Introdução
Pensar na Educação de Jovens e Adultos (EJA) ofertada à população indígena é pensar na diversidade, a qual deve ser compreendida como uma riqueza, tendo em vista que estamos nos referindo a um coletivo que possui mais de 309 etnias espalhadas nas cinco regiões do país, com especificidades que precisam ser valorizadas, contempladas e respeitadas nos processos pedagógicos.
O presente artigo é um recorte de uma pesquisa, em nível de doutorado,1 desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba (PPGE/UFPB) que objetivou conhecer as práticas pedagógicas dos professores indígenas Potiguara na modalidade da Educação de Jovens e Adultos, nos municípios de Rio Tinto, Marcação e Baía da Traição, no Litoral Norte da Paraíba (SILVA, 2022).
Na contemporaneidade, é visível, entre os professores indígenas, o esforço em realizar uma Educação Escolar Indígena que comtemple no cotidiano escolar práticas pedagógicas interculturais contextualizadas com a realidade dos estudantes, como destaca Tupinambá (2017, p. 38): “os momentos das práticas acontece, por exemplo, quando os/ as alunos/as indígenas trazem para a sala de aula os conceitos sobre sua concepção da vida, do mundo e da existência, relacionando suas epistemologias.” Os conhecimentos trazidos pelos estudantes e articulados aos conteúdos não indígenas, abordados pela escola de forma conjunta, possibilitam a efetivação de práticas pedagógicas interculturais, as quais, se trabalhadas a partir dos saberes indígenas e dos não indígenas de forma dialética, podem ser um caminho possível e viável para um ensino em uma perspectiva intercultural.
À luz de autores como Santos e Queiroz (2021), Candau (2011), Tupinambá (2017), Barcellos (2012) e Munduruku (2009), nos acostamos à seguinte concepção de prática pedagógica, ou seja, aquela em que os indivíduos estão inseridos no processo de ensino e aprendizagem como protagonistas deste processo, numa perspectiva crítica e emancipatória. Pois, ao pensarmos no jovem e no adulto indígena, bem como na educação ofertada a esse público, é de fundamental importância considerar o contexto em que estão inseridos esses sujeitos, os quais trazem em sua trajetória de vida saberes, bem como a dimensão cultural, elementos que são importantes e que precisam ser considerados e respeitados nos processos educacionais.
Na cultura indígena é possível perceber que a aprendizagem não se limita ao espaço escolar. Os saberes indígenas são repassados naturalmente na convivência diária, são conhecimentos ou etnoconhecimentos que dizem respeito à cultura e à tradição desses povos, os quais são elementos importantes para pensar as práticas pedagógicas na Educação de Jovens e Adultos indígenas, contextualizadas com a realidade desses sujeitos (SANTOS; SILVA, 2021).
Sabemos que pensar as práticas pedagógicas na modalidade da EJA para os indígenas significa pensar na diversidade que, segundo Candau (2011), não é uma discussão recente; diversos grupos, entidades e movimentos sociais buscam mecanismos para trabalhar as diferenças no espaço escolar; o reconhecimento dessas nuances traz à tona a necessidade de que sejam vislumbradas estratégias pedagógicas interculturais.
Para Santos e Queiroz (2021, p. 3), as práticas pedagógicas não podem estar “desvinculadas dos aspectos culturais onde os indivíduos estão inseridos”. Portanto, ao pensar no jovem e no adulto indígenas e na educação ofertada a esse público, é de fundamental importância considerar o contexto em que estão inseridos esses sujeitos, os quais trazem em sua trajetória de vida a dimensão cultural. Essa compreensão dialoga com as reflexões de Aiwá, professor indígena, que identificamos no Referencial Curricular Nacional para Escolas Indígenas, que nos apresenta o seguinte:
Os desafios que os povos indígenas enfrentam na atualidade exigem dos professores indígenas uma postura e um trabalho adequado e responsável. Devem estar comprometidos em desenvolver o processo de ensino-aprendizagem não como únicos detentores de conhecimentos, mas como articuladores, facilitadores, intervindo, orientando, problematizando, sem desconsiderar a atitude de curiosidade dos diversos alunos para os novos conhecimentos. A escola indígena deve ser espaço de pesquisa e de produção de conhecimentos e de reflexão crítica por parte de todos os que participam dela. (BRASIL, 1998, p. 43).
Logo, nesse discurso, notamos uma preocupação com uma prática docente comprometida, problematizadora e emancipatória, capaz de promover nos estudantes indígenas atitudes de curiosidade para novos conhecimentos, como também a promoção do diálogo, da participação e do protagonismo, possibilitando que os estudantes realizem a leitura de mudo, bem como um olhar crítico da sociedade onde se encontram inseridos.
O presente estudo, de natureza qualitativa, teve por objetivo analisar os elementos discursivos identificados nas práticas pedagógicas discursivas de professores indígenas da EJA que contribuem para o fortalecimento da cultura Potiguara.
O lócus da nossa pesquisa foi o litoral norte da Paraíba, onde vive, há mais de 500 anos, a etnia Potiguara em 32 aldeias nos municípios de Rio Tinto, Marcação e Baía da Traição, os quais possuem escolas no território, gestores e docentes indígenas.
Para o tratamento dos dados, optamos por escolher os princípios metodológicos da Análise Crítica do Discurso apresentada, inspirados em Norman Fairclough (2016), por ser uma técnica que busca analisar criticamente qualquer discurso presente na sociedade, além de ser uma ferramenta de leitura crítica do mundo.
Sobre a categoria central trabalhada nas análises, utilizamos a interdiscursividade, a qual possibilitou observar como os discursos dos professores indígenas da EJA articulam-se com diversos discursos postos em documentos e dispositivos legais.
Os colaboradores da pesquisa foram nove professores indígenas Potiguara que atuam na modalidade em foco: duas mulheres e sete homens. As entrevistas foram realizadas no primeiro semestre de 2021. Quanto à formação e ao tempo de atuação na área educacional, essas informações são apresentadas no Quadro 1.
MUNICÍPIO | COMPONENTE CURRICULAR | IDENTIFICAÇÃO | IDADE | SEXO | FORMAÇÃO | TEMPO DE ATUAÇÃO NA EDUCAÇÃO | TEMPO DE ATUAÇÃO NA EJA INDÍGENA |
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Rio Tinto | Etno-história | Alecrim | 38 | Masculino | Pedagogia | 3 anos | 5 anos |
Arte e cultura | Aroeira | 45 | Masculino | Superior intercultural História | 3 anos | 3 anos | |
Língua Tupi | Arruda | 40 | Masculino | Cursando Licenciatura em Letras | 5 anos | 4 anos | |
Marcação | Etno-história | Babosa | 41 | Masculino | Licenciatura História | 5 anos | 3 anos |
Arte e cultura | Carnaúba | 37 | Masculino | Licenciatura em Artes | 2 anos | 2 anos | |
Língua Tupi | Guajiru | 47 | Masculino | Superior intercultural em Letras | 4 anos | 4 anos | |
Baía da Traição | Etno-história | Goiabeira | 42 | Masculino | Superior intercultural em História | 10 anos | 8 anos |
Arte e cultura | Jenipapo | 43 | Feminino | Superior intercultural em Letras | 4 anos | 4 anos | |
Língua Tupi | Jatobá | 30 | Feminino | Cursando o ensino superior em Matemática | 3 anos | 3 anos |
Fonte: Elaborado pela autora deste artigo com base em dados da pesquisa.
