Em seu primeiro número de 2022, a Revista ETD - Educação Temática Digital apresenta um conjunto de contribuições com o escopo de promover uma ampla discussão sobre os diferentes contextos e condições relacionadas ao uso de tecnologias no âmbito educacional e, em particular, aquelas geradas em decorrência da pandemia da Covid-19.
A situação emergencial ocasionou a migração das atividades de ensino da modalidade presencial para o denominado Ensino Remoto Emergencial (ERE). Em diferentes lugares do mundo fez-se necessário o desenvolvimento de estratégias que pudessem dar suporte à particularidade do momento, tendo como parâmetro diminuir os impactos no ensino e aprendizagem para os indivíduos impossibilitados de frequentar presencialmente os estabelecimentos de ensino. Os impactos da ausência do ensino presencial têm sido, inclusive, discutidos por agências internacionais voltadas para políticas de desenvolvimento global, como a UNESCO e a OCDE, as quais têm enfatizado que os países devem estar atentos para a criação de mecanismos de mitigação.
O debate sobre as tecnologias na educação não configura tema novo, mas ganhou especial atenção nos últimos dois anos dada a necessidade de adoção do ERE. Assim, é importante, no âmbito educacional, atentarmos para as mudanças que as novas tecnologias digitais vêm imprimindo nas sociedades e nos cotidianos. Por estes mesmos motivos, consideramos que o tema ganha especial relevância no período em que vivemos, no qual muitos estabelecimentos de ensino se viram obrigados a funcionar por meio de/nas tecnologias5. No bojo deste processo, práticas foram (re)pensadas e retornos (re)imaginados. No Brasil, a discussão sobre o fechamento das escolas e a necessidade de sua reabertura pautou diferentes posições de governantes, gestores de educação, professores, estudantes e seus familiares.
Apresentamos, tendo todo este panorama em vista, o Dossiê Temático "Tecnologias digitais na Pandemia: a defesa do ensino público, democrático e inclusivo" com o objetivo de promover uma ampla discussão sobre os impactos da pandemia quanto às experiências com a utilização de tecnologias no contexto educacional, buscando contribuir para um debate que sustente reflexões sobre a sua incorporação na educação para além da mera inserção mercadológica de "produtos tecnológicos" em sistemas de ensino e práticas pedagógicas, vale dizer, com foco na defesa do ensino público, democrático e inclusivo tanto no período pandêmico quanto nos cenários que se desenham para o futuro.
O número que a leitora e o leitor têm em tela apresenta 14 manuscritos que trazem discussões que permeiam tanto o contexto geral do uso de tecnologias como cenários específicos. São nove artigos com resultados de pesquisa, três relatos de experiência, um ensaio e uma entrevista, realizada com o sociólogo francês Michel Maffesoli. Nela, o intelectual apresenta sua visão relativa às mudanças provocadas pela internet no campo educacional, abordando essencialmente quatro eixos: 1) formação acadêmica; 2) compreensão do fenômeno educacional na contemporaneidade; 3) pesquisas realizadas; e 4) reflexões de aspectos políticos na contemporaneidade. Ainda nesta perspectiva, o artigo "Educação e Desinformação: letramento midiático, ciência e diálogo" nos traz uma importante discussão sobre como a formação crítica para o uso das mídias pode nos auxiliar numa leitura socialmente engajada no combate à desinformação e ao negacionismo científico, existente há tempos, mas potencializado nos últimos anos.
Outro eixo temático contemplado engloba diferentes estudos realizados durante o período pandêmico, os quais abordam práticas pedagógicas que permeiam o uso de estratégias distintas, como a gamificação, o uso vídeos educativos e de ferramentas como redes sociais e canais de comunicação diversos em projetos educacionais e/ou de extensão em diferentes ações pensadas e desenvolvidas no período de isolamento social. Os artigos nos permitem refletir sobre propostas que sustentam o enfrentamento à exclusão digital na busca de uma formação crítica, aspecto marcante e que dialoga diretamente com o primeiro eixo no que tange à ideia do letramento digital e midiático, bem como sobre o papel das tecnologias nestes contextos.
Por fim, o número contempla trabalhos que nos permitem olhar para além do período vivenciado nos dois últimos anos. Problematiza-se o uso das tecnologias frente aos diversos interesses no que tange ao financiamento educacional e discute-se a concepção de ensino híbrido, conceito amplamente utilizado no período, mas que ganha significados distintos (e por vezes inconsistentes ou mesmo contraditórios) quando temos em mente a educação que buscamos. Nesse sentido, oferece-se importantes discussões sobre o papel docente no mundo contemporâneo, bem como reflexões sobre a personalização do ensino híbrido que reconheça as diferenças na escola e leve em consideração o mundo multicultural e desigual em que vivemos. Como podemos ver e de acordo com o que temos presenciado cotidianamente, a pandemia da Covid-19 e o ERE nos obriga a repensar o papel das novas tecnologias digitais no ensino e aprendizagem, assim como suas propiciações e limitações.
Convidamos as leitoras e os leitores a compartilhar conosco destas reflexões!