Introdução
Tradicionalmente, a área de Orientação Profissional e de Carreira (OPC) tem direcionado seu foco de estudo e de intervenção para o individual, atuando, majoritariamente, com estudantes do Ensino Médio, especialmente os(as) de classe média e alta. Embora não seja uma atividade privativa da profissão, a OPC, no Brasil, é composta, majoritariamente, por psicológos(as) que concentram suas intervenções em aspectos como a maturidade para a escolha e o autoconhecimento, por meio de técnicas como entrevistas e instrumentos de autorrelato favoráveis para a utilização da profissão (Ambiel; Campos; Campos, 2017).
Contudo, tal enfoque deixa de lado um amplo número de sujeitos que vivenciam suas trajetórias de carreira de maneira distintas, bem como esquece de analisar variáveis interseccionais que interferem direta ou indiretamente no modo como essas pessoas planejam e experimentam sua vida profissional (Ribeiro; Figueiredo; Almeida, 2021). Nesse sentido, a busca pela justiça social por meio da OPC fez com que diferentes autores(as) começassem a se questionar sobre a adequação dessas intervenções para a grande parte da população e, especialmente, para populações específicas (Blustein, 2011; Blustein et al., 2019; Duffy et al., 2016; Ferreira et al., 2013; Hooley; Sultana; Thomsen, 2017; Savickas et al., 2009). Esse questionamento também se deu no âmbito nacional (Cardoso; Duarte, Sousa, 2016; Silva; Paiva; Ribeiro, 2016), uma vez que teorias importadas sobre a carreira muitas vezes não faziam jus à realidade brasileira com contextos instáveis, precários, com elevadas taxas de desemprego e sem o suporte social adequado (Ribeiro; Figueiredo; Almeida, 2021). Destaca-se, ainda, que a pandemia da covid-19, iniciada no ano de 2020, realçou o cenário desigual existente no Brasil e trouxe à tona a urgência de pensar a OPC sob novas perspectivas, de modo a não recair mais em uma individualização da vida e em poucas reflexões sobre o que efetivamente é o trabalho e a carreira (Ribeiro, 2020).
Tais aspectos podem ser oportunamente observados no Ensino Superior, uma vez que este representa uma fase de preparação para o mundo do trabalho e propicia que o sujeito possa fazer reflexões e planos acerca da sua carreira. Assim como no mercado de trabalho, as desigualdades de acesso ao Ensino Superior e de permanência costumam atingir os grupos historicamente marginalizados, como mulheres, pessoas não brancas e pessoas de classes mais baixas (Heringer, 2018). Essa marginalização tem raízes culturais e, tratando-se do público feminino em específico, ganha força na ideia machista de que a mulher é naturalmente propensa e deve voltar suas energias para atos de cuidado, seja por meio da maternagem ou pela realização de atividades domésticas (Prates; Gonçalves, 2019). No que tange ao segmento estudantil de universitárias grávidas ou com filhos(as), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indica que a segunda maior causa de abandono escolar de mulheres é a gravidez e o trabalho (PNAD Educação [...], 2020). Também é interessante observar que, de acordo com a V Pesquisa Nacional de Perfil Socioeconômico e Cultural dos (as) Graduandos (as) das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), realizada pelo Fórum Nacional dos Pró-Reitores de Assuntos Estudantis - Fonaprace (2019), cerca de 11,4% dos(as) graduandos(as) têm filhos(as), e as mulheres compõem a maioria absoluta de mães solo.
Esta pesquisa também identificou uma relação entre raça e maternidade, de modo que, enquanto 8,3% dos(as) estudantes brancos(as) tinham filhos(as), a população não branca esteve sempre acima do patamar dos 10%. A proporção de mulheres estudantes com filhos(as) advindas de escolas públicas também se mostrou superior ao de estudantes oriundas de escolas particulares (14,3% e 6,0%, respectivamente), podendo ser um indicativo de um viés de classe nesse fenômeno (Fonaprace, 2019). Nesse sentido, a descoberta da gravidez durante a Graduação pode ser vivida pelas mulheres com uma ambivalência de sentimentos decorrentes da sensação de realização de ambas as atividades (ser mãe e estudante) de forma inadequada, tal qual a diminuição do desempenho acadêmico e o acúmulo de funções. Do mesmo modo, elas vivenciam a necessidade de reconstrução da identidade, dificuldades financeiras e um certo isolamento social decorrente de estigmas sobre a maternidade e o papel social da mulher, que podem ainda se intercruzar com preconceitos de raça e classe (Moreno; Duarte; Mazo D’Affonseca, 2020; Nascimento et al., 2020).
Diante disso e da falta de suporte social adequado das Instituições de Ensino Superior (IES), do Estado e, muitas vezes, da própria família, essas universitárias têm dificuldade de exercer seus papéis de mãe e estudante de forma segura (Dias; Soares, 2019). Tais barreiras podem fazer com que essas estudantes tranquem o curso de forma temporária ou atrasem. Outra dificuldade para a permanência na universidade pode surgir a partir do baixo preparo dos(as) docentes sobre a execução das atividades acadêmicas no período de licença maternidade das estudantes (Prates; Gonçalves, 2019).
