Introdução
O Brasil, tradicionalmente um país jovem, também tem sofrido alterações demográficas significativas, que induzem ao aumento do número de idosos em relação a outras faixas etárias. O país vivenciou o aumento de 4,8 milhões de idosos em cinco anos, o que corresponde a um crescimento de 18% desse grupo etário. As mulheres são maioria expressiva nesse grupo, com 16,9 milhões (56% dos idosos), enquanto os idosos do sexo masculino são 13,3 milhões (44% do grupo) (Paradella; Barroso, 2018). Conforme projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), um em cada quatro brasileiros terá 65 anos ou mais em 2060 (Projeção…, 2018), mais precisamente 25,5% do total da população, e essa tendência de envelhecimento da população vai fazer com que o país tenha mais pessoas idosas do que crianças a partir de 2039 (Villas Bôas, 2018).
Importante recordar que a forma como a sociedade percebe o processo de envelhecimento é singular em cada cultura. Imagens negativas de envelhecimento são incutidas na sociedade por meio da linguagem, religião, literatura, mídia e práticas das instituições médicas e de serviços sociais (Wilson; Parker; Kan, 2007).
As diferenças no processo de envelhecimento também possuem características ocupacionais e organizacionais. Este estudo busca tratar especialmente dessa questão no ambiente universitário e na carreira acadêmica. No Brasil, tal carreira é marcada majoritariamente pelo ensino, como atividade precípua. Contudo, é importante recordar que a estrutura da carreira docente do magistério superior, notadamente nas instituições de ensino superior (IES) públicas, privilegia a pesquisa, o ensino de pós-graduação e a orientação, o que amplia o escopo de responsabilidades dos professores, principalmente os ligados a Programas de Pós-graduação. Melo e Serva (2014) indicam que um professor, ao longo da carreira, à medida que vai se tornando mais conhecido por seu trabalho, vai recebendo um nível de demanda muito alto, impactado pelo capital científico. Diferente de outras profissões, que permitem ao idoso a seleção e a redução de atividades ao longo da carreira – por exemplo, Morato e Ferreira (2020) –, os docentes, à medida que concluem o doutorado e se inserem na pós-graduação e na pesquisa, acumulam mais atividades. Reconhece-se, contudo, que há um outro lado decorrente do ingresso na pós-graduação: ele representa, em si, um espaço de poder e de reconhecimento social, permitindo, por exemplo, maior acesso a financiamento.
Em um contexto produtivista, tal inserção, além de trazer maiores responsabilidades, traz maiores cobranças e situações de preconceito, notadamente com professores mais velhos. Tais situações são marcadas pelo ageísmo1 – crenças, atitudes, suposições e estereótipos negativos sobre a idade –, usado para apoiar, implícita e explicitamente, comportamentos discriminatórios que marginalizam os adultos mais velhos (Palmore, Branch; Harris, 2005).
Para Palmore (1999), o ageísmo traduz um preconceito ou forma de discriminação, contra ou a favor de um grupo etário. Adultos mais velhos enfrentam estigma de idade na forma de qualquer preconceito de idade benevolente ou hostil (Chasteen; Cary, 2014). A ambiguidade de sentimentos, em relação ao idoso, gera sentimentos paternalistas, à princípio, positivos, por incutirem o cuidado; ao mesmo tempo, caracterizam o idoso como incapaz ou inútil.
Importante recordar que, tendo a idade como base, o ageísmo pode manifestar-se tanto em relação a jovens, quanto a idosos. A discriminação de idade pode ser definida como as decisões prejudiciais que são baseadas em idade, em vez de se basearem em competências ou capacidades individuais (Arrowsmith; McGoldrick, 1997). A UNECE (2019) expõe que o ageísmo é implícito, subconsciente e incontestado nas sociedades atuais e decorre da percepção de que uma pessoa pode ser velha demais ou jovem demais para fazer algo.
Em relação aos mais velhos, na carreira docente, essa discriminação está associada à própria representação social do envelhecimento. Em um estudo com professores universitários, Nascimento et al. (2016) apontam que o preconceito em relação à idade, para os entrevistados, é reflexo das mudanças ocorridas nas relações do indivíduo e da sociedade, promovidas pelas transformações verificadas no campo da tecnologia, da economia, da cultura e do trabalho. Os autores verificaram a existência do preconceito em relação à idade do professor com 60 anos ou mais. Contudo, observou-se “[…] que as debilidades decorrentes do avanço da idade, que por vezes o torna marginalizado, não o impede de continuar a exercer suas atividades no trabalho” (Nascimento et al., 2016).
Com vistas a contribuir com esse debate, notadamente no ambiente acadêmico, este artigo objetiva analisar o ageísmo entre docentes da Universidade Federal do Piauí. Para tanto, foi aplicada a Escala de Ageísmo no Contexto Organizacional, junto aos docentes, cujos resultados foram analisados de modo multivariado (Analise Fatorial Exploratória e regressão linear múltipla), com intuito de identificar os fatores predominantes do ageísmo na universidade.
Envelhecimento e Carreira Docente
Em novembro de 2021, segundo dados do Painel Estatístico de Pessoal do Ministério da Economia (Brasil, 2021), apenas 0,88% dos docentes efetivos do magistério superior no serviço público federal possuíam até 30 anos, enquanto, no quadro geral de servidores, esse valor é de 3,88%. O baixo ingresso de jovens na carreira pode ser explicado, em parte, pela exigência de titulação de doutorado na maioria dos ingressos à carreira através dos concursos públicos.
Regularmente, o acadêmico tende a cursar a graduação por 4 anos, mestrado em até 2 anos, e o doutorado em até 4 anos, o que totalizaria em torno de 10 anos de processo de formação para ingresso na carreira como doutor, após a conclusão do ensino médio. Alunos que não possuem registros formais de trabalho antes do ingresso na carreira docente, mesmo os financiados por bolsas de pesquisa, ingressam na carreira de forma tardia, o que os força, diante de novas regras previdenciárias, a permanecer por mais tempo na instituição até cumprirem os requisitos mínimos de aposentadoria.
