INTRODUÇÃO
Em que pese o fato de o Rio de Janeiro, até fins julho de 2016, ainda não dispor do seu Plano Estadual de Educação (PEE) consoante ao Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024 - Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014 (BRASIL, 2014a)1 -, constata- se que, até aquela data, 89 (97%) das 92 localidades fluminenses já haviam procedido à transformação dos seus novos Planos Municipais de Educação (PMEs) em norma jurídica. Nesse sentido, essas cidades, à exceção da capital (Rio de Janeiro) e Niterói - cujos PMEs ainda tramitavam nas respectivas câmaras municipais -2, já se encontravam com seus planos aprovados pelo Legislativo, sancionados pelo Executivo e, ainda, publicados em órgão oficial. Em escala regional, observa-se, também, que, das 21 localidades que presentemente compõem a Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ), 19 (90%) já dispunham dos seus planos assim regulamentados.
A RMRJ, também denominada Grande Rio, veio a ser estabelecida por meio da Lei Complementar (LC) n. 20, de 1 de julho de 1974 (BRASIL, 1974),3 que, no Capítulo II, determinou a fusão dos estados do Rio de Janeiro e da Guanabara, o que também significou união entre as regiões metropolitanas (RMs) do Grande Rio Fluminense e da Grande Niterói. Inicialmente delimitada a 14 municípios,4 a RMRJ veio, ao longo dos anos, sendo modificada pela exclusão e inclusão de localidades, integrando, em 2010, 19 municípios.5 Mais recentemente, em função da LC n. 158, de 26 de dezembro de 2013 (RIO DE JANEIRO, 2013), mais duas cidades passaram a integrá-la,6 totalizando 21 municípios.
Inicialmente, cabe destacar que aquela elevada taxa (97%) de elaboração dos PMEs do estado do Rio de Janeiro alinhados ao PNE 2014-2024 representa um grande avanço em termos do esforço, em tese, de tornar o planejamento local da educação menos experimental, intuitivo e fragmentado, e, por conseguinte, mais projetivo, racional e sistematizado, aspectos que, entre outros, servem à caracterização desses planos decenais (BORDIGNON, 2014; DIDONET, 2000, 2001; MARTINS, 2012; MENDONÇA, 2002; VIEIRA, 2014). Em razão de se constituírem em políticas de Estado, esses planos passam também a apresentar menor vulnerabilidade às sazonalidades das políticas de governo para a área da educação.7 Assim, afirmam-se com maior perenidade na medida em que, por um lado, têm duração de dez anos, e não vulnerável aos quatro anos dos mandatos governamentais, e, de outro, para serem alterados ou revogados, impõem, no mínimo, debate no interior dos órgãos públicos responsáveis por sua normatização jurídica, especialmente por parte das casas legislativas, podendo (e devendo), em função do grau de democratização do município, envolver a comunidade local (BORDIGNON, 2014).
Especificamente em relação aos PMEs da RMRJ alinhados ao extinto PNE 2001-2010 (BRASIL, 2001), nota-se que o número de novos planos, consoantes ao PNE 2014-2024 (BRASIL, 2014a), praticamente dobrou (de dez para 19). Segundo Souza e Alcântara (2015, 2016), entre 2001 e 2012, de um universo de 19 municípios que, à época, definiam essa RM, apenas dez (53%) tinham PMEs aprovados. Os autores observam, ainda, que, à exceção da cidade de Nilópolis, que regulamentou o plano em dezembro de 2001, todas as demais localidades vieram a ter seus planos transformados em norma jurídica somente a partir do sexto ano de vigência daquele PNE, processo que se estendeu de 2006 a 2012, expondo elevada dissintonia em relação às metas definidas em escala nacional.
Contudo, é importante considerar que, em larga medida, o aumento da adesão dos municípios da RMRJ a esse tipo de planejamento, assim como o ocorrido em relação às demais localidades do país, decorre da precisão, até mesmo temporal, com que o PNE 2014-2024 determina aos entes federados (estados, Distrito Federal e municípios) a elaboração dos planos de educação correspondentes ou a adequação dos planos já aprovados em lei, “em consonância com as diretrizes, metas e estratégias previstas nesse PNE, no prazo de 1 (um) ano contado da publicação desta Lei” (BRASIL, 2014a, art. 8º). Importante observar que, no caso do PNE 2001-2010, a lei que o regulamentou - Lei n. 10.172, de 9 de janeiro de 2001 - apenas dispunha que esses entes federados deveriam “com base no Plano Nacional de Educação, elaborar planos decenais correspondentes” (BRASIL, 2001, art. 2º).
