Introdução
Muitos estudantes questionam o motivo de terem de aprender ciências, sobretudo aqueles educados na perspectiva tradicional, centrada na transmissão passiva de conteúdos. Este tipo de ensino pode acarretar em inibição do pensamento especulativo e da criatividade, visto que vai em direção totalmente contrária ao caráter investigativo da ciência, e não promove relacionamentos dela com os aspectos históricos, sociais e ambientais que poderiam prover sentido ao estudo da ciência na escola. (MILLAR, 2003).
Documentos da área de educação em ciências em todo o mundo (por exemplo, BRASIL, 2002; MILLAR; OSBORNE, 1998) apresentam várias recomendações que procuram atender a uma reconhecida necessidade de atualização do currículo de ciências. No caso dos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 2002), isto é feito por meio da proposta de desenvolvimento de competências gerais que dizem respeito aos domínios de:
• representação e comunicação, envolvendo a leitura e interpretação de códigos, nomenclaturas e textos próprios, a transposição entre diferentes formas de representação, a busca de informações, a produção e análise crítica de diferentes tipos de textos;
• investigação e compreensão, ou seja, o uso de ideias, conceitos, leis, modelos e procedimentos científicos associados a determinadas disciplinas;
• contextualização sociocultural, que visa situar, claramente, o contexto em que os conhecimentos científicos e tecnológicos são desenvolvidos e aplicados.
Uma abordagem que busca atender às exigências contemporâneas para o ensino de ciências é a utilização de atividades de construção, expressão, teste e utilização de modelos4. Isto porque, dentre outros motivos, tais atividades apresentam o caráter investigativo da ciência, levam em consideração as ideias prévias dos estudantes e a importância da compreensão dos modelos como representações parciais do conhecimento científico. A utilização de atividades de modelagem, isto é, atividades voltadas para a construção, reformulação e validação de modelos, pode resultar em um ensino mais significativo, que ajude o estudante a desenvolver um entendimento mais crítico e coerente com a própria ciência. Além disso, o ensino fundamentado em modelagem pode contribuir para que os estudantes aprendam sobre como o conhecimento científico é produzido - aspecto coerente com um ensino de ciências mais autêntico (GILBERT, 2004).
O uso de atividades de modelagem caracteriza uma situação de ensino construtivista sociointerativa (VYGOTSKY, 1986), na qual a construção de conhecimento ocorre por meio de interações estudante-estudante e/ou professor-estudante, o que, neste trabalho, chamamos de processo de coconstrução de conhecimento. Nessa situação, é importante identificar quais entidades podem auxiliar na construção do conhecimento científico, pois isto pode fomentar e/ou facilitar a ocorrência dessas atividades em salas de aula. Considerando uma abordagem sociocultural, podemos chamar essas entidades de mediadores. Wertsch (1985) define mediadores, a partir dos relatos de Vygotsky, como sendo ferramentas psicológicas ou signos para o controle da própria atividade e da dos outros.
Este trabalho está focado na caracterização do papel dos mediadores, e das ações desencadeadas pelos mesmos, em um contexto de ensino fundamentado em modelagem. Seus resultados, isto é, a análise de como os mediadores podem ajudar os estudantes a construir conhecimento, podem contribuir para favorecer um ensino de maior qualidade. Além disso, considerando as especificidades desse contexto de ensino fundamentado em modelagem caracterizadas a posteriori neste trabalho, acreditamos que nossas conclusões podem ser estendidas para outros contextos de ensino investigativo.
Texto na íntegra em PDF