superações que negam o que já estava estabelecido em tempo e em preservação. A categoria da qualidade se eleva para outro nível superior, inserida na totalidade dinâmica, daquilo que já estava estabelecido.

A categoria qualidade, denominada por Cury (1986) como categoria mediação, torna-se básica porque medeia as ações executadas na prática social. A qualidade entre duas ações sociais, ocorre à medida que a segunda ação supera em qualidade a primeira ação. A posse de uma ideia move a ação mediada para outra ideia. Esta categoria permite superar a aparente lacuna que se apresenta entre as ideias e as ações.

d) Categoria unidade e a luta dos contrários

A expressão “contrários” é definida por Cheptulin como as características que têm divergentes fundamentos de transformação e “... cuja interação constitui a contradição ou a ‘luta’ dos contrários” (1982, p. 286). Para o autor, apesar de propensão oposta de sua ação na transformação, na sua evolução, as forças opostas se afastam de maneira que se correspondem em conflitos contínuos e constantes; por isso, aproximam-se e se desenvolvem de modo conjunto, inter-relacionados. Estes opostos se admitem de tal maneira que formam única realidade, ou seja, “a unidade dos contrários”.

De acordo com Gadotti (1983), as forças opostas transformam a realidade, mediante as forças existentes no interior do ser humano. Os opostos existem e se fundamentam no real. A contradição dialética é a inclusão plena e concreta dos opostos, ao mesmo tempo.

Cury (ibid.) declara que a categoria da contradição é o alicerce do Método Dialético, porque reflete o movimento da realidade e é a categoria primordial para análise da sociedade de classes. O processo histórico suprimido da contradição é irreal e a-histórico.

Almeida (2018) afirma que o método do Materialismo Histórico Dialético se distancia de métodos que investigam formas lineares, harmônicas, a-históricas e formas lógicas de conhecimento, porque ele compreende a realidade viva, dinâmica e plena de contradições.

A contradição, revela Konder (2008), instiga a pessoa a refletir sobre os elementos da realidade. Ela é reconhecida pela dialética como categoria básica do movimento pelo qual os seres existem.

O Método Dialético, de acordo com Gadotti (1983), revela as lutas, os conflitos e o movimento. Tudo está relacionado. Esse método busca captar as articulações da unidade ao movimento, que engendra os processos contraditórios, a fim de aprofundar o conhecimento, que é infinito.

A unidade dos contrários estabelece troca mútua entre os opostos e as características contrárias inexistem sozinhas, porque a contradição:

... não é uma coisa fixa, imutável, mas encontra-se em movimento incessante, em mudança permanente, passando das formas inferiores às superiores, e vice-versa, enquanto os contrários passam um pelo outro, tornam-se idênticos, e a formação material que os possui propriamente entra em um novo estado qualitativo (CHEPTULIN, 1982, p. 295).

O Materialismo Histórico-Dialético, para o autor, admite que existem contradições, porque esta representa requisito universal para haver a matéria. Esta lei possibilita que o Método Dialético estabeleça, de maneira científica, a origem do movimento e do desenvolvimento.

Para aprofundar o conhecimento da realidade, Konder (ibid.) destaca que é necessário esclarecer a dimensão imediata e a mediata. A primeira é aquilo que as pessoas percebem rapidamente e a segunda consiste no que as pessoas vão construindo ou reconstruindo paulatinamente. O pensamento dialético identifica as contradições concretas e as mediações específicas que constituem a totalidade. Esta possibilita a análise das partes abstraídas do todo.

Para compreender o Materialismo Histórico-Dialético específico em pesquisa, é preciso entender a investigação e o papel do pesquisador. Esse assunto será tratado no item a seguir.

5 A pesquisa e o papel do pesquisador no método dialético

Pesquisar, acentua Severino (2009), significa apresentar e investigar a estrutura do objeto em conformidade com os procedimentos metodológicos, instrumentos científicos e fundamentação teórica, preferencialmente baseada em fontes primárias. Esses aspectos permitem conhecer a realidade pensada e interpretada, que se processa como o resultado de articular o pensamento com o real. A teoria dá sustentação às análises dos dados empíricos e dialoga com a real finalidade de elaborar novos significados. A realidade pensada e interpretada ocorre por meio da relação entre o sujeito e o objeto.