Não obstante o reconhecimento do valor desses avanços para a profissionalização da gestão local da educação e em continuidade aos estudos de Souza e Alcântara (2015, 2016), o presente artigo se propõe a avaliar a organização interna dos PMEs da RMRJ, de modo a aferir sua consonância em relação ao PNE 2014-2024. Elege, como dimensões de análise, a normatização jurídica, o diagnóstico da situação educacional e a definição das metas e estratégias, abordando-os de forma exploratória (KETELE; ROEGIERS, 1993) e por meio de incursões comparativas (YANG, 2015) relativas não apenas ao PNE, mas entre os próprios PMEs, isso com foco nos documentos legislativos correspondentes - leis de criação e seus anexos (planos propriamente ditos) - e tomando por referência os marcos jurídicos e a literatura acadêmica correlata. Cada uma dessas dimensões é, portanto, respectivamente examinada nas três seções que se seguem a esta introdução, quando, após, são estabelecidas as conclusões do estudo, com vistas à formulação final da avaliação em causa.8
NORMATIZAÇÃO JURÍDICA DOS PMES
Com base no Quadro 1, observa-se que, transcorridos 12 meses da aprovação do PNE 2014-2024, apenas dez (47%) dos 21 municípios da RMRJ tinham PMEs transformados em norma jurídica, o que significa que vieram a ter seus planos efetivamente aprovados no prazo estabelecido na Lei n. 13.005/2014, qual seja, “de 1 (um) ano contado da publicação desta Lei” (BRASIL, 2014a, art. 8º), a saber, Belford Roxo, Cachoeiras de Macacu, Guapimirim, Itaboraí, Japeri, Nova Iguaçu, Paracambi, Rio Bonito, São João de Meriti e Tanguá.
Daquele total de 21 localidades, constata-se que outros nove (43%) municípios vieram a ter os seus PMEs aprovados e publicados após essa data: Duque de Caxias, Itaguaí, Magé, Mesquita, Queimados e Seropédica, com menos de um mês de atraso; Maricá e Nilópolis, com cerca de três meses; e São Gonçalo, com retardo de quase seis meses. Todavia, tais defasagens temporais em relação à consecução do PNE são passíveis de serem consideradas de baixo impacto para o planejamento decenal nacional, na medida em que não sugerem implicar reduções significativas nos tempos máximos definidos para alcance das metas nacionalmente fixadas.
De fato, os casos mais graves consistem nos PMEs de Niterói e Rio de Janeiro que, pelo menos até o final do mês de julho de 2016, ou seja, dois anos após a sanção do PNE 2014-2024 e um ano seguinte ao término do prazo fixado na sua lei, ainda não tinham PMEs transformados em norma jurídica, encontrando-se em trânsito nas respectivas câmaras municipais.9
O Quadro 1 permite, ainda, depreender que grande parte desses 19 PMEs – 15 (79%) – explicita, em seus documentos (no corpo da lei ou do plano propriamente dito), o intervalo de tempo de sua duração, enquanto que apenas quatro (21%) unicamente assinalam que o plano entra em vigor a partir da data de sua publicação, como de praxe nos textos legislativos. Nesses casos, procedeu-se à dedução do período em questão, considerando-se a data de publicação do PME no órgão oficial e a indicação do tempo total de vigência explicitado (dez anos), como o ocorrido com os planos de Cachoeiras de Macacu, Magé, Mesquita e Queimados.
Assim, no seu conjunto, esses planos têm vigência decenal, correspondentemente ao período 2015-2025, à exceção de Nilópolis e São Gonçalo, que assinalam o período 2015-2024, sugerindo tratar-se de planos pautados no esquema de datação adotado pelo antigo PNE 2001-2010 (BRASIL, 2001), que considerava o ano de aprovação o primeiro ano de vigência decenal do plano propriamente dito. Já o PME de São João de Meriti, embora tenha sido aprovado em 17 de junho de 2015, indica o decênio 2014-2024 como aquele concernente à duração do plano, apresentando inconsistência em relação à data de início de sua vigência, que corresponde ao da sua publicação em órgão oficial.
De acordo com levantamento documental efetuado em torno desses 19 PMEs,10 cumpre também destacar que se logrou obter a publicação do plano e da lei correlata em órgão oficial referente a apenas nove (47%) municípios – Cachoeiras de Macacu (2015), Guapimirim (2015), Maricá (2015), Mesquita (2015a, b), Nilópolis (2015), Nova Iguaçu (2015), Queimados (2015), São Gonçalo (2015a, 2015b) e São João de Meriti (2015). Em relação aos outros quatro (21%) planos, conseguiu-se localizar apenas a publicação da lei em órgão oficial, mas excluída do texto do plano propriamente dito, conforme ocorrido com Belford Roxo (2015a), Duque de Caxias (2015a), Rio Bonito (2015a) e Seropédica (2015a). No que remete aos demais seis (32%) planos – Itaboraí (2015), Itaguaí (2015a, b), Japeri (2015a, b), Magé (2015), Paracambi (2015) e Tanguá (2015) –, em que pese a identificação do texto da lei e do PME digitados ou digitalizados, não se conseguiu detectar as versões, de fato, publicadas em órgão oficial.11
Sobre as questões relacionadas à publicação da lei e/ou dos PMEs em órgão oficial,12 cumpre esclarecer que, conforme o determinado no art. 1º da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro – Decreto-Lei n. 4.657, de 4 de setembro de 1942 (BRASIL, 1942), cuja ementa veio a ser alterada pela Lei n. 12.376, de 30 de dezembro de 2010 para “Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro” (BRASIL, 2010) –, “Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada” (BRASIL, 1942, art. 1º). Além disso, a própria Constituição Federal (CF) de 1988 (BRASIL, 1988, art. 84, IV) consagra o princípio da publicidade relativamente a tais atos normativos, na medida em que determina ao chefe do Poder Executivo que publique as leis aprovadas, princípio também enunciado no seu art. 37.
