A coletânea “Leituras sobre Martha Nussbaum e a Educação” (Fávero et al., 2021a), publicada pela editora CRV e organizada por Altair Alberto Fávero, Carina Tonieto, Evandro Consaltér e Junior Bufon Centenaro, tem como objetivo discutir a educação a partir do pensamento de Martha Nussbaum. A obra, composta por 18 capítulos, aborda o papel da educação para o fortalecimento da democracia, para o desenvolvimento humano, para a promoção das capacidades humanas e da justiça social global.
O primeiro capítulo, intitulado “Políticas públicas e a efetivação das capacidades humanas: o papel central da educação”, de autoria dos organizadores da coletânea, apresenta o enfoque das capacidades de Nussbaum como uma potente perspectiva para fundamentar as políticas públicas de educação orientadas para o desenvolvimento humano (Fávero et al., 2021b).
No capítulo, “El revés de la cultura: el desvelo de las capacidades humanas y género”, López e Roman (2021) discutem o pensamento e as contribuições de Nussbaum sobre seu espírito de justiça, desenvolvimento humano quanto à possibilidade de “focar no que as pessoas realmente são capazes de fazer e ser”, a dignidade e o conceito de liberdade, não só de gênero, mas das pessoas com deficiência e até da vida dos animais.
Constituindo o terceiro capítulo da coletânea, o texto “Enfoque do desenvolvimento humano na construção de políticas educacionais com foco nas capacidades”, de Fávero et al. (2021c), debate em que sentido o enfoque teórico do desenvolvimento humano pode ampliar o conjunto informacional para a tomada de decisões e a construção de políticas educacionais centradas nas capacidades humanas.
O capítulo “A abordagem das capacitações (capabilities) e a educação para a liberdade”, escrito por Zambam e Martinelli (2021), elucida que a ampliação das capacitações (capabilities) por meio da educação possui um significado simbólico, potencial e efetivo de inclusão das pessoas nos espaços de participação e decisão de forma progressiva. Aborda a temática a partir das pesquisas empíricas de Amartya Sen e Martha Nussbaum, descrevendo que a superação das desigualdades e injustiças se encontra na ampliação das capacitações, por meio do acesso à educação como referencial seguro e duradouro.
De Fávero et al. (2021d), o capítulo “Direitos fundamentais e a justiça: a dimensão ética e política da teoria das capacidades” objetiva compreender como se articulam os direitos fundamentais com o princípio da justiça social. Para os autores, desenvolver o trabalho a partir das capacidades proporciona uma ordenação correta dos resultados alcançados em matéria de desenvolvimento, pois oferece bases teóricas e práticas para as políticas públicas e orienta para uma educação para a dignidade humana e o exercício dos direitos.
O sexto capítulo, “A educação democrática em Nussbaum e a educação libertadora em Freire: relações e aproximações”, de Pinheiro e Sartori (2021), articula os olhares sobre a educação democrática e a educação libertadora, compreendendo que a abordagem crítica que perpassa as ideias fundamentadas por Nussbaum e Freire fortalece a indignação e o inconformismo pelo desprestígio da área das humanidades.
Intitulado “A função política da palavra para a formação do sujeito no mundo na visão de Nussbaum e Freire”, o sétimo capítulo, de Silveira et al. (2021), debate a função política do uso da palavra como mediadora para a leitura do mundo em tempos em que o contexto social perpassa por distintas transformações e evidencia a relevância da escola e dos atores educacionais para a formação humana.
Na sequência, o oitavo capítulo, “Interculturalidade e cidadania universal: o papel imprescindível das humanidades na perspectiva de Nussbaum”, de Fávero et al. (2021e), analisa o papel imprescindível das humanidades como pavimentação para a constituição de uma educação intercultural e a promoção de uma cidadania universal. Além disso, também debate a importância das humanidades enquanto preceptoras da cidadania universal, ou ainda, do cidadão do mundo no cenário contemporâneo.
O capítulo “Emoções, vulnerabilidade e educação para um ethos democrático em Martha Nussbaum” escrito por Cenci et al. (2021), discute uma adequada educação das emoções voltada para a constituição de um ethos democrático que precisa considerar a problemática da vulnerabilidade humana. Os autores abordam a teoria das emoções de Nussbaum visando problematizar a necessidade de bem orientar emoções como repugnância e a vergonha primitiva para dar conta da educação voltada para o ethos democrático.
O décimo capítulo, “Educação das emoções e formação humana: a imaginação narrativa na perspectiva de Nussbaum”, é assinado por Fávero et al. (2021f) e analisa de que forma a educação das emoções e a imaginação narrativa podem se tornar potencialmente produtivas para construir uma concepção alargada de formação humana.