Devido às adversidades elencadas anteriormente, o apoio social se mostra um fator de extrema importância para essas universitárias. O apoio social é definido como os recursos externos, advindos de outros sujeitos, que o indivíduo tem a sua disposição para enfrentar diferentes situações da vida (Sherbourne; Stewart, 1991). Esse é um construto multidimensional, visto como uma estratégia de sustentação em momentos de estresse e influenciado pelas expectativas que o sujeito tem a respeito de como as pessoas vão se comportar caso ele(a) precise de ajuda, principalmente em momentos de adaptação, tal como o nascimento de um(a) filho(a) ou a entrada na Graduação (Rapoport; Piccinini, 2006).
Contudo, embora o apoio social seja um amortecedor dos efeitos estressantes (Santos et al., 2019), a forma como as universitárias mães lidam com a sua trajetória de carreira não pode ser entendida unicamente com esse construto, uma vez que ele diz respeito majoritariamente à dimensão social. Nesse cenário, a motivação acadêmica também se mostra benéfica para a compreensão da construção de carreira dessas mulheres. Esse construto pode ser entendido por meio da Teoria da Autodeterminação, a Self-Determination Theory (SDT) (Deci; Ryan, 2000), que sugere que a motivação surge em contextos nos quais as necessidades básicas são propícias de serem atendidas. Logo, busca-se entender a orientação do comportamento no esforço de satisfazer essas necessidades e a sua intensidade. Assim, a SDT prevê três níveis de motivação, a saber: a desmotivação ou amotivação, a motivação extrínseca e a motivação intrínseca. Dessa forma, a motivação acadêmica propriamente dita pode ser definida como a motivação para se autodeterminar, ou seja, se orientar e continuar as atividades relacionadas ao estudo universitário (Davoglio; Santos; Lettnin, 2016). Considerando tais aspectos, a SDT possibilita a compreensão do engajamento, ou a falta dele, das graduandas mães nas suas atividades acadêmicas.
Além disso, ao pensar na trajetória de carreira dessas mulheres, torna-se importante compreender como essas universitárias e mães formam a sua identidade profissional no interjogo maternidade-graduação. A identidade profissional pode ser entendida como o conjunto de atitudes, crenças, valores, aprendizados e habilidades que são compartilhadas por uma profissão, sendo um construto que se forma de maneira contínua (Matthews; Bialocerkowski; Molineux, 2019; Rossi; Oliveira, 2020). Tal construto desponta como um fator associado a maiores taxas de conclusão da Graduação bem como uma variável mediadora, sensível ao meio externo, de modo a provocar respostas em busca de adaptação (Andrianto et al., 2018; Rossi; Oliveira, 2020).
Levando esses aspectos em consideração, o presente estudo objetiva analisar como se dá a permanência e o progresso de universitárias grávidas ou com filhos(as) pequenos(as) na Graduação. De modo mais específico, buscou-se investigar os níveis de suporte recebido por elas para que continuem sua formação e verificar possíveis correlações entre o apoio social, a motivação acadêmica, a identidade profissional, bem como diferenças em função de variáveis demográficas.
Método
Nesta seção, discorre-se sobre os participantes da pesquisa, os instrumentos e os procedimentos utilizados para a coleta de dados, e por fim, como se deu a análise desses dados.
Participantes
Participaram desta pesquisa 131 mulheres, com idades entre 19 e 52 anos (M = 30,31; DP = 7,05)1. Dentre essas mulheres 90,1% (n = 118) já possuíam filhos(as) e 9,9% (n = 13) eram gestantes de primeira gravidez. A quantidade de filhos(as) variou de 1 a 5 filhos (M = 1,33; DP = 0,67), e 52,7% (n = 69) delas engravidaram depois do ingresso na Graduação. Além disso, 50,4% (n = 66) delas não precisou interromper a Graduação em função da gravidez ou dos(as) filhos(as). Ainda assim, 76,3% (n = 100) delas já pensou em trancar a Graduação por conta da gravidez ou dos(as) filhos(as). No que concerne à autodeclaração racial, 45% (n = 59) eram pardas e 35,1% (n = 46) brancas. Da amostra, 48,9% (n = 64) dessas mulheres eram solteiras, 35,9% (n = 47) se encontravam desempregadas, 26% (n = 34) estavam em um emprego formal e 22,9% (n = 30) eram bolsistas. Todas as regiões do Brasil foram contempladas na amostra, pertencendo a maior parte à região Nordeste (31,3%; n = 41), seguida da região Sul (23,7%; n = 31).
Quanto à Graduação, 87,8% (n = 115) estavam em instituições de ensino públicas, estudavam em período integral (44,3%; n = 58) ou noturno (31,3%; n = 41) e ingressaram por meio da ampla concorrência (46,6%; n = 61) ou cotas (43,5%; n = 57). A amostra contemplou todas as áreas de conhecimento categorizadas pelo Ministério da Educação (MEC), porém 30,5 % (n = 40) dessas universitárias faziam parte de cursos da área de Ciências Humanas, 25,2% (n = 33) da área de Ciências da Saúde e 13% (n = 17) da área de Ciências Biológicas. Em relação à assistência estudantil, 78,6% (n = 103) declararam não receber nenhum benefício. As participantes apontaram que o principal responsável pelo cuidado das crianças enquanto elas desenvolviam as atividades acadêmicas eram seus familiares (32,8%, n = 43), seguidos pelo pai da criança (26,7%, n = 35) e escola e creche (25,2%; n = 33).