* Para preservar o anonimato dos nossos entrevistados, os professores indígenas da EJA, utilizamos o nome das plantas medicinais para representar cada um deles por compreender que elas fazem parte da cultura indígena.
A seguir, proceder-se-á a uma breve reflexão teórica sobre as práticas pedagógicas na Educação de Jovens e Adultos ofertadas à população indígena e, finalmente, o foco do presente artigo, as práticas pedagógicas dos professores indígenas Potiguara no chão da escola na modalidade em tela.
As práticas pedagógicas na educação de jovens e adultos indígena
Refletindo as práticas pedagógicas na EJA, no contexto histórico da educação brasileira, percebemos que essa modalidade vem sendo construída ao longo dos anos, e novos discursos e paradigmas foram sendo inseridos, numa perspectiva de pensá-la não apenas como campanhas de alfabetização e escolarização, mas como política pública que contemplasse a educação enquanto processo e aprendizagem ao longo da vida.2
A educação, longe de se limitar ao período da escolaridade, deve abarcar todas as dimensões da vida, estender-se a todas as competências e domínios de saber, adquirir-se por meios diversos a favorecer todas as formas de desenvolvimento da personalidade. (IRELAND; SPEZIA, 2014, p. 42).
Concordamos com esses autores, visto que a educação precisa ser pensada numa perspectiva ao longo da vida, atendendo às necessidades dos sujeitos em qualquer tempo. Nessa direção, entendemos que as práticas pedagógicas precisam estar atentas às mudanças da sociedade contemporânea, que vão além da escolarização. Ou seja, elas precisam ser compreendidas como uma modalidade de educação com dimensões amplas que ultrapassam a função do ato de ler e escrever.
Na atualidade, as práticas pedagógicas acerca da EJA apontam para a necessidade de continuar a luta para garantir a escolarização, mas não podemos nos limitar a pensar o processo de Educação de Jovens e Adultos apenas como prática de leitura e escrita, pois existem outras demandas e necessidades, as quais estão emergindo na sociedade, que vão além da aquisição da leitura e escrita, como o acesso ao letramento digital e à formação profissional, entre outras questões, que precisam estar presentes na agenda da EJA, bem como nas práticas pedagógicas para atender às necessidades dessa modalidade. Nessa direção, Machado (2009, p. 18) enfatiza que é de fundamental importância
[...] não reduzir a EJA a escolarização; ao contrário, é fundamental que se reconheça que a luta pelo direito à educação implica, além do acesso à escola, a produção do conhecimento que se dá no mundo da cultura do trabalho e nos diversos espaços de convívio social, em que jovens e adultos seguem constituindo-se como sujeitos.
Concordamos com Machado (2009), a partir de cujas reflexões refletimos que a EJA ofertada à população indígena não deve reduzir-se apenas ao processo de escolarização. As práticas pedagógicas devem considerar a diversidade presente neste público, de modo que sejam considerados nos processos educacionais seus interesses e saberes.
Na história do Brasil, as primeiras experiências educacionais ofertadas à população indígena apontam para práticas pedagógicas marcadas por um processo de dominação, violência e negação, conforme afirma Saviani (2013, p. 29): “a educação foi marcada por práticas de aculturação, isto é, a inculcação nos colonizados das práticas, técnicas, símbolos e valores próprios dos colonizadores.” Essa repressão foi imposta por meio de um discurso e uma prática tradicional e autoritária a qual considerava a cultura de referência entendida como única com legitimidade, para ser transmitida pela escola, responsável, por muito tempo, pelo silenciamento da cultura e da história indígena.
Ao refletirmos sobre as práticas pedagógicas na EJA voltadas para a população indígena, é importante destacar quais são as práticas a que estamos nos referindo, que discursos podem ser observados no tocante à educação no que tange ao jovem e ao adulto indígena. Esses questionamentos fazem parte do cotidiano que permeia o espaço escolar e são elementos pertinentes para serem refletidos quando pensamos a Educação de Jovens e Adultos ofertada à população indígena.
Cabe-nos lembrar que, somente a partir de 1980, no contexto de luta e resistência, os movimentos sociais, entre eles o indígena, iniciam um processo de retomada dos territórios na defesa da terra e de outros bens sociais, a exemplo da educação, como ressalta Melatti (2007). O movimento social indígena traz como contribuição e desafio a gestação de um novo modelo de educação, não mais com uma prática pedagógica integracionista com viés colonizador, mas que atenda às especificidades dos sujeitos em uma perspectiva intercultural, dialógica, emancipatória e democrática.
Nesse processo de luta e organização, é importante destacar o decreto n. 6.861/2009 (BRASIL, 2009), que dispõe sobre a Educação Escolar Indígena e define sua organização em territórios etnoeducacionais; esse documento é uma conquista da população indígena no campo educacional. O decreto supracitado apresenta de forma sistematizada os objetivos da Educação Escolar Indígena, a qual deve ser organizada com a participação dos povos indígenas respeitando as necessidades e especificidades.
O Decreto nº 6.861/2009 (BRASIL, 2009), ao trazer no artigo 1º a importância da participação das populações indígenas no processo de organização da Educação ofertada às etnias e o reconhecimento das especificidades desse público, traz à tona a necessidade de que seja pensada um Educação diferenciada para esse público, que só será possível com a efetivação de práticas pedagógicas que considerem os sujeitos como protagonistas do processo de ensino e aprendizagem.
Ainda no campo das conquistas, trazemos a Lei nº 11.645/08 (BRASIL, 2008), que alterou a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabeleceu a inclusão no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena em todo território nacional (BRASIL, 1996). Tais alterações nas leis educacionais foram resultado de um longo e constante movimento de mobilização dos professores indígenas, o que vai reverberar em novas políticas educacionais para os povos indígenas que, aos poucos, vão substituindo práticas tradicionais que ao longo da história foram ofertadas à população indígena com o objetivo de colonizar e eliminar essa população do território brasileiro.
Para Candau (2011), a cultura dominante, por muito tempo, defendeu e ainda defende práticas pedagógicas hegemônicas que legitimam o silenciamento e tentam padronizar a educação. Essas ações trazem como consequência a perda de dialéticos, de saberes ancestrais, de crenças e valores culturais.
A realidade descrita por essa autora aconteceu com as diversas etnias indígenas no Brasil, inclusive com os Potiguara na Paraíba. A imposição de práticas pedagógicas tradicionais impostas no Vale do Mamanguape por meio das escolas não indígenas foi responsável também pelo apagamento e esquecimento da língua materna, o Tupi, bem como de outros costumes, crenças e tradições presentes na cultura indígena, que foram sendo esquecidos, apagados, silenciados e perdidos (PALITOT, 2005).
Nesse contexto, pensar as práticas pedagógicas na modalidade da EJA para os indígenas significa pensar na diversidade. Segundo Candau (2011), essa discussão não é recente: diversos grupos, entidades e movimentos sociais buscam mecanismos para trabalhar as diferenças no espaço escolar. O reconhecimento dessas diferenças traz à tona a necessidade de que sejam pensadas práticas pedagógicas interculturais.
