INTRODUÇÃO
O art. 13 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) indica que os casos de suspeita ou confirmação de maus tratos devem ser obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade de moradia da vítima. Também descreve como ato de infração a não comunicação desses eventos por profissionais de saúde e de educação (BRASIL, 1990).
O preenchimento adequado da ficha de notificação de violência interpessoal/ autoprovocada do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) é importante para o registro de dados fidedignos, o que possibilita a criação de políticas e estratégias de prevenção e redução do número de casos de violências (BRASIL, 2002). Contudo, observa-se que muitos desconhecem esse documento ou o preenchimento adequado de seus campos, o que interfere na análise dos dados por ela gerados. Segundo o Ministério da Saúde (MS)
Os problemas de qualidade dos dados das notificações de violências ocorrem em todas as etapas do processo. No entanto, o estabelecimento de rotinas de monitoramento, limpeza, retroalimentação para os serviços e treinamento das equipes podem oferecer melhores condições para o registro acurado e completo dos dados (BRASIL, 2019b, p.5).
Essa ficha de notificação é um instrumento público de diagnóstico, pois ajuda a caracterizar o perfil epidemiológico dos eventos. Após o preenchimento, a ficha é enviada à vigilância epidemiológica e digitada no SINAN. A omissão do profissional em relação a ela leva à responsabilidade penal e civil do agente, que deveria notificar independente de laudo do Instituto Médico Legal (IML). Ela difere do boletim de ocorrência, pois não tem valor de instauração de inquérito policial e não é encaminhada para este serviço (BRASIL, 2002). Segundo o Ministério da Saúde
Em 2016, foram notificados 274.657 casos de violência interpessoal e autoprovocada, no Sinan. Foram excluídos 31.398 (11,4%) casos devido à inadequação à definição de caso, duplicidades e inconsistência de dados, resultando em 243.259 casos para compor a base nacional limpa (BRASIL, 2019a, p.12)
Há várias ações ministeriais desenvolvidas no país com o intuito de prevenir os acidentes e a violência na infância, como a Política Nacional de redução da morbimortalidade por acidentes e violência (BRASIL, 2005), que deve ser de conhecimento de todo profissional de saúde durante sua formação e sua atividade profissional.
Como eixo norteador para sua atuação, o enfermeiro tem o código de ética profissional que descreve: o profissional de enfermagem deve obrigatoriamente realizar a comunicação externa para órgãos de responsabilização criminal dos casos de violência contra crianças, adolescentes, idosos e incapazes, assim também como no caso de violência doméstica contra a mulher (CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM, 2017).
As diretrizes curriculares nacionais ressaltam que a formação do Enfermeiro deve atender às necessidades sociais da saúde, com ênfase no Sistema Único de Saúde (SUS), e assegurar a integralidade da atenção e a qualidade e humanização do atendimento, que são seus princípios norteadores. Por isso é importante que o enfermeiro durante sua formação tenha acesso às políticas e aos protocolos do Ministério da Saúde, pois isso será fundamental para sua atuação profissional (BRASIL, 2001).
Deste modo, o objetivo deste estudo foi avaliar o efeito de ação educativa sobre o preenchimento da ficha de notificação de violência interpessoal/autoprovocada, durante a atividade curricular de formação de enfermeiros.
MÉTODO
Levando em consideração o referencial trazido pela Política Nacional de Redução de Morbimortalidade por Acidentes e Violência (BRASIL, 2005), bem como as Diretrizes Curriculares Nacionais que contemplam a formação do enfermeiro para atuação no SUS (BRASIL, 2001), foi realizado um estudo quase experimental, no qual se pretende “atingir um grau de controle próximo aos dos delineamentos experimentais para inferir que dado tratamento teve o efeito pretendido” (COZBY, 2003, p. 238), com abordagem quali-quantitativa. O uso concomitante das abordagens qualitativa e quantitativa pode complementar o planejamento da investigação (MINAYO; SANCHES, 1993, p. 240).
Após aprovação (Parecer no 1.502.439/2016) do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), foi realizado contato com a faculdade e pactuação com os docentes das disciplinas para disponibilização da data na qual seria realizada a ação com os alunos de cada semestre, em dias diferentes. Foi utilizado um caso fictício de violência infantil envolvendo a violência doméstica, identificado pela escola e encaminhado para a unidade de saúde no qual o provável autor da violência era o padrasto. Foi entregue uma ficha de notificação de violência interpessoal/autoprovocada, do SINAN, para cada aluno. Após a leitura do caso, eles deveriam preencher individualmente a ficha conforme a orientação recebida pela pesquisadora.
