1 INTRODUÇÃO
A internacionalização da educação superior (ES) é uma realidade cada vez mais evidente, nas instituições públicas de educação superior brasileira, demonstrada, dentre outros indicadores, pela oferta de bolsas no exterior3. Na lógica das armadilhas e ilusões da sociedade do conhecimento, a internacionalização da educação passou a ser fundamental, enquanto fator demonstrativo da inserção dos países na globalização econômica, além de significar, para os organismos internacionais (OI), uma alavanca para o crescimento econômico, na perspectiva mercadológica. Essas posições têm contribuído para que a ES seja um agente preponderante da geração do conhecimento útil, enquanto força produtiva para a expansividade do capital. A dimensão internacional da ES passou a ser prioridade tanto para os governos nacionais, quanto para os OI, levando Universidades a se organizarem no sentido de atender essa demanda.
O papel das agências brasileiras de fomento, que incluíram a internacionalização como indicador de qualidade dos Cursos, com destaque aos Programas de Pós-Graduação stricto sensu, tem levado a um incremento de estratégias para o desenvolvimento de programas, em parceria com instituições com sede em outros países, incentivando a mobilidade de estudantes e docentes, a criação de redes de pesquisa, a inclusão no currículo de disciplinas ministradas em inglês, a participação de professores visitantes estrangeiros e outras ações.
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE, 2008), o Banco Mundial (BM, 2012) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO, 2018) têm se manifestado por meio de documentos, tais como a Declaração de Porto Alegre, oriunda da VIII Conferência Regional de Educação Superior (UNESCO, 2018), em relação ao significado que a internacionalização da educação representa para o desenvolvimento econômico de um país. Da mesma forma, estudiosos como Morosini e Nascimento (2017) e Associações Internacionais têm publicado documentos com evidências do papel dessa estratégia que pode contribuir com a produção de conhecimentos e com o processo de inovação tecnológica.
Quando se fala de internacionalização da ES, é preciso que se explicite a acepção atribuída a esse processo, cujo sentido tem sido ressignificado, através do tempo. A internacionalização que, nos anos 1980, significava preponderantemente uma relação vertical de países do Norte (Estados Unidos e Europa) com os países em desenvolvimento, foi evoluindo, na atualidade, para outras lógicas. Knight (2005), De Wit (2011) e Bernheim (2018) têm levantado a questão dessas mudanças e procurado atualizar a concepção de que a internacionalização vem ganhando no século XXI.
A exigência pelo estabelecimento estratégico de ações de internacionalização na pós-graduação brasileira, sobretudo, a partir dos anos 2000, tem sido um dos eixos norteadores de avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). No quadriênio de 2013 a 2016, essa agência instituiu como imperativo, para o grau de excelência (notas 6 e 7) de um Programa, o nível de internacionalização, demonstrado também pela liderança, nucleação e solidariedade (CAPES, 2016).
Considerando os indicadores de avaliação da CAPES, a internacionalização das Instituições de Ensino Superior (IES) tem ganhado a centralidade do debate na esfera da academia, sobretudo por representar uma demanda complexa que tem requerido inúmeras articulações e diferentes estratégias na organização das relações global/interculturais/internacionais das universidades. Segundo Knight (2003, p. 1-2, tradução nossa), “dimensão internacional, intercultural e global são três termos usados intencionalmente como uma tríade. [...] Esses três termos se complementam e juntos representam a riqueza em termos de amplitude.”
No transcurso da internacionalização das IES, subjaz uma preocupação com os Programas de Pós-Graduação em Educação (PPGE) mais novos que, em sua maioria, estão localizados na região Norte do Brasil, no sentido de saber de que forma estão implementando as diretrizes da CAPES na organização estrutural, assim como na realização de acordos e cooperação internacionais, intercâmbios, ensino e extensão, produções científicas no quadriênio 2013-2016 e no período de 2017-2018.