Consideramos a dimensão cultural como um elemento de fundamental importância no processo ensino-aprendizagem para os jovens e adultos indígenas, de modo que as práticas pedagógicas sejam pensadas em uma perspectiva que contemple a especificidade desses sujeitos. Quanto a isso, trazemos as reflexões de Candau (2014, p. 1) acerca da Educação Intercultural, que apresentam a seguinte contribuição:
A Educação Intercultural parte da afirmação da diferença como riqueza. Promove processos sistemáticos de diálogo entre diversos sujeitos individuais e coletivos, saberes e práticas na perspectiva da afirmação da justiça social, econômica, cognitiva e cultural assim como da construção de relações igualitárias entre grupos socioculturais e da democratização da sociedade, através de políticas que articulam direitos da igualdade e da diferença.
À luz da reflexão de Candau (2014), podemos inferir que a Educação Intercultural é uma educação que acolhe a diferença enquanto riqueza, que procura promover um diálogo de respeito entre a diversidade presente no espaço escolar na direção da construção de relações de igualdade e respeito na sociedade. Ao refletirmos acerca das práticas pedagógicas na EJA indígena com sujeitos que possuem uma cultura diferente, torna-se de fundamental importância pensar em práticas pedagógicas que contemplem no fazer pedagógico uma educação em uma perspectiva intercultural.
A educação em uma perspectiva intercultural é aquela que promove o diálogo entre os diferentes sujeitos e os saberes trazidos por eles. Nessa direção, as práticas pedagógicas na EJA, em uma perspectiva intercultural, têm como desafio proporcionar o diálogo e o respeito entre os saberes, bem como valorizar e acolher as diferenças dos sujeitos que dela fazem parte, de modo que a diferença não proporcione desigualdade e exclusão, como ressalta Santos (1993).
Em se tratando da EJA indígena, as práticas pedagógicas na direção da interculturalidade buscam articular os saberes indígenas aos saberes não indígenas sistematizados pela sociedade brasileira, de modo que os conhecimentos culturais sejam reconhecidos e valorizados como conhecimentos válidos, os quais devem ser tratados em condição de igualdade com os conhecimentos não indígenas.
A ausência de práticas pedagógicas que contemplem, em seu fazer pedagógico, a interculturalidade apresenta algumas implicações nos estudantes negros, indígenas, LGBTQIA+, ribeirinhos, populações do campo, entre outros grupos. Uma das implicações descritas por Candau (2014) é o não reconhecimento e pertencimento, bem como a falta de representatividade, pois eles não se sentem representados nos livros didáticos, tampouco nas práticas peda gógicas tradicionais desenvolvidas pela escola.
Direcionando nosso olhar para as práticas pedagógicas, compreendemos que elas são efetivadas por uma prática docente, à luz das reflexões de Freire (1996), que nos leva a inferir a existência de duas práticas pedagógicas: uma delas é a que promove uma educação libertadora, problematizadora, questionadora e crítica; a outra é a prática docente bancária, que enxerga o estudante como um ser sem luz, o qual não possui saberes, tendo o professor a função de transmitir conhecimento por meio de conteúdos presentes em um programa, cabendo-lhe o papel de despejar na cabeça dos estudantes informações para que possam adquirir habilidades necessárias para a sua faixa etária de maneira mecânica e rápida, com o objetivo de aprender em um período estabelecido, não importando como essa aprendizagem acontece.
Diante do exposto, defendemos práticas pedagógicas ofertadas à população indígena na EJA que valorizem os conhecimento e saberes trazidos pelos estudantes, de modo que sejam ampliados e somados aos saberes e experiências do professor de forma dialética, considerando o contexto social, político, cultural e ideológico em que estão inseridos os estudantes, seu ritmo de aprendizagem e sua forma de aprender, de modo que as práticas pedagógicas possam contribuir com a emancipação dos sujeitos e sua leitura de mundo (FREIRE, 1996).
As práticas pedagógicas que defendemos nesta pesquisa possui um víeis popular, emancipatório, inspirado nos pressupostos da educação popular que busca a emancipação dos sujeitos. Tais concepções são possíveis de serem observadas também na Educação Escolar Indígena, a qual traz como orientação uma Educação que vai além do processo de escolarização e decodificação de símbolos linguísticos. Para os povos indígenas, a Escola, através da Educação, tem o papel de formar guerreiros para ler um documento a serviço da comunidade, formar seus próprios médicos, advogados e professores de modo que possam contribuir nas lutas diárias do seu povo e garantir os direitos, os quais diariamente são negados e violados (BONIN, 2012).
No próximo tópico, trazemos os discursos acerca dos elementos pedagógicos presentes nas práticas pedagógicas dos professores indígenas na EJA no litoral norte, no chão da escola indígena, de modo que será possível perceber como elas acontecem no cotidiano na modalidade em tela.
Os elementos pedagógicos na prática dos professores da eja no fortalecimento da cultura potiguara no chão da escola
As práticas pedagógicas na Educação Escolar Indígena na modalidade da EJA apresentam-se como um elemento importante, de resistência e empoderamento quando pensamos em um coletivo que pertence a uma cultura diferente que, por muito tempo, esteve à margem dos processos educacionais, gerando sentimentos e posturas de vergonha e silenciamento da sua cultura, ao passo que novas práticas pedagógicas vão sendo inseridas e trabalhadas nas escolas na modalidade da EJA pelos docentes da etnia. Diante disso, os estudantes passam a expressar sentimento de orgulho, participação, criticidade, conscientização, diálogo, pertencimento e protagonismo sobre a cultura indígena Potiguara.
Essas mudanças materializam-se em discursos e atitudes dos jovens e adultos indígenas na modalidade em tela, que, gradualmente, vão sendo percebidas pelos professores, resultado do trabalho que vem sendo realizado pela escola mediante as práticas pedagógicas dos professores Potiguara sobre a cultura indígena de valorização e respeito na perspectiva de uma mudança social.
Nas práticas pedagógicas dos professores é possível observar os seguintes elementos pedagógicos: a educação contextualizada, criticidade, conscientização, corporificação das palavras pelo exemplo, organização, diálogo e o protagonismo indígena, os quais são de fundamental importância no fortalecimento da cultura Potiguara, bem como na construção de uma educação de qualidade e na formação de cidadãos.
Vejamos como são trabalhados esses elementos nas práticas pedagógicas dos professores da EJA no litoral norte da Paraíba.
Educação contextualizada
O primeiro elemento pedagógico que destacamos presente nas práticas pedagógicas é a “educação contextualizada” com a realidade dos sujeitos. Embora não seja utilizado esse termo ao se referir ao ensino da língua Tupi, a professora refere-se à metodologia utilizando o cotidiano dos jovens e adultos indígenas. As saudações do dia a dia têm o objetivo de naturalizar e fixar expressões rotineiras em Tupi esquecidas no processo de aculturação e silenciamento. Um simples bom-dia, boa-tarde ou boa-noite em Tupi pode iniciar um processo de revitalização desta língua no território, como ressalta a professora entrevistada.
