INTRODUÇÃO
As Tecnologias da Comunicação e Informação (TIC) vêm promovendo grande dinamismo no modo como a sociedade age e modifica seu meio, oportunizando formas diferenciadas de construção de conhecimentos e atribuição de novos significados. Isso nos leva a refletir sobre as possibilidades das TIC serem inseridas no ambiente educacional, integrando-se ao fazer pedagógico.
Na década de 1990, o governo federal brasileiro, como fomentador de políticas públicas, buscou institucionalizar tais inovações por meio de documentos, entre eles o Plano Decenal de Educação 1993-2003 (BRASIL, 1993), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação 9.394/1996 (BRASIL, 1999) e o Plano Nacional de Educação (BRASIL, 2001). Podemos identificar, em um dos seus dispositivos, que a formação de professores contemplou “o domínio de tecnologias de comunicação e da informação (TIC) e capacidade para integrá-las à prática docente” (BRASIL, 2001, p. 68). Também foi previsto equipar escolas com recursos tecnológicos para utilização pedagógica e desenvolvimento de programas de Educação a Distância (EAD) nos diferentes níveis de ensino (BRASIL, 2001).
Paralelamente a essas iniciativas, a formação de professores passou por transformações norteadas por algumas tendências. Uma delas, a tendência crítica, possibilita ao professor novos direcionamentos do seu fazer pedagógico, orientado pelo “paradigma da reflexão” (SCHÖN, 1983; ALARCÃO, 1996; SCHÖN, 2000; FREIRE, 2002; PERRENOUD, 2002; PIMENTA, 2002; TARDIF, 2005).
Considerando esse cenário, foram implantados investimentos públicos na formação continuada de professores e recursos tecnológicos para as escolas brasileiras, mediante programas do governo federal, favorecendo o fomento de cursos na modalidade de EAD, com a utilização de diferentes meios midiáticos auxiliados pelos Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA), como apoio aos cursos dessa modalidade de ensino.
Além disso, os recursos disponíveis no AVA podem auxiliar o professor na realização do processo reflexivo durante sua formação, tornando-se um caminho para contrapor o ensino baseado na transmissão-assimilação de conhecimentos. O Diário de Bordo é um desses recursos que, por intermédio da escrita, torna-se um dos meios para esse fim. Segundo Liberali (1999), o Diário de Bordo é uma ferramenta capaz de proporcionar mudanças no indivíduo, visto que o faz pensar de modo a promover a autoavaliação e perceber sua evolução.
No entanto, muitos percalços ocorrem durante o processo de formação de professores. Segundo Soares-Leite e Nascimento-Ribeiro (2012, p. 177), “um dos principais entraves para a utilização das TICs na educação brasileira é a falta de conhecimento e domínio dessas tecnologias por grande parte dos professores”. Em seus estudos, os autores ressaltam a importância da formação como meio de propiciar embasamento para que o professor construa conhecimentos técnicos e pedagógicos acerca das tecnologias.
A partir desse contexto, apresentamos, neste artigo, um recorte de uma pesquisa mais ampla, do tipo descritiva, com abordagem qualitativa, intitulada O Diário de Bordo como recurso para reflexão crítica na formação docente no âmbito do Programa de Formação Continuada Mídias na Educação, desenvolvida no Mestrado Acadêmico em Educação da Fundação Universidade Federal de Rondônia (UNIR).
Como objeto de estudo, enfocamos as dificuldades encontradas pelos sujeitos da pesquisa durante a realização do curso de formação, considerando as reflexões feitas por esses participantes. Para a obtenção de dados, elegemos como fonte de pesquisa o Diário de Bordo, recurso on-line disponível no Ambiente Colaborativo de Aprendizagem e-ProInfo, utilizado pelo Curso de Extensão Mídias na Educação - Ciclo Básico, no âmbito do Programa de Formação Continuada Mídias na Educação, ofertado pela Fundação Universidade Federal de Rondônia (UNIR) e desenvolvido em parceria com a Secretaria de Educação a Distância (SEED), atualmente extinta, e Secretarias de Educação (SE).
A questão que norteou nosso estudo foi: em que consistiram as dificuldades dos professores-cursistas do Curso de Extensão Mídias na Educação - Ciclo Básico? Partindo desta indagação, tivemos por objetivo geral conhecer as dificuldades apresentadas pelos professores-cursistas durante o Curso de Extensão Mídias na Educação - Ciclo Básico. Visando atingir nosso objetivo geral, propusemos como objetivos específicos: a) identificar quais as dificuldades apresentadas pelos professores-cursistas durante o Curso de Extensão Mídias na Educação - Ciclo Básico; e b) verificar se as dificuldades são de infraestrutura técnica, conhecimento pedagógico e domínio da tecnologia.
