Introdução
O ato de aprender requisita do estudante atenção e condições suficientes para o acesso aos “arquivos” da memória (Gazzaniga et al., 2006). A partir dos avanços tecnológicos, hoje é possível investigar no nível cerebral mecanismos subjacentes à aprendizagem (Horvath; Lodge; Hattie, 2017). Por esse motivo e, considerando o impacto positivo de novas abordagens educacionais, o presente trabalho direciona o foco para o papel das ilustrações em livros didáticos sob a perspectiva da neuroeducação, que busca o entendimento do processo de ensino e aprendizagem com base em evidências científicas do campo da neurociência (Silva, 2018).
O estudo da neurociência enquanto suporte teórico para a educação busca entender como as redes neurais são estabelecidas e fortificadas durante os processos de aprendizagem (Amthor, 2017). Com base nesse entendimento, espera-se ser possível desenvolver métodos eficazes no que diz respeito à aquisição e à retenção de novos conhecimentos.
Os livros didáticos são bons exemplos de como os recursos visuais podem ser empregados em prol da aprendizagem. Com efeito, conforme reitera Medina (2014, p. 184), “o processo visual não ajuda apenas na percepção do nosso mundo. Ele domina a percepção do nosso mundo”. Além disso, o livro didático tem sido alvo de pesquisas de várias naturezas, conforme relatam Zambon e Terrazzan (2013), devido ao seu efeito positivo no desenvolvimento de competências cognitivas, na formação social e cultural e na ampliação, no aprofundamento e na consolidação dos conhecimentos adquiridos (Gerard; Roegiers, 1998).
Em relação ao campo da análise de livros didáticos,
é possível avaliar a linguagem e aspectos gráficos que constituem os conteúdos de ciências e matemática com o objetivo de caracterizar qualitativamente as diferentes abordagens metodológicas. A parte V da ficha de avaliação apresentada no Guia do Livro Didático (Brasil. MEC, 2013), por exemplo, é destinada à avaliação de aspectos textuais, linguísticos e visuais, justificando, assim, a necessidade de articulação dos conteúdos com suas respectivas representações linguísticas e gráficas. (Silva; Fonseca, 2017, p. 138).
O problema em que repousa esta pesquisa está na ausência de esclarecimentos acerca do papel das figuras em livros didáticos e no tocante ao formato em que são apresentadas ao leitor. É importante levar em consideração que, do ponto de vista psicológico, as figuras servem como guias para uma análise imediata, pois a tentativa de interpretação desse tipo de representação dentro do contexto de resolução de exercícios é um processo que pode levar à atenção concentrada, que será sustentada caso o indivíduo se interesse e encontre significado na resolução da tarefa.
O direcionamento voluntário da atenção pode ocorrer em decorrência da busca voluntária por informações, motivada por processos perceptuais anteriores, como quando um aluno observa uma figura com dados ao seu redor, cria uma expectativa e percorre o texto para tentar encontrar o seu significado.
Nesse sentido, o objetivo desta pesquisa foi construir uma ficha de análise para a avaliação de tarefas ilustrativas de livros didáticos com base em princípios de aprendizagem que consideram o funcionamento cognitivo relativo à atenção e à memória.
Princípios da Teoria da Aprendizagem Multimídia articulados a elementos teóricos da neurociência cognitiva
Uma das teorias modernas de aprendizagem que podem fundamentar o uso apropriado de figuras em livros didáticos é a Teoria da Aprendizagem Multimídia (TAM), a qual foi desenvolvida pelo psicólogo educacional Richard Mayer e leva em consideração o funcionamento cognitivo do processamento da informação, sobretudo quando são as informações pictóricas e verbais as recebidas e processadas pelas áreas cerebrais responsáveis.