Instrumentos
Os instrumentos utilizados para a coleta de dados foram:
Escala de Apoio Social (MOS-SSS) (Sherbourne; Stewart, 1991, adaptada para o cenário brasileiro por Griep et al., 2005, e normatizada por Zanini; Peixoto; Nakano, 2018). A escala possui 19 questões, voltadas à percepção de apoio recebido durante diferentes situações da vida. Ela é dividida em quatro fatores, a saber: apoio emocional/informacional, apoio social afetivo, interação social e apoio material. O instrumento é respondido por meio de uma escala Likert de cinco pontos como chave de resposta, formada pelas seguintes afirmações: 0 - nunca; 1 - raramente; 2 - às vezes; 3 - quase sempre; e 4 - sempre. A precisão (alfa de Cronbach) dos fatores no presente estudo foi de 0,96 para emocional/informacional, 0,92 para social afetivo, 0,96 para interação social e 0,89 para apoio material.
Escala de Motivação Acadêmica (EMA) (Vallerand et al., 1989, adaptada para o Brasil por Sobral, 2003). Ela é composta por 28 itens, divididos em subescalas que buscam mensurar os níveis de motivação para o estudo, por meio dos tipos de motivação que determinam o comportamento dos(as) graduandos(as): motivação intrínseca para conhecimento (MIC); motivação intrínseca para realização (MIR); motivação intrínseca para experimentar estímulos (MIEE); amotivação/desmotivação; e motivações extrínsecas, por identificação (MEID), por introjeção (MEIN) e por regulação externa (MERE). Sua chave de resposta se dá por uma escala do tipo Likert de sete pontos, que vão de “Nenhuma correspondência” a “Total correspondência” (Davoglio; Santos; Lettnin, 2016). Os coeficientes de precisão (alfa de Conbrach), no presente estudos, foram satisfatórios, a saber: MIC = 0,82; MIR = 0,88; MIEE = 0,84; MEID = 0,85; MEIN = 0,85; MERE = 0,84; e Desmotivação = 0,80.
Escalas de Identidade Profissional de Macleod Clark (EIP), adaptada da Macleod Clark Professional Identity Scale (Adams et al., 2006) por Rossi e Oliveira (2020). O instrumento busca investigar a identidade profissional dos(as) estudantes em seus primeiros anos de estudo, além de considerar as diferenças entre as áreas de estudo. Esse é um instrumento unifatorial, com seis itens, e a chave de resposta usa uma escala Likert de cinco pontos: 1 - não muito; 2 - um pouco; 3 - às vezes; 4 - muito; e 5 - sempre. A precisão no estudo de construção foi de 0,83 (alfa de Cronbach).
Questionário sociodemográfico (desenvolvido para esta pesquisa): composto por perguntas fechadas relativas à idade das participantes, tipo da instituição de ensino, área do curso, gênero, raça, modalidade de ingresso na Graduação, turno do curso estado civil, região, vínculo empregatício, quantidade de filhos, se recebe algum auxílio da instituição na qual estuda ou se recebe apoio financeiro da família, quem cuida do(s) filho(s) enquanto ela estuda, se precisou trancar a Graduação em algum momento e se a gravidez ocorreu depois do ingresso na Graduação. Ademais, por meio de uma escala tipo Likert de 10 pontos (1 - pouco a 10 - muito), também se investigou a satisfação das participantes com o seu rendimento acadêmico, o nível de suporte percebido para lidar com a maternidade vindo da família e de possíveis parceiros(as) e a responsabilidade que elas tinham quanto às atividades domésticas.
Procedimentos
A presente pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Instituto de Psicologia da Universidade Federal da Bahia - UFBA (CAAE: 55497022.3.0000.5686) e os(as) autores(as) atenderam à Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012 (Brasil, 2013), e à Resolução nº 510, de 7 de abril de 2016 (Brasil 2016), no que tange à ética em pesquisa. A coleta de dados se deu de forma virtual, utilizando a plataforma Google Forms, por meio da qual foram veiculados os instrumentos e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O questionário foi disseminado por meio de um link, divulgado em grupos do WhatsApp, páginas do Instagram e do Facebook e listas de e-mails de algumas IES, contando com a estratégia de divulgação de bola de neve. A participação na pesquisa ocorreu de maneira voluntária e anônima. Para submeter uma resposta ao questionário, as pessoas deveriam ter 18 anos ou mais, serem mulheres estudantes do Ensino Superior, com filhos(as) até os 17 anos de idade e estar de acordo com o TCLE. Esses crítérios foram explicados previamente no próprio formulário, e as participantes que não atenderam a tais requisitos tiveram suas respostas descartadas na fase de análise de dados. O questionário ficou disponível para resposta entre maio e novembro de 2022.