A pesquisa, observam Silva e Carneiro (2019), emerge a partir de questionamentos acerca de um determinado objeto, que inquieta o pesquisador. Estas inquietações motivam a pesquisa, a fim de tentar compreender o objeto na totalidade.

Pesquisar, na visão de Gadotti (1983), é o modo de apropriar-se da estrutura do objeto estudado. Analisar as evidências e as relações internas de cada elemento. Cada realidade requer maneira específica para passar da aparência para a estrutura mediante a análise do objeto.

Analisar a estrutura do objeto pela pesquisa, conforme Silva e Carneiro (2019), requer que o pesquisador domine os conceitos científicos elaborados pelo homem. Estes conceitos representam o modo como o ser humano entende o mundo real. A pesquisa exige limites no mundo real em que o objeto está inserido.

A pesquisa qualitativa, consoante Martins (2000), descreve e determina com precisão conceitual e rigorosa o fundamento da percepção das coisas, com descrição compreensível e natural. Os procedimentos da pesquisa qualitativa são suprimidos de direção uniforme.

A pesquisa qualitativa, para Borba (2011), é:

... realizada numa situação natural; trabalha com dados descritivos; a preocupação com o processo é muito maior que com o produto, o “significado” que as pessoas dão às coisas e à sua vida são focos de atenção especial do pesquisador e a análise dos dados tende a seguir um processo indutivo; o envolvimento do pesquisador com o sujeito pesquisado é inevitável, pois há uma total identidade entre sujeito e objeto de pesquisa, desqualificando o discurso da neutralidade axiológica do pesquisador. (2011, p. 5).

A pesquisa qualitativa, desvela a autora, descreve e interpreta significados das atividades humanas inseridas em determinada realidade social. A pesquisa qualitativa inclui os diferentes atores sociais que interagem de modo dinâmico. Cada indivíduo realiza a própria ação que se relaciona com outras atividades sociais.

Interpretar a vida prática social, segundo Carneiro, Mesquita e Afonso (2017), parte do homem social que, primeiro, produz as condições básicas de sobrevivência, como a alimentação e a moradia. Estas condições de sobrevivência, evidenciam a importância do papel econômico e político do trabalho do homem.

O fator básico para o homem, em concordância com Silva e Carneiro (2019), é interagir com o que existe na natureza. As concepções elaboradas pelo homem inexistem no mundo natural. O ser humano adveio após o mundo material. O mundo como objeto independe do homem. O conhecimento é o resultado do esforço humano, que esclarece os objetos reais, por meio de concepções elaboradas sobre a realidade.

Para Almeida:

... o método materialista histórico e dialético, também, sistematiza forma de apreensão da realidade. [...] segundo essa concepção, é preciso compreender como se desenvolvem e se produzem de maneira concreta os fenômenos sociais. Para o materialismo histórico-dialético, tal construção se dá de maneira sincrônica e diacrônica, revelando o caráter histórico do objeto em investigação (2018, p. 32).

O método Materialismo Histórico-Dialético, registra o autor, sistematiza o processo de aprender, a fim de revelar e expor as estruturas sociais, que mediam para transformar os fenômenos da sociedade. Essa construção dialética acontece de modo sincrônico. Galli (2019) explica que, o modo sincrônico são quando as “coisas” ocorrem ao mesmo tempo e diacrônico, quando as “coisas” ocorrem ao longo do tempo.

As formas sincrônicas e diacrônicas, para Almeida (ibid.), revelam o caráter histórico da investigação. Esse método busca revelar a estrutura do objeto pesquisado, a partir de fatos encontrados, a fim de compreender e transformar a realidade.

O objeto do pesquisador, de acordo com Konder (2008), faz parte de um todo; cada problema do homem está interligado e, para solucioná-lo, é necessária a visão de conjunto da sociedade que compreende a visão histórica, educacional, econômica, social, cultural e as suas contradições.