Assim, este artigo tem como objetivo apresentar uma análise do processo de internacionalização dos PPGE da região Norte do Brasil, evidenciando estratégias, mecanismos adotados e os resultados obtidos. Essa análise traz informações e dados sobre as ações que essas instituições vêm desenvolvendo, tais como as estruturas, as produções científicas, o estabelecimento de convênios e cooperações, fazendo-se uma relação com a natureza da internacionalização que vem sendo priorizada nessas instituições.
Este artigo está organizado em três seções, além desta Introdução e das Considerações Finais. Na seção (2), aborda-se a importância que é atribuída à internacionalização por diferentes OI, acadêmicos e governos. Também são apresentados alguns sentidos atribuídos à internacionalização. Na seção (3), especifica-se o método e procedimentos de pesquisa que se fundamentam no materialismo histórico-dialético. Na seção (4), apresentam-se os principais resultados provenientes da análise documental, identificando a política que os PPGE da região Norte do Brasil estão desenvolvendo para atingir os objetivos na dimensão da internacionalização. Nas considerações finais, apontam-se aspectos importantes para a questão em estudo.
2 ASPECTOS TEÓRICO-ANALÍTICOS: A INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO
A internacionalização da ES é hoje uma realidade para inúmeros governos, instituições e organizações internacionais. A OCDE, o BM e a UNESCO têm se manifestado em relação a este processo, ainda que de formas diferentes. A OCDE (2008) deixa claro que o futuro da ES está na internacionalização e dá destaque ao papel que a criação de redes de conhecimento entre países pode desempenhar para o desenvolvimento e o crescimento econômico entre as partes envolvidas nesse processo.
O Banco Mundial (2012) destaca a importância da internacionalização, enquanto uma estratégia básica para a construção de uma universidade de classe mundial. Para esse organismo, é importante que se estimule a criação de “universidades competitivas em nível global”, que sejam capazes “de rivalizar no mercado mundial da educação superior por meio da aquisição, da adaptação e da criação de conhecimentos avançados” (BM, 2012, p. 3-4).
O Instituto Internacional de Educação Superior para a América Latina e Caribe (IESALC), órgão da UNESCO, no VIII Encontro de Redes Universitárias e Conselho de reitores da América Latina e Caribe, realizado em 2017, apresentou na Declaração de Porto Alegre, oriunda do evento, a importância de “fortalecer a internacionalização solidária da educação superior na América Latina e Caribe, especialmente aquelas já existentes na região” (UNESCO, 2017, p. 6).
Em junho de 2018, ocasião da celebração dos 100 anos da Reforma de Córdoba, realizou-se, naquela cidade, a III Conferência Regional de Educação Superior para a América Latina e o Caribe, com o protagonismo do UNESCO/IESALC. Essa Conferência, como as anteriores, tem sido o momento privilegiado, no qual reitores e outros participantes ativos da elaboração e execução de políticas para a ES se reúnem, propõem e reafirmam a construção da educação, enquanto um “bem público social, um direito humano e universal, e um dever dos Estados” (UNESCO, 2018, p. 1). A Declaração, oriunda desse evento, assinala que “a internacionalização se constitui em uma ferramenta chave para transformar a educação superior, fortalecer suas comunidades e promover a qualidade e pertinência do ensino, da pesquisa e da extensão” (UNESCO, 2018, p. 7).
No caso brasileiro, no Plano Nacional de Educação, Lei n. 13.005/2014 (BRASIL, 2014), as estratégias da Meta 14 apontam a necessidade de “consolidar programas, projetos e ações que objetivem a internacionalização da pesquisa e da pós-graduação brasileira” e a importância de “promover o intercâmbio científico e tecnológico, nacional e internacional, entre as instituições de ensino, pesquisa e extensão”, como ações que poderão impulsionar a expansão da pós-graduação no país.