Importante recordar que o sentido do trabalho para o professor idoso reflete diretamente o seu bem-estar físico, mental e emocional, tendo em vista que permite que se mantenha produtivo perante a família e a sociedade, além da possibilidade de realização profissional, de inclusão social e de prover sua liberdade de autonomia (Nascimento et al., 2016). A permanência no trabalho, portanto, absorve aspectos relacionados ao trabalho e, ainda, elementos pessoais que se distanciam da sala de aula.
Silva, Pletsh e Biavatti (2015) observaram que os principais motivos para a permanência de docentes na graduação eram, entre outros, amor pela carreira, ensino e pesquisa; relacionamento interpessoal; plano de carreira; satisfação pessoal e profissional; atividade em uma universidade; e finanças. Para Amaral e Torres (2017), a continuidade no trabalho estaria vinculada a condições materiais da aposentadoria influenciadas por políticas econômicas e sociais e por fatores internos, como identificação e condições de trabalho, autonomia e liberdade, pressão e disputas internas, e apoio familiar.
Essa permanência no trabalho e na carreira docente não chega, contudo, sem custo ao professor. Nascimento et al. (2016) destacam, por exemplo, a existência de preconceito em relação à idade do professor sexagenário e as debilidades decorrentes do avanço da idade que, mesmo que ainda permitam a continuidade de suas atividades, podem torná-lo marginalizado. Docentes no ápice da carreira ainda devem cumprir carga horária exigida por regulamentação interna de sua IES, tabulada em um número mínimo de disciplinas, orientações, publicações e pesquisas. A vinculação à pós-graduação é impulsionada pela própria estrutura da carreira, e a participação em outras competências acadêmicas como gestão e extensão também são pontuados no momento de atingir o ápice da carreira: professor titular. Os gestores universitários em todo o mundo permitem que as pessoas se especializem em áreas nas quais sejam mais competentes, mas a maioria dos docentes ainda é obrigada a realizar todas as áreas de trabalho acadêmico (Hotchings; Wilkinson; Brewster, 2020).
Discutindo a Carreira e Atividade Docente no Brasil
Segundo dados do Perfil Estatístico de Pessoal (Brasil, 2021), de novembro de 2021, o Executivo Federal possui 605.055 servidores ativos, 439.033 aposentados e 242.114 pensionistas, respectivamente 47,04%, 34,13% e 18,82%, do total do quadro do Executivo. Dos servidores ativos, o Ministério da Educação (MEC) é o que possui maior quadro, 293.873 servidores, ou 48,57% do total de quadro do Executivo Federal (Brasil, 2021). Dentro do quadro de servidores do MEC, Professor do Magistério Superior é o cargo mais significativo, perfazendo um total de 86.060 servidores públicos.
Os docentes do Ensino Básico Técnico e Tecnológico, ligados aos Institutos Federais de Ensino e aos Colégios Técnicos, surgem como a quarta categoria mais significativa no MEC, com um total de 44.241 docentes. Considerando ambas as carreiras, somam-se 130.301 docentes no serviço público federal, o que significa um total de 21,54% de todos os servidores públicos na ativa.
Os docentes acima de 51 anos de idade totalizam 37,26% do quadro geral de docentes, enquanto que os docentes até 30 anos refletem apenas 0,88%. Isso demonstra a tendência de envelhecimento dos ativos da carreira para os próximos anos e a necessidade de políticas de gestão voltadas ao docente envelhecente (Brasil, 2021).
Silva e Costa (2014) definem docente como o sujeito que exerce atividades de ensino (necessariamente), pesquisa, extensão e desenvolvimento institucional. Entre as principais atividades do professor, destacam-se as seguintes: ministrar aulas, preparar material, elaborar sistemática de avaliação, corrigir atividades, orientar e atender alunos (Melo; Serva, 2014), ministrar aulas na graduação e pós-graduação, fazer orientações de mestrado, doutorado e iniciação científica, extensão, supervisionar estágios, participar de comissões e produção bibliográfica (Bernardo, 2014). Apesar da visão de que cabe ao professor apenas a tarefa de “dar aulas”, o ambiente universitário o preenche de outras atribuições, várias delas sem qualquer relação com sua formação; como, por exemplo, responsabilidades administrativas e de representação.
A pesquisa se destaca nas atividades docentes, principalmente à medida que o docente evolui na carreira e se insere na pós-graduação. A pesquisa, segundo Sleutjes (1999), é o aprofundamento do conhecimento já existente, nascido da busca por soluções e pelo novo, do gosto pela investigação e pela descoberta, e é um excelente exercício de maturidade científico-sociocultural. Silva e Costa (2014) destacam que o foco na competência para pesquisa é consequência do processo regulatório de avaliação que valoriza a produção intelectual e de projetos de pesquisa.
A inserção e permanência do professor na pós-graduação, no Brasil, força uma nova forma de atuação docente, menos envolvida com graduação e extensão, e mais voltada à produção acadêmica, alimentada pelos próprios órgãos gestores de pesquisa e inovação científica no país. Andrade, Cassundé e Barbosa (2019) reforçam que, em virtude da valorização da pesquisa e dos artigos, outras atividades ficam prejudicadas, como extensão e publicação de livros. Ainda nesse contexto, Sguissardi (2009) indica que o formato de financiamento de pesquisas vinculadas à pós-graduação sujeita-se à avaliação periódica tanto para penalidades quanto para distribuição de bolsas ou outros valores de auxílio. Isso força a permanência na pós-graduação e em relação à pesquisa, independentemente da idade, a se sujeitar a padrões de atividade laboral que tendem a aumentar à medida em que a concorrência por tais recursos se amplia e a oferta de recursos é mais escassa.