A organização deste artigo está assim disposta: iniciamos por esta introdução, na qual contextualizamos o problema. Continuando, abordamos o contexto teórico e descrevemos a metodologia adotada para a realização da pesquisa. Na sequência, procedemos a análise e interpretação dos dados, a partir dos textos contidos no Diário de Bordo. Por último, nas considerações finais, comentamos a respeito dos resultados obtidos.
CONTEXTO TEÓRICO
A tecnologia e as implicações na educação
A evolução tecnológica tende a predominar sobre as formas tradicionais de comportamento, modificando e estabelecendo novos processos de comunicação entre indivíduos e também a relação entre informação e aprendizagem (SILVA; CORREA, 2014).
Presente em nosso dia a dia, a “tecnologia é uma invenção do homem, produzida num determinado contexto social e cultural” (LÉVY, 1999, p. 25), impondo novos desafios que requerem conhecimento e formação permanente.
No âmbito educacional, professores, alunos e escola são compelidos, por esse movimento, a buscar formas para se adequar à época atual. Em vista disso, surge a necessidade do professor experienciar e compreender as implicações educacionais que permeiam diferentes formas de lidar com a tecnologia, a fim de propiciar um ambiente criativo e reflexivo para o aluno. Assim, também inserida nesse contexto, a escola necessita reorganizar seu modelo de ensino, tornando-o prazeroso e contextualizado.
Nessa linha de pensamento, Altoé (2005) comenta que mudanças paradigmáticas ocorridas na sociedade trazem desdobramentos para a educação e para a escola, requerendo novos modelos de educação. Completando, o autor afirma que “o tipo de homem necessário para a sociedade de hoje é diferente daquele aceito em décadas passadas” (ALTOÉ, 2005, p. 39). Complementando, as autoras Corradini e Mizukami (2013) versam que as inovações são inadiáveis e que vão além de aquisição de habilidades, pois requerem uma nova forma de compreensão do Fazer pedagógico, com novos saberes, bem como uma formação permanente que visa preparar os professores para essa nova realidade da sala de aula.
Sob esse ponto de vista, Valente (1999) discute a inserção da informática na educação, discorrendo sobre a necessidade de alteração na proposta pedagógica, uma vez que o computador possibilita contribuições à aprendizagem. No entanto, é necessário pensar a reestruturação da constituição da escola, no sentido de estar receptível às inovações bem como à preparação do docente, para que este incremente, reinvente um fazer pedagógico diferenciado, de forma a viabilizar ao aluno a produção de seu conhecimento.
Tais demandas constituem-se em condição necessária à transformação do contexto educativo e das ações pedagógicas, já que não se restringem apenas à aquisição de diferentes recursos tecnológicos e sim instauram aspirações de profissionais engajados em formas diferenciadas para o ensino e a aprendizagem. Nessa perspectiva, Tornachi, Prado e Almeida (2010, p. 47) argumentam que:
O uso da tecnologia na educação requer, sem dúvida, um olhar mais abrangente. Logo, é preciso que haja, nesse processo, o envolvimento de novas formas de ensinar, aprender e de desenvolver um currículo condizente com a sociedade tecnológica, que deve se caracterizar pela integração, complexidade e convivência com a diversidade de linguagens e formas de representar o conhecimento.
Dialogando com os autores Valente (1999), Altoé (2005), Tornachi, Prado e Almeida (2010) e Corradini e Mizukami (2013), estes sinalizam para uma transformação no modelo educacional. Para tanto, é imprescindível introduzir mudanças na escola e na formação de professores, a fim de que a escola possa atender às necessidades de uma sociedade caracterizada pela tecnologia e conhecimento e os professores possam refletir sobre os resultados do seu fazer pedagógico. A consequência desse movimento tende a resultar em práticas balizadas pela reflexão, incorporando a tecnologia, numa perspectiva emancipadora e inovadora. Isso contribui na superação de uma cultura da assimilação e reprodução, a contar de um novo ambiente de ensino e aprendizagem.
Portanto, nesse processo, uma das prioridades diz respeito à formação de professores sob uma nova ótica, de modo contínuo, contextualizada nas práticas e voltada para um profissional reflexivo, conforme discutem os autores Nóvoa (1999); Schön (2000); Pérez Gómez (2002) e Tardif (2005), dentre os quais tomamos como referencial Schön (2000), para que essa assertiva possa ser concretizada.