A mudança, por exemplo, é nós pensarmos numa língua esquecida: o Tupi, e agora ela volta a ser falada, o fato de você chegar dar um bom dia, uma boa tarde ou um boa noite em Tupi e isso vai entrando no cotidiano dos estudantes passando para diversas gerações. Então é importante perceber o quanto essa mudança em pequenas coisas, em como a educação vai mudando as pessoas a partir de pequenos gestos. A partir de objetos que eles vão conhecendo, que eles não sabiam, as próprias saudações. Então, essa mudança é a conscientização a partir da educação, nós vamos percebendo o quanto é importante valorizar, principalmente na educação de jovens e adultos. (JENIPAPO, 2021, grifo nosso).3
Acerca das mudanças percebidas nas práticas pedagógicas, a professora Jenipapo, em seu discurso, destacou dois elementos que consideramos pedagógicos e que contribuem para o fortalecimento da cultura indígena Potiguara na EJA no litoral norte da Paraíba.
Percebemos que as atividades realizadas com a língua Tupi4 (utilizada em momentos pontuais nos rituais indígenas) possuem a intencionalidade de reforçar o seu ensino, fazendo com que os estudantes adquiram o hábito de utilizar com mais frequência em seu cotidiano. Trazer o ensino da língua Tupi a partir das situações do cotidiano de modo contextualizado, tornando-a significativa para o jovem e o adulto indígenas, nos leva a inferir que o professor indígena na sua prática pedagógica utiliza uma pedagogia inspirada em Freire (2011); de uma educação contextualizada com a vida dos sujeitos, de forma que procura realizar processo de mediação do ensino articulada à vida, é dar sentido ao ensino de uma língua que, mesmo não sendo exigida na seleção de ENEM, não a torna menos importante que as demais disciplinas exigidas no processo seletivo de ingresso ao ensino superior.
A língua Tupi, ao ser ensinada de forma contextualizada com a vida dos sujeitos, a partir das situações do cotidiano, demonstra a sua importância para a manutenção das tradições e da cultura indígena Potiguara, a qual deve ser fortalecida e valorizada nas práticas pedagógicas desenvolvidas pelas escolas em todas as modalidades de ensino, inclusive na EJA indígena. Logo, “a inclusão de uma língua indígena no currículo escolar tem a função de atribuir-lhe o status de língua plena e colocá -la, pelo menos no cenário escolar, em pé de igualdade com a língua portuguesa” (BRASIL, 1998, p. 118).
Nesse sentido, compreendemos que o ensino da língua Tupi nas escolas indígenas Potiguara, enquanto efetivação de um direito, coloca-se em condição de igualdade com a língua oficial. O fato de os indígenas, mesmo de maneira tímida, voltarem a falar a sua língua materna é apontado por eles como uma mudança social.
Nesse contexto, o ensino da língua Tupi contextualizada com a vida dos indígenas, como nos lembra Freire (1996, p. 14), “é muito mais que formar, é muito mais que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas”, de modo que aprender o Tupi não é apenas treinar um idioma, ser fluente e bilíngue. Essa língua tem todo um significado étnico para os indígenas Potiguara da Paraíba, que, gradualmente, vem sendo recuperado pelos professores indígenas por meio de suas práticas pedagógicas de fortalecimento da cultura, tendo em vista que as atividades realizadas trazem discursos pedagógicos de reforço positivo da língua, enquanto um bem social coletivo.
Outros elementos pedagógicos apontados dizem respeito à participação, criticidade e conscientização. Vejamos o que diz a prática discursiva dos professores indígenas sobre essa questão.
Participação, criticidade e conscientização
Nos discursos dos professores Alecrim e Goiabeira, é possível identificar, mediante as práticas, dois elementos pedagógicos - a participação e a criticidade -, os quais contribuem para fomentar as atividades realizadas nas escolas indígenas:
Alguns alunos tinham um comportamento mais de vergonha e hoje você percebe um outra posição relacionada a cultura indígena pelo fato de estar participando da Escola Indígena e das atividades de fortalecimento a cultura, a gente incentiva muito essa participação, é importante mostrar a eles nossa história, dos indígenas Potiguara; a importância do indígena na história do Brasil. Hoje você percebe alguma mudança no comportamento deles, de se orgulharem; você percebe ainda que eles ainda são tímidos mas já está bem melhor que antes, hoje eles já participam um pouco mais. Os livros trazem o indígena no passado e nós professores tentamos mudar essa história. (ALECRIM, 2021, grifo nosso).5
A principal mudança é a consciência na escola indígena você sabe que é vivenciada a cultura indígena então quando os estudantes entram nela já sabe que ele vai ter um currículo diferenciado, também sabe que nela tem as atividades sobre a cultura que é um dos critérios para permanecer, é participar desses eventos culturais, esses momentos de vivências que são realizados na escola realmente fortalecem nossa cultura, nossa identidade cultural. (GOIABEIRA, 2021, grifo nosso).6
Como podemos observar nas práticas discursivas desses professores, ambos destacam a “participação” como um elemento pedagógico importante que contribui para uma mudança de postura do jovem e do adulto indígenas. Participar da Escola Indígena e das atividades propostas por ela na modalidade da EJA, a partir de um currículo diferenciado que contemple os elementos da cultura Potiguara, com práticas pedagógicas de incentivo à cultura, possibilita que esses jovens e adultos se reconheçam enquanto indígenas pertencentes a uma etnia, com posturas participativas frente à cultura da qual fazem parte.
Sobre a participação, trazemos as reflexões de Freire (1991, p. 75), que apresenta o seguinte entendimento:
[...] a participação não pode ser reduzida a uma pura colaboração que setores populacionais devessem e pudessem dar à administração pública. [...] Implica, por parte das classes populares, um ‘estar presente na História e não simplesmente nela estar representadas’. Implica a participação política das classes populares através de suas representações ao nível das opções, das decisões e não só do fazer o já programado.
À luz das reflexões de Freire (1991), podemos inferir que a participação vai além da colaboração da representação, acontecendo quando as camadas populares se apropriam de sua história enquanto sujeitos de direitos e conseguem exercer posturas e decisões que rompem paradigmas estabelecidos que não correspondem a suas realidades. É possível observar essa participação na população indígena Potiguara, a qual, por meio de suas lutas e organizações diárias, vem ressignificando a escola enquanto instituição e seu papel social, como é possível observar na prática discursiva de Santos e Silva (2021, p. 107):
Embora reconhecidos os esforços federal e estadual respaldados por leis, a movimentação das políticas públicas para colocar os ambientes escolares a serviço dos interesses e necessidades dos povos indígenas, acontecem muitas vezes, por iniciativas pensadas e executadas pela própria comunidade indígena, por meio de suas diversas representações, principalmente, pelos próprios professores indígenas, a exemplo da comunidade Potiguara, no estado da Paraíba, resultando, portanto, em atividades concretas de transformação a favor da educação escolar indígena, ao ponto de traduzir e expandir uma educação escolar autêntica e diferenciada, respeitando as especificidades socioculturais de cada povo.
Nos processos educacionais, a participação pensada e executada pela população indígena é de fundamental importância quando se pensa em uma Educação Escolar Indígena na EJA, numa perspectiva emancipatória e cidadã, na qual os próprios sujeitos exerçam o papel de gestores, professores e legisladores das políticas educacionais destinadas às populações indígenas, na direção da construção de uma educação que contemple, nos processos pedagógicos, a diversidade presente neste coletivo, bem como os valores e saberes presentes nas diversas etnias espalhadas pelo Brasil.