Ageísmo
O termo ageísmo, ou preconceito de idade, foi concebido por Butler (1969) como um processo de estereotipar sistematicamente e discriminar pessoas por meio da idade, afetando as decisões de contratar pessoas, os cuidados médicos e a política social (França et al., 2017). Assim como outros tipos de preconceito, pode dar-se de forma velada e discreta, mas também pode ocorrer de forma sistêmica.
A sociedade tem ficado mais sensível a diversos temas atrelados à diversidade e à inclusão, o que tem gerado discussões, inclusive políticas, em relação à discriminação e à violência contra minorias. Apesar dessa tendência, não se percebe o movimento significativo quanto à consciência em relação à idade, na Educação, mais especificamente em relação aos idosos. Importa destacar que há um debate para além da educação, que reconhece essa questão como importante – por exemplo, Ayalon e Tesch-Römer (2018).
Palmore (2001) indica que, no ocidente, o ageísmo é a terceira forma de discriminação mais comum, após o racismo e o sexismo.
Robert Butler (1969) cunhou o termo ageísmo como uma forma de discriminação e intolerância relacionada à idade. Palmore (2004) definiu o termo como forte preconceito e discriminação contra pessoas idosas. O conceito original de ageísmo se modificou com o tempo e ampliou seu entendimento para algo que não apenas é direcionado às pessoas idosas, pois, segundo Butler (1969), ele envolve o preconceito a qualquer sujeito em função de sua idade, sejam crianças, adolescentes, jovens, adultos ou idosos. Angus e Reeve (2006) o definiram como o preconceito ou discriminação contra ou a favor de qualquer faixa etária.
O ageísmo pode se manifestar em comportamentos positivos e negativos diante do idoso, predominando os negativos, que são relacionados a estereótipo, preconceito, segregação social, discriminação e conflitos de gerações. Loth e Silveira (2014) apontam como estereótipos positivos o conhecimento amplo, maior experiência, respeitabilidade, sensatez, ponderação, maturidade, energia remanescente, autocrítica e credibilidade. Apesar das características positivas encontradas nos estudos citados, Cary, Chasteen e Remedios (2017) enfatizam que comportamentos e atitudes paternalistas que parecem benignas, e talvez até mesmo úteis, estão associadas a uma série de resultados negativos.
Não há consenso quanto à relação entre escolaridade e discriminação por idade, pois há estudos que não relatam relações significativas (Rippon; Zaninotto; Steptoe, 2015; Ayalon; Gum, 2011; Kessler; Mickelson; Williams, 1999; Luo; Granberg; Wentworth, 2012), enquanto há outros que associam positivamente as duas variáveis (Gee, 2002; Van dem Heuvel; Van Santvoort, 2011). No estudo de Rippon, Zaninotto e Steptoe (2015), na comparação entre Inglaterra e EUA, houve associação entre educação e discriminação por idade na Inglaterra, e não foi encontrada relação nos EUA.
De todo modo, Loth e Silveira (2014) alertam sobre a pluralidade de causas do ageísmo, o qual não pode ser dissociado de outras formas de preconceito que, quando associadas, produzem nova intensidade de discriminação. Essa mescla de fatores dispersos na sociedade se acumulam nos ambientes organizacionais, ampliados ainda pela pressão por produtividade, metas e políticas de gestão pouco definidas.
Ageísmo no Ambiente de Trabalho
O ageísmo está presente nos mais diversos países e das mais diferentes maneiras, o que inclui as organizações. Segundo o Instituto Ethos (ETHOS; IBOPE, 2010), há uma correlação positiva entre idade e altos níveis hierárquicos nas 500 maiores empresas do Brasil. Ou seja, nas grandes empresas, é comum os níveis mais altos serem ocupados por pessoas mais velhas, e isso sugere resistência por parte dos mais jovens quanto à essa condição, ainda mais quando a consequência direta disso é que a remuneração dos sujeitos mais velhos tende também a ser maior. Duncan e Loretto (2004) avaliaram a discriminação entre grupos etários e identificaram que os jovens se sentiram discriminados nos salários e nas condições de trabalho com mais frequência do que os entrevistados mais velhos, que apontaram oportunidades de treinamento reduzidas. O aumento da população idosa e sua maior ocupação trazem consequências diretas para as empresas, ainda pouco investigadas (Loth; Silveira, 2014).
North e Fiske (2013) sugerem que o preconceito de idade no ambiente de trabalho é predominantemente dos jovens. Há ainda o preconceito do idoso em relação a si mesmo, e ao seu grupo etário. Loth e Silveira (2014) concluíram que, por mais que o envelhecente relate que não compactua ou realiza práticas discriminatórias direcionadas às pessoas mais velhas, ao compartilhar certos estereótipos sobre velhice e envelhecimento, está contribuindo para perpetuar o ageísmo. De outra parte, há estudos que apontam que “[…] chefes mais velhos não entendem o jeito que quem é mais novo trabalha e não conseguem ajudar a pessoa a se desenvolver da melhor maneira” (Beltramini, Cepellos; Pereira, 2020).
Os estereótipos simplificam processos cognitivos, ajudam a lidar com a complexidade e permitem interpretar e agir mais rapidamente, sobretudo se a informação sobre um trabalhador é ambígua (Pinto, 2015). Voss, Bodner e Rothermund (2018) discutiram que a existência em si dos estereótipos não implica sua ativação prática a todos e nem em toda situação, pois há associações de pessoas e situações que não induziriam a comportamentos negativos. O tipo de mentalidade (Sassenberg; Moskowitz, 2005) e os objetivos comuns (Moskowitz et al., 1999) funcionariam, por exemplo, como inibidores dos estereótipos negativos.