Análise de dados
Os dados foram analisados no software SPSS (versão 21). Foram aplicadas estatísticas descritivas como frequência, média e desvio-padrão para caracterização da amostra, além de testes de qui-quadrado para identificar prevalências entre categorias demográficas. A precisão dos instrumentos foi calculada por meio do alfa de Cronbach. O teste de normalidade foi verificado por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov (KS). A correção de ausência de normalidade em todas as análises foi realizada por meio da permutação aleatória de dados (botstraping) com 1.000 reamostragens. As comparações de média para estado civil, momento em que ocorreu a gravidez e a necessidade de interromper a Graduação após a descoberta da gravidez foram realizadas por meio do teste t de Student para amostras independentes. Para esta análise, a homogeneidade da variância foi analisada via teste de Levene e o tamanho de efeito verificado a partir do d de Cohen, sendo o valor do coeficiente interpretado a partir de Cohen (2013).
As comparações de média para satisfação com o suporte familiar, suporte recebido pelo pai da criança e grau de responsabilidade nas atividades domésticas foram realizadas a partir da Análise de Variância One-Way. A homogeneidade da variância foi analisada a partir do teste de Levene, sendo sua ausência corrigida por meio do teste de Welch. Os testes post hoc utilizados foram Tukey (para quando a homogeneidade foi acatada) e Games-Howell (quando a homogeneidade não foi acatada). O tamanho de efeito foi verificado a partir do eta-quadrado e os seus coeficientes interpretados com base em Cohen (2013). A correlação de Pearson foi utilizada para verificar a relação entre os construtos, e as magnitudes foram interpretadas com base nos critérios de Dancey e Reidy (2018).
Resultados
O teste de normalidade deu início à análise dos dados, não existindo uma distribuição normal para nenhum dos fatores das variáveis analisadas na pesquisa (motivação acadêmica, identidade profissional e apoio social). Na sequência, buscou-se analisar o nível de satisfação das estudantes com o suporte familiar, com o suporte do pai da criança, com o desempenho acadêmico, bem como o grau de responsabilidade nas tarefas domésticas e o quanto costumam pensar sobre o futuro profissional. Além das pontuações médias, as respostas foram recodificadas em três quartis no intuito de permitir verificar a distribuição das participantes nas variáveis, bem como identificar a prevalência entre as categorias. Os resultados são apresentados na Tabela 1.
Variável | M | DP | Classificação | n | χ² | p |
---|---|---|---|---|---|---|
Satisfação com o suporte familiar recebido | 6,12 | 3,32 | Baixa | 33 | 11,64 | 0,00 |
Média | 62 | |||||
Alta | 36 | |||||
Satisfação com o suporte recebido do pai da criança | 6,41 | 3,64 | Baixa | 34 | 6,51 | 0,03 |
Média | 57 | |||||
Alta | 40 | |||||
Satisfação com o rendimento acadêmico | 8,15 | 2,15 | Baixa | 37 | 3,17 | 0,20 |
Média | 41 | |||||
Alta | 53 | |||||
Grau de responsabilidade nas atividades domésticas | 5,69 | 2,28 | Baixo | 47 | 9,35 | 0,00 |
Médio | 28 | |||||
Alto | 56 |
Fonte: Elaborada pelos autores com dados da pesquisa.
Nota: M = média; DP = desvio-padrão; n = amostra; χ² = qui-quadrado; p = p-valor.
Os resultados indicam que as participantes apresentaram níveis médios de satisfação com o suporte recebido por familiares e do pai da criança, porém a análise das classificações indicou também uma maior prevalência de participantes medianamente satisfeitas com tais aspectos. De modo contrastante, as discentes apresentaram níveis altos de satisfação com o rendimento acadêmico; todavia, na análise de prevalência, não foram encontrados resultados significativos nas diferenças entre grupos. Por fim, apesar das participantes indicarem um nível médio na responsabilidade pela realização das tarefas domésticas, o qui-quadrado indicou prevalência significativa para a distribuição encontrada, com uma maior frequência para aquelas que são mais responsáveis pelas tarefas. Com base nos resultados de prevalência, foram realizadas comparações de médias nos fatores de motivação acadêmica, apoio social, identidade profissional em função da satisfação com o suporte familiar e com o suporte do pai da criança. Os resultados estatisticamente significativos são apresentados na Tabela 2.