A formação continuada de professores: possibilidades de formação numa perspectiva reflexiva
No campo da formação, identificamos um percurso em que há entendimentos diversificados e pautados por uma concepção tecnicista, cuja preocupação se volta ao êxito e à produtividade na educação. Nessa linha de raciocínio, nos deparamos com cursos rápidos, como os denominados de treinamento, reciclagem e capacitação, não considerando os saberes práticos dos professores, concebendo-os como meros receptores de conhecimento ou cumpridores de tarefas. Assim, a reflexão sobre práticas é deixada de lado, fortalecendo o desconhecimento da realidade do sujeito.
Durante um bom tempo, a preparação dos professores para o uso das tecnologias no fazer pedagógico consistiu em cursos aligeirados, num formato instrumental, sob a responsabilidade das secretarias de educação, visando atender ao programa oficial do governo, cabendo ao professor, em sala de aula, o desenvolvimento de atividades pontuais com a utilização de recursos tecnológicos e sem a possibilidade de refletir sobre a ação desenvolvida.
Mediante um contexto tecnológico, essa concepção de formação de professores torna-se inviável, requerendo a compreensão de que a tecnologia, como expressão da atividade humana e a serviço desta, faz parte da maneira de viver do ser humano. Desse modo, não conseguimos visualizar o homem separado da tecnologia. Concebemos que a necessidade de suplantar modelos convencionais por uma formação continuada fundamentada nas ideias de reflexão da prática - a qual se embasa nos conceitos de reflexão na ação, reflexão sobre a ação e reflexão sobre a reflexão na ação (SCHÖN, 2000) - pode ser uma possibilidade de preparar o professor para a inserção da tecnologia em seu fazer pedagógico.
As ideias de Schön (2000) apontam a premência da educação continuada a tentar para uma formação que integre os aspectos técnicos, práticos e a crítica, propiciando aos professores a reflexão na prática sobre suas práticas e sobre a reflexão de suas práticas. Essas reflexões promovem o diálogo sobre o observado e o vivido, com o objetivo de nortear a construção ativa do conhecimento na ação, pautada na metodologia do “aprender fazer fazendo”, numa perspectiva de desenvolvimento profissional e pessoal.
Por esse viés, ressaltamos que a formação de professores críticos e reflexivos não ocorre por intermédio da inércia e da reprodução. Ela requer viver efetivamente o momento da formação, experienciando as etapas do processo, de forma a construir a aprendizagem. Assim, formar professores para a utilização da tecnologia, segundo Valente e Almeida (1997, p. 8), requer do profissional “[...] condições para que ele construa conhecimento sobre as técnicas computacionais, entenda por que e como integrar o computador na sua prática pedagógica e seja capaz de superar barreiras de ordem administrativa e pedagógica”.
Segundo Valente e Almeida (1997), tomando por base tais aspectos, o profissional tende a romper com o modelo tecnicista transmitido pelas políticas públicas de formação de professores, abrindo caminho para propor mudanças no processo de ensino e de aprendizagem e, ainda, transpor dificuldades no âmbito administrativo (condições de infraestrutura física, materiais e técnicas, bem como o procedimento dos gestores escolares) e pedagógico. Por esse enfoque, Kenski (2007, p. 44) traduz que, para a superação das adversidades, se faz necessário
[...] buscar informações; realizar cursos, pedir ajuda aos mais experientes, enfim, utilizar os mais diferentes meios pra aprender a se relacionar com a inovação e ir além, começar a criar novas formas de uso e, daí, gerar outras utilizações. Essas novas aprendizagens, quando colocadas em prática, reorientam todos os nossos processos de descobertas, relações, valores e comportamentos.
A interlocução entre os autores Valente e Almeida (1997) e Kenski (2007) evidencia que a formação continuada é basilar para o professor, a fim de que este possa acompanhar as mudanças que estão ocorrendo na sociedade, evitando que a escola se torne descontextualizada desse processo.
Nesse sentido, Kenski (2007, p. 51) afirma que “cada vez mais, é preciso que haja uma nova escola, que possa aceitar o desafio da mudança e atender as necessidades de formação”. Por essa vertente, Fullan e Hargreaves (2000) acrescentam que a escola também passa por um processo de aprendizagem, sendo compreendida como local em que se desenvolve uma organização aprendente, na medida em que seus professores progridem.
Apesar das possibilidades de se implantar a utilização de recursos tecnológicos nas escolas, ainda nos deparamos com fragilidades e desafios. É o tema que trataremos a seguir.