Mesmo quando um candidato destaca características e habilidades valorizadas positivamente, se tal candidato invocar estereótipos de velhice, é possível que se criem crenças implícitas de que o candidato seja “mais velho” do que os outros, e isso pode colocá-lo em desvantagem diante de candidatos estereotipados como jovens (Abrams; Swift; Drury, 2016). Esse entendimento se deve a outros aspectos, como iniciativa, força, disposição e vigor, que possam influenciar positivamente no desempenho produtivo. Na força de trabalho, os problemas de contratação, promoção e aposentadoria compulsória de trabalhadores mais velhos resultam no envelhecimento institucionalizado (Butler, 1980). De fato, a expectativa de que os idosos tenham déficits cognitivos e físicos pode debilitar o idoso em termos de auto-estima e desempenho (Nelson, 2005). Ou seja, a concretização de uma expectativa negativa se dá não em razão de fatores concretos previsíveis, mas da queda de moral por parte do funcionário mais velho.
Há estudos que apontam particularidades no processo de envelhecimento docente. Dambros (2019), em um estudo qualitativo sobre a influência da identidade profissional no processo de envelhecimento docente, sob o olhar da biopolítica, indica a necessidade de instituições de ensino superior terem claras as políticas referentes ao encerramento da carreira docente, serem transparentes quanto a essas definições, e reformularem os programas de preparação para a saída da instituição. A autora considera que há especificidades nesses profissionais que os diferenciam dos demais. Tais questões, ligadas ao próprio trabalho intelectual, e à relação permanente e intensa com os alunos e com o conhecimento, influenciaram a qualidade do processo de envelhecimento docente.
Percurso Metodológico
Trata-se de uma pesquisa de natureza aplicada, exploratória e descritiva, cujos dados foram analisados de modo quantitativo.
Os dados da pesquisa foram coletados por meio da aplicação da Escala de Ageísmo no Contexto Organizacional (EACO), validada por França et al. (2017), que é o único instrumento validado no qual o ageísmo é analisado no contexto organizacional. Optou-se por focar nos docentes da Universidade Federal do Piauí por questão de acessibilidade e ainda por compreender que os resultados da investigação podem ser extrapolados para outras IES do serviço público federal, e ainda para outros órgãos que possuam características de pessoal semelhante.
No questionário enviado eletronicamente, além das questões específicas da EACO, foram adicionadas questões sobre o perfil pessoal: sexo, data de nascimento e estado civil; sobre dados funcionais: centro/campus de lotação, curso de lotação, regime de trabalho, nível funcional e abono de permanência; e sobre dados laborais: membro de programa de pós-graduação, membro permanente ou colaborador, quantidade de programas com vínculo, curso com vínculo principal; além de uma pergunta aberta ao final para críticas, sugestões ou qualquer espécie de observação.
Para caracterização e delineamento da população, foram utilizados dados do Painel Estatístico de Pessoal (PEP), do Ministério da Economia, de agosto/2020, no qual foram identificados 1562 docentes, incluídos efetivos e visitantes (Brasil, 2021). O cálculo amostral pela proporção na população finita, com nível de confiança de 95%, margem de erro de 5%, concluiu pela necessidade de uma amostra de 265,44 (266) respondentes.
Em virtude da pandemia da covid-19 e do regime de trabalho remoto da instituição, optou-se por construir e distribuir o formulário eletronicamente via Google Forms. Inicialmente, foi realizado um pré-teste em janeiro/2021, com alguns servidores, tanto para avaliar o entendimento sobre o Termo de Livre Consentimento, quanto para mensurar o entendimento das questões. O resultado do pré-teste apontou ajustes necessários no Termo de Livre Consentimento, que precisou ser reduzido e ainda adaptado para a realidade atual de impossibilidade de troca física de documentos assinados e adequação do sentido de algumas frases do instrumento, particularmente quanto aos perfis pessoais e funcionais.
Para distribuição dos questionários foram solicitados os e-mails dos docentes junto à Unidade de Gestão de Pessoas da Universidade. Foram disponibilizados 720 e-mails em 08/02/2021, já que há servidores que não possuem e-mail registrado no Sistema integrado de Administração de Recursos Humanos (SIAPE), e há docentes que possuem e-mails pessoais cadastrados, que não podem ser informados; portanto, foram disponibilizados apenas os e-mails institucionais. Os questionários foram enviados em duas etapas, uma por e-mail, e outra por WhatsApp.
Ao todo, foram enviados e não devolvidos 694 e-mails, entre os dias 09/02/2021 e 16/02/2021, dos quais se obtiveram 33 questionários respondidos, gerando um índice de resposta de 4,76%. Entre os dias 18/02/2021 e 22/02/2021, o link do formulário da EACO foi enviado por WhatsApp. Foram enviadas 288 mensagens eletrônicas, e alguns docentes ainda replicaram tais mensagens para outros colegas de trabalho próximos. No total, após as duas etapas, 319 questionários foram respondidos.
Sobre as respostas, inicialmente foi feita a eliminação de questionários respondidos em duplicidade e com questões sem resposta, resultando em 295 questionários válidos.
Foi realizada uma análise descritiva, através do Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 27, e Análise Fatorial Exploratória, para verificar os fatores extraídos para explicar o fenômeno.
Foram realizadas ainda regressão múltipla para identificar variáveis pessoais, funcionais e laborais que explicassem os respectivos fatores gerados. Nas regressões múltiplas com todas as variáveis independentes ao mesmo tempo, utilizou-se o método stepwise, que segundo Hair et al. (2009), considera a inclusão de cada variável antes do desenvolvimento da equação e seleciona apenas as relações mais fortes dentro do conjunto de dados.