Variável | F (gl) | Comparações múltiplas ente grupos | Diferença da média | Bootstrapping (95% IC BCa) | h2 | |||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Erro Std. | Inferior | Superior | ||||||
Satisfação com o suporte familiar | ||||||||
Desmotivação (EMA) | 3,55(2)* | Baixo | Médio | 2,63 | 1,23 | -0,29 | 5,56 | 0,05 |
Alto | 3,51* | 1,38 | 0,24 | 6,79 | ||||
Médio | Alto | 0,87 | 1,20 | -1,97 | 3,72 | |||
Apoio emocional | 14,45(2)** | Baixo | Médio | -7,15** | 1,83 | -11,50 | -2,80 | 0,18 |
Alto | -10,83** | 2,05 | -15,70 | -5,97 | ||||
Médio | Alto | -3,68 | 1,78 | -7,91 | 0,55 | |||
Apoio interação social | 13,67(2)** | Baixo | Médio | -3,24* | 0,97 | -5,54 | -0,94 | 0,17 |
Alto | -5,65* | 1,08 | -8,23 | -3,08 | ||||
Médio | Alto | -2,41* | 0,94 | -4,65 | -0,18 | |||
Apoio material | 24,58(2)** | Baixo | Médio | -2,32* | 0,85 | -4,35 | -0,31 | 0,27 |
Alto | -6,50** | 0,95 | -8,76 | -4,25 | ||||
Médio | Alto | -4,17** | 0,82 | -6,14 | -2,21 | |||
Apoio afetivoa | 9,62(2)** | Baixo | Médio | -2,06 | 0,85 | -4,13 | 0,00 | 0,13 |
Alto | -3,56* | 0,84 | -5,60 | -1,52 | ||||
Médio | Alto | -1,49* | 0,58 | -2,88 | -0,11 | |||
Satisfação com o suporte recebido do pai da criança | ||||||||
Regulação externaa (EMA) | 7,92(2)* | Baixo | Médio | 2,29* | 0,74 | 0,51 | 4,08 | 0,06 |
Alto | 3,51* | 1,16 | 0,71 | 6,32 | ||||
Médio | Alto | 1,22 | 1,27 | -1,83 | 4,28 | |||
Apoio emocional | 15,82(2) ** | Baixo | Médio | -3,86 | 1,82 | -8,20 | 0,47 | 0,19 |
Alto | -10,77* | 1,96 | -15,44 | -6,10 | ||||
Médio | Alto | -6,90* | 1,74 | -11,03 | -2,78 | |||
Apoio interação social | 16,38(2) ** | Baixo | Médio | -2,57* | 0,959 | -4,85 | -0,30 | 0,20 |
Alto | -5,85** | 1,03 | -8,30 | -3,41 | ||||
Médio | Alto | -3,28* | 0,912 | -5,44 | -1,12 | |||
Apoio material | 9,68(2) ** | Baixo | Médio | -1,72 | 0,93 | -3,95 | 0,49 | 0,13 |
Alto | -4,36* | 1,00 | -6,76 | -1,97 | ||||
Médio | Alto | -2,63* | 0,89 | -4,75 | -0,52 | |||
Apoio afetivo a | 16,95(2) ** | Baixo | Médio | -2,09* | 0,84 | -4,12 | -0,06 | 0,19 |
Alto | -4,22** | 0,80 | -6,17 | -2,28 | ||||
Médio | Alto | -2,12* | 0,54 | -3,43 | -0,83 |
Fonte: Elaborada pelos autores com dados da pesquisa.
Nota: EMA = Escala de Motivação Acadêmica; a = Teste de Welsh e post hoc Games-Howell; F = ANOVA test; gl = graus de liberdade = degrees of freedom; IC BCa = Intervalo de Confiança Tendência Corrigida e Acelerada; h2 = eta-quadrado; *p < 0.05; **p < 0.001.
Em relação à identidade profissional, não foram observados resultados com significância estatística. No que concerne às comparações em função do nível de satisfação com o suporte familiar, os resultados estatisticamente significativos indicaram diferenças entre os grupos com tamanhos de efeito variando de fracos a moderados. No fator desmotivação (EMA), observou-se que pessoas com baixa satisfação com o suporte familiar apresentaram maiores médias (M = 11,15; DP = 6,60) do que aquelas com maior satisfação (M = 7,64; DP = 5,38). Em sentido oposto, as comparações de apoio social indicaram que quanto maior a satisfação com o suporte familiar, maiores as médias em apoio social, de maneira que as maiores diferenças encontradas foram entre as participantes com alto e baixo nível de satisfação com o suporte familiar nos fatores emocional, interação social, material e afetivo.
A comparação em função da satisfação com o suporte recebido do pai da criança também gerou resultados similares. Por exemplo, a motivação extrínseca para regulação externa apontou que as estudantes com baixa satisfação com o suporte recebido do pai da criança, apresentaram maiores médias (M = 26,12; DP = 2,19) do que aquelas mais satisfeitas (M = 22,60; DP = 6,93). Por sua vez, nas comparações de suporte social, especificamente nos fatores de apoio emocional, interação social, material e afetivo, os resultados indicaram que aquelas mais satisfeitas com o suporte do pai da criança, apresentaram maiores médias que aquelas com baixa satisfação em todos os fatores apresentados.
Na sequência, foram analisadas diferenças nos construtos em função do grau de responsabilidade nas tarefas domésticas. Os resultados estatisticamente significativos são apresentados na Tabela 3.