Mayer (2009) evidenciou que experiências multissensoriais são mais bem avaliadas nos contextos de aprendizagem. Grupos de alunos que estudam por meio de recursos auditivos/verbais juntamente com recursos visuais têm desempenho mais robusto em termos de aprendizagem do que grupos de alunos que estudam os mesmos conteúdos por um único sentido, por exemplo, a audição ou a visão.
Mayer (2008) toma como pressuposto o fato de existirem, paralelamente, duas possibilidades de processamento da informação: pelas vias auditiva e visual. Na sua concepção, as informações navegadas pelas vias sensoriais são interpretadas dinamicamente, e a construção de esquemas mentais lógicos depende da integração, pelo cérebro, de palavras, áudios, figuras e gestos, de forma orquestrada. Há de se considerar, porém, que processos cognitivos responsáveis pela aprendizagem, como a atenção e memória de trabalho, possuem capacidades de funcionamento limitadas. Dessa forma, não se consegue prestar atenção em duas coisas ao mesmo tempo sem prejudicar um dos focos, bem como não se consegue processar qualquer tipo ou quantidade de informação na memória de trabalho por um curto intervalo de tempo.
Assim, a TAM se baseia, em linhas gerais, em três importantes assertivas (Mayer, 2008): I) há dois canais não dependentes um do outro (auditivo e visual) para o processamento de informações; II) cada canal tem uma capacidade de processamento limitada; e III) a aprendizagem depende do processamento cognitivo do aluno durante o aprendizado e inclui (a) selecionar - focar no material relevante recebido; (b) organizar o material recebido em uma representação mental coerente; e (c) integrar - relacionar o material recebido com o conhecimento existente da memória de longo prazo.
Para o estudo do objeto desta pesquisa, apoiamo-nos em três dos nove princípios baseados em evidências científicas levantados por Mayer (2008), a fim de gerenciar o processamento de informações multimídia (verbais e visuais) pelo cérebro humano:
princípio multimídia: apresentar palavras e figuras em vez de apenas palavras;
princípio da coerência: reduzir materiais extrínsecos; e
contiguidade espacial: alocar palavras próximas às respectivas ilustrações.
Assim como o princípio multimídia, todos os outros são sustentados por pesquisas com grupos controle e experimental de alunos de diferentes níveis escolares. O tratamento, geralmente estatístico, revela os padrões e as generalizações prováveis. Por esse motivo, é possível transpor tais princípios para outras situações, como é o caso desta pesquisa, que trata da apresentação de figuras em livros didáticos.
De acordo com a TAM, a aprendizagem em que há construção de conexões entre representações verbais e pictóricas é mais eficaz. Isso se deve ao fato de que a integração de informações advindas de diferentes vias sensoriais funciona como um gerador de dados mais favoráveis aos sistemas da memória de longo prazo, podendo resultar numa aprendizagem mais robusta.
O princípio da coerência trata do formato mediante o qual o material a ser compreendido é apresentado ao aluno. A redução do material extrínseco implica tentar reduzir ao máximo a complexidade de apresentação de um dado conteúdo. O termo extrínseco vem da Teoria da Carga Cognitiva desenvolvida por Sweller (2011) e se refere à carga imposta à memória de trabalho pela forma como os materiais são expostos aos estudantes. Tomando como exemplo os textos e as figuras nos livros didáticos, pode-se entender que se existem informações desnecessárias, tanto no texto quanto na figura, o aluno irá empreender um esforço mental maior do que se as informações fossem apresentadas de forma simplificada ou contendo somente os dados necessários.
A contiguidade espacial está relacionada com a disposição espacial das informações textuais e pictóricas. Segundo a TAM, as pessoas aprendem melhor quando as palavras e figuras correspondentes são apresentadas próximas umas das outras. Por exemplo, uma figura em que é preciso identificar nomes é mais bem memorizada quando esses nomes estão próximos aos seus respectivos referenciais do que quando são colocados como legenda ou dentro de um texto.