Análise dos Dados
A primeira fase de análise dos dados é descritiva, na qual serão delineados os perfis dos respondentes, em comparação à população de docentes da universidade. Os resultados indicaram o seguinte:
Indicador descritivo | População (%) | Amostra (%) | |
---|---|---|---|
Sexo | Feminino | 48,3 | 45 |
Masculino | 51,7 | 54 | |
Faixa etária | Até 44 anos | 51,2 | 46,4 |
45 a 59 anos | 32,9 | 37,6 | |
Acima de 60 anos | 15,7 | 15,9 | |
Regime de trabalho | 20 horas | 6,9 | 1,7 |
40 horas | 6,7 | 8,1 | |
Pós-graduação | Dedicação Exclusiva | 86,3 | 90,2 |
Membro de Pós | 29,51 | 39,3 |
Fonte: Elaborado pelos próprios autores, com base nas informações do Painel Estatístico de Pessoal (Brasil, 2021) e SPSS.
Quanto a serem membros permanentes ou colaboradores de programas de pós-graduação, a amostra possui 39,3% de membros permanentes e 12,5% de membros colaboradores, podendo ter sujeitos coincidentes nas duas tabelas. Na população estudada, 29,5% dos docentes possuem vínculo com programas de pós-graduação, portanto, a amostra possui percentuais semelhantes ao da população estudada.
Não | Sim | |||
---|---|---|---|---|
Frequência | Percentual | Frequência | Percentual | |
Membro Permanente de Programa | 179 | 60,7 | 116 | 393 |
Membro Colaborador de Programa | 258 | 87,5 | 37 | 125 |
Recebe Abono de permanência | 261 | 88,5 | 34 | 11,5 |
Fonte: Elaborado pelos próprios autores.
Apenas 11,5% da amostra já cumpriu os requisitos de aposentadoria e percebem o abono de permanência, permanecendo na ativa. Ao cruzar essa informação com o percentual de 15,9% da amostra acima de 60 anos, percebe-se que a maioria dos docentes acima desta idade já cumpriram os requisitos de aposentadoria e se mantém na ativa ou reingressaram na instituição como professores voluntários. Na visão de Ribeiro et al. (2018), a importância do trabalho após a aposentadoria influencia o bom condicionamento físico e mental e um senso de utilidade e bem-estar. Os autores ainda concluíram que idosos com maior escolaridade tendem a ter acesso a ocupações mais qualificadas e, por essa razão, optam pela permanência no mercado de trabalho, motivados tanto pelo rendimento quanto pela satisfação com o trabalho e suas conquistas.
Lima (2017) destaca prejuízos salariais no momento da aposentadoria do servidor público, pois deixa de perceber auxílio alimentação, adicional de insalubridade, auxílio transporte, terço de férias e abono de permanência. Tais perdas, a depender do contexto individual, forçam o docente a permanecer na ativa. Carvalho (2009) expõe que, na medida em que podem se sustentar e auxiliar no orçamento familiar, também garantem sua liberdade e autonomia. Cepellos, Tonelli e Aranha Filho (2013) salientam que as motivações para o trabalho após a aposentadoria são diversas, desde caracterizar-se como uma pessoa ativa a questões financeiras.
Antunes e Moré (2014) destacam que a transição para a aposentadoria se constitui como um dos principais eventos críticos da vida adulta, e é referendado por Bressan et al. (2013) ao enfatizar que o bem-estar na aposentadoria possui como fatores-chave o planejamento financeiro, a saúde e os relacionamentos familiares. Schneider e Irigaray (2008) defendem que a aposentadoria é uma experiência heterogênea e complexa, que pode ir desde um desligamento social até uma vida social prazerosa.
Análise Fatorial Exploratória da Escala de Ageísmo no Contexto Organizacional
A Escala de Ageísmo no Contexto Organizacional (EACO) foi desenvolvida por França et al. (2017); na qual sua primeira versão possuía 46 itens agrupados em 7 dimensões, e, após aperfeiçoamento, resultou em uma EACO com 14 itens, agrupados em duas dimensões: D1, atitudes negativas (aspectos cognitivos e de saúde), e D2, atitudes positivas (aspectos afetivos). Optou-se por utilizar a escala reduzida com 14 itens, uma vez que ela apresentou resultados satisfatórios quanto a eigenvalues, cargas fatoriais e comunalidades. A escala foi desenvolvida em pesquisa com trabalhadores de diversas regiões do país e, apesar de validada, decidiu-se por aplicá-la para um público específico e comparar com os resultados alcançados pelos autores, tanto para mensurar a validade do instrumento quanto para identificar o objeto de estudo, o ageísmo, junto aos docentes.
Foi realizada análise fatorial exploratória, com a extração dos componentes principais para verificar fatorabilidade da matriz e rotação Equamax. Esse método de extração que foi utilizado no aprimoramento da EACO tende a distribuir variáveis de maneira mais uniforme entre os fatores do que o varimax, e, portanto, é menos propenso a fortalecer fatores gerais (Mulaik, 2010). A variância total explicada foi de 48,2% com dois fatores: D1 (atitudes negativas) e D2 (atitudes positivas). Valores próprios, ou Eigenvalues, referem-se à variância explicada pelo fator, antes e após o procedimento de rotação, e, por padrão, são exibidos componentes com valores próprios totais superiores a 1 (Ribas; Vieira, 2011).