Outro problema relacionado ao déficit de informações sobre os PMEs da RMRJ implica no desconhecimento acerca do histórico de sua construção local. Também se considerando os documentos em questão, apurou-se que, do conjunto desses 19 planos, apenas dez (53%) fornecem algum tipo de referência acerca do processo de sua elaboração, sendo possível distingui-las, de forma pontual, diminuta e fragmentada nos planos de Belford Roxo (2015b), Duque de Caxias (2015b), Itaboraí (2015), Itaguaí (2015b), Magé (2015) e Nova Iguaçu (2015), e, de modo sistematizado e com mais detalhes, apenas nos PMEs de Japeri (2015b), Paracambi (2015), Rio Bonito (2015b) e Seropédica (2015b).13
DIAGNÓSTICO DA SITUAÇÃO EDUCACIONAL NOS PMES
Em um plano de educação, o diagnóstico consiste no exame de certa realidade territorial educacional (por exemplo, nacional, estadual, distrital, regional ou municipal), isso por meio da análise de indicadores quantitativos e de caracterizações e contextualizações qualitativas, compreendendo o equacionamento de problemas, dificuldades e perspectivas (BONAMINO et al., 2006; MONLEVADE, 2002; ROCHA; MONLEVADE; AGUIAR, 2006). Esses indicadores, por definição geral, podem ser considerados “sinais que chamam a atenção sobre determinados comportamentos de um sistema” (BOTTANI, 1998, p. 24) e que, com isso, expressam “uma forma de descrever o sistema” (SOARES; XAVIER, 2013, p. 920). É a partir do diagnóstico, portanto, que se estabelecem as escolhas para a formulação das políticas que vêm a dar corpo ao plano propriamente dito, em termos das suas metas/decisões e estratégias, isso com maior fidedignidade em relação a uma situação educacional específica (BORDIGNON, 2014).
Mas não basta apenas que o diagnóstico seja elaborado e venha a subsidiar a construção do plano de educação. A um só tempo, torna-se necessária sua ampla divulgação para o poder público e para a sociedade em geral, publicização que possibilita, de fato, o debate acerca da pertinência do plano, ou seja, sua avaliação no sentido lato, até mesmo configurando a diagnose em referência para que os entes federados possam proceder à elaboração dos seus respectivos planos em sintonia ao PNE (MARTINS, 2014). Para o MEC, em documento orientador da elaboração dos planos infranacionais – denominado Planejando a próxima década: alinhando os planos de educação –, tal publicização consiste no reforço do caráter democrático da administração pública, pois fornece “subsídios aos órgãos de controle social para exercerem o acompanhamento dos objetivos e das metas definidas nos planos” (BRASIL, 2014b, p. 16).
Em que pese à importância fundamental da ação diagnóstica para, em particular, o planejamento da educação, nota-se que a publicação do PNE 2014-2024 no Diário Oficial da União (DOU) (BRASIL, 2014a) não é acompanhada de nenhum diagnóstico que fundamente as suas metas e estratégias.14 Já no texto propriamente dito do plano, referências explícitas ao emprego do diagnóstico como meio que possibilita o conhecimento acerca de uma dada realidade educacional são pontuais, constando apenas de duas estratégias, respectivamente associadas às Metas 9 e 15, não havendo, em qualquer outro momento, alusões à sua adoção. No primeiro caso, o diagnóstico é indicado na estratégia 9.2, vinculada à meta de Educação de Jovens e Adultos (EJA), como forma de identificação da “demanda ativa por vagas” nessa modalidade de ensino (BRASIL, 2014a, Meta 9). Tal perspectiva se repete na estratégia 15.1, relativa à meta sobre Formação dos Profissionais da Educação, agora evocando a importância de um “plano estratégico que apresente diagnóstico das necessidades de formação” desses profissionais (BRASIL, 2014a, Meta 15) e que possibilite informações sobre a “capacidade de atendimento, por parte de instituições públicas e comunitárias de educação superior existentes nos Estados, Distrito Federal e Municípios [...]” (BRASIL, 2014a, Meta 15).15
No âmbito dos PMEs da RMRJ, preliminarmente cabe salientar que os planos alinhados ao PNE 2001-2010 (BRASIL, 2001) já apresentavam diversos problemas relativos ao registro do diagnóstico em questão. Pesquisa realizada por Souza e Alcântara (2015, 2016) evidenciou que, não obstante o fato de a grande maioria desses PMEs ter exposto, em seus respectivos planos, seção dedicada à explicitação do que denomina diagnóstico ou análise da situação educacional, de modo recorrente apresenta
[…] caráter vago, pois prioriza considerações de âmbito nacional, princípios expressos na LDBEN n. 9.394/1996 (BRASIL, 1996) ou perpassa problemas clássicos que marcam a educação no país, apoiando-se, sobretudo, em dados educacionais mais gerais e genéricos [...]. (SOUZA; ALCÂNTARA, 2015, p. 274)
Do conjunto de dez PMEs examinados por esses autores (já mencionados anteriormente), apenas três demonstraram maior empenho em traçar diagnósticos que viessem dar conta da situação educacional local, mapeando dados educacionais apropriados (SOUZA; ALCÂNTARA, 2016).