A CAPES (2017, p. 4) considera que “a internacionalização das IES tem o potencial de transformar as vidas de estudantes” além deter “um papel cada vez maior para ciência através da intensa troca de conhecimento acadêmico, permitindo assim a construção de capacidades sociais e econômicas”. Para essa instituição, a internacionalização é um componente estratégico de sua missão e, por isso, elaborou e aplicou um questionário para levantar dados sobre a situação atual da internacionalização nas Instituições de ES. Uma das ações decorrentes desse posicionamento foi o lançamento do Programa Institucional de Internacionalização (PRINT)4 da CAPES, cujo objetivo é fomentar a construção, a implementação e a consolidação de planos estratégicos de internacionalização das instituições, por meio de recursos financeiros que possibilitem a criação de redes de pesquisa, a mobilidade discente e docente, dentre outras atividades.
Há uma convergência de interesses que perpassam as instituições nacionais e internacionais, na busca da realização do objetivo que, na contemporaneidade, aparece como uma prioridade, qual seja, internacionalizar as instituições de ES. Mas é importante que se identifique qual é a natureza dessa internacionalização que está sendo buscada, quais são seus objetivos e quais as estratégias que estão sendo utilizadas.
Morosini e Nascimento (2017, p. 288) destacam que “é nesse cenário que a internacionalização da educação superior constrói-se como um conceito-chave neste século, deslocando-se de uma posição periférica a uma posição central e imbricada a uma noção positiva de qualidade”. Para a Association Nationale des Universités (AIU, 2012), a internacionalização é parte integrante de um processo contínuo e central de mudança na ES.
Knight (2005) diz que a internacionalização quer dizer coisas diferentes para pessoas diferentes, causando, em função disso, muitas confusões sobre seu exato significado. A autora expõe alguns dos sentidos atribuídos ao termo, tais como mobilidade acadêmica de estudantes e professores, vínculos e associações a novos programas acadêmicos internacionais, investigação conjunta com parceiros de outros países, a inclusão de uma dimensão intercultural, internacional ou global, no plano de estudos e no processo de ensino-aprendizagem.
Para a AIU (2012), a internacionalização da educação superior é um processo e, como tal, está constantemente sendo redefinida em função do próprio contexto no qual está inserida, mudando de acordo com as alterações que esse contexto venha a sofrer, sendo assim um conceito em evolução. Esse conjunto de compreensões e definições, concernentes ao sentido da internacionalização, por vezes, tem criado dificuldades no desenvolvimento de políticas, programas e planos que possam ser implementados por países e governos. Por isso, considera-se importante analisar diferentes perspectivas da internacionalização, para entender as concepções e as funções dos PPGE da região Norte, objeto central deste texto.
3 MÉTODO
Adotou-se o materialismo histórico-dialético como método de trabalho, o que demanda um tratamento crítico no esforço pelo entendimento do tema, em sua totalidade histórico-social. Essa abordagem permitirá a compreensão da relação da internacionalização e da realidade dos PPGE do Norte do Brasil, efetuando-se comparações com as recomendações dos OI, do Estado e da política educacional, imbricados nesse processo. Nesse entendimento, considerou-se como ocorre tal correlação, a partir das mediações com o tema e os diferentes contextos econômicos, sociais, políticos e culturais.
A natureza da pesquisa é de cunho quantitativa-qualitativa, desenvolvida por meio do estudo bibliográfico e documental. Assim, explorou-se a literatura disponível, nacional e estrangeira, no sentido de embasar os aspectos teóricos do estudo. Na pesquisa documental, avançou-se na compreensão de que os documentos são objetos de conhecimentos nomeados, de opiniões, de vertentes, de referência, de conteúdo. Manifestam e originam uma combinação de intencionalidades, valores e discursos (EVANGELISTA, s/d).
Considerando-se esses pressupostos, o estudo documental, com utilização da técnica de Análise de Conteúdo, segundo Bardin (2011), ocorreu em três fases: 1) pré-análise; 2) exploração do material; e 3) tratamento dos resultados, inferência e interpretação. Os seguintes documentos se constituíram no corpus do trabalho: Planos de Desenvolvimento Institucional das universidades da região Norte, Dados da Plataforma Sucupira do quadriênio 2013-2016 e do período de 2017-2018 e homepage das seguintes IES: Universidade Estadual do Pará (UEPA); Universidade Estadual de Roraima (UERR); Universidade Federal do Acre (UFAC); Universidade Federal do Amazonas (UFAM); Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA); Universidade Federal do Pará5 (UFPA); Universidade Federal de Tocantins (UFT); Universidade Federal de Rondônia6 (UNIR) e Universidade Federal do Amapá7 (UNIFAP).