Variável | F (df) | Comparações múltiplas ente grupos | Diferença da média | Bootstrapping (95% IC BCa) | h2 | |||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Erro Std. | Inferior | Superior | ||||||
Regulação externa (EMA) a | 3,37(2)* | Baixo | Médio | -0,71 | 1,42 | -4,15 | 2,73 | 0,05 |
Alto | -2,58* | 1,01 | -5,00 | -0,17 | ||||
Médio | Alto | -1,87 | 1,24 | -4,91 | 1,16 | |||
Apoio emocional | 9,60(2)* * | Baixo | Médio | -1,77 | 2,09 | -6,75 | 3,20 | 0,13 |
Alto | 6,01* | 1,73 | 1,89 | 10,14 | ||||
Médio | Alto | 7,78* | 2,03 | 2,96 | 12,61 | |||
Apoio interação social | 8,01(2) * | Baixo | Médio | -1,02 | 1,11 | -3,67 | 1,63 | 0,11 |
Alto | 2,83* | 0,92 | 0,64 | 5,03 | ||||
Médio | Alto | 3,85* | 1,08 | 1,29 | 6,42 | |||
Apoio material | 20,00(2) * | Baixo | Médio | 0,83 | 0,96 | -1,46 | 3,12 | 0,23 |
Alto | 4,79* | 0,80 | 2,89 | 6,70 | ||||
Médio | Alto | 3,96* | ,093 | 1,74 | 6,19 | |||
Apoio afetivo | 4,074(2) * | Baixo | Médio | -0,76 | 0,83 | -2,76 | 1,22 | 0,06 |
Alto | 1,39 | ,069 | -0,26 | 3,04 | ||||
Médio | Alto | 2,16* | 0,81 | 0,23 | 4,09 |
Fonte: Elaborada pelos autores com dados da pesquisa.
Nota: *p < 0.05; **p < 0.001.
Na comparação em função do grau de responsabilidades domésticas, as mulheres com alto grau de responsabilidade nas tarefas apresentaram maiores médias de motivação extrínseca para regulação externa (M = 25,38; DP = 3,83) do que aquelas menos atarefadas (M = 22,79; DP = 5,96). Já nos fatores de apoio social, observou-se que aquelas mais responsáveis pelas tarefas domésticas apresentaram menores médias de apoio emocional, interações sociais, material e afetivo do que as com baixa ou média responsabilidade. Na sequência, continuou-se a analisar possíveis diferenças das pontuações nos instrumentos em função de variáveis demográficas. As análises em função do período em que ocorreu a gravidez (antes ou após o início da Graduação) e da necessidade de interromper o curso com a descoberta da gravidez não geraram diferenças estatisticamente significativas entre os grupos. Por fim, a comparação em função do estado civil identificou diferenças significativas nas dimensões de apoio social, conforme apresentado na Tabela 4. A comparação foi realizada apenas entre as participantes solteiras e casadas, pois o grupo de divorciadas era muito pequeno.
Apoio social | Grupos | M (DP) | t | d |
---|---|---|---|---|
Emocional/Informacional | Solteiras | 14,08 (8,10) | 1,62** | 0,73 |
Casadas | 20,63 (9,62) | |||
Interação social | Solteiras | 8,19 (4,84) | 0,79** | 0,58 |
Casadas | 11,92 (4,09) | |||
Material | Solteiras | 7,63 (4,75) | 0,79** | 0,45 |
Casadas | 9,68 (4,31) | |||
Afetivo | Solteiras | 7,05 (3,76) | 0,59** | 0.81 |
Casadas | 9,72 (2,75) |
Fonte: Elaborada pelos autores com dados da pesquisa.
Nota: AS = apoio social; M = média; DP = desvio-padrão; d = d de Cohen; **p<0,001.
Os resultados indicam que as estudantes casadas apresentaram maiores níveis de apoio social, em todos os fatores analisados em comparação com as participantes solteiras. O tamanho de efeito das diferenças encontradas foi médio para os fatores emocional/informacional, interação social e material. De modo distinto, a diferença encontrada para o fator afetivo teve tamanho de efeito grande.
Posteriormente, foi realizada a correlação de Pearson entre os fatores da motivação acadêmica, do apoio social e a identidade profissional e os resultados são apresentados na Tabela 5.
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | 6 | 7 | 8 | 9 | 10 | 11 | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
1 | 1 | ||||||||||
2 | 0,42** | ||||||||||
3 | 0,41** | 0,79** | |||||||||
4 | 0,30** | 0,76** | 0,81** | ||||||||
5 | 0,31** | 0,65** | 0,54** | 0,49** | |||||||
6 | 0,27** | 0,54** | 0,75** | 0,62** | 0,38** | ||||||
7 | 0,15 | 0,29** | 0,26** | 0,16 | 0,57** | 0,31** | |||||
8 | -0,20* | -0,25** | -0,17* | -0,13 | -0,31** | -0,03 | 0,01 | ||||
9 | 0,13 | 0,15 | 0,06 | 0,06 | 0,01 | -0,02 | -0,08 | -0,20* | |||
10 | 0,11 | 0,09 | 0,03 | 0,05 | -0,03 | -0,06 | -0,04 | -0,23** | 0,71** | ||
11 | 0,11 | 0,15 | 0,03 | 0,06 | 0,05 | -0,04 | -0,05 | -0,19* | 0,58** | 0,56** | |
12 | 0,16 | 0,18* | 0,16 | 0,14 | 0,05 | 0,01 | 0,01 | -0,25** | 0,74** | 0,74** | 0,56** |
Fonte: Elaborada pelos autores com dados da pesquisa.