Já na esfera dos PMEs relacionados ao PNE 2014-2024 (BRASIL, 2014a), a maior parcela – 15 (79%) – expõe algum tipo de registro da situação educacional local, à exceção dos planos de Cachoeiras de Macacu (2015), Maricá (2015), Nilópolis (2015) e Queimados (2015), aspecto positivo se levada em conta certa tendência de os planos infranacionais reproduzirem, em alguma medida, a organização e o conteúdo do PNE que, conforme visto, não veicula o diagnóstico sobre a realidade nacional.
Do conjunto dos 15 PMEs que, de alguma forma, aludem à realização de diagnósticos, cinco (33%) – Duque de Caxias (2015b), Mesquita (2015a), Nova Iguaçu (2015), São Gonçalo (2015b) e São João de Meriti (2015) – organizam seus planos de modo que, para cada meta declarada, a definição das estratégias seja antecedida por análises específicas sobre a situação local da educação. Para isso, pautam-se em referenciais jurídicos e normativos, em alguns casos também em estudos acadêmico-científicos, assim como em indicadores quantitativos, como os sinalizados no Anexo 1 do presente artigo, adiante tratados. Nesses planos, embora com algumas variações, é possível observar uma relação de consequência mais imediata entre o diagnóstico efetuado – que, via de regra, culmina no equacionamento dos desafios postos à educação municipal – e a declaração das metas e das estratégias que lhe dão corpo.
Outro agrupamento de cinco PMEs (33%) documenta o diagnóstico em seções específicas do plano, mas esquematicamente dissociada da declaração das estratégias. No entanto, organizam essas análises situacionais ou em correspondência a cada uma das suas metas – Itaboraí (2015) e Tanguá (2015) – ou a eixos temáticos relativos, tanto aos níveis, etapas e modalidades de educação quanto a certos temas como gestão democrática, conselhos de educação, formação de professores, entre outros –, Japeri (2015b), Magé (2015) e Rio Bonito (2015b), como na organização empregada no PNE 2001-2010 (BRASIL, 2001). De um modo ou de outro, o que caracteriza esses documentos é o fato de indicarem seus respectivos diagnósticos em seções que antecedem ou dão sequência às seções que declaram as metas e diretrizes do PME, dificultando, com isso, a visualização mais imediata sobre a possível articulação entre esses elementos do planejamento. Assim como no grupo anterior, esses PMEs buscam alicerçar suas análises por meio de abordagens qualitativas e quantitativas (Anexo 1), também com vistas ao equacionamento das demandas educacionais locais.
Por fim, um terceiro conjunto, também constituído por cinco (34%) planos, em que pese o fato de dispor de seção que realiza exposição de diversos indicadores e estatísticas dispostas em tabelas e/ou quadros, furta-se ao exame desses elementos. Com isso, ou exclusivamente, registra-os no documento – Belford Roxo (2015b) e Paracambi (2015) –, acrescentando algumas considerações de caráter genérico – Guapimirim (2015) –, ou se atém a algumas breves incursõesdescritivas, mas não analíticas – Itaguaí (2015b) e Seropédica (2015b). Em todas essas situações, constata-se ausência de exames sobre os dados veiculados no plano, de modo que viessem a dar causa às decisões e estratégias elencadas em seções anteriores ou posteriores, o que, a nosso ver, leva à descaracterização da diagnose.
Conforme Bordignon (2014, p. 35), “Não basta conhecer a realidade atual (informações e dados estatísticos), mas é essencial compreendê-la”, ou seja, a ação diagnóstica não pode reduzir-se a simples exposição de informações quantitativas, ou qualitativas, sobre o contexto educacional local, mesmo que de forma descritiva ou exploratória, sem que se avance na perspectiva da sua interpretação crítica, de modo a permitir a apreensão das exigências educacionais do município e, em consequência, a declaração dos meios que se direcionarão ao seu encontro.
Pelo exposto, avalia-se que apenas dez (53%) dos 19 PMEs da RMRJ enfocados por esse estudo, relativos aos dois primeiros grupos anteriormente mencionados, apresentam, de fato, exame efetivo acerca da situação educacional local, e não 15, apesar dessa diferença remeter a planos que listam indicadores e demais informações que potencialmente poderiam implicar diagnósticos producentes ao planejamento em questão.
Segundo o Anexo 1, distingue-se que a maior parcela das fontes dos dados mencionadas nos 15 PMEs que, de algum modo, alude à realização de diagnósticos sobre a realidade educacional local, é produzida pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC), seja englobando microdados16 relativos ao Censo Escolar da Educação Básica (Educacenso), ao Censo da Educação Superior (CES), ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e ao Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) – nesse caso, em especial, também sobressaindo dados discretos relativos à Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (Anresc) –, seja apoiando-se no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) – já alcançado pelo município ou projetado para os próximos anos, até 2021 (constante do diagnóstico e/ou da Meta 7, relativa à qualidade da educação básica)17 –, confirmando o notório valor dos estudos realizados por esse órgão federal, particularmente para o planejamento da educação.