No tocante às múltiplas condições materiais que apresentam o fenômeno em tela, compreende-se ser fundamental romper com as aparências e com a perspectiva descritiva do objeto de pesquisa, para atingir a essência do fenômeno. De tal maneira, torna-se relevante debater as concepções, as influências e os cenários da internacionalização nas IES na região Norte do Brasil, no tempo presente de ação do capitalismo, pois não é possível entender o que se passa em qualquer recorte específico, sem compreender as determinações contextuais dos sujeitos, pois “os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstância de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado” (MARX, 1978, p. 17).
4 RESULTADOS
A região Norte do país, constituída pelos estados do Amazonas, Roraima, Amapá, Pará, Tocantins, Rondônia e Acre, é a maior entre as cinco regiões brasileiras, representando 45,25% do território nacional, com uma população de 18,4 milhões de habitantes e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0.730, segundo dados do IBGE (2019). Apesar do espaço geográfico que ocupa, há uma rarefação demográfica e o IDH é o segundo menor entre as cinco regiões brasileiras.
Os fatores geográficos, políticos e econômicos da região se constituem em elementos fundamentais para a implantação tardia dos PPGE. A Universidade Federal do Amazonas foi pioneira no assunto, tendo o primeiro curso, surgido ainda na segunda metade da década de 1980. Contudo, houve uma longa interrupção de sua oferta, tendo voltado a funcionar em 1995, após ter sido credenciado pela CAPES. Os demais estados tiveram seus cursos implementados a partir dos anos 2000 (Quadro 1), com destaque para a UFPA, a maior da região, que teve o Curso de Mestrado reconhecido em 2002, com a primeira turma implementada no ano seguinte e o Curso de Doutorado que passou a funcionar em 2008.
IES | Nome do Programa | Início | Nota | Nível |
---|---|---|---|---|
UFAM | EDUCAÇÃO | 1987 | 3 | Mestrado/Doutorado |
UFPA | EDUCAÇÃO | 2003 | 5 | Mestrado/Doutorado |
UEPA | EDUCAÇÃO | 2005 | 4 | Mestrado/Doutorado |
UFT | EDUCAÇÃO | 2012 | 3 | Mestrado |
UNIR | EDUCAÇÃO | 2012 | 4 | Mestrado |
UERR | EDUCAÇÃO | 2014 | 3 | Mestrado |
IES | Nome do Programa | Início | Nota | Nível |
UFAC | EDUCAÇÃO | 2014 | 3 | Mestrado |
UFOPA | EDUCAÇÃO | 2014 | 4 | Mestrado |
UFPA | EDUCAÇÃO E CULTURA | 2014 | 3 | Mestrado |
UFPA | CURRÍCULO E GESTÃO DA ESCOLA BÁSICA | 2015 | 3 | Mestrado |
UNIFAP | EDUCAÇÃO | 2017 | 3 | Mestrado |
Fonte: Elaborado pelas autoras, com base na Plataforma Sucupira - Quadrienal de 2017
Observa-se que, na região Norte, existem 11 Cursos de Mestrado em Educação e somente três Cursos de Doutorado em Educação, nos sete estados, de um total de 279 Mestrados e 98 Doutorados, abrangendo todas as áreas do conhecimento. Outro aspecto a ser destacado dos dados, contidos no Quadro 1, refere-se ao fato de que apenas um Programa (PPGE/UFPA) obteve, na última avaliação da CAPES, a nota 5, o que sugere, dentre outros indicadores, uma maior inserção nos itens relativos ao processo de internacionalização.