O objeto, pesquisado no mundo ocidental globalizado, consoante Carneiro, Mesquita e Afonso (2017), se constitui na realidade da sociedade capitalista. Para compreender o ser humano nessa sociedade é necessário partir das condições materiais, que determinam o existir do homem. Produzir e reproduzir a vida humana, é categoria central do Materialismo Histórico-dialético. O ser social nasce em condições materiais determinadas e se produz pelo trabalho.

O pesquisador adepto do Materialismo Histórico-Dialético, mostra Netto (2011), reproduz a atividade de pensar. Isto significa que o real é reproduzido no plano do pensamento mediante a pesquisa viabilizada pelo método. O pesquisador reproduz a estrutura do objeto que investigou. Por isso, o sujeito está envolvido com o objeto. Para o pesquisador construir o objeto de modo concreto, conforme Carneiro, Mesquita e Afonso (2017), é necessário:

... apreender as suas múltiplas determinações, o pesquisador lança mão dos conhecimentos disponíveis em cada época histórica para construir/interpretar os nexos. Esse caminho do empírico a construção do objeto se faz lançando mão da fundamentação teórica, que aplicada ao objeto concreto em seu contexto, permite a construção de um novo conhecimento. [...] o objeto é enriquecido pelo conhecimento socialmente produzido, acrescido do novo conhecimento (2017, p. 73-74).

As autoras esclarecem que é preciso apropriar-se do objeto pensado pelo pesquisador. O objeto está situado em dado espaço e momento histórico; está em construção contínua e inserido na sociedade em movimento. O real são as forças produtivas, que são analisadas pelo pesquisador como relações sociais determinadas.

Cada realidade pesquisada, conforme Gadotti (1983), apresenta contradições particulares e precisa apreender o movimento, a qualidade e as transformações do objeto. O método deve subordinar-se ao conteúdo, ao objeto e à matéria.

Almeida (2018) esclarece que o pesquisador deve ser fiel à estrutura do objeto mediante as contradições e as mediações que estão presentes na realidade pesquisada.

Essa fidelidade do pesquisador à estrutura do objeto, consoante Netto (2011), tem o fundamento e a dinâmica da realidade que orientam os procedimentos do pesquisador. O Método Dialético determina a perspectiva do sujeito que pesquisa. Na relação com o objeto, ele extrai as suas determinações.

O objeto e o sujeito, de acordo com Silva e Carneiro (2019), são indissociáveis das condições materiais e exige-se esforço para desvelar a realidade. O pesquisador que almeja conhecer o objeto cria relação dialética em mudança contínua. Apropriar-se do real pela pesquisa significa tomar a realidade para si, a fim de construir o objeto que se deseja conhecer.

O pensamento do pesquisador, para Gadotti (1983), elabora a análise crítica do objeto e apreende o conjunto das conexões internas: como cada unidade se inter-relaciona, se movimenta e se desenvolve. O pesquisador apreende os aspectos e os momentos contraditórios da unidade, encontrados na totalidade.

Apreender o conjunto dessas conexões, desvela Almeida, acontece pela prática que:

... torna-se o ponto de partida e intervenção dos que se propõem a utilizar o materialismo histórico-dialético. Isso significa dizer que nesse método as análises não partem de abstrações sobre a realidade, antes tomam como critério de partida e chegada a prática social, porém, tendo na chegada uma elaboração mais complexa sobre o real (2018, p. 33).

A prática revela a partida e a chegada. Na chegada, elabora-se a visão complexa do real, pela atividade de pensar. É fundamental transformar e explicar a prática e as relações sociais concretas.

O ponto de partida na pesquisa, segundo Borba, Portugal e Silva (2008), é da ordem da teoria. É a partir da pesquisa teórica que se encontra e se produz a concretude da realidade, que se constrói as concepções do objeto a ser pesquisado.