A breve discussão anterior fornece condições para refletir acerca de alguns elementos das representações verbais e pictóricas, mas não são suficientes para justificar a elaboração do quadro de análise de que trata esta pesquisa. Portanto, recorremos aos estudos de Silva e Fonseca (2015, 2017) para justificar a busca de significados dentro de enunciados contextualizados presentes em livros didáticos. A perspectiva trabalhada se fundamentou em conceitos da neurociência cognitiva relativos às funções cognitivas “atenção” e “memória”.
O primeiro trabalho que relacionou análise de livro didático com neurociência (Silva; Fonseca, 2015) tratou de questões mais detalhadas sobre a decodificação de informações pelo cérebro, mencionando, no nível químico, como as informações são captadas, transduzidas e interpretadas pelo córtex cerebral. Com isso, os autores observaram, no nível teórico, as relações existentes entre as figuras/textos em livros didáticos e o que chamaram de princípios neuroquímicos.
No artigo citado, basicamente, foi assumido que a percepção de figuras e textos desencadeia processos neuroquímicos que se iniciam pela geração de potenciais de ação1, seguida pela comunicação através das conexões sinápticas2 e, em caso de aprendizagem, da plasticidade cerebral3. As categorias de análise envolveram relações entre figuras e textos/enunciados como sendo responsáveis pelos processos cognitivos que levam à aprendizagem, como a presença de: contextualização4; significado entre a ilustração e o conteúdo; e dicas visuais nas figuras para identificação rápida de informações que auxiliem na resolução do problema. Silva e Fonseca (2015, p. 131) resumem que:
O cérebro é capaz de perceber, gerar padrões e criar significados, mas resiste quando padrões insignificativos são impostos, como informações isoladas que não fazem sentido para o estudante. O enriquecimento de conteúdos através de ilustrações contextualizadas favorece a criação de padrões e, consequentemente, melhora a retenção das informações.
Em 2017, os mesmos autores ampliaram a noção de avaliação de livros didáticos com base em pressupostos da neurociência. Dessa vez, as categorias de análise foram fundamentadas em três funções cognitivas importantes para a aprendizagem: percepção, atenção e memória.
Segundo Lent (2010, p. 612), a percepção é a “capacidade de associar as informações sensoriais à memória e à cognição, de modo a formar conceitos sobre o mundo e sobre nós mesmos e orientar o nosso comportamento”. Dessa forma, se apropriaram do conceito de percepção em Lent (2010) para defenderem o uso de palavras, números e símbolos em figuras que ajudem no entendimento das tarefas a serem realizadas, mesmo antes das leituras dos enunciados, uma vez que esses elementos podem facilitar a compreensão do conteúdo.
Os conceitos sobre a atenção permitiram inferir que a presença de figuras coloridas pode captar o foco da atenção e desencadear processos perceptivos mais robustos, considerando que o contraste e a clareza do conteúdo podem levar a interpretações menos dispendiosas e mais precisas.
De acordo com Cosenza e Guerra (2011), um dos circuitos nervosos essenciais para que ocorra a efetivação da atenção é a regulação da vigilância, podendo ser efetivada de duas formas. No primeiro caso, acontece pela atenção reflexa, quando estímulos periféricos levam à focalização automática da atenção. Por exemplo, figuras coloridas podem ser utilizadas em livros didáticos com o intuito de conduzir a atenção do leitor a locais específicos. O segundo caso ocorre por meio da atenção voluntária, em que o indivíduo se dispõe e se esforça para se manter concentrado (Kandel et al., 2014). Por exemplo, o êxito na resolução de problemas matemáticos em livros didáticos depende do foco e da concentração dispensados pelo estudante.
Conforme foi visto, um dos principais quesitos necessários à efetivação do aprendizado é a atenção, porque por meio dela é possível reter e, assim, adquirir o conhecimento (Fiori, 2008). No entanto, apenas as informações significantes e importantes são selecionadas para serem retidas na memória de longa duração (Izquierdo, 2011), o que justifica a necessidade de prover o aluno com atividades contextualizadas.