Ainda no âmbito do MEC, observa-se que alguns desses PMEs se utilizam dos indicadores disponibilizados pelo Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e Controle do MEC (Simec).18 Esses ilustram graficamente a situação de cada meta da região do país, do estado, da mesorregião (por exemplo, a RM) e/ou do município em relação à situação nacional. Em particular, cabe destacar a preocupação da maior parcela dos planos que transcrevem esses indicadores em também incluir o gráfico correspondente à situação educacional da RMRJ, o que pode estar sinalizando certa tendência, mesmo que incipiente, de uma apreciação comparativa da realidade educacional local em escala também regional.
Igualmente recorrente entre esses PMEs é a utilização dos dados produzidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),19 resultados do Censo Demográfico (CD) e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). Nota-se, também, a utilização por muitos planos de dados coletados e/ou processados pela própria SME, ao lado de outros de maior especificidade a cada PME (informados nas notas do Anexo 1), produzidos por órgãos locais, estaduais, nacionais ou por organismos internacionais.
Observando-se o Anexo 1, o PME de Duque de Caxias merece destaque, pois pauta-se única e exclusivamente em dados localmente coletados em levantamento realizado pela SME20 com a comunidade. Embora importantes para revelar algumas das demandas educacionais locais, especialmente segundo a ótica da comunidade (o que corrobora, positivamente, o caráter democrático e sociopolítico do plano), esses dados não expõem suficiência para seu alinhamento técnico (e também político) em relação aos desafios postos ao planejamento mais amplo da educação, em escala nacional. No âmbito do planejamento decenal em causa, o que se encontra no centro da questão não é apenas a construção de um plano que pretenda dar conta de certos déficits educacionais locais, mas, sem perder de vista essas especificidades, estabelecer sintonia em relação ao fato de as metas serem orgânica e nacionalmente alcançadas, movimento que, em larga medida, calça-se em índices como o Ideb21 que, ao lado de outros importantes indicadores, também veio a ser desconsiderado por esse plano. No vácuo gerado por essas omissões, não se observou outro indicador que possa subsidiar, de algum modo, a avaliação desse PME.
Decerto concordamos com Popkewitz e Lindblad (2001,p. 111) quando afirmam que os relatórios de estatísticas educacionais consistem numa ficção, “pois as categorias não são reais, mas representações elaboradas para identificar e ordenar relações e permitir planejamentos sociais [...]”. Igualmente, coincidimos com as críticas de Almeida, Dalben e Freitas (2013) e Soares e Xavier (2013) a respeito dos limites do Ideb. Os primeiros sinalizam “que os desempenhos médios obtidos [pelas instituições escolares] não podem ser traduzidos como retrato fiel da qualidade das instituições” (ALMEIDA; DALBEN; FREITAS, 2013, p. 1.155), pois a qualidade da escola ou sua eficácia são passíveis de outras representações. Já os segundos autores demarcam que esse índice carece de aperfeiçoamentos, como sua divulgação
[…] de forma contextualizada, que contenha pelo menos uma descrição do nível socioeconômico das escolas ou dos municípios. Idealmente, outras características das escolas, como sua infraestrutura, devem também ser consideradas. (SOARES; XAVIER, 2013, p. 920)
Todavia, há de se ponderar que o problema em causa consiste em harmonizar o planejamento decenal local da educação ao nacional, o que significa estabelecer, conforme anteriormente enfatizado, coesão entre as metas desses PMEs e o PNE, conferindo unidade em torno das decisões e, nesse caso, incluindo-se os indicadores que as balizam e que, em consequência, deverão ser empregados para efeito do monitoramento e avaliação dos planos. Aliás, a própria Lei n. 13.005/2014 determina que as metas do PNE devam ter como referência o Pnad, o CD e os Censos Nacionais da Educação Básica e Superior (BRASIL, 2014a, art. 4º), o que, invariavelmente, abarca as decisões relativas aos planos infranacionais.
METAS E ESTRATÉGIAS DOS PMEs
Conforme já sinalizado, as metas de um plano trazem à vista as decisões assumidas para explicitarem as intenções e ações das políticas educacionais a serem adotadas para a solução dos problemas identificados na etapa diagnóstica, com números e prazos mensuráveis e, ainda, com indicação das estratégias nas e pelas quais o plano se moverá ao longo da sua implementação (BORDIGNON, 2014; BONAMINO et al., 2006; MONLEVADE, 2002). Essas estratégias consistem justamente nos meios e processos que viabilizarão o alcance das metas do plano, expondo a definição das ações, dos recursos e das “condições favoráveis disponíveis para avançar rumo às metas” (BORDIGNON, 2014, p. 32).
