Com o intuito de compreender a situação das investigações sobre a educação católica no Brasil, a professora Evelyn de Almeida Orlando, decidiu reunir as pesquisas desenvolvidas pelos integrantes do projeto “Igreja católica e circulação de saberes pedagógico: intelectuais, impressos e práticas educativas (1916-1970)”, organizando seu livro Histórias da Educação Católica no Brasil e em Portugal. Os resultados das pesquisas são apresentados na forma de onze capítulos.
O livro está organizado em duas partes. A primeira, Intelectuais e projetos educacionais, apresenta seis capítulos que versam sobre alguns intelectuais que disseminaram ideais católicos para a sociedade e que tiveram seu trabalho reconhecido pelo Estado. Já a segunda parte, Impressos e práticas educativas, apresenta cinco capítulos que mostram a importância que dos periódicos para a circulação da doutrina cristã na sociedade e no contexto escolar. É interessante perceber que os autores desses trabalhos dão visibilidade aos diferentes atores da educação, tais como alunos, professores, padres e intelectuais.
O primeiro capítulo do livro, intitulado Em nome da família: imprensa católica e debates educacionais brasileiros (anos 1930 e 1950/60) é escrito pela professora Ana Maria Bandeira de Mello Magaldi, referência nos estudos sobre família e educação no Brasil. Nele, são apresentados os debates sobre a reforma educacional brasileira do governo Getúlio Vargas, sobretudo a perspicácia dos educadores católicos na defesa de subvenções do estado para as escolas confessionais.
O segundo capítulo, O Estado, a Igreja, a Família e a Educação: um debate em contexto autoritário (Portugal, meados do século XX) do professor Joaquim Pintassilgo, mostra a presença das três instituições mais atuantes na educação portuguesa: o Estado, a Igreja e a família. A família seria o primeiro lugar em que a educação se efetuaria. Já a Igreja era vista como responsável pela manutenção da educação cristã. Por fim, o Estado seria o principal eixo da tríade, pois atuaria na fiscalização das instituições, gerindo os espaços públicos e privados da educação.
O terceiro capítulo, Catolicismo, autoritarismo e Escola Nova: a pedagogia portuguesa durante o Estado Novo, escrito pela professora Maria João Mogarro, traz o contexto da formação de professores em Portugal diante da dicotomia: autoritarismo e Escola Nova. É evidenciada a imposição do catolicismo e do nacionalismo nas práticas educativas no regime salazarista. Contudo, a autora destaca a resistência dos professores que pensavam a educação amparada no movimento da Escola Nova, apresentando a importância da atuação e da produção intelectual desses professores.
O quarto capítulo, Stella de Faro: uma luz no caminho da restauração católica, de Peri Mesquita, aborda a presença do catolicismo na escolarização do sexo feminino. Diante do contexto da gradativa separação entre Igreja e Estado, promovida pela instauração do Estado laico, a mulher foi considerada uma importante peça na cristianização da sociedade, sobretudo por meio de congregações e associações católicas. Stella de Faro foi um exemplo entre essas mulheres e reconhecida pela sua luta pela instauração voto feminino, entre outras.
O capítulo cinco, Maria Junqueira Schmidt e os caminhos de uma trajetória intelectual pela palavra impressa, também apresenta a trajetória e as ações de uma mulher na sociedade brasileira. Esse capítulo é de autoria da organizadora do livro que apresenta Maria Junqueira, uma intelectual que, considerada influenciadora da sociedade no contexto da tentativa de recristianização no Brasil. Sua formação no exterior e a grande visibilidade que ganhou ao retornar ao Brasil na década de 1920 fez com que ganhasse destaque na imprensa brasileira.
Também é sobre uma intelectual mulher que o capítulo seis se debruça. Fascínio equatorial de Paula Romana: uma estratégia de circulação e divulgação do carisma da unidade é de autoria da professora Maria José Dantas, apresenta Paula Romana, pseudônimo utilizado por Chiara Lubich, uma importante cristã italiana, líder do Movimento Católico do século XX. Amparada no diário de Chiara, a autora busca informações sobre a visita da italiana ao Brasil e descobre que usava o pseudônimo para publicar os relatos que fazia sobre a situação social do Brasil.
Já, na segunda parte do livro, o sétimo capítulo, A força da palavra impressa: cartografia de periódicos de instituições católicas de ensino, da professora Alexandra Lima da Silva, apesenta o mapeamento dos impressos de alunos em escolas brasileiras. Considerados lugares de memórias, a autora evidencia a riqueza e, ao mesmo tempo, a escassez desse tipo de documentação para a pesquisa.
Baseado em dois impressos católicos, o oitavo capítulo, Universalização cultural e modo de doutrinação: dois impressos dos missionários de Nossa Senhora Salette, da professora Paula Leonardi e Leticia Aparecida Mazochi, apresenta o “Bulletin” e o “Mensageiro”, jornais do início do século XX, que propagavam ideais católicos com o objetivo de divulgar informações, rituais e práticas estabelecidas entre a igreja e a população.
Já os autores Cláudia Regina Condello Candido de Oliveira Kluck e Sérgio Rogério Azevedo Junqueira assinam o texto Ensino religioso e livro didático: interfaces históricas em que realizam uma contextualização do livro didático no Brasil, desde a sua primeira utilização no catecismo e na alfabetização na Colônia, por meio de orações e adoração ao cristianismo, até a sua presença mais recente no ensino religioso, mesmo após o estabelecimento do Estado laico e da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases de agosto de 1971 (LDB 5692/1971).
Marcas de uma identidade: a união entre catolicismo e educação em comunidade étnica italiana/veneta, da professora Mara Francieli Motin, relata a chegada dos imigrantes italianos ao Brasil e a fundação de uma colônia italiana no país. Os autores abordam os costumes que esses imigrantes traziam consigo, sobretudo a forte crença na religião católica.
Por fim, o último capítulo, Formar professores sob o signo da cruz: ideais e princípios pedagógicos (Portugal, década de 50 do século XX), escrito pelo professor Helder Henriques, aborda os modelos de educação propostos pelo estado de Portugal durante a 1ª República e o Estado Novo. Ao investigar o contexto de uma escola privada e um jornal destinado à formação de professores, o autor identifica a adoção da religião pelo Estado como forma de tornar o professor um sacerdote, moldando comportamentos e atitudes.
A obra possui uma escrita detalhada de dados e análises instigantes ao apresentar todo um compêndio da presença da religião católica na educação no Brasil e em Portugal. Trata-se de uma obra escrita por mestres e doutores de universidades brasileiras a partir de suas pesquisas da área da História da Educação. O livro contribui significativamente para quem deseja conhecer melhor a história da intervenção do catolicismo, ou até mesmo trabalhar com impressos católicos e personagens intelectuais que atuaram nessa esfera, apresentando uma riqueza de fontes e interessantes métodos de pesquisa.