Variância total explicada | |||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Valores próprios iniciais | Somas de extração de carregamentos ao quadrado | Somas rotativas de carregamentos ao quadrado | |||||||
Componente | Total | % de variância | % cumulativa | Total | % de variância | % cumulativa | Total | % de variância | % cumulativa |
1 | 4,165 | 29,749 | 29,749 | 4,165 | 29,749 | 29,749 | 4,162 | 29,732 | 29,732 |
2 | 2,584 | 18,457 | 48,206 | 2,584 | 18,457 | 48,206 | 2,586 | 18,474 | 48,206 |
3 | 0,946 | 6,758 | 54,964 | ||||||
4 | 0,881 | 6,293 | 61,257 | ||||||
5 | 0,764 | 5,457 | 66,714 | ||||||
6 | 0,709 | 5,066 | 71,78 | ||||||
7 | 0,668 | 4,768 | 76,549 | ||||||
8 | 0,596 | 4,258 | 80,807 | ||||||
9 | 0,527 | 3,765 | 84,572 | ||||||
10 | 0,514 | 3,673 | 88,246 | ||||||
11 | 0,46 | 3,286 | 91,531 | ||||||
12 | 0,427 | 3,046 | 94,578 | ||||||
13 | ,391 | 2,792 | 97,370 | ||||||
14 | ,368 | 2,630 | 100,000 | ||||||
Método de Extração: Análise de Componente Principal. |
Fonte: Elaborado pelos próprios autores.
A matriz rotacionada é o valor da carga fatorial de cada item que compõe determinado fator. Foram delimitados dois fatores para explicar o constructo; identificaram-se 9 componentes no primeiro fator e 5 componentes no segundo fator. Percebe-se, aqui, resultado semelhante ao encontrado no desenvolvimento do instrumento por França et al. (2017), o fator 1 (FAC1_1) possui conotação negativa ao idoso, enquanto o fator 2 (FAC2_1) possui conotação positiva. Destaca-se que os fatores possuem os mesmos itens encontrados no instrumento original, contudo, as cargas fatoriais encontradas nesta pesquisa foram maiores.
Matriz de componente rotativaª | ||
---|---|---|
Componente | ||
1 | 2 | |
Velhos Mais Tempo | 0,714 | |
Velhos Adoecem | 0,721 | |
Velhos FaItam | 0,709 | |
Jovens Concentram | 0,687 | |
Velhos Esquecem | 0,717 | |
Velhos Persistentes | 0,592 | |
Jovens Produtivos | 0,7 | |
Velhos Comprometidos | 0,768 | |
Velhos Conhecimento | 0,698 | |
Velhos Capazes | 0,74 | |
Envelhecer Afeta | 0,656 | |
Velhos Habilidade | 0,757 | |
Velhos Acidente | 0,593 | |
Jovens Compreendem | 605 |
Nota: Método de Extração: Análise de Componente Principal; Método de Rotação: Equamax com Normalização de Kaiser;
aRotação convergida em 3 iterações.
Fonte: Elaborado pelos próprios autores.
Para averiguar a confiabilidade da escala, utilizou-se o Alfa de Cronbach, com resultado 0,780, o que demonstra a confiabilidade interna do instrumento aplicado com 14 itens. Hair et al. (2009) afirmam que o valor do Alfa de Cronbach deve ser superior a 0,7.
Estatísticas de Confiabilidade | ||
---|---|---|
Alfa de Cronbach | Alfa de Cronbach com itens personalizados | N de itens |
0,78 | 0,78 | 14 |
Fonte: Elaborado pelos próprios autores.
Diante do resultado da análise fatorial, é observada a adequabilidade da amostra, por meio da medida Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), com resultado de 0,848. Hair et al. (2009) indicam que KMO’s entre 0,6 e 0,7 são razoáveis, entre 0,7 e 0,8 são médios, e entre 0,8 e 0,9 são bons. Pallant (2007) sugere 0,6 como um limite razoável. O valor encontrado é considerado bom e compatível com o encontrado pelos desenvolvedores do instrumento 0,83. Conforme Lorenzo-Seva, Timmerman e Kiers (2011), o KMO sugere a proporção de variância dos itens que pode estar sendo explicada por uma variável latente.
Teste de KMO e Bartlett | ||
---|---|---|
Medida Kaiser-Meyer-Olkin de adequação de amostragem. | 0,848 | |
Teste de esfericidade de Bartlett | Aprox. Qui-quadrado | 1215,302 |
df | 91 | |
Sig. | ,000 |
Fonte: Elaborado pelos próprios autores a partir dos dados da pesquisa.
O teste de esfericidade de Bartlett indicou a inexistência de uma matriz identidade (sig. = 0,0000), o que permite prosseguir a análise dos dados. Os valores do teste de esfericidade de Bartlett com níveis de significância p<0,05 indicam que a matriz é fatorável (Tabachnick; Fidell, 2007), rejeitando a hipótese nula de que a matriz de dados é similar a uma matriz-identidade.
A matriz de correlação demonstra a força de associação de determinada variável com outras variáveis. Os valores apresentados pela pesquisa são predominantemente menores que 0,6, portanto, as variáveis que compõem os fatores possuem baixa correlação entre si. Correlações reduzidas sugerem variáveis que não estão sob influência do mesmo fator (Ribas; Vieira, 2011).
A matriz de anti-imagem revela variáveis que estejam atrapalhando a análise. Todos os itens apresentam valores significativos, o mais baixo é 0,699, no item 6 (docentes mais velhos são mais persistentes), a 0,917; no item 11 (envelhecimento afeta a produtividade). Isso, aliado ao KMO de 0,848, sugere que a fatorial, utilizando todas as 14 variáveis, é válida. Assim como o estudo desenvolvido por França et al. (2017), não foi encontrada correlação significativa entre os fatores, indicando que a escala é ortogonal.
Foi realizada ainda, a correlação entre os itens que compõem a EACO e variáveis independentes: sexo, faixa etária, estado civil, unidade de lotação, regime de trabalho, nível funcional, abono de permanência e sobre ser membro colaborador ou permanente de programas de pós-graduação. As correlações entre as variáveis independentes e os fatores negativos e positivos também foram realizadas: em ambos os casos, foram avaliados conforme critério de Miles e Shevlin (2001), os quais apontam que valores entre 0,1 a 0,29 são baixos, 0,3 a 0,49 moderados, e acima de 0,5 são altos. Há predomínio de correlação baixa tanto em fatores negativos quanto positivos.