Por essa razão, Silva e Fonseca (2017) retomaram, na ficha de avaliação proposta, a importância da contextualização e da significação por meio de tarefas que relacionam as figuras com eventos do cotidiano, justificando que a aprendizagem e sua longa duração (memória) dependem da significância da experiência para o aluno.
O Quadro 1 revisita as categorias de análise elaboradas por Silva e Fonseca em 2015 e 2017 e mostra a versão proposta nesta pesquisa (2019).
*Silva e Fonseca (2015) defenderam que é importante adicionar dados da questão na própria figura para facilitar a resolução do problema, mas não detalharam essa assertiva. Vimos, porém, a necessidade de informar ao leitor que, embora seja importante adicionar dados na questão para reduzir a carga extrínseca, não faz sentido apresentar todos os dados na própria figura, pois o aluno pode não se sentir estimulado a ler o enunciado, que é parte importante para o processo de aquisição de sentido.
A ficha de análise atual se diferencia das outras duas em alguns aspectos, mas preserva os objetos de análise e os delimita com mais especificidade, tanto em termos de julgamento das categorias quanto em termos teóricos. Portanto, enquanto o artigo de 2015 trata a questão da aquisição de informação em livros didáticos no nível neuroquímico e o artigo de 2017 discute as categorias em termos de funções cognitivas, o presente texto junta todos os elementos discutidos anteriormente e traz uma abordagem mais consistente para a justificação da análise verbal e pictórica em livros didáticos por meio da Teoria da Aprendizagem Multimídia.
Procedimentos metodológicos
Esta pesquisa de caráter teórico e documental considerou os resultados de Silva e Fonseca (2015, 2017) quando elaboraram duas matrizes de referência para análise de ilustrações de livros didáticos de matemática.
O primeiro passo foi organizar um quadro teórico que justifica o uso de ilustrações como elementos de aprendizagem. Os princípios multimídia, da coerência e da contiguidade espacial abordados pela TAM, foram considerados na adoção de categorias para a ficha de análise. No cenário da neurociência cognitiva, Lent (2010), Gazzaniga (2006), Cosenza e Guerra (2011) foram os principais autores referenciados quanto ao papel das ilustrações na aprendizagem por meio de livros didáticos.
Em seguida, inspirou-se nos itens de análise de Silva e Fonseca (2015, 2017), resgatando-os de modo a fundamentar e orientar a definição de três categorias - significado, contexto e estímulo - estruturadas numa nova ficha de análise.
Por fim, testou-se a ficha de análise por meio da sua utilização na avaliação do capítulo “Trigonometria no triângulo retângulo5” do livro Matemática: 1º ano do ensino médio (Paiva, 2015). Foram avaliadas 40 questões com o critério de “conter algum tipo de representação pictórica”.
Interpretação das categorias de análise (satisfatórias ou pouco satisfatórias)
Significado [Foco de Análise: Figura]
Nesse quesito, a figura é considerada satisfatória se tem relação com o cotidiano, o que quer dizer que a figura é a representação de algo manipulável, podendo ser próxima do real ou não.
Apresentamos alguns exemplos para a definição desse critério. A Figura 1 é uma representação de uma esfera, mas não há um interesse explícito do autor em relacioná-la com algo do cotidiano. Portanto, figuras como essa são, no nosso critério, pouco satisfatórias.
Cabe destacar, porém, que a categoria “significado” tem a ver com a nossa visão teórica que leva em consideração pressupostos da neurociência cognitiva para uma melhor aprendizagem de alunos da educação básica. Por exemplo, estudos neurocientíficos têm comprovado que o cérebro humano responde diferentemente a objetos conhecidos e desconhecidos. Dessa forma, defendemos o uso de figuras que têm relação com o cotidiano para que o grau de associação entre o novo (conteúdo de matemática) e o conhecimento prévio (forma do globo terrestre, por exemplo) seja maior e favoreça a formação de memórias de longo prazo.