A conectividade na escola: possibilidades e desafios no uso da tecnologia
Com a chegada do computador e da internet na escola, ocorreram novas oportunidades de exploração pedagógica. Inclui-se, nesse contexto, o ambiente virtual de aprendizagem, que congrega diferentes ferramentas, tais como fórum, diário de bordo, e-mail e chat, proporcionando novas interações entre professor-aluno, aluno-aluno e professor-aluno-aluno, construindo significados com suas trocas linguísticas por meio das escritas. Por essa lógica, Xavier (2005) reconhece que as ferramentas podem ser utilizadas no fazer pedagógico de forma a tornar as aulas de produção textual atraentes e dinâmicas, a título de exemplo.
Com relação ao chat, ferramenta síncrona de interação, podemos caracterizá-lo como um momento de ensino e aprendizagem fértil, desenvolvido coletivamente, constituindo-se como meio de gerar construção de conhecimento entre pessoas. Autores como Prado (2001), Mercado (2005) e Cruz (2006) defendem sua utilização no ensino e aprendizagem por entenderem que o chat propicia a instauração de uma rede interativa de desenvolvimento e construção do conhecimento em tempo real.
Entretanto, a utilização pedagógica do chat de forma crítica é um desafio, visto que há necessidade de “incentivar entre os professores o desenvolvimento de competências e habilidades necessárias para que possam atuar nesse novo ambiente, o que se estende às questões ligadas ao currículo e às práticas pedagógicas” (CGI.BR, 2016, p. 27).
Nessa vertente, Barbosa (2014, p. 293) expõe que a apropriação das tecnologias envolve “aspectos relacionados às capacidades e habilidades que permitem uma efetiva apropriação dessas ferramentas”, uma dimensão mais complexa acerca da atuação docente e da intencionalidade do processo de ensino.
Ainda por essa perspectiva, Almeida (2001 p. 43) alude que, ao se dispor a fazer uso das tecnologias, adotando metodologias inovadoras de aprendizagem, o professor “além de desenvolver a habilidade de uso das mesmas, estabelece uma ligação entre esse domínio, a prática pedagógica, as teorias educacionais, refletindo sobre sua própria prática buscando transformá-la”. Isso pode resultar na dinamização e na intensificação do processo de ensino e aprendizagem.
Relacionando as ideias apresentadas por Almeida (2001), Barbosa (2014) e GI.BR (2016), identificamos que estas convergem para os dois aspectos: a) habilidade, saber fazer, saber lidar na prática com as tecnologias; e b) competência, “aprender a aprender”, capacidade de mobilizar recursos e saberes vivenciados pela interação, a qual nos reporta à formação contínua para o uso das tecnologias - momento em que se reúnem saberes, atitudes e valores, envolvendo os domínios pessoal, cognitivo e comportamental de forma organizada e articulada (CRUZ, 2001).
No entanto, uma situação que precisa ser observada se refere à necessidade de investimentos em infraestrutura tecnológica e formação, pois, no processo de inovação, “os professores brasileiros demonstram interesse em utilizar recursos educacionais digitais, mas nem sempre existem condições de infraestrutura e capacitação para o uso da Internet com propósito pedagógico” (CGI.BR, 2015, p. 29).
A respeito da infraestrutura de conexão de internet, Barbosa (2014) reflete sobre a consequência da baixa velocidade nas escolas, vez que esta inviabiliza o suporte necessário ao desenvolvimento de atividades que requerem banda larga para trabalhar com os alunos em sala de aula. Lemos e Marques (2012) complementam, declarando que o problema tem origem na resistência de algumas empresas de telecomunicações em expandir o serviço de conexão de internet banda larga para áreas de regiões distantes, justificando a elevada carga tributária do Brasil e os altos custos de operação, dificultando que o usuário usufrua desses serviços. Lemos e Marques (2012, p. 8) acrescentam, ainda, que:
Há evidências, ainda, de que a desigualdade se acentua se forem consideradas as diferenças de velocidade de conexão entre regiões. Ou seja, mesmo que tenham disposição em pagar mais caro pelo serviço, não há oferta de serviço por parte das operadoras em determinadas localidades.
Essa situação revela um desequilíbrio de velocidade e conexão de internet entre as regiões brasileiras, dado que nas localidades onde existem elevada densidade e maiores rendas, nas regiões Sudeste e Sul, a concorrência é acirrada entre as operadoras, que apostam na qualidade dos serviços diferenciados e com preços mais acessíveis. A região Norte fica em terceiro lugar, seguida das regiões Nordeste e Centro-Oeste (BOLAÑO; REIS, 2015), onde a situação é inversa: as operadoras não se sentem atraídas para a oferta de serviços.