Nota: 1 - Identidade profissional; 2 - Motivação intrínseca para o conhecimento; 3 - Motivação intrínseca para realização; 4 - Motivação intrínseca para experiências estimulantes; 5 - Motivação extrínseca por identificação; 6 - Motivação extrínseca por introjeção; 7 - Motivação extrínseca por regulação externa; 8 - Desmotivação; 9 - Apoio social emocional; 10 - Apoio social interação social; 11 - Apoio social material; 12 - Apoio social afetivo. *p < 0.05; **p < 0.001.
Existiram correlações estatisticamente significativas que variavam entre magnitudes fracas e fortes. A identidade profissional apresentou correlações fracas e moderadas com todos os fatores da motivação acadêmica exceto a motivação extrínseca por regulação externa (MERE), e sua relação com a desmotivação foi negativa. A motivação intrínseca para o conhecimento (MIC) exprimiu uma correlação fraca com o apoio afetivo. Já a motivação extrínseca por regulação externa (MERE) apresentou correlação nula com a desmotivação, enquanto a motivação extrínseca por introjeção (MEIN) apresentou correlação nula com o apoio social afetivo. Todos os fatores do apoio social apresentaram correlações negativas e fracas com a desmotivação.
Discussão
O presente estudo teve como objetivo analisar as características da permanência e do progresso de universitárias grávidas ou com filhos(as) pequenos(as) na Graduação, viabilizando, assim, o entendimento mais aprofundado acerca das especificidades e das necessidades desse público em relação à OPC, por meio da compreensão de como essas universitárias lidam com a trajetória de carreira que estão construindo e como elas são afetadas pelas barreiras sociais que se impõem como dificultador da sua continuidade no ramo acadêmico, de modo a expandir e qualificar a atuação nessa área (Pereira; Santos; Silva, 2022; Ribeiro; Figueiredo; Almeida, 2021).
Nota-se que a cultura patriarcal exige da mulher a primazia sobre os cuidados maternos e domésticos (Pontes et al., 2022), o que não foi diferente do encontrado na presente amostra. Como forma de manutenção de um bom rendimento acadêmico, as mulheres mães buscam suporte e apoio de terceiros no cuidado com os(as) filhos(as) (Pereira; Santos; Silva, 2022); assim, a apresentação contínua de uma elevada satisfação com a carreira, na presente amostra, se faz coerente com o achado de média satisfação com o suporte recebido por seus familiares e pelo pai da criança, uma vez que as graduandas contam com esses terceiros para dar conta das demandas acadêmicas e da maternidade.
Nesse sentido, a presente pesquisa também verificou que, quanto mais satisfeitas essas universitárias estavam com o suporte familiar e do pai da criança, maiores eram as médias de apoio social em todos os seus fatores. Por conseguinte, quanto mais eram responsáveis pelas atividades domésticas, menos essas estudantes apontavam o recebimento de suporte social. Assim, há a probabilidade do apoio social, do suporte familiar e paterno serem variáveis significativas para que essas graduandas tenham uma maternagem segura e possam se dedicar de maneira satisfatória a seus estudos e carreira (Andrade et al., 2022). Além disso, as mulheres casadas apresentaram maiores níveis de apoio social, o que reitera a importância do(a) cônjuge na oferta de suporte social e desenvolvimento de carreira dessas mulheres (Scorsolini-Comin et al., 2016; Tronco et al., 2022).
Em termos de justiça social, é válido ressaltar também que o suporte social aparece na Teoria da Psicologia do Trabalhar (TPT) como um moderador do trabalho decente e, por conseguinte, da motivação (Blustein et al., 2019), sendo um importante amortecedor das restrições e marginalizações sofridas pelo sujeito (Pires; Ribeiro; Andrade, 2020). Reiterando essa relação, as universitárias da presente amostra apresentaram correlações entre o apoio social afetivo e a motivação intrínseca para o conhecimento (MIC). Estudos anteriores (Nunes; Pontes; Silva, 2020) também apontam a correlação entre o apoio social percebido e o envolvimento escolar, de modo que ele pode propiciar uma maior construção de recursos para o engajamento e a qualidade no processo de estudo dessas universitárias (Zanatta et al., 2021), além da possibilidade de guiar uma construção de carreira que busque alcançar a justiça social por meio do trabalho decente.
A presente pesquisa também evidenciou que a baixa satisfação com o suporte paterno e o alto grau de demandas domésticas se atrelaram com as maiores médias de motivação extrínseca por regulação externa (MERE). Tal achado pode ser um indicativo de que a aceitação das pressões e os estereótipos de gênero também contribuem para a anuência a imposições sociais em outros aspectos da vida dessas estudantes, como a sua carreira (Andrade et al., 2022). Observa-se que os esteriótipos de gênero são indicativos sociais de quais lugares esperam que homens e mulheres ocupem e criam, assim, barreiras para que mulheres se envolvam com outras atividades que não sejam as socialmente esperadas (Barros; Mourão, 2020), e a motivação extrínseca por regulação externa (MERE) está, justamente, atrelada à realização de atividades acadêmicas para o recebimento de recompensas sociais (Pavão; Borges; Voese, 2020) e a evitação de sanções, deixando de lado as vontades da pessoa e cedendo às pressões externas (Davoglio; Santos; Lettnin, 2016).