Quanto à avaliação satisfatória, como pode ser visto na Figura 2, a representação não é sofisticada, mas há interesse do autor em relacionar a figura com algo real (nesse caso, o planeta Terra). Não é nosso objetivo, nesse estágio da pesquisa, julgar a qualidade da figura e seus efeitos na compreensão de um dado conteúdo.
Contexto [Foco de Análise: Enunciado da Questão]
Para uma avaliação satisfatória, nessa categoria, o requisito é que a figura seja amparada por um enunciado contextualizado, em que são apresentadas situações-problema hipotéticas que justificam o uso do conteúdo estudado. Embora o termo “contexto” pressuponha uma discussão complexa em termos de natureza epistemológica e didática, aqui será entendido como a descrição de uma situação-problema real. A qualidade da justificativa para a resolução do problema não será julgada; isso significa que o “contexto” é satisfatório quando o autor dá sentido ao problema. A Figura 3 é um exemplo de contexto satisfatório, em que há uma justificativa para a aplicação do conteúdo:
Diferentemente da Figura 3, o exemplo da Figura 4 não justifica a necessidade de saber a distância que uma pessoa percorre ao subir uma rampa, sendo, portanto, pouco satisfatório.
Percebe-se que uma figura relacionada com o cotidiano nem sempre possui um contexto de aplicação satisfatório. É o caso do exemplo da Figura 5, em que o enunciado aparece de forma técnica e isento de justificativa para o cálculo da altura do teleférico no ponto C. Qual o motivo de sabermos a altura do teleférico nesse ponto? Esse exemplo é pouco satisfatório.
É importante destacar que, dependendo do nível de entendimento do leitor, ele pode atribuir vários significados a uma determinada situação. Porém, a falta de clareza e de justificativas nos enunciados das questões pode dificultar a interpretação dos alunos, principalmente em termos de aplicabilidade no cotidiano. Há diferenças, por exemplo, entre um enunciado que pede para calcular diretamente a altura de um prédio e outro que justifica a necessidade desse cálculo.
A Figura 6 pode ser classificada como satisfatória. O contexto é breve, mas faz sentido chamar um topógrafo para medir a altura de um prédio.
Estímulo [Foco de Análise: Figura e Enunciado]
Essa categoria foi criada para oportunizar a análise da relação existente entre a figura e o enunciado. Defendemos que uma figura não deve conter todas as informações necessárias à resolução da questão, de modo que o aluno seja estimulado a examinar o contexto de aplicação do conteúdo.
Observa-se que na Figura 7 não há todos os dados necessários à resolução do exercício; logo, o aluno precisa ler o enunciado para buscar o objetivo do problema. Há, no entanto, informações adicionais (linhas tracejadas e ângulo de 30º) que podem levar o aluno a perceber que existe alguma relação matemática entre as informações do dispositivo do topógrafo e o prédio. Aqui, o critério “estímulo” é satisfatório.
Já na Figura 8, “todas” as informações são disponibilizadas e o aluno só precisa saber de um dado que geralmente não faz parte do contexto em si, mas é apresentado no final do enunciado. É o caso do dado: tg 40º = 0,84. Esse exemplo é, portanto, pouco satisfatório.
O estudo teórico acerca da importância das figuras em tarefas de livros didáticos resultou na ficha de análise apresentada no Quadro 2.
Aplicação da ficha de análise em tarefas de matemática
Com o intuito de avaliar a funcionalidade da ficha de análise (Quadro 2), cada questão ilustrativa encontrada no capítulo sobre trigonometria no triângulo retângulo foi avaliada conforme os três critérios estabelecidos. Os dados foram inseridos em uma planilha do Excel (Figura 9).