A situação da infraestrutura de internet banda larga resulta do acordo realizado entre o governo federal e as empresas de telefonia, concedendo às mesmas exclusividades para implantar o cabeamento lógico nas cidades, até chegar às escolas, inicialmente gratuita até 2025 (BONILLA, 2010).
Tal exclusividade adquirida pelas empresas de telefonia acabou por refletir em altos preços cobrados aos usuários, principalmente nas localidades em que não há concorrência na prestação do serviço (BRASIL, 2009). Bonilla (2010, p. 48) sinaliza para a preocupação quanto à continuidade do projeto banda larga nas escolas após 2025, devido à indefinição na responsabilidade pela conexão nas escolas. A autora se refere ainda, a Brasil (2008), que menciona:
O programa Banda Larga nas Escolas faz parte da política do MEC para informatização das instituições de ensino, a qual prevê a instalação de computadores nas escolas, a capacitação de professores e a oferta de conteúdos educacionais. Entre as iniciativas estão o portal do Professor e do Banco Internacional de Objetos Educacionais destinados a auxiliar os professores na oferta de conteúdos curriculares com recursos de multimídia.
Bonilla (2010) se reporta à reformulação do ProInfo, ocorrida pelo Decreto nº 6.300, de 12 de dezembro de 2007 (BRASIL, 2007a), contemplando a integração das mídias na educação com base na adoção de: a) infraestrutura com distribuição de computadores conectados à internet banda larga para as escolas urbanas e rurais; b) recursos de comunicação e interação entre professores e alunos pelo ambiente virtual de aprendizagem; e c) formação de professores para o uso de TIC na educação.
Essas proposições objetivam oferecer condições à escola e ao professor para que a tecnologia seja inserida no fazer pedagógico.
Trataremos, a seguir, do Programa de Formação Continuada Mídias na Educação.
Programa de Formação Continuada Mídias na Educação - Ciclo Básico
Visando atender metas estabelecidas no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), o Programa Nacional de Informática na Educação (ProInfo), criado pela Portaria nº 522 (BRASIL, 1997), passou por uma reformulação, resultando no Decreto nº 6.300 (BRASIL, 2007a), denominado de Programa Nacional de Formação Continuada em Tecnologia Educacional (ProInfo Integrado). Dentre as finalidades deste programa, citase: promover o uso pedagógico das tecnologias e a formação dos agentes educacionais.
É nesse contexto que se institui, por meio da Portaria nº 171 (BRASIL, 2007b) e da Resolução CD/FNDE nº 64 (BRASIL, 2007c), o Programa de Formação Continuada Mídias na Educação, com a finalidade de formar profissionais atuantes na Educação Básica do sistema público de ensino para o uso integrado de diferentes mídias da informação e da comunicação (TV e vídeo, informática, rádio e impresso) no fazer pedagógico.
No ano de 2005, em caráter experimental, ocorreu o lançamento do programa pela Secretaria de Educação a Distância do Ministério da Educação (SEED/MEC), atualmente extinta. A organização do programa contemplou três ciclos de complexidade, com carga horária específica, caracterizando níveis de aprendizagem e certificação diferenciada: a) Ciclo Básico (Extensão)-120 horas; b) Intermediário (Aperfeiçoamento)-180 horas; e c) Avançado (Especialização)-mínimo de 360 horas. Sua estrutura modular, com sistemas de créditos, apresentou proposta integradora, articulada e autoral, sem perder de vista a reflexão-crítica quanto ao uso das mídias de forma consciente na escola.
A estrutura curricular do Ciclo Básico contemplou os módulos: Introdutório (30 horas), TV e Vídeo (15 horas), Rádio (15 horas), Informática (15 horas), Material Impresso (15 horas) e Gestão Integrada de Mídias (30 horas) (BRASIL, 2005).
O Curso de Extensão Mídias na Educação - Ciclo Básico foi desenvolvido pela Fundação Universidade Federal de Rondônia (UNIR), no período de 2006 a 2007, atendendo 211 professores-cursistas, distribuídos em quatro turmas, localizadas em três polos: Porto Velho (duas turmas), Ji-Paraná (uma turma) e Vilhena (uma turma), numa relação de, no mínimo, um tutor para cada 50 professores-cursistas.