De acordo com o balanço efetuado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) sobre os problemas que marcaram o PNE 2001-2010 (BRASIL, 2001), dentre as deformidades internas ao texto desse plano, sobressai o excessivo número de decisões/metas (295) que, em decorrência, acabou por pulverizar e fragmentar as ações previstas (BRASIL, 2009). Para Dourado (2010, p. 684), esse elevado número de decisões retrata, justamente,
[...] a carência de organicidade interna do Plano, na medida em que várias metas são reiteradas, por vezes superpostas, e, em outros casos, não apresentam a devida articulação interna [...].
Entretanto, o PNE 2014-2024 indica ter superado os problemas decorrentes do número excessivo de decisões, na medida em que se estrutura a partir de 20 metas, o que também vem a favorecer “o engajamento da sociedade civil e o controle social na execução do plano, fundamentais para seu sucesso” (MARTINS, 2014, p. 15). No seu conjunto, essas decisões visam à universalização das etapas e modalidades da educação básica, articuladamente à melhoria da sua qualidade, à ampliação, igualmente, da oferta com qualidade do ensino superior, incluindo-se o segmento de pós-graduação, passando pela qualificação e valorização dos profissionais da educação e culminando tanto no asseguramento de condições para a efetivação da gestão democrática quanto na ampliação do investimento público em educação para os almejados 10% do produto interno bruto (PIB), prevendo, ainda, seu acompanhamento e avaliação nacional e infranacional, tanto pelo poder público quanto pela sociedade civil organizada (BRASIL, 2014a, 2014b).
Em que pese o fato de o número de metas do novo PNE se mostrar exequível, o que tende a repercutir também positivamente quando da definição das decisões dos planos infranacionais, a atenção deve ser mantida agora em termos do número de estratégias. Em larga medida, as estratégias, assim como as metas/decisões de um plano, em essência, equivalem a objetivos a serem perseguidos. No entanto, esses objetivos diferem-se na medida em que as estratégias se configuram em “objetivos meios” viabilizadores das decisões/metas, ou seja, dos “objetivos fins” do plano (BORDIGNON, 2014) e, por isso, dependendo da sua especificação quantitativa e qualitativa, podem tanto contribuir para o alcance da decisão/meta, como dela se distanciar.
Assim, o Anexo 2 enumera o conjunto das 20 decisões e estratégias do PNE 2014-2024 (BRASIL, 2014a), também especificando os números de estratégias definidas para cada um dos PMEs.
De início, cabe salientar que o plano de Duque de Caxias (2015b) não se encontra incluído na sistematização mostrada no Anexo 2 pelo fato de a organização de suas decisões não expor consonância ao modelo empregado no PNE 2014-2024 (BRASIL, 2014a), espelhando estrutura similar à adotada no PNE 2001-2010 (BRASIL, 2001).22 Isso equivale a dizer que esse PME se organiza por eixos temáticos e subtemas a partir dos quais é indicado um extenso conjunto de diretrizes e, sobretudo, cerca de 383 objetivos/metas, o que impede o confronto com a estrutura dos demais PMEs, a começar pelo próprio PNE em vigência.23 Assim, dos 18 PMEs indicados no Anexo 2, cinco merecem destaque – Itaboraí, Maricá, Nilópolis, Rio Bonito e São Gonçalo –, como segue.
O PME de Itaboraí (2015) é o único desses 18 planos que não declara 20 metas e sim 19, resultado da fusão das Metas 8 e 9 do PNE 2014-2024 em uma única decisão.24 Contudo, de modo a viabilizar as quantificações apresentadas no Anexo 2, optou-se em dividir proporcionalmente as 24 estratégias originais da Meta 8 do PME de Itaboraí entre essa decisão e a que sofreu integração (articulada à Meta 9 do PNE), de modo a também sintonizar as numerações desse conjunto de metas em relação ao plano nacional. Sem isso, as estratégias e metas não coincidiriam. Por exemplo, as estratégias da Meta 19 desse PME, relativas ao financiamento da educação, estariam indicadas na coluna correspondente à Meta 19 do PNE (gestão democrática da educação) e não à Meta 20, a que de fato equivale.
Por seu turno, o plano de Maricá (2015), embora declare as 20 decisões que, a princípio, o nivelam em relação à organização do PNE 2014-2024, expõe quatro metas desvestidas de qualquer estratégia, constando do próprio plano publicado em órgão oficial o registro da informação “SUPRIMIDA” para cada uma das estratégias das seguintes decisões: Meta 3 (universalização do atendimento escolar para a população de 7 a 15 anos), com todas as 19 estratégias suprimidas (3.1 a 3.19); Meta 11 (aumento das matrículas na educação profissional), com todas as 14 estratégias suprimidas (11.1 a 11.14); Meta 12 (elevação das matrículas na educação superior), com todas as nove estratégias suprimidas (12.1 a 12.9) e, ainda, Meta 13 (qualificação de pessoal da educação superior), com todas as três estratégias suprimidas (13.1 a 13.3). Ou seja, subtende-se que esse plano, em vez de ter 20 metas, na prática, tem apenas 16, na medida em que as Metas 3, 11, 12 e 13 encontram-se desvestidas da indicação dos meios e processos que lhes dão sustentação, ou seja, não expõem exequibilidade. Desconhecendo-se as motivações de tais supressões, tampouco se sabe a respeito da sua origem, ou seja, se ocorreram na esfera da aprovação do PME pela Câmara Municipal, ou se constituem em vetos do Poder Executivo, quando da sua sanção.