De modo geral, as tarefas tiveram as três categorias consideradas mais satisfatórias do que pouco satisfatórias. Percebeu-se que a proposta do livro didático analisado se baseia no uso de ilustrações coloridas, propiciando a interação visual e verbal ao longo do capítulo, bem como na ênfase de tarefas contextualizadas para agregar sentido ao problema.
As categorias “contexto” e “estímulo” foram as mais bem classificadas. O Quadro 3 mostra o percentual em cada uma.
É importante ressaltar que o autor do livro traz uma seção com 16 tarefas denominadas “exercícios contextualizados”. A Figura 11 mostra a avaliação dessas tarefas e de mais 24, subdivididas em exercícios resolvidos (n=3), propostos (n=15) e complementares (n=6).
Quando comparadas as categorias, nota-se que o percentual geral apontado para “satisfatório” em todas elas se deve mais aos exercícios julgados pelo autor como contextualizados, correspondendo aos requisitos da ficha de análise. Grande parte dos exercícios não classificados pelo autor como contextualizados são técnicos e parecem objetivar o treino das noções teóricas apresentadas para automatizar esquemas cognitivos. Cabe salientar que não temos o objetivo de criticar os exercícios que fogem dos critérios empregados na ficha de análise, mas levantar algumas questões acerca do uso equilibrado de figuras e textos, enfatizando a importância da contextualização.
Por questões de direitos reservados, nenhuma ilustração do livro analisado foi recortada para este artigo. Para efeito de demonstração, os exemplos seguintes representam algumas figuras examinadas.
A Figura 12 acompanha o seguinte enunciado:
1) O famoso livro Guiness World Records, mais conhecido entre aqueles que amam curiosidades e principalmente desafios, precisa registrar o maior prédio já construído. Para realização desta atividade, eles precisaram contratar um topógrafo para o cálculo de alguns prédios, entre eles o que foi selecionado na imagem abaixo. Para medir a altura deste prédio foi necessário que o topógrafo se distanciasse 300 metros do prédio, assim formando um ângulo de 75°. Portanto, calcule a altura do prédio.
Essa questão pode ser avaliada como satisfatória para as categorias “significado”, “contexto” e “estímulo”, pois é uma representação de algo palpável, tem um enunciado contextual e necessita ser associada ao texto para a sua resolução.
A Figura 13 se associa ao enunciado:
2) Um avião está voando em direção ao aeroporto. Para realizar a aterrissagem ele é inclinado 30° e logo após ele precisará percorrer mais 7 km para chegar ao solo. O responsável na torre de comando necessita saber a que altura o avião está em relação ao chão e, por isso, pergunta ao comandante.
Essa questão pode ser avaliada como satisfatória para as categorias “significado” e “estímulo”, mas não para “contexto”, pois não está claro o motivo pelo qual o responsável pela torre de comando necessita saber a que altura o avião está em relação ao chão. Note que, no caso da questão 1 (Figura 12), o conhecimento da altura do prédio é justificado: “o livro Guiness World Records precisa registrar o maior prédio já construído”.
Considerações finais
O objetivo desta pesquisa foi elaborar uma ficha de análise para a avaliação de tarefas matemáticas acompanhadas de ilustrações. Tomaram-se como base princípios de aprendizagem que consideram o funcionamento cognitivo relativo à atenção e à memória. Diante dos fundamentos apresentados, bem como do que foi identificado nos resultados, pode-se constatar que, por meio da integração dos livros didáticos a uma nova abordagem do ensino de matemática, em que textos e imagens representam contextos assimiláveis, é possível pensar no livro didático como um recurso indispensável à compreensão dos conteúdos matemáticos.
Nesse sentido, destaca-se que um dos papéis do cérebro humano é aproveitar, seletivamente, o máximo das informações disponíveis nas situações do ambiente para assimilá-las a conteúdos existentes na memória de longo prazo. Assim, entendemos que a presença de significado, contexto e estímulo, na perspectiva da ficha de avaliação aqui sugerida, pode propiciar a filtração de informações importantes para a aprendizagem matemática.