No que diz respeito ao acompanhamento, em cada módulo foram realizados encontros presenciais, além de contar com o Ambiente Colaborativo de Aprendizagem e-ProInfo, plataforma virtual mantida pelo Ministério da Educação, a fim de hospedar o curso, disponibilizar os módulos (disciplinas) e propiciar a interação com seus diferentes recursos, como: a) apoio (agenda, referência, tira-dúvidas); b) interação (webmail); c) fórum; d) enquete; e) bate-papo (chat); f) diário de bordo; g) biblioteca (material do aluno, material do professor); e h) módulo (atividades do módulo, atividades da turma, conteúdo do módulo).
Dentre esses recursos, nos reportaremos, primacialmente, ao Diário de Bordo, por ser objeto deste estudo, como potencializador de práticas críticoreflexivas.
Diário de Bordo: possibilidade de reflexão
O Diário de Bordo, recurso assíncrono, disponibilizado no e-ProInfo, possibilita ao aluno, ao longo do curso, o registro de suas experiências relativas aos avanços, dificuldades, dúvidas, questionamentos e anseios, resultantes do pensar sobre questões decorrentes dos procedimentos reflexivos a respeito do processo de aprendizagem. Nesse sentido, Freire (1996) menciona que “quando escrevemos desenvolvemos nossa capacidade reflexiva sobre o que sabemos e o que ainda não dominamos” (FREIRE, 1996, p. 6), a fim de compreender a realidade e orientar novos procedimentos para aprender.
Além de propiciar a reflexão crítica através da escrita, o Diário de Bordo é considerado como um recurso de aprendizagem e avaliação do processo de ensino e aprendizagem, conforme preconizam Pannunzio, Rizolli e Sanchez (2005, s/p.):
O Diário de Bordo acompanha os diferentes caminhos que o aluno percorre para realizar suas diferentes aprendizagens, ou seja: mobiliza recursos, ativa esquemas e toma decisões. Sendo assim, é uma avaliação processual, inclusiva e acolhedora; portanto, uma avaliação formativa, pois ajuda o aluno a aprender e a se desenvolver a partir de um projeto educativo.
Os autores retratam que o uso do Diário de Bordo é um recurso que acompanha o aluno no seu processo de aprendizagem, como também favorece a organização de ideias, mediando métodos reflexivos para autoavaliação da aprendizagem, compreensão da realidade e orientação de novos procedimentos para aprender.
A seguir, abordaremos os procedimentos metodológicos utilizados para nortear a investigação do problema desta pesquisa.
O DESENHO METODOLÓGICO DA PESQUISA
A natureza do objeto de estudo nos levou a definir como metodologia a pesquisa empírica documental descritiva (LÜDKE; ANDRÉ, 2014), com abordagem qualitativa (BOGDAN; BIKLEN, 1994), tomando por base as escritas dos sujeitos e documentos primários que ainda não receberam nenhum tipo de tratamento, disponíveis no Diário de Bordo do e-ProInfo, do curso de Extensão Mídias na Educação - Ciclo Básico, no período de 2006 a 2007, visando a obtenção de dados. Para a análise dos dados, consideramos a técnica de análise de conteúdos (BARDIN, 2011), buscando descrever o conteúdo das mensagens emitidas no processo de comunicação, alicerçada na temática categorial e subsidiada pelo referencial teórico. Neste caso, adotamos como temática categorial as dificuldades enfrentadas pelos participantes.
Participaram como sujeitos da pesquisa quatro professores-cursistas que atuaram, concomitantemente, como professores-tutores do curso. Para a preservação de suas identidades, foram denominados como Professor-Cursista (P1), Professor-Cursista (P2), Professor-Cursista (P3) e Professor-Cursista (P4), garantindo, dessa forma, o sigilo e o anonimato.
O campo empírico ficou delimitado aos sujeitos da pesquisa que estavam localizados nos polos de apoio presencial de Porto Velho, Ji-Paraná e Vilhena, no estado de Rondônia, sudoeste da Amazônia brasileira.
AS PERCEPÇÕES DA ANÁLISE E DISCUSSÕES
Para a análise, alicerçamos nossa pesquisa nos textos dos Diários de Bordo, disponíveis no e-Proinfo, como escritas elaboradas pelos professorescursistas, com a temática “reflexão sobre sua trajetória de aprendizagem”, o que nos permitiu elencar como categoria a posteriori “Dificuldades Enfrentadas”, conforme exposto no Quadro 1.