Um dos indicadores considerados neste artigo, em função de seus objetivos, foi a produção acadêmica dos PPGE da região Norte. Houve uma produção, desde a criação de todos os Programas até o ano de 2019, de 1.003 dissertações e 168 teses, totalizando 1.171 produtos de finalização de Curso. Pode-se inferir que a temática internacionalização, apesar da importância destacada na própria academia e pelo significado que as agências de fomento públicas vêm dando ao assunto, não está ainda plenamente presente nos programas, tomando-se como base o resultado representado pelas dissertações e teses. De 11 PPGE existentes na região, distribuídos em nove instituições, apenas a UFPA (com três Programas) apresentou 10 produções e a UFAM apenas uma.
Para Knight (2005, p. 22, tradução nossa), a internacionalização é vista como “o processo de integração de uma dimensão internacional, intercultural ou mundial nas finalidades, nos papéis ou na organização do ensino pós-secundário”. A AIU (2012, p. 3, tradução nossa) amplia o conceito de Knight para a internacionalização da educação superior, reafirmando que “é o processo intencional de integrar uma dimensão internacional, intercultural ou global ao propósito, às funções e à entrega do ensino pós secundário” e inclui um complemento que dá um sentido mais político e social ao termo, ou seja, “a fim de melhorar a qualidade da educação e da pesquisa para todos os alunos e funcionários, e para dar uma contribuição significativa para a sociedade”. Philip Altbach et al. (2008, apud DE WIT, 2011, p. 4, tradução nossa) dizem que “a internacionalização se define como a variedade de políticas e programas que as universidades e os governos implantam para responder à globalização”.
Bernheim (2018) analisa o papel e as funções da internacionalização na atualidade e destaca que esta deve “contribuir para gerar um maior entendimento entre as culturas e as nações, ao mesmo tempo que põe as bases para o que mais falta na globalização atual: a solidariedade humana”. Além disso, salienta o autor, “a internacionalização é também uma contribuição à superação da crise epistemológica que vive a educação na atualidade” (BERNHEIM, 2018, p. 18, tradução nossa).
Na ficha de avaliação, utilizada na última Quadrienal da CAPES (2017), em três itens há elementos que permitem visualizar as ações que foram desenvolvidas e abrangem também as questões da internacionalização8: Proposta do Programa, Corpo Docente e Inserção Social9. A Proposta do PPGE da CAPES vai repercutir diretamente em três outros pontos, quais sejam, nos intercâmbios, nas citações internacionais e nas bibliografias das disciplinas ministradas.
Ao analisar-se a atuação do PPGE da região Norte, observa-se no Quadro 2 que três Programas pontuaram Fraco ou Regular, no que diz respeito às propostas que estão sendo apresentadas e desenvolvidas, no tocante ao aspecto da internacionalização. Apenas os Programas da Universidade Federal do Amazonas e da Universidade Federal do Pará foram avaliados como tendo desenvolvido de forma muito satisfatória, no item Inserção Social, a Dimensão Internacional, o que implica, dentre outros aspectos, o pós-doutoramento e a participação de professor visitante do corpo docente do programa, em centros de excelência no exterior; o número de professores visitantes estrangeiros recebidos pelo programa; o Intercâmbio de alunos com IES do exterior (sobretudo bolsas sanduíche); a participação de docentes e doutorandos em eventos internacionais de alto nível; o financiamento internacional de projetos e outras atividades; a participação de docentes em comitês, consultorias, editoria de periódicos e outras atividades no exterior; a participação em projetos de pesquisa de colaboração internacional.