De autoria de Leite et al. (2021), o décimo primeiro capítulo, “Mulheres e educação: contribuições de Martha Nussbaum e as práticas escolares no Brasil”, realiza um debate sobre as relações desiguais entre homens e mulheres, bem como a formação educativa voltada às mulheres e ao seu papel potencializador dos processos de emancipação feminina.
O capítulo seguinte, “Justiça, democracia e humanidades: reflexões para o ensino superior”, de Copatti et al. (2021), discute como a mesma lógica identificada por Nussbaum em distintos países é reproduzida no contexto brasileiro. O texto enfatiza os currículos nas universidades, os tipos de pesquisa que passam a ser priorizadas para o desenvolvimento econômico e as implicações do empobrecimento do ensino das humanidades no desenvolvimento humano.
Intitulado “Docência na educação superior e as capacidades humanas em Nussbaum: para além da profissionalização e do pragmatismo economicista”, o décimo terceiro capítulo é assinado por Pagliarin et al. (2021). As autoras discutem os desafios da docência na Educação Superior no sentido de promover uma formação humana que preserve os princípios democráticos e de cidadania. Para tal, utilizam como referencial autores que pesquisam o contexto da Educação Superior e da crise global, especialmente relacionados ao conceito basilar da teoria das capacidades defendida por Nussbaum.
O décimo quarto capítulo, “O pensamento de Martha Nussbaum na pesquisa Educacional Brasileira: revisando teses e dissertações”, de Centenaro e Santos (2021), apresenta um panorama da forma como a teoria de Nussbaum vem sendo adotada na pesquisa educacional brasileira. Os autores apontam que Nussbaum tem se destacado internacionalmente por suas pesquisas e escritos sobre desenvolvimento humano, direitos das mulheres, abordagem das capacidades humanas, humanidades e qualidade da democracia, entre outros temas de filosofia e de ciências sociais.
Com o título “A produção de conhecimento voltado para o mercado e a crise das humanidades: uma análise da Portaria MCTIC n. 1.122 a partir de Martha Nussbaum”, o capítulo de Bechi et al. (2021) aponta os problemas e consequências do baixo investimento nas áreas de pesquisa das humanidades a partir de Nussbaum. Os autores trazem a análise da Portaria articulada aos problemas levantados por Nussbaum referentes às fontes de financiamento para as humanidades.
Por sua vez, o décimo sexto capítulo, “A meritocracia que reforça a desigualdade: crítica às ‘medições’ em Educação à luz da Teoria das Capacidades” é escrito por Fávero et al. (2021g), que discutem de que forma a ideia de meritocracia na educação reforça a desigualdade e evidenciam, com base na ideia de medição enquanto obstáculo epistemológico, como ela pode reduzir avaliações que utilizam um único dado mensurável que, em tese, deveriam ser profundamente discutidas e analisadas a fim de contemplar todas as esferas da vida.
O capítulo “Algumas indicações de convergências e divergências nos conceitos de formação humana entre as tradições da paideia, da bildung e os desafios da atualidade em Martha Nussbaum” é escrito por Rocha e Madaloz (2021) e aponta que a educação, juntamente com seus processos formativos e objetivos pretendidos, é fonte de debates no mundo todo. Para os autores, um grande problema educacional na contemporaneidade é conciliar as exigências da especialização, cada vez mais requerida, com a necessidade de uma formação humana mais ampla.
Por fim, o último capítulo, “A filosofia e a pedagogia socrática como princípio educativo para o fortalecimento de capacidades humanas”, de autoria de Fávero et al. (2021h), problematiza os perigos de um currículo possuidor de uma racionalidade lucrativa e instrumentalizadora da formação das capacidades humanas. Também indica a filosofia e a pedagogia socráticas como princípios educativos capazes de promover o fortalecimento das liberdades, entre elas, a de pensamento.
De modo geral, a coletânea problematiza temáticas atuais e importantes para serem debatidas no âmbito educacional. O conjunto de capítulos apoiados na leitura de Martha Nussbaum apresenta a educação como base fundamental para a formação de uma sociedade democrática, autônoma e livre. Mostra o papel das humanidades no desafio de tornar os sujeitos críticos, reflexivos e cidadãos do mundo, através de uma perspectiva de educação para a sensibilidade e com a capacidade de compreensão das diferenças. Dessa forma, recomendamos essa coletânea para todas as pessoas que lutam por uma educação humanizadora, de qualidade e acessível a todos.