Categoria a posteriori | Sujeitos da Pesquisa | Fragmentos das escritas dos professores-cursistas extraídas do Diário de Bordo |
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Dificuldades Enfrentadas | P1 | “As dificuldades foram mais operacionais e consegui superar com a ajuda da minha parceira de trabalho e curso”. |
P2 | “Os obstáculos como, por exemplo, conexão lenta, sites bloqueados e alguns trabalhos acumulados, devido não conseguir conciliar e, alguns momentos trabalho e curso”. | |
P3 | “Compreender os conteúdos não é tão difícil, já que orientei os cursistas em todas as etapas, mas é o fator tempo para elaborar uma boa reflexão pessoal escrita avaliativa”. | |
P4 | “Um dos maiores obstáculos tem sido a falta de tempo”. |
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2016.
Essa categoria se reporta às dificuldades encontradas pelos sujeitos da pesquisa (P1, P2, P3 e P4), no decorrer do curso, as quais se referem a problemas operacionais, conexão lenta, sites bloqueados e tempo exíguo para a realização das atividades previstas no módulo.
No que se refere aos problemas operacionais, estão relacionados ao manuseio dos recursos disponibilizados no e-ProInfo para a postagem das atividades. Nesse sentido, Valente (2005, p. 30-31) considera que:
Embora as sofisticações tecnológicas sejam ainda maiores, existem dois aspectos que devem ser observados na implantação dessas tecnologias na educação. Primeiro, o domínio do técnico e do pedagógico não deve acontecer de modo estanque, um separado do outro. É irrealista pensar em primeiro ser um especialista em informática ou em mídia digital para depois tirar proveito desse conhecimento nas atividades pedagógicas. O melhor é quando os conhecimentos técnicos e pedagógicos crescem juntos, simultaneamente, um demandando novas ideias do outro. O domínio das técnicas acontece por necessidades e exigências do pedagógico e as novas possibilidades técnicas criam novas aberturas para o pedagógico, constituindo uma verdadeira espiral de aprendizagem ascendente na sua complexidade técnica e pedagógica.
Tornaghi, Prado e Almeida (2010, p. 51) comentam que:
O professor que associa as TICs aos métodos ativos de aprendizagem é aquele que também busca desenvolver a habilidade técnica relacionada ao domínio da tecnologia e, sobretudo, esforça-se para assumir uma atitude de reflexão frequente e sistemática sobre sua prática, sobre o que seus pares falam da própria prática e sobre as teorias tratadas por autores de referência.
Os autores compreendem que a inviabilidade técnica não é empecilho para a realização do curso, dado que os obstáculos vão desaparecendo no decorrer dos estudos, na medida em que vamos manuseando os recursos existentes, junto com a aprendizagem pedagógica. Além disso, o auxílio de colegas contribui muito para facilitar a aprendizagem técnica; a exemplo, o sujeito P1 relatou, em seus escritos, que superou sua dificuldade com a ajuda de uma parceira de trabalho. A esse espeito, Kenski (1996, p. 146) argumenta que:
A aprendizagem pode se dar com o envolvimento integral do indivíduo, isto é, do emocional, do racional, do seu imaginário, do intuitivo, do sensorial em interação, a partir de desafios, da exploração de possibilidades, do assumir de responsabilidades, do criar e do refletir juntos.
A aprendizagem é um processo ativo que conduz a transformações e a diferentes formas de superar obstáculos, dentre elas a de refletir juntos. Almeida (2003, p. 335) expõe que “aprender é planejar; desenvolver ações; receber, selecionar e enviar informações; estabelecer conexões; refletir sobre o processo em desenvolvimento com os pares”.
Neste caso, P1 buscou interagir com seus pares e adquirir domínio para o manuseio dos recursos tecnológicos no processo de construção de sua aprendizagem.
Com relação à conexão lenta, abordada por P3, sabemos que, em certas regiões do interior do Brasil, a conexão de internet apresenta fragilidade, especialmente na região Norte, pela dimensão de seu território e em virtude de parte da área ser coberta por uma densa floresta e rios. Desse modo, como um dos grandes desafios ao acesso à internet, encontram-se também questões de intempéries, como chuvas e ventos. Além do mais, há casos em que a sobrecarga de acessos simultâneos inviabiliza o sinal, ou este é mínimo, dificultando fazer download e upload, o que é caracterizado por Lévy (1999) como “dilúvio informacional”.