Itens de avaliação/quesito | PROGRAMA/IES10 | AVALIAÇÃO | Percentual distribuído |
---|---|---|---|
Proposta do Programa Planejamento do programa com vista a seu desenvolvimento futuro, contemplando os desafios internacionais da área, na produção do conhecimento, seus propósitos na melhor formação de seus alunos, suas metas quanto à inserção social mais rica dos seus egressos, conforme os parâmetros da área. |
UFPA/CAMETÁ | FRACO | 10% |
UFOPA/UNIR | REGULAR | 20% | |
UFPA-NEB*/UEPA/ UFAC/UERR/UFT |
BOM | 50% | |
UFPA/UFAM | MUITO BOM | 20% | |
Corpo Docente Intercâmbios e inserção acadêmica com instituições estrangeiras e nacionais; Participação em eventos internacionais; Indicação de autoria estrangeira, nas referências bibliográficas das disciplinas. |
UFPA/CAMETÁ | FRACO | 10% |
UFAC/UERR/UFT | REGULAR | 30% | |
UFPA-NEB*/UEPA/ UFOPA/UNIR |
BOM |
40% | |
UFPA/UFAM | MUITO BOM | 20% | |
Inserção social Integração e cooperação com outros programas e centros nacionais e estrangeiros. |
UFPA-NEB* UFOPA/UFAC |
REGULAR | 30% |
UFPA-NEB*/UERR/ UEPA/UFT |
BOM | 40% | |
UFPA/UFAM/UNIR | MUITO BOM | 30% |
Fonte: Elaborado pelas autoras, com base nos relatórios da Avaliação da CAPES (2017).
* Programas que não completaram um ciclo avaliativo de quatro anos.
Ganha destaque, no processo de internacionalização da educação superior, a mobilidade de estudantes. A OCDE (2016) informa que um em cada 10 estudantes, cursando o Mestrado, está em mobilidade internacional e, no Doutorado, isso representa um estudante em cada quatro. Ou seja, há uma grande movimentação para esse tipo de internacionalização, mas sabe-se que existem várias outras formas que, se contabilizadas, vão representar um grande quantitativo de estudantes e professores inseridos no processo de internacionalização da ES. Na região Norte, apenas 12 estudantes realizaram o chamado doutorado sanduíche, isto é, fizeram uma parte do curso, entre seis a 12 meses, em uma instituição localizada em outro país. No caso específico, talvez pela baixa em proficiência em outros idiomas, as escolhas dos alunos quanto ao país-destino foram Portugal, Colômbia, Argentina, Espanha e México.
Fonte: Elaborado pelas autoras, com base nos relatórios da Plataforma Sucupira
Avaliação Quadrienal (2017) e anos 2017, 2018.
Nas ações que promovem a internacionalização acadêmica, destacam-se o Grupo Coimbra de Universidades Brasileiras (GCUB)11, o Programa Alianças para a Educação e a Capacitação (PAEC)12 que, em parceria com a Organização dos Estados Americanos (OEA), selecionam estudantes de vários países, para cursar mestrado ou doutorado em IES no Brasil. Na região Norte, visualizamos, dos 11 PPGE, cinco adesões aos editais do PAEC e uma ao edital do Programa Nacional de Pós Doutorado (PNPD/CAPES), com destaque para o Programa da UFPA que possui mestrado e doutorado, aprovando três bolsistas. Tais ações13 estão se consolidando como importantes mecanismos para a internacionalização, no âmbito da cooperação sul-sul.
Os PPGE da região Norte têm desenvolvido ações que visam atender ao aspecto da internacionalização para atender as exigências da avaliação, realizada pela CAPES, mas também levam em conta a importância e a necessidade da inserção dos estados em uma plataforma global, na qual seria possível um compartilhamento maior dos avanços científicos e uma busca conjunta de soluções para os problemas sociais e econômicos, envolvendo a parte mais pobre do país do ponto de vista econômico, apesar de suas riquezas naturais, como a floresta e a hidrografia. O Gráfico 2 apresenta os números relativos às ações de internacionalização, desenvolvidas pelos Programas.
Fonte: Elaborado pelas autoras, com base nos relatórios da Plataforma Sucupira da CAPES - Avaliação Quadrienal 2017 e anos 2017, 2018.
Mais uma vez, constata-se que a UFPA, com o PPGE, e a UFAM capitaneiam as atividades de eventos internacionais, participação de professores visitantes em programas no exterior, alunos e docentes apresentando trabalhos em eventos no exterior, professores realizando pós-doutorado, estudantes fazendo doutorado sanduíche e a constituição de redes internacionais de pesquisa.