Isso posto, torna-se pertinente ressaltar que, na presente amostra, a motivação extrínseca por regulação externa (MERE) foi o único tipo de motivação que não apresentou uma correlação (seja ela moderada ou fraca) com a identidade profissional. Embora construto da identidade profissional apresente fortes relações com o meio social (Wang et al., 2020), o presente achado pode ser um indicativo de que, a despeito das influências e tensões externas, as atividades acadêmicas e profissionais não podem ser completamente alheias às crenças e aos desejos pessoais dessas universitárias, com o intuito de que essas tarefas contribuam para a construção da sua identidade profissional (Cruess; Cruess; Steinert, 2019), uma vez que esse construto auxilia na conquista de melhores resultados na carreira (Zuber; Oliveira, 2021).
Ademais, uma vez que tal construto se atrele às crenças e aos valores pessoais, propiciando uma vinculação com a comunidade profissional (Wang et al., 2020), torna-se coerente que as universitárias mães da presente amostra não tenham apresentado relações entre a identidade profissional e a satisfação com o suporte familiar e paterno, visto que esses laços familiares não apresentam relações diretas com o construto em questão (Cruess; Cruess; Steinert, 2019).
Contudo, a falta de associação entre a realização de demandas domésticas e a identidade profissional na presente amostra vai contra achados encontrados em pesquisas anteriores (Matsui et al., 2019), que apontam conflitos entre as identidades pessoais das mulheres mães, permeadas por construções sociais patriarcais de obrigações domésticas e a identidade profissional delas, que trazem exigências de dedicação e empenho quase que exclusivos. Nesse sentido, a motivação acadêmica e o apoio social podem ter funcionado como fatores protetivos contra esses conflitos para essas estudantes, uma vez que tais construtos funcionam, respectivamente, como um redutor de ansiedades acadêmicas (Iraola-Real; Matos; Gargurevich, 2022) e promotor de resiliência (Yıldırım; Çelik Tanrıverdi, 2021), impulsionando as crenças dessas mulheres de que podem desempenhar bem ambos os papéis de maneira satisfatória.
Por fim, é importante ressaltar que as universitárias mães da presente pesquisa apresentaram correlações negativas entre a desmotivação, o apoio social em todos os seus fatores e a identidade profissional. Além disso, quanto maiores eram os índices de desmotivação das mulheres da amostra, menos elas estavam satisfeitas com o suporte familiar recebido. Dessa forma, o apoio social, a identidade profissional e o suporte familiar despontam como fatores propulsores do engajamento dessas estudantes nas atividades acadêmicas, dificultando, assim, a sua evasão e o abandono do curso (Pavão; Borges; Voese, 2020), a despeito das barreiras sociais encontradas nos exercícios de uma maternagem e vida acadêmica seguras.
Considerações finais
Os achados da presente pesquisa indicam que o apoio social, o suporte familiar e paterno e uma divisão mais equânime das atividades domésticas se apresentam como fatores facilitadores para conciliação entre as demandas acadêmicas e da maternidade, de modo a propiciar uma construção de carreira mais segura para estudantes grávidas ou com filhos(as). Além disso, o apoio social e a identidade profissional também apareceram, na presente amostra, como possíveis fatores protetivos contra a desmotivação. Assim, políticas públicas que impulsionem o suporte social a essas mulheres e currículos universitários que favoreçam a formação de uma identidade profissional podem ser ações que facilitem a permanência dessas mulheres em seus cursos. Uma prática de OPC que se atente para esses eixos também se torna essencial para facilitar a compreensão das universitárias mães acerca de seus caminhos e escolhas de carreira. Intervenções que foquem, além do autoconhecimento, em barreiras de carreiras e estratégias de enfrentamento, além de atividades coletivas, que possam criar um sentimento de pertencimento e acolhimento a essas estudantes também podem tornar a prática de OPC mais efetiva com esse público.
Cumpre ressaltar que a relação entre apoio social e motivação acadêmica bem como as correlações entre motivação acadêmica e identidade profissional seguem o curso previsto pela TPT na conexão do suporte social e autodeterminação com o trabalho decente (Blustein et al., 2019). Assim, os achados desta pesquisa também aparecem como um indicativo da importância da construção de mecanismos sólidos para que essas graduandas tenham disponibilidade de vivenciar experiências práticas e seguras de socialização profissional e possam acolher traços das suas vidas pessoais durante suas experiências acadêmicas.
No entanto, é importante ressaltar que, apesar de suas contribuições para a compreensão da formação de carreira de universitárias grávidas ou com filhos(as) pequenos(as), o presente estudo apresentou algumas limitações que devem ser consideradas durante a sua leitura. O número da amostra foi pequeno e houve a predominância de estudantes de faculdades públicas, dificultando o acesso a diferentes realidades. A maioria das mulheres já eram mães, o que também dificultou a investigação da percepção dos construtos durante a gravidez. A maioria das estudantes da amostra não recebiam auxílio estudantil, o que impediu a compreensão de como o suporte institucional atinge a experiência das mulheres. Pesquisas futuras devem se atentar a essas lacunas, de modo a possibilitar uma compreensão mais completa desses fenômenos nessas mulheres.