Por essa ótica, Barbosa (2014, p. 29) avalia que, “apesar de avanços verificados nos últimos anos, a velocidade de conexão ainda é uma das principais barreiras, especialmente se considerada a necessidade de uso simultâneo de equipamentos em uma mesma escola”. Colaborando com essa discussão, Lemos e Marques (2012) alegam que no Brasil há poucas prestadoras de serviços de internet de banda larga localizadas no Norte e Nordeste, especialmente operando no interior dessas regiões. Tal afirmação evidencia a necessidade de se ampliar o quantitativo dessas operadoras, no intento de reduzir disparidades no atendimento de serviço de internet banda larga nas regiões descobertas e, com isso, ampliar a velocidade de conexão, a fim de que se possa trabalhar em melhores condições tecnológicas.
No que diz respeito a site bloqueado, mencionado por P3, a Secretaria de Estado da Educação de Rondônia adotou o bloqueio de sites, durante o Curso de Extensão Mídias na Educação - Ciclo Básico (2006 a 2007), como medida necessária à proteção de rede, dos computadores e seus usuários, para evitar problemas relacionados à segurança de dados. Com isso, houve dificuldades no desenvolvimento de atividades quando se utilizou, na ocasião, mensagem, chat, facebook, Orkut. Tal situação se tornou inconveniente tanto para os professores-cursistas, que estavam em processo de formação, quanto para seus respectivos alunos, pois impossibilitou os professores-cursistas de utilizarem esses recursos tecnológicos no fazer pedagógico.
Embora haja restrições a recursos síncronos, autores como Prado (2001), Mercado (2005) e Cruz (2006) defendem o seu uso como, por exemplo, o chat, vislumbrando o ensino e aprendizagem, uma vez que esse recurso possibilita a comunicação entre pessoas separadas em espaço e tempo, de forma que possam manter diálogo em tempo real.
A falta de tempo, retratada por P4, deve-se à sobrecarga de trabalho imposta ao professor, configurando-se como dificuldade para a sua formação e apropriação das tecnologias em seu fazer pedagógico. Uma alternativa proposta por Fullan e Hargreaves (2000, p. 51) sobre a questão do tempo diz respeito à compreensão dos diretores e vice-diretores de escola, os quais
[...] podem também auxiliar, liberar tempo ao professor para outras atividades, dando, ocasionalmente, cobertura às suas aulas. Assim, agindo, eles também mostram seu compromisso com a atividade para a qual os professores estão sendo liberados.
Os autores Fullan e Hargreaves (2000) destacam a importância de reagirmos frente às dificuldades, procurando identificar suas origens e buscar soluções, de modo a possiblitar o crescimento e o aperfeiçoamento pessoal e profissional do professor. Isso propiciará desenvolver a criatividade e desprendimento para iniciativas inovadoras.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao concluirmos este trabalho, retomamos o seu objetivo geral, que foi conhecer as dificuldades apresentadas pelos professores-cursistas durante o Curso de Extensão Mídias na Educação - Ciclo Básico. Para alcançar sua finalidade, contamos com dois objetivos específicos, resgatados a seguir.
O primeiro centra-se na identificação das dificuldades apontadas pelos professores-cursistas durante o curso e o segundo verifica se as dificuldades estão relacionadas aos aspectos de infraestrutura técnica, conhecimento pedagógico ou domínio da tecnologia.
No tocante ao primeiro objetivo, nos fragmentos extraídos das escritas dos professores-cursistas P1, P2, P3 e P4, sujeitos da pesquisa, identificamos que as dificuldades vivenciadas estão relacionadas às questões operacionais (alusivas ao manuseio dos recursos disponibilizados no e-ProInfo), bloqueio de sites, conexão lenta e falta de tempo para os estudos.
No que diz respeito ao segundo objetivo - verificar se as dificuldades estão relacionadas aos aspectos de infraestrutura técnica, conhecimento pedagógico ou domínio da tecnologia - averiguamos que as dificuldades operacionais se relacionam aos aspectos de domínio da tecnologia, sendo necessário adquirir conhecimento para se chegar à alfabetização digital.
As dificuldades pertinentes a bloqueio de sites e conexão lenta estão vinculadas à infraestrutura técnica, visto que há uma precarização de investimentos dessa natureza por parte do poder público. Relativamente à falta de tempo, decorre de fator como a sobrecarga de trabalho que é imposta ao professor.
Apesar das dificuldades atinentes às questões operacionais, tais como bloqueio de sites, conexão lenta e falta de tempo, há formas de superá-las ou, pelo menos, minimizá-las, a partir da reflexão sobre a situação no processo de formação dos professores, com suas percepções no que diz respeito à importância das tecnologias como recursos que oportunizam mudanças e auxiliam na construção do conhecimento em sala de aula.