A partir das contribuições de Freire (1991) e de Santos e Silva (2021), podemos inferir que a participação é um elemento indispensável para uma prática pedagógica progressista, especialmente na EJA indígena, pois possibilita aos sujeitos inseridos no processo ensino -aprendizagem o exercício e o direito da fala, de interagir, intervir, sugerir e expressar seus posicionamentos, elementos de fundamental importância no processo pedagógico na formação de cidadãos. Em se tratando do jovem e do adulto indígenas, é de extrema importância esse elemento na prática pedagógica, o qual consegue promover uma educação voltada ao citado público não mais com viés de imposição e alienação, mas na direção da criticidade do respeito às diferenças, da autonomia dos sujeitos e do seu protagonismo.
Na Escola Indígena na modalidade da EJA, a partir das práticas discursivas, é possível perceber uma preocupação com o elemento da participação na modalidade nas atividades realizadas, bem como na construção do conhecimento. Existe um esforço em realizar atividades contextualizadas com a realidade dos estudantes, como já foi mencionado por outros professores. Essas estratégias metodológicas contribuem no processo de participação, visto que as atividades realizadas nas práticas pedagógicas, por contemplarem a realidade desses sujeitos, tornam-se significativas e atrativas, o que contribui para uma maior participação dos estudantes.
O professor Alecrim (2021) ainda menciona, na sua prática discursiva, as mudanças percebidas no livro didático acerca da cultura indígena. Segundo ele, a maioria dos livros traz esses coletivos utilizando verbos no passado, deixando claro o lugar que ocupam os indígenas no cenário educacional brasileiro.
No entanto, é necessário destacar que esse discurso faz emergir outro elemento pedagógico presente nas práticas pedagógicas: a criticidade dos sujeitos, mencionada também pelo professor Goiabeira (2021), ao destacar a mudança de consciência que a escola indígena proporciona. Essa mudança diz respeito à não aceitação do lugar que sempre foi delegado por alguns setores da sociedade brasileira de invisibilidade desses sujeitos. Cada vez mais, é visível um movimento de luta e resistência, com avanços e limites por espaços garantidos por lei, que nem sempre são respeitados e ocupados pelos indígenas, sendo necessário um olhar crítico da realidade e uma mudança de consciência ingênua para uma consciência crítica, como nos lembra Freire (1996), para se poder avançar na garantia dos direitos.
Sobre a criticidade, é importante destacar mos que não acontece de forma espontânea, ela é resultado de um processo educacional, no qual as práticas pedagógicas na EJA ofertada à população indígena podem ser um caminho possível para educador e educando refletirem criticamente a realidade na qual estão inseridos e, refletindo criticamente, buscarem mecanismos para intervir nas situações de injustiça social na direção de transformá-la (SILVA; SILVA, 2019).
A conscientização e a criticidade são processos educativos que podem caminhar juntos. Segundo as reflexões de Freitas (2008), elas exercem uma relação de complementaridade, como podemos observar na prática discursiva desse autor:
A conscientização, compreendida como processo de criticização das relações consciência-mundo, é condição para a assunção do comprometimento humano diante do contexto histórico-social. No processo de conhecimento, o homem ou a mulher tendem a se comprometer com a realidade, sendo esta uma possibilidade que está relacionada à práxis humana. É através da conscientização que os sujeitos assumem seu compromisso histórico no processo de fazer e refazer o mundo, dentro de possibilidades concretas, fazendo e refazendo também a si mesmos. (FREITAS, 2008, p. 157).
À luz da prática discursiva de Freitas (2008), podemos inferir que esse processo leva a uma tomada de consciência, a uma mudança de atitude e comportamentos que pode transformar-se em uma consciência crítica. Em se tratando do jovem e do adulto indígenas, a criticidade acontece quando eles começam a assumir posturas não mais de invisibilidade diante de uma sociedade que sempre considerou os indígenas como populações inferiores e do passado. A criticidade é percebida na EJA indígena quando posturas de vergonha dão lugar a posturas de orgulho e pertencimento à cultura Potiguara, que passa a ser valorizada por esses indígenas por reconhecerem a importância para a história do seu povo e para sua existência, bem como as gerações do presente e do futuro.
Os elementos pedagógicos participação e conscientização são ressaltados nos discursos dos professores Carnaúba (2021)7 e Aroeira (2021),8 os quais destacaram que a participação dos estudantes nos eventos com adereços indígenas provocou mudanças nos seus comportamentos, passando a ter uma postura de aceitação. Sobre o elemento conscientização, é algo recorrente na prática pedagógica desses professores, visto que ressalta que, quando é solicitado para o ensino da língua materna o Tupi, não o faz descontextualizado da realidade indígena: “eu faço questão de mostrar pra eles qual a importância do Tupi.” (CARNAÚBA, 2021).9 Nessa frase, é possível inferir que mostrar a importância é conscientizar, de modo que o elemento pedagógico da conscientização se encontra presente nas práticas pedagógicas dos professores indígenas da EJA, com a função de tornar os estudantes cidadãos participativos e críticos.
Para Freire (1997, p. 20), “a tomada de consciência abre o caminho à expressão das insatisfações sociais, se deve a que estas são componentes reais de uma situação de opressão”. Ao mostrar para os estudantes da EJA a importância da língua Tupi e as causas que levaram ao seu silenciamento no território Potiguara, os professores indígenas da EJA estão realizando um processo de conscientização.
A perda da língua Tupi é fruto de um processo de aculturação, e a conscientização da importância dela e o processo de revitalização que vem sendo realizado nos três municípios de Rio Tinto, Marcação e Baía da Traição demonstram a conscientização que eles possuem acerca da necessidade da preservação do Tupi para os Potiguara e a criticidade no desafio de defender sua recuperação enquanto um bem cultural.
No contexto das práticas, menciona-se, ainda, o elemento pedagógico da teoria articulada à prática, a qual Freire (1996) vai denominar de corporificação das palavras pelo exemplo. Vejamos, a seguir, os discursos dos professores sobre essa questão.
Corporificação das palavras pelo exemplo e organização
Outro elemento pedagógico que podemos destacar nas práticas pedagógicas dos professores da EJA indígena de fortalecimento à cultura indígena Potiguara é a “corporificação das palavras pelo exemplo”, ressaltada também por Freire (1996). Vejamos o que está posto no discurso da professora indígena Jatobá sobre essa questão e quais mudanças sociais podem ser perceptíveis:
O professor indígena nesse processo é muito importante, mas nós precisamos ficar atento como a história do professor ensina o estudante a fazer, mas ele mesmo não vive. Como eu posso ensinar o meu estudante a entrar numa roda de Toré, se eu mesma não entro? Como eu ensino meu estudante a usar um cocar, se eu tenho vergonha de usar o meu? Balançar uma Maracá, se eu não tenho uma? Todas as disciplinas específicas entram no currículo como um divisor de águas. (JATOBÁ, 2021, grifo nosso).10
Na prática discursiva da professora Jatobá, ela destaca um ponto que ainda não foi mencionado pelos demais colegas, que diz respeito à teoria relacionada à prática, ou seja, o ensino da temática da cultura indígena Potiguara mediado pela vivência do professor. Não basta apenas ensinar os estudantes acerca da importância de praticar a cultura indígena, é necessário o professor vivenciá-la, ser agente multiplicador.