Já os planos de Nilópolis, São Gonçalo e Rio Bonito se destacam em função das situações quantitativamente extremas que representam. Nilópolis (2015) consiste no PME que se poderia aqui predicar por minimalista, pois, em contraste com o restante dos planos, é o que menos estratégias apresenta (37). Das 20 metas que tem, 17 são caracteristicamente compostas por uma ou, no máximo, duas estratégias, o que configura esse plano num instrumento desafiador do ponto de vista de sua implementação, pois, majoritariamente, não mais do que dois caminhos são traçados para alcance da maior parcela das suas decisões, o que, decerto, restringe sua efetividade, subestimando a complexidade que cerca a consecução das decisões tomadas. Importante também notar que o segundo plano com menos estratégias consiste no PME de Japeri (2015b), com 125, mesmo assim com 88 estratégias a mais do que Nilópolis (2015).
No polo diametralmente oposto ao que se sucede com o PME de Nilópolis, os planos de São Gonçalo (2015b) e Rio Bonito (2015b) trazem à vista os dois maiores números de estratégias, respectivamente 322 e 319. Nesse sentido, têm, nessa ordem, cerca de 27% e 25% de meios e processos a mais do que os 254 apresentados pelo PNE 2014-2024 (veja-se Anexo 2). Embora tais diferenças não pareçam tão relevantes, cabe destacar que, se, por um lado, esses PMEs se encontram poupados da pulverização e fragmentação de suas metas – conforme o ocorrido com o PNE 2001-2010 (BRASIL, 2001) –, correm o risco de que o empoar agora se verifique na consecução das estratégias que dão corpo às suas metas, dificultando, com isso, a implementação do plano propriamente dito.
Uma última consideração acerca do Anexo 2 também concerne às situações numéricas extremas, agora relacionadas às metas que mais e menos atenção receberam por parte dos 18 PMEs em questão. Nesse sentido, observa-se que as Metas 4 e 7 são aquelas que aglutinam o maior número de estratégias, respectivamente 441 e 354, sinalizando tendências igualmente observadas no PNE 2014-2024, no qual a Meta 7 é a que mais reúne estratégias (36), seguida, em terceiro lugar, da Meta 4 (19). Denotam, portanto, maior cuidado em assegurar, de um lado, a universalização da educação básica e o atendimento educacional especializado para a “população de quatro a 17 (dezessete) anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação” (BRASIL, 2014a, Meta 4) e, de outro, a qualidade desse nível de ensino “em todas as etapas e modalidades, com melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem” (BRASIL, 2014a, Meta 7). Decerto, há muito tempo que a educação especial se constitui em ponto crítico da educação municipal, particularmente em face da problemática da capacitação docente nessa área e dos recursos logísticos demandados que, em particular, refletem-se nas dificuldades de atendimento de alunos com necessidades especiais em classes comuns das escolas municipais (FERREIRA; GLAT, 2003). Em relação à qualidade da educação básica, trata-se de questão polêmica, sobretudo quando remete às fragilidades dos sistemas municipais de ensino do país (NARDI; SCHNEIDER; RIOS, 2014; PADILHA et al., 2012), além das constatações de que os recentes avanços de sua melhoria vêm ocorrendo de modo desigual entre os estudantes das camadas sociais economicamente mais altas e mais baixas da população (GOIS, 2016).25
O outro extremo de número de estratégias para o qual o Anexo 2 chama a atenção refere-se às Metas 13 e 14, que exibem o menor número total de estratégias desses planos, respectivamente 72 e 94. Trata-se de duas metas relacionadas à educação superior, cujo atendimento não se constitui em prioridade dos municípios (BRASIL, 1996), mas que, de algum modo, não deixam de ser contempladas por esses PMEs, quer em função da previsão de colaboração por parte do estado do Rio de Janeiro e da rede federal de instituições de ensino superior, quer por meio de parcerias com instituições privadas. Assim, enquanto a primeira meta visa a “elevar a qualidade da educação superior e ampliar a proporção de mestres e doutores do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior” (BRASIL, 2014a, Meta 13), a segunda objetiva a elevação gradual do “número de matrículas na pós-graduação stricto sensu” (BRASIL, 2014a, Meta 14).
No seu conjunto, os extremos superior e inferior relativos ao número de estratégias das metas dos 18 PMEs indicados no Anexo 2 acabam se justificando, seja pela importância e complexidade do seu atendimento local, seja por não se constituírem prioridade de cobertura em âmbito municipal.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme visto, parecem ser muitos os avanços relativos aos novos PMEs da RMRJ, a começar pelo significativo crescimento do número de municípios metropolitanos que vieram a aderir à sua elaboração (no contexto do PNE 2001-2010, não mais do que 53%, enquanto que na esfera do novo PNE, cercade 90%). A um só tempo, merece destaque o fato de que: (i) embora somente 42% dessas localidades vieram a transformar o PME em norma jurídica no prazo estipulado pela Lei n. 13.005/2014 (BRASIL, 2014a), os atrasos das demais podem ser ajuizados como não comprometedores do alinhamento de prazos relativos às metas nacionais e municipais, à exceção dos PMEs de Niterói e Rio de Janeiro, que já expõem retardos superiores a um ano; (ii) metade desses PMEs efetivamente registrou o diagnóstico que sustenta as decisões do plano, operando por meio de um extenso e diverso conjunto de indicadores educacionais e sociais, expressão do esforço em apreender a complexidade que cerca o exame da situação educacional local; (iii) a quase totalidade definiu metas e estratégias numericamente exequíveis, coerentemente à organização que edifica o PNE 2014-2024.