Pela análise dos Planos de Desenvolvimento Institucional (PDI), foi constatado que a internacionalização aparece institucionalizada em 50% das IES que têm, em sua estrutura organizacional, uma unidade administrativa específica para esta dimensão. A UFPA é única da região que consta, na estrutura organizacional, com uma Pró-reitoria exclusiva para o desenvolvimento da internacionalização. Nos documentos analisados, todas as IES concebem a internacionalização alinhadas a objetivos, metas e estratégias institucionais sistematizados, porém com disparidades quanto à sua relação entre ensino, extensão e pesquisa.
As IES definem estratégias para alavancar essa dimensão que se expressa em todas as instituições, em forma de parcerias com a finalidade de promover a visibilidade da universidade em âmbito global e de captar recursos humanos e financeiros, na produção de conhecimento científico e tecnológico. Chama-se a atenção para as ações no tocante à mobilidade e ao intercâmbio estudantis, que se configuram como uma tendência governamental e institucional, para o alcance de patamares mais elevados dessas universidades em âmbito mundial. “[...] A captação de recursos via projetos de pesquisa e programas de cooperação internacional tornou-se, de um modo geral, uma das fontes de financiamento de maior importância para as universidades brasileiras” (UFPA, 2016, p. 50).
As ações direcionadas aos professores/pesquisadores aparecem nos PDI de forma desigual e pontual, na maioria das IES, com destaque para a participação em redes de pesquisas internacionais. De um modo geral, há diversas ações de internacionalização, com ênfase para a mobilidade e o intercâmbio por meio de parcerias e convênios com órgãos governamentais e instituições internacionais. “O processo colaborativo no âmbito acadêmico e científico se transformou numa necessidade muito maior, em função das transformações tecnológicas e socioeconômicas na era do mundo globalizado [...]” (UFAC, 2015, p. 35).
Percebe-se que as parcerias para a promoção da interculturalidade14, propostas pela UFPA, pressupõem a produção do conhecimento e a compreensão de outras culturas e realidades, que se contrapõem ao conceito de internacionalização como produção de conhecimento a serviço do mercado. Assim, o direcionamento dado à internacionalização se faz por meio de ações que envolvem a mobilidade e o intercâmbio de professores e estudantes, a participação em redes de pesquisa educacional, o estímulo à pesquisa por parcerias com instituições nacionais e internacionais, a celebração de convênios e também há uma sinalização para o conhecimento de outros idiomas com a capacitação/formação em língua estrangeira para docentes e técnicos e inclusão de disciplinas de línguas estrangeiras nos programas de pós-graduação.
Outro elemento importante a ser destacado é as políticas e as diferentes estratégias que vêm sendo adotadas pelas IES (Quadro 3).