Na tradição indígena, aprender pelo exemplo é algo muito particular da cultura. Ouvir, observar e sentir, portanto, não cabem na prática pedagógica do professor indígena na modalidade da EJA: “faça o que mando e não faça o que eu faço, quem pensa certo está cansado de saber que as palavras a que falta a corporeidade do exemplo pouco ou quase nada vale” (FREIRE, 1996, p. 34). Portanto, à luz das reflexões de Freire (1996), podemos inferir que se uma prática discursiva na EJA indígena for vazia de significado (com o professor incentivando o estudante da modalidade a praticar a cultura, mas não participando), dificilmente alcançará os objetivos de aprendizagem.
As práticas pedagógicas dos professores indígenas na EJA, pensadas na direção do fortalecimento da cultura Potiguara, incluem a participação desses sujeitos nos processos e eventos de fortalecimento da cultura, podendo ser um espaço de potencialização, motivação e envolvimento dos estudantes com a cultura local.
A partir da participação dos docentes nesses espaços, é possível que os estudantes passem a enxergar a cultura como algo positivo, considerando que o docente, em muitos casos, é alguém de referência e respeitado pelos estudantes. Com a sua prática discursiva de fortalecimento à cultura indígena aliada à prática pedagógica e a sua vivência, o professor pode ser um elemento potente nesse processo de valorização da cultura Potiguara, sendo importante ressaltar que as práticas pedagógicas na EJA indígena, quando nos referimos à cultura, não podem ser pensadas apenas na perspectiva da transmissão de conhecimento, elas precisam ser vivenciadas.
Segundo Munduruku (2009, p. 22), “o professor desempenha um papel fundamental, por ser o mediador do conhecimento”. Portanto, cabe-lhe, como facilitador do processo de ensino-aprendizagem, desenvolver práticas pedagógicas que sejam promotoras de saberes e referenciais positivos sobre a cultura indígena Potiguara, bem como desenvolver referências positivas sobre outras culturas, para que sejam rompidas imagens discriminatórias e preconceituosas que são construídas em relação à cultura do outro.
No discurso, a professora Jatobá utiliza a expressão “divisor de águas” ao mencionar a inclusão dos componentes específicos no currículo e no fortalecimento da cultura indígena Potiguara. O uso da metáfora denota uma separação, uma divisão, levando o leitor a refletir que existia um modelo de educação ofertada à população indígena antes da inclusão dos componentes no currículo e que hoje, após a inclusão, a escola possui outra configuração, que possibilita práticas pedagógicas de valorização, respeito e fortalecimento da cultura indígena no espaço escolar, considerada, segundo Fairclough (2016), uma mudança social, a qual vem sendo observada nas escolas indígenas Potiguara no litoral norte da Paraíba e, consequentemente, na EJA indígena do território.
No entanto, é preciso deixar claro que as mudanças sociais apontadas pelos professores indígenas na EJA são resultado de um processo de organização que identificamos como um elemento pedagógico importante presente em suas práticas pedagógicas discursivas, como também nas lutas e mobilizações. Por meio da organização, é possível observar, ainda, os avanços e limites que são tecidos e construídos no decorrer da história desse coletivo em uma perspectiva nacional e local em diversas áreas, principalmente no campo da educação, como podemos observar no discurso do professor indígena Aroeira:
Sim eu costumo dizer que a educação que as escolas indígenas é um pilar nesse fortalecimento dessa cultura porque assim, antes de conquistar o direito de ter nossas escolas indígenas a uma educação diferenciada específica a partir de todo uma legislação, era muito difícil quando a gente participava de um evento os jovens não gostavam de dançar o Toré tinham vergonha, ficavam escondidos. A partir do fortalecimento da educação escolar indígena isso começa a melhorar, no início nós sentimos essa resistência que eu falei, era muito grande, mas agora a partir das atividades sobre a cultura que é realizado dentro das escolas a gente sente que isso vem mudando, temos dificuldade, mas é diferente. Nós precisamos trabalhar especificamente com um calendário específico para nossas atividades então a mudança está justamente aí, a conscientização do que é ser indígena e trabalhar com essas questões na escola é de suma importância. (AROEIRA, 2021, grifo nosso).11
Na aldeia São Francisco quando eu trabalhava lá, nós tínhamos dias de juntar todo mundo no pátio da escola e a comunidade participava também do ritual do Toré. Graças a Deus, o PPP nos dá autonomia para realizar atividades que venham fortalecer nossa cultura. Então essa questão vai fazendo parte da rotina da escola e do estudante, dessa forma é trabalhado as temáticas indígenas, essas atividades vêm fortalecendo temos o calendário próprio das atividades é uma mudança lenta, mas nós já estamos vendo a nossa cultura sendo fortalecida aos poucos. (BABOSA, 2021, grifo nosso).12
Nas práticas discursivas expostas é possível observarmos processos pedagógicos de organização educacional, pontuados pelos dois docentes nas mudanças sociais visualizadas a partir do movimento de organização da Educação Escolar Indígena no território Potiguara e na modalidade da EJA.
O professor Aroeira reconhece o papel da Educação Escolar Indígena no fortalecimento da cultura e destaca o processo de organização dos indígenas Potiguara na efetivação desse direito. A organização da Educação Escolar Indígena no território Potiguara, realizada pelos professores indígenas na escola, apresenta-se como um elemento pedagógico de fundamental importância no fortalecimento da cultura. É possível observar mudanças nos discursos dos estudantes, bem como nas posturas e comportamentos assumidos pelos jovens e adultos, os quais, segundo o professor, apresentavam comportamentos de “vergonha e ficavam escondidos”. Após o trabalho que vem sendo realizado na escola indígena, passaram assumir outras posturas, de participação e aceitação da cultura.
O professor Babosa destacou, ainda, em sua prática discursiva, a importância do calendário específico, que possibilita o trabalho com temáticas do cotidiano indígena. Ações assim, aos poucos, vão contribuindo, segundo esse professor, para que aconteçam as mudanças, mesmo que lentas.
Sobre as mudanças sociais, Fairclough (2016) argumenta que as mudanças acontecem na problematização de práticas tradicionais. Logo, podemos inferir que, ao problematizar práticas tradicionais, engessadas e descontextualizadas, vivenciadas nos calendários do sistema de ensino e impostas às escolas, por práticas pedagógicas que contemplem a realidade indígena por meio do calendário, essa ação vai fomentando mudanças sociais, nas quais as datas comemorativas tradicionais da sociedade não indígena trabalhadas na escola vão sendo substituídas por momentos significativos vivenciados pela população Potiguara, inseridas nos calendários escolares das Escolas Indígenas de forma sistematizada.
Sobre o elemento pedagógico organização presente nas escolas indígenas, retomamos o discurso do professor Babosa, que ressalta a importância do Projeto Político Pedagógico, um documento construído coletivamente, que apresenta, de maneira sistematizada, as ações desenvolvidas pela escola. Consideramos esse documento um instrumento importante para a organização da escola e das práticas pedagógicas por ela realizadas, bem como um espaço para a construção e a consolidação de sua identidade.