Ainda do ponto de vista do seu conjunto, há outro aspecto favorável a esses PMEs, que consiste na identificação de certa tendência, mesmo que diminuta, de algumas decisões também apontarem a situação regional-metropolitana da meta, isso com base nos indicadores disponibilizados pelo Simec. Embora tal fato não necessariamente implique considerar movimento em torno de uma possível cooperação intermunicipal entre esses planos, sugere, no mínimo, certo interesse em confrontar a realidade da educação local com a mesorregional que sequer foi mencionada na versão anterior desses PMEs. Conforme identificado nos estudos de Souza e Alcântara (2015, 2016), os planos da RMRJ alinhados ao extinto PNE 2001-2010 (BRASIL, 2001) encontravam-se integralmente desvestidos de referências a essa RM. De um modo ou de outro, continua-se a não observar elementos de planejamento que indiquem cooperação intermunicipal, pois, assim como nos PMEs pregressos,
[…] se constatou a ausência de um enfoque regional-metropolitano no conjunto de decisões desses planos, o que caracteriza certo isolamento entre os planejamentos locais da educação, e entre estes e um possível planejamento integrado para a área”. (SOUZA; ALCÂNTARA, 2016)
Ao lado dos problemas relacionados a pouca transparência da publicação em órgão oficial das leis e/ou planos propriamente ditos, por parte da metade desses municípios, é possível afirmar que as questões mais críticas que marcam a organização do conjunto dos PMEs analisados consistem: (i) no reduzido número de planos (não mais da metade) que registra algum tipo de referência sobre sua elaboração local, sendo possível distingui-la, de modo sistematizado, em poucos documentos, prevalecendo, nos demais, informações genéricas e fragmentadas; e (ii) na evidência de que apenasmetade chega a registrar o necessário diagnóstico sobre a realidade educacional local, enquanto que os demais planos ou o reduzem a uma simples exposição de indicadores quantitativos ou nenhuma informação a seu respeito veiculam.
Conclusivamente, postula-se que apenas cerca da metade – nove (47%) – dos PMEs da RMRJ não apresenta problemas significativos em torno da sua organização, a saber, Itaboraí, Japeri, Magé, Mesquita, Nova Iguaçu, Rio Bonito, São Gonçalo, São João de Meriti e Tanguá. Os demais dez (53%) PMEs, ainda circunscritamente às dimensões privilegiadas neste estudo (normatização jurídica, diagnóstico da situação educacional e definição das metas e estratégias), expõem problemas em um ou mais desses indicadores. Como casos mais graves, que implicam, de fato, importantes desalinhamentos em relação ao PNE 2014-2024, destacam-se os PMEs de: (i) Duque de Caxias, cuja estrutura e organização se distanciam integralmente daquela empregada por esse plano nacional, além do fato de não ter realizado diagnóstico ancorado em nenhum dos dados que servem às metas desse plano nacional; (ii) Maricá, que embora declare 20 decisões, suprime inteiramente as estratégias de quatro dessas metas, inviabilizando-as; e, ainda, (iii) Nilópolis, que expõe significativa insuficiência de estratégias de sustentação das metas indicadas – apenas 37, correspondente, em termos médios, à taxa de 1,8 estratégias por meta –, isso sem levar em conta o fato de esses dois últimos planos não portarem qualquer informação relativa ao diagnóstico que baliza as decisões tomadas.
É claro que este estudo não encerra o exame acerca dos PMEs da RMRJ relacionados ao PNE 2014-2024, propondo-se, portanto, que seja tomado como esforço de avaliação preliminar sobre esses instrumentos de planejamento local da educação, havendo múltiplas dimensões organizativas e estruturais ainda a serem contempladas, por exemplo: a propriedade dos indicadores das metas/decisões em viabilizar o monitoramento e a avaliação do plano, as articulações internas entre as estratégias dessas metas, as vinculações do plano com outros instrumentos de gestão local da educação, os mecanismos de financiamento, o papel atribuído aos diversos conselhos de educação na sua implementação local, entre outros. A um só tempo, em conformidade ao previsto pela Lei n. 13.005/2014, tem-se ainda pela frente “o acompanhamento local da consecução das metas deste PNE e dos planos previstos no art. 8º [planos estaduais e municipais, e do Distrito Federal]” (BRASIL, 2014a, art. 6º, § 3º) que, para além da pretendida avaliação aqui realizada, colocará empiricamente em causa a eficiência, a eficácia e/ou a efetividade desses PMEs.