Políticas, Estratégias e Ações | Atividades | Percentual distribuído |
---|---|---|
Estrutura organizacional | Núcleo (UFAM); Diretoria (UFT); Assessoria (UFAC); Pró-reitoria (UFPA); Coordenação (UEPA). |
55,5% |
Formação/pesquisa para docentes | - Capacitação em línguas estrangeiras (UERR/UFAM/UFPA); - Participação em eventos internacionais (UERR/ UFT/UFAC); - Participação em redes de pesquisa internacional (UERR/UNIR/UFAM/UFPA); - Participação em pesquisa de caráter internacional (UFRR/UFT); - Auxílio financeiro para apresentação em evento científico no exterior (UFT); - Produção científica em parceria com instituições internacionais (UFAM/UFPA); |
55,5% |
Financiamento | - Convênios com governo federal e órgãos/ instituições nacionais e internacionais (UEPA/UERR/UNIR/ UFPA/UFAM/UFAC/UNIFAP). | 77,7% |
Currículo |
- “Diálogos interculturais” (palestras, mesas redondas temáticas com representantes de diferentes países, exposição de trabalhos artísticos, ciclos de cinema) - (UFPA). | 11,1% |
Mobilidade, intercâmbio estudantil | - Intercâmbio e parcerias com Instituições de Ensino e Pesquisa internacionais (UERR/UFPA/UNIFAP); - Parcerias com universidades estrangeiras para promoção da interculturalidade (UFPA); - Adesão aos programas de incentivo à internacionalização: Ciência sem Fronteiras, Idiomas sem Fronteiras, Erasmus Mundus (IBRASIL e EBW), Bolsa Santander Livre para Professores, Grupo Coimbra de Universidades Brasileiras (PAEC, PROPAT), Programa de Intercâmbio e Mobilidade Internacional com a Universidade de Quebec em Montreal, Canadá (UQAM), Grupo Coimbra, Grupo Montevidéu, Grupo Tordesilhas, Grupo Columbus, Associação das Universidades de Língua Portuguesa, Portal Universia, Santander Universidades (UFT/ UEPA/UFAC/UNIR/UFPA); |
55,5% |
Fonte: Elaborado pelas autoras com base no PDI, vigente em 2019/2020 das IES da Região Norte do Brasil
O Quadro 3 deixa claro a assimetria que existe entre os PPGE, instalados nas Universidades Federais da região Norte do país. Todos os Programas têm algum tipo de política, mas as ações que são desenvolvidas, relatadas nos PDI, não têm o mesmo peso e nem abrangência. O fato exige mais análise, para que se identifiquem as principais causas de uma tão grande desigualdade, no âmbito da região Norte, o que contribui para aumentar as diferenças com as demais regiões do país.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A internacionalização da educação é um fato que já está enraizado na cultura das IES, motivado principalmente por ações governamentais e agências internacionais, sobretudo naquelas instituições que desenvolvem programas de pós-graduação stricto sensu. No caso brasileiro, esse fenômeno tem se acelerado, passando a integrar indicadores de qualidade de uma instituição ou de um programa, indicadores esses elaborados e avaliados principalmente por órgãos governamentais. Esse processo também se manifesta nos Programas em Educação da região estudada, com destaque para o fato de que duas instituições têm um número maior de ações.
Há maiores indícios, pelas ações apresentadas pelas IES, de um modelo de internacionalização norte-sul, no qual se estabelece uma relação entre países que se encontram em nível mais avançado, de acordo com os critérios definidos pelos países do Norte, no tocante à produção de conhecimento e nível de desenvolvimento da ES, tendo a conotação de um processo de ajuda/assistência de países desenvolvidos em direção a países em desenvolvimento. É fundamental que a natureza da internacionalização não represente um aspecto de mercantilização, como um grande negócio. É preciso que este processo esteja assentado na solidariedade e na consciência social, na quebra de fronteiras do conhecimento, tendo como objetivo contribuir para emancipação humana, por meio do desenvolvimento social dos povos.
A conjuntura política na qual o Brasil está vivendo, a crise internacional do capital que já se estende por mais de uma década e a mudança de prioridades do atual governo brasileiro em relação às áreas sociais, com forte impacto sobre a educação, são alguns dos elementos que precisam ser considerados, quando se analisam as exigências de internacionalização para a educação. Os cortes de bolsas para o exterior para estudantes e docentes, praticados nos últimos anos, com destaque para o ano de 2019, o contingenciamento e a diminuição do orçamento das Instituições Públicas Federais e a diminuição drástica de concursos para professores e técnicos administrativos são alguns dos fatores determinantes para o atraso acadêmico e científico que o Brasil pode passar a viver nos próximos anos, com impactos para além do processo de internacionalização.
Para que a internacionalização ocorra de forma mais equilibrada e com benefícios mútuos é fundamental que a educação seja considerada um bem público. Para os PPGE do Norte, há necessidade de disponibilização de mais recursos e de políticas de incentivo específicas para essa região, para que se rompam as diferenças históricas que os separam de outros Programas, sobretudo aqueles localizados no Sul e Sudeste do Brasil.