Segundo esse professor, o Projeto Político Pedagógico serve também para possibilitar autonomia nas atividades de fortalecimento da cultura desenvolvidas no chão da escola. As reflexões de Barcellos (2012, p. 95) corroboram essa assertiva, quando ele argumenta que diante dos diversos desafios e das “amarras estaduais e municipais, as conquistas educacionais na área indígena vão acontecendo, e ganhos, nos últimos anos, vêm paulatinamente mudando a realidade”.
Concordamos com esse autor, apesar dos desafios que a Educação Escolar Indígena vivência nos âmbitos estadual e municipal. É necessário reconhecer os avanços e conquistas alcançados pelos Potiguara no que diz respeito à Educação, percebida na organização das escolas indígenas com atividades e eventos voltados para o fortalecimento desta cultura em todas as modalidades de ensino, com práticas pedagógicas de reconhecimento e incentivo à cultura, o que vem mudando a realidade de negação e silenciamento da cultura indígena antes vivenciada na região do litoral norte da Paraíba.
Após dialogarmos acerca da corporificação das palavras pelo exemplo, evidenciando a necessidade da teoria aliada à prática, no próximo tópico discutiremos a importância do diálogo nas práticas pedagógicas como um elemento importante nesse processo.
Diálogo
Destacamos, ainda, nas práticas pedagógicas dos professores indígenas da EJA, o elemento pedagógico diálogo, de fundamental importância no processo de ensino-aprendizagem, como nos lembra Freire (1996, p. 135): “ensinar exige disponibilidade para o diálogo.” Ao pensar a educação de jovens e adultos para qualquer público em uma perspectiva libertadora e no protagonismo dos sujeitos, o diálogo é um elemento de fundamental importância no processo de ensino-aprendizagem, pois possibilita que educador e educando questionem, concordem, discordem, ouçam e falem em um movimento dinâmico e dialógico.
Sobre o diálogo, vejamos como esse elemento pedagógico encontra-se presente na prática pedagógica dos professores indígenas da EJA:
Hoje a gente percebe algumas mudanças, temos estudantes que ainda tem vergonha de aceitar a sua etnicidade, mas hoje a gente já consegue um resultado bacana com muita conversa, porque eu acho importante ouvir, eles têm muito conhecimento, mas eu também tento mostrar nossa realidade e a importância de valorizar o que é nosso para que outras pessoas não tomem posse da nossa terra e da nossa história. Quando você conhece a si mesmo, o grupo étnico que você pertence, você pode falar com mais se gurança, quando não conhece é complicado, a educação escolar indígena ajuda nessa parte a gente se aceitar e valorizar. (ARRUDA, 2021, grifo nosso).13
Ainda com relação ao diálogo, o professor Arruda menciona que, na sua prática, utiliza muito das “conversas”. Na oportunidade, ele relatou que existe uma troca, visto que oportuniza aos estudantes participarem expressando suas opiniões e conhecimentos, expondo também as suas. Esse movimento realizado na prática pedagógica, embora não seja mencionado, entendemos como um elemento pedagógico no qual o professor não é apenas o transmissor do conhecimento, mas o mediador das aprendizagens por meio do diálogo, que, ainda segundo esse professor, proporciona uma “fala com mais segurança”, visto que possibilita aos sujeitos a apropriação dos conhecimentos que já possuem, tendo acesso a novos.
A respeito do diálogo, Freire (1993, p. 60) nos lembra que:
No processo da fala e da escuta a disciplina do silêncio a ser assumida com rigor e a seu tempo pelos sujeitos que falam e escutam é um ‘sine qua’ da comunicação dialógica. O primeiro sinal de que o sujeito que fala sabe escutar é a demonstração de sua capacidade de controlar não só a necessidade de dizer a sua palavra, que é um direito, mas também o gosto pessoal, profundamente respeitável, de expressá-la.
A partir das reflexões de Freire (1993), podemos inferir que o diálogo é o exercício da fala e da escuta, à medida que, na prática pedagógica na EJA indígena, o professor, enquanto mediador dos conhecimentos, possibilita esse movimento de fala e escuta de todos os envolvidos do processo ensino-aprendizagem. Assim, o diálogo está sendo efetivado, proporcionando aprendizagens.
Compreendemos o diálogo como um elemento pedagógico de fundamental importância nas práticas pedagógicas, possibilitando que estudantes e professores participem dos processos educacionais de ensino-aprendizagem de forma democrática e dialógica. Ainda sobre os elementos pedagógicos presentes nas práticas pedagógicas na EJA, no próximo tópico discutiremos o protagonismo indígena na modalidade em tela. Vejamos o que os professores apresentam em sua prática discursiva sobre essa questão.
Protagonismo indígena Potiguara
Por último, destacamos, enquanto elemento pedagógico, o protagonismo indígena. Nele é possível identificar algumas mudanças sociais apontadas pelos docentes. Vejamos o que o discurso do professor Carnaúba apresenta sobre essa questão:
O Tupí vem se fortalecendo e com ele nossa cultura, algumas pessoas de vez em quando me procuram querendo saber o significado de palavras, frases ou coisas assim... e nesse momento que eu faço questão de mostrar qual a importância do Tupi. A cultura especificamente a língua tem muitas mudanças, tem estudante indígena que chega da universidade todo orgulhoso em casa contando a mãe dele como os professores na universidade ficaram satisfeito, em saber que nós indígenas voltamos a falar o Tupi que é nossa língua, para mim é um orgulho isso, foi uma luta nossa muito grande conseguir que todas as escolas indígenas ensinassem o Tupi desde a base na infância até chegar na EJA, isso para os Potiguara foi uma vitória muito grande. (CARNAÚBA, 2021, grifo nosso).14
A prática discursiva do professor Carnaúba traz o protagonismo indígena enquanto elemento pedagógico presente nas práticas dos professores indígenas na EJA. O fortalecimento da cultura por meio do protagonismo indígena é percebido não apenas nas escolas indígenas, mas também em outros espaços, como na universidade.
Esse protagonismo indígena descrito no discurso desse professor vem acompanhado de processos de luta, resistência e organização, liderado pelos professores Potiguara, que passaram a exigir uma educação diferenciada e, nela, a inclusão, em todas as modalidades de ensino, inclusive na EJA, do ensino da língua Tupi, esquecida, apagada e silenciada no processo de colonização, mas que, aos poucos, vem sendo revitalizada, fruto do protagonismo dos indígenas Potiguara, como é possível observar no extrato do discurso do professor Carnaúba: “foi uma luta conseguir que todas as escolas indígenas ensinassem o Tupi desde a base na infância até chegar na EJA, isso para os Potiguara foi uma vitória muito grande”.
Como podemos observar na prática discursiva do professor Carnaúba, a implementação do componente curricular língua Tupi, presente oficialmente na matriz curricular indígena em todas as modalidades, inclusive na EJA, nas Escolas Estaduais do estado da Paraíba, é fruto desse protagonismo. Essa conquista tem, enquanto sujeitos de direitos, os professores indígenas Potiguara, os quais, cotidianamente, vêm investindo em práticas pedagógicas contextualizadas com a realidade do seu povo, de modo que a escola, para eles, na contemporaneidade, vem sendo ressignificada e se constituindo como um espaço não apenas de escolarização da cultura do não indígena, mas um espaço de fortalecimento da sua cultura.