No geral, os resultados encontrados não destoaram do instrumento original tanto por comunalidades e correlações reduzidas quanto pela quantidade de fatores gerados e ainda pela associação dos componentes aos fatores idênticos à EACO de França et al. (2017). Alta confiabilidade interna do instrumento demonstrada pelo Alfa de Cronbach, alto KMO e a significância do teste de esfericidade de Bartlett referendam a possibilidade de prosseguimento da análise. Figueiredo Filho e Silva Junior (2010) indicam que a Análise Fatorial Exploratória pode ser utilizada para criar variáveis dependentes ou independentes para serem utilizadas em modelos de regressão.
Regressão Múltipla
Nessa fase da análise quantitativa, foram realizadas regressões múltiplas para identificar o comportamento das variáveis pessoais, funcionais e laborais – variáveis independentes, em relação a cada fator FAC1_1 (atitudes negativas) e FAC2_1 (atitudes positivas) de ageísmo – variáveis dependentes, e, assim, além de identificar o ageísmo em si, poder relacioná-lo com aspectos pessoais ou profissionais em maior profundidade.
A regressão linear consiste na realização de uma análise estatística com o objetivo de verificar a existência de uma relação funcional entre uma variável dependente e uma ou mais variáveis independentes. Hair et al. (2009) definem que a primeira fase de definição do modelo de regressão é a seleção de variáveis dependentes e independentes. Para isso, é necessário observar a colinearidade entre as variáveis independentes, pois duas variáveis independentes que possuam alta correlação podem distorcer a análise destas sobre a variável dependente.
Conforme Hair et al. (2009), ampliar o uso de variáveis independentes tende a melhorar a resposta sobre a variável dependente e, portanto, melhorar o modelo de regressão, pois amplia a correlação entre as variáveis independentes incluídas na equação de regressão, o que se denomina colinearidade. Ribas e Vieira (2011) indicam que a multicolinearidade pode distorcer a interpretação dos resultados, pois, se duas variáveis forem altamente correlacionadas, elas podem estar mensurando essencialmente a mesma característica, sendo impossível identificar qual das duas é mais relevante ao modelo.
Variáveis independentes | |
---|---|
Sexo | Qual o sexo do respondente |
Faixa Etária | Dummy que agrupou as idades (1) até 45 anos, (2) de 46 a 60 anos; (3) acima de 60 anos |
Estado Civil | Qual estado civil |
CentroCampus | Em qual Centro, Campus ou Colégio é lotado |
Capitallnterior | Dummy que agrupou as lotações entre Capital ou Interior |
CursoLotação | Em qual curso ou departamento é lotado |
Regimetrabalho | Se é 20 horas, 40 horas ou dedicação exclusiva |
NivelFuncional | Se é Auxiliar. Assistente, Adjunto, Associado ou Titular |
Abono | Se recebe ou não abono de permanência |
Permanente | Se é membro permanente de algum Programa |
Colaborador | Se é membro colaborador de algum Programa |
Qtdprogramas | De quantos Programas é membro |
CursoPos | Em qual principal Programa é vinculado |
Fonte: Elaborado pelos próprios autores.
A identificação de colinearidade ou multicolinearidade exige que os dados sejam examinados na busca da existência de correlações em torno de 0,8, muito embora magnitudes vizinhas ao patamar de 0,7 possam provocar problemas (Ribas; Vieira, 2011). Portanto, a primeira análise a ser realizada é a correlação existente entre as variáveis independentes.
Hair et al. (2009) indicam correlações fracas até 0,59 e, acima de 0,6, correlações fortes. A primeira correlação forte destacada é entre CapitalInterior e CentroCampus, o que já era esperado em virtude da variável CentroCampus indicar o centro ou o campus de lotação do professor, e CapitalInterior ser uma variável dummy, criada para indicar quais docentes possuem lotação em centro ou campus da capital ou do interior, com base justamente nos dados de CentroCampus.
Há correlação significativa também entre QtdProgramas e Permanente, CursoPos e Permanente e ainda entre CursoPos e QtdProgramas, ou seja, essas três variáveis independentes possuem correlações significativas entre si. QtdProgramas reflete de quantos programas de pós-graduação o docente é membro colaborador ou permanente. A variável Permanente indica se é membro permanente de algum programa, e a variável CursoPos indica à qual programa o docente considera que tem o principal vínculo. A correlação forte entre essas três variáveis independentes também já era esperada, em virtude de serem variáveis com o mesmo perfil de respostas, inclusive por possuírem características complementares de resposta. Assim sendo, no modelo de regressão múltipla, não devem figurar em conjunto as variáveis independentes colineares: CapitalInterior e CentroCampus; QtdProgramas e Permanente; CursoPos e Permanente, e; CursoPos e QtdProgramas. Todos os modelos a seguir terão índice de confiabilidade de 95% e análises residuais de Durbin-Watson.
Regressões Múltiplas
Para determinar quais variáveis independentes devem compor o modelo com o fator negativo do ageísmo (FAC1_1), foram realizadas 4 regressões múltiplas, sendo a primeira com a amostra completa, e as demais por faixa etária. Ao utilizar toda a amostra para identificar as variáveis adequadas à equação de regressão com FAC1_1, as variáveis FaixaEtaria e Sexo foram encontradas. Identifica-se que o ageísmo negativo se apresenta à medida em que se reduz a faixa etária, enquanto que docentes mais velhos possuem menor influência dos fatores negativos do ageísmo. Além disso, os docentes masculinos percebem os fatores negativos do ageísmo com maior intensidade.