A fundamentação teórica, assinalam Silva e Carneiro (2019), subsidia o delineamento do objeto a ser pesquisado. O conhecimento é indispensável para interpretar a realidade e definir o objeto de pesquisa. Lembre-se que o objeto é questionável porque é histórico. Em razão disto, a revisão de literatura deve ocorrer de modo contínuo durante toda a pesquisa.

O método dialético como instrumento de análise, entendido por Gadotti (1983), representa forma fundamental de criticar os pressupostos, as ideologias, as visões de mundo, os dogmas e os preconceitos. Esse método, consoante Netto (2011), analisa os pressupostos reais e as condições reais de vida que determinam a consciência do homem.

Carneiro, Mesquita e Afonso (2017) mencionam as ideias de Marx para afirmarem que o método como caminho possibilita apreender o real. Esse real são as relações sociais dos homens, desvelada por meio do movimento histórico continuo, determinado ao homem como condições materiais.

O movimento histórico explica as relações sociais concretas por meio do Método Dialético como atividade de pensar e se fundamenta na matéria. Esse método desvela a realidade contraditória que advém das ações intencionais dos homens. A verdade definida por Marxe citada por Almeida (2018) representa a realidade e permite apreender a estrutura do objeto por meio desse método.

Estas concepções a serem construídas, de acordo com Gadotti (ibid.), devem estar cientes que a verdade objetiva inexiste, existem verdades.

O Materialismo histórico-dialético, como método, abstrai a capacidade intelectiva, extraída em contexto de totalidade e isola o objeto para examiná-lo e reintegrar-se ao movimento circular da realidade, que é concreta e constitui o conhecimento.

6 Considerações finais

Na Grécia Antiga, a dialética significou a arte do diálogo, que buscou descobrir as contradições. O diálogo se realizava por meio de perguntas e respostas entre as pessoas. No platonismo, a teologia condenou a dialética e, na Idade Moderna, ela foi considerada inútil.

No Renascimento, surgiu a ideia de que apenas a organização democrática desenvolveria o homem em sua plenitude. Há ingenuidade nessa ideia, considerando-se que, na sociedade liberal dividida em classes burguesa e proletariado, somente a burguesia usufruiria desse direito.

Compreendeu-se a dialética como concepção de homem e de sociedade, que se vale da ciência para analisar as relações de produção da sociedade capitalista e contribui para esclarecer as relações que determinam o homem e independem do indivíduo, porque, por meio delas, o homem se constitui como produto de sua própria existência.

A práxis revelada como a verdade sobre a realidade, encontrada nas atividades que o homem realiza, nas ações que transformam sua vida e produzem a história, mostraram que a teoria e a prática tornaram-se indissociáveis, a fim de alcançar mudanças reais, conscientes e necessárias para transformar a realidade social.

A totalidade, o movimento, a qualidade e a contradição, são algumas das categorias do materialismo histórico-dialético desenvolvidas pelas ciências modernas e fazem parte do processo inacabado e inconstante, modificando-se por meio de movimento circular, transformador, contínuo da realidade e inseparável de todas as coisas.

Ainda, desvelou-se que o pensamento do pesquisador se vale do método para fazer análises e apreender o conjunto das conexões do objeto. O pesquisador deve ser fiel ao objeto investigado, desvelando sua estrutura e, com isso, conhecer a realidade pesquisada.

Essa pesquisa mostrou que a dialética propõe o processo em que nada é destruído; tudo é reconstruído como realidade viva, dinâmica e analisa as lutas de classes empreendidas na sociedade capitalista, a fim de modificá-la. A dialética faz parte da história e permite desnudar a realidade social. Este processo ocorre mediante contradições, conflitos, mediações e movimento, suscitando a realização de pesquisas que vislumbrem a transformação da realidade por meio de mudanças concretas.

1 O platonismo é uma corrente filosófica baseada no pensamento de Platão. Indica a filosofia de Platão e da sua escola. Abrange as ideias de filósofos que viveram entre o século IV a.C. e a primeira metade do século I a.C.

2 Zênon de Eleia viveu aproximadamente (490-430 a. C) e Sócrates (469-399 a. C).

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Recebido: 23 de Outubro de 2021; Aceito: 27 de Junho de 2022

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