Acerca do protagonismo dos professores indígenas, Fernandes (2018, p. 76) argumenta que “os movimentos de professores indígenas se constituíram como base reivindicatória por demandas específicas relacionadas à ampliação da luta de muitos movimentos indígenas por uma educação em múltiplas escalas”. Concordamos com esse autor: é visível que o movimento de professores indígenas se constitui como um instrumento importante na luta, no intuito de que seja implementado o que determina a lei acerca das políticas educacionais para a população indígena no Brasil.
Na Paraíba, a organização dos professores indígenas Potiguara (OPIP) vem mobilizando os professores e a população indígena no que se refere às políticas educacionais em todas as modalidades, fortalecendo a Educação Escolar Indígena “por promover entre os professores indígenas, o despertar de ensinar as gerações mais jovens, a valorização dos ensinamentos provenientes das tradições e costumes que forma a cultura do povo Potiguara” (SILVA; SANTOS; SILVA, 2021, p. 64).
Ainda sobre o protagonismo indígena, ele se reflete na prática pedagógica dos professores indígenas de “tornar ensinável o que se vive no cotidiano das aldeias, quando um dos resultados da colonização é o distanciamento e a negação deste cotidiano plural e conflitivo, vivenciado por diversas gerações Potiguara” (SILVA; SANTOS; SILVA, 2021, p. 59).
Nessa direção, o protagonismo indígena efetiva-se quando os próprios professores são promotores de ações de fortalecimento da cultura Potiguara no chão da escola indígena, nas aulas de campo, na semana de conscientização indígena, na marcha cultural, entre outras ações promovidas e organizadas pelos professores que possuem como intencionalidade trazer para o espaço escolar temáticas esquecidas e silenciadas pelo processo de colonização, mas que, na contemporaneidade, vêm sendo inseridas no cotidiano escolar no calendário das escolas indígenas.
Um exemplo desse protagonismo realizado no chão da escola indígena são os eventos, como a semana cultural, em que as práticas pedagógicas dos professores são direcionadas à promoção e ao fortalecimento da cultura local. Vejamos:
A Semana cultural, que é uma iniciativa que contempla as seguintes categorias: religião, rituais e festas tradicionais, músicas, cantos e danças, textos escritos, língua indígena, medicina tradicional, jogos e brincadeiras, artesanato, pintura corporal, grafismo, contos, espiritualidade indígena. Além disso tudo, inclui outras categorias de expressão simbólica, as quais são trabalhadas em forma de oficinas. Essas oficinas têm como objetivo buscar a interação entre escola/família/comunidade, para que dessa forma possam incentivar, conscientizar e fortalecer a identidade cultural Potiguara, bem como a preservação do meio ambiente, promovendo, assim, ações que os incentivem a se desenvolver como cidadãos críticos, conscientes e protagonistas da sua própria história. (SANTOS; SILVA, 2021, p. 110).
O protagonismo indígena Potiguara, pedagogicamente, é materializado em ação de fortalecimento à cultura, como a semana cultural, que traz para a sala de aula seus rituais, as tradições, a língua, a medicina tradicional, a espiritualidade e a ancestralidade, entre outros elementos, efetivados pelos professores, que fazem parte da cultura e da tradição indígenas Potiguara.
Nessa direção, o protagonismo indígena Potiguara é reafirmado cotidianamente quando os indígenas recusam uma categoria de educação versada na ideia de tutela ou política de apagamento dotada e naturalizada pelo Estado brasileiro e propõem outra categoria de educação, pautada na sua ancestralidade e cosmovisão (SILVA; SANTOS; SILVA, 2021).
Na EJA indígena Potiguara é possível observarmos ações de protagonismo dos professores nas práticas pedagógicas, as quais foram pontuadas nas ações desenvolvidas nos componentes específicos Etno-história, Arte e Cultura e Língua Tupi, em favor do fortalecimento da cultura, bem como nos movimentos de mobilização e reivindicação que acontecem em prol do fortalecimento e da efetivação das políticas educacionais indígenas no estado da Paraíba.
Percebe-se uma ação efetiva de luta e mobilização desses sujeitos na direção de cobranças dos órgãos públicos para ser cumprido o que determina a legislação educacional brasileira acerca da educação para a população indígena.
Nesse processo de fortalecimento da cultura indígena Potiguara no chão da escola na modalidade da EJA, são fundamentais os elementos pedagógicos organização, criticidade, participação, educação contextualizada, corporificação das palavras pelo exemplo, diálogo e o protagonismo indígena, pois contribuem de modo mais efetivo e sistemático para a construção de práticas pedagógicas de fortalecimento da cultura, as quais se constituem como mais uma ação de resistência dessa população no litoral norte da Paraíba, bem como um instrumento de luta por políticas públicas na melhoria da Educação Escolar Indígena e na modalidade da EJA no território Potiguara.
Considerações finais
À guisa de considerações finais, percebemos que as práticas pedagógicas tradicionalmente impostas para o público indígena possuem viés homogeneizador, de forte influência colonial e dominadora, características essas de uma educação bancária, que, por muito tempo, foi ofertada à população de jovens e de adultos indígenas.
No entanto, as práticas pedagógicas que vêm sendo construídas pela população indígena Potiguara no litoral norte da Paraíba, na modalidade da EJA, são aquelas que promovem uma educação contextualizada, com fomento do protagonismo indígena, da participação, da criticidade, da corporificação da palavra pelo exemplo e do diálogo.
A partir dos discursos postos, percebemos que os elementos pedagógicos citados pelos professores na modalidade em tela têm como objetivo contribuir para o fortalecimento da cultura, de modo a se tornarem mais uma ação de resistência dessa população no litoral norte da Paraíba nas Escolas Indígenas e na Educação de Jovens e Adultos, de forma que a educação ofertada na escola e na modalidade seja mais participativa, crítica, democrática e emancipatória.
Apesar disso, destacamos a importância de pensar as práticas pedagógicas a partir de um viés intercultural, de modo que seja contemplada nos processos pedagógicos a dimensão cultural, bem como o respeito às diferenças, tendo em vista que os sujeitos da EJA compõem um perfil não homogêneo. Vimos, entre os professores entrevistados, a preocupação com o fortalecimento da cultura Potiguara na EJA, uma vez que é recorrente em sua prática discursiva que as atividades de consolidação cultural acontecem, de forma mais efetiva e sistematizada, no componente curricular de Etno-história, no qual são discutidas temáticas relacionadas à demarcação do território, aos conflitos vivenciados no cotidiano para manter-se na terra, às temáticas ligadas à saúde indígena, à preservação das tradições, à ancestralidade, à demarcação, à retomada dos espaços tradicionais, à preservação da natureza, entre outras questões.
Assim, ao analisar os elementos discursivos presentes nas práticas pedagógicas dos professores indígenas da etnia Potiguara, na modalidade da EJA, nos municípios de Rio Tinto, Marcação e Baía da Traição, nos componentes curriculares Etno-história, Arte e Cultura e Língua Tupi, podemos concluir e validar a seguinte tese: a educação contextualizada, o protagonismo indígena, a participação, a criticidade, a corporificação da palavra pelo exemplo e o diálogo são elementos presentes nas práticas pedagógicas discursivas desenvolvidas por professores indígenas da modalidade da EJA nas escolas da comunidade Potiguara, as quais têm contribuído para o fortalecimento desta cultura, constituindo-se como mais uma ação de resistência dessa população no litoral norte da Paraíba.