Fatores Nativos (FACI_I) |
Fatores Positivos (FAC2_1) |
|
---|---|---|
Amostra Completa | Amostra Completa | |
Variáveis inseridas | FaixaEtaria | FaixaEtaria |
Variáveis inseridas | Sexo | CapitalInterior |
R | 0,25 | 0,384 |
R quadrado | 0,063 | 0,148 |
Erro Padrão da Estimativa | 0,97154068 | 0,9263448 |
Durbin-Watson | 2,065 | 1,922 |
Resíduo | 275,616 | 250,569 |
Z | 9,738 | 25,306 |
Sig. | 0 | 0 |
B | -0,287 | 0,555 |
Sig. | 0 | 0 |
B | 0,236 | 0,335 |
Sig. | 0,04 | 0,012 |
Fonte: Elaborado pelos próprios autores.
Na regressão múltipla, para identificar variáveis independentes que mais explicam os aspectos positivos do ageísmo, resumidos no fator FAC2_1, apenas as variáveis FaixaEtaria e CapitalInterior se apresentaram como significativas ao modelo. Identifica-se que o ageísmo positivo se apresenta à medida que aumenta a faixa etária, enquanto que docentes mais velhos possuem menor influência dos fatores negativos do ageísmo. Além disso, os docentes lotados fora da capital percebem com maior intensidade os fatores positivos do ageísmo.
O ageísmo negativo é associado, segundo Schwartz e Simmons (2001), a características como teimosia, senilidade, solidão, mal humor, esquecimento, reclamação, egoísmo, lentidão e doença. Butler (1980) complementa que o ageísmo negativo traz a ideia de uma pessoa inútil. Siqueira et al. (2007) destacaram que o envelhecimento observado sob o âmbito negativo induz a caracterizações como isolamento, solidão, pobreza, doença, incapacidade de gerir sua própria vida e demência física e social.
Pelos resultados apresentados, os docentes mais jovens percebem com maior intensidade o ageísmo negativo, o que reflete, em grande medida, um possível choque de gerações, no qual os mais jovens denotam aspectos negativos do ageísmo em relação aos docentes envelhecentes. O choque entre as gerações e a segregação etária induzem a barreiras em relação ao envelhecimento. Conforme Bytheway (2003), o envelhecimento e a segregação etária marcam nítidas distinções entre o eu e o outro.
Em contraponto, os docentes com maior faixa etária não percebem o ageísmo negativo com tanta intensidade. Conforme Loth e Silveira (2012), os envelhecentes valorizam a identidade decorrente do senso de pertencimento ao grupo mais velho e diminuem características ameaçadoras aos mais velhos na competição por espaços organizacionais. O sentimento de pertencimento, ou mesmo do valor de seu trabalho para a instituição e os alunos, faz com que a percepção sobre aspectos negativos do envelhecimento seja reduzida.
Nesta investigação, a amostra da pesquisa expôs que os homens, mais que as mulheres, identificam aspectos negativos do ageísmo, o que contradiz os achados de Duncan e Loreto (2004), os quais identificaram mais mulheres relatando experiências negativas associadas ao envelhecimento, normalmente associadas à aparência ou sexualidade. Contudo, Lasher e Faulkender (1993) apontaram que homens tinham níveis mais elevados de ansiedade sobre o envelhecimento do que as mulheres. Nessa linha, Rupp, Vodanovich e Credé (2005) apontam que os homens são mais ageístas que as mulheres, o que talvez possa refletir o achado da pesquisa.
Os resultados encontrados acerca de maior identificação de aspectos do ageísmo entre professores (em comparação com as professoras) pode estar associado ao próprio trabalho docente na universidade. Em estudo com professoras, Sá e Wanderbroocke (2016) apontaram que as entrevistadas reconhecem as dificuldades no processo de envelhecimento e aposentadoria da carreira docente, mas igualmente vislumbram possibilidades positivas na vida após o término da carreira laboral.
Diversos fatores são associados de forma positiva aos trabalhadores envelhescentes. Cepellos e Tonelli (2017) identificaram maior equilíbrio emocional, fidelidade à empresa, pontualidade, e maior capacidade de diagnosticar problemas. Já Taylor e Walker (1998), atribuíram maior confiabilidade, produtividade, criatividade e menor propensão a acidentes de trabalho. Couto et al. (2009) identificaram estereótipos, como maturidade e sabedoria, associados aos idosos. Os docentes, à medida que ampliam a faixa etária, apontam aspectos positivos de ageísmo, o que reflete que a elevação da idade não está associada a aspectos negativos no ambiente de trabalho.
Portanto, a percepção positiva do envelhecimento docente se amplia à medida que maior for a faixa etária e a quantidade de programas de pós-graduação com vínculo. Isso permite inferir que o professor envelhecente está positivamente posicionado à medida que está inserido em mais programas de pós-graduação.
Considerações Finais
Observando-se ambos os fatores, FAC1_1 e FAC2_1 em conjunto, a variável independente mais representativa é FaixaEtária, o que é compatível com a teoria de ageísmo, que se refere à discriminação em virtude da idade, apresentada na base de dados por essa variável. Levy e Banaji (2002) definem o ageísmo como sentimento, crença ou comportamento em resposta à idade cronológica percebida de um indivíduo ou grupo. Portanto, a faixa etária certamente é elemento presente tanto em fatores positivos, quanto em fatores negativos no grupo estudado.
A Escala de Ageísmo no Contexto Organizacional indicou que existe ageísmo na Universidade Federal do Piauí, e que de ambos os fatores, negativo e positivo, são dimensionados por faixa etária. Quanto maior for a faixa etária, menor é a percepção dos aspectos negativos do ageísmo e, em contrapartida, quanto maior a faixa etária, maior é a percepção dos aspectos positivos do ageísmo. Infere-se que os aspectos positivos sobrepõem os negativos na medida do envelhecimento docente, e que a experiência laboral induz ao ageísmo positivo entre os docentes.
Por fim, observou-se que homens percebem o ageísmo negativo de forma mais intensa do que as mulheres, enquanto que docentes lotados fora da capital são mais sensíveis ao ageísmo positivo entre os docente2.