Participaram 93 graduandos de um curso de Enfermagem de uma Faculdade do Interior paulista, sendo 10 do primeiro ano, 17 do segundo ano, 23 do terceiro ano, 14 do quarto ano e 29 do quinto ano. Foi uma amostragem não probabilística e de forma intencional. Durante a atividade curricular, com permissão e na presença do docente responsável, foi realizada uma explanação sobre conceitos e principais tipos de violência, papel do enfermeiro e políticas existentes sobre o tema, ressaltando a importância da ficha de notificação e seu preenchimento adequado. A seguir, cada graduando recebeu uma ficha de notificação interpessoal e autoprovocada, do SINAN, e o texto, com explicações sobre o preenchimento adequado, reforçando a necessidade de preencher todos os campos e, posteriormente, devolvê-la.
O tempo destinado à atividade foi de 40 minutos. Avaliou-se o preenchimento (in)completo/(in)correto dos campos da ficha. Os dados foram digitados em um arquivo em Excel, em seguida foram cadastrados e analisados no software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS®), contendo todas as informações da ficha de notificação de violência interpessoal e autoprovocada, do SINAN. Assim, procedeu-se à análise das quantidades de preenchimento: completo/correto, completo/incorreto, incompleto/correto, e incompleto/incorreto, em cada bloco de informação da ficha e em seus respectivos campos. Baseado nos dados dos 93 estudantes, distribuídos de acordo com os anos do curso, foi aplicado o teste estatístico Kruskal-Wallis (CONOVER, 1998), considerando o nível de significância de 5%, a fim de verificar a existência de alguma diferença no preenchimento correto, incompleto e errado, dos 12 blocos de informação entre os anos do curso.
O instrutivo de preenchimento desta ficha informa que há itens considerados de preenchimento obrigatório, essenciais e chaves.
Campo de preenchimento obrigatório é aquele cuja ausência de dado impossibilita a inclusão da notificação no SINAN. Campo essencial é aquele que, apesar de não ser obrigatório, registra dado necessário à investigação do caso ou ao cálculo de indicador epidemiológico ou operacional. Campo chave é aquele que identifica o registro no sistema Brasil (BRASIL, 2015, p.23).
Considerou-se o preenchimento: completo/correto quando os quadrículos foram preenchidos com a informação correta segundo o texto, por exemplo, a hora da ocorrência (item 51) foi às 10 horas, conforme o caso elaborado; completo/incorreto quando o preenchimento dos quadrículos teve uma informação divergente à apresentada pelo caso, por exemplo, o horário diferente da ocorrência da violência; incompleto/correto quando, nos blocos com opções múltiplas de preenchimento, os alunos marcaram somente o item correspondente à informação correta, mas não completaram os demais. Neste último caso, no item encaminhamento (65), deveriam preencher com o número “1”, referente ao “sim”, nos itens serviços de saúde, escola, conselho tutelar e delegacia da mulher; e, nos demais itens, colocar o número “2” referente a “não”, ou seja, serviços em que a criança e a mãe não haviam sido encaminhadas, conforme o caso fictício. Por consequência, foi considerado incompleto/incorreto quando os quadrículos ficaram sem preenchimento.
Para esclarecimento sobre os itens da ficha e análise do preenchimento feito pelos alunos, é importante descrever sobre os blocos que a compõem e seus respectivos campos. Portanto, seguem, na Tabela 1, os dados que o instrutivo do Ministério da Saúde descreve como de preenchimento obrigatório e os itens considerados importantes para análise, nesta pesquisa.
Blocos | Quantidade de itens | Quantidade de itens analisados | Campos obrigatórios | Campos essenciais | Campos chaves |
Dados gerais | 9 (1-9) | 7* | 4;6;7;8;9 | - | 3;5 |
Notificação individual | 9 (10-18) | 9 | 10-14 | 15-18 | - |
Dados da residência | 14 (19-32) | 10** | 19;20 | 21-32 | - |
Dados da pessoa atendida | 7(33-39) | 6 | 36-37;39** | 33-35;38 | - |
Dados da ocorrência | 15 (40-54) | 12**** | 40;41;52 | 50;51;53;54 | |
Violência | 3(55-57) | 3 | 55-56 | 57 | - |
Violência sexual | 2(58-59) | 2 | - | 58-59 | - |
Dados do provável autor da violência | 5 (60-64) | 5 | 60-62; 64 | 63 | - |
Encaminhamento | 1 (65) | 1 | 65 | - | - |
Dados finais | 4 (66-69) | 2 | 69 | 66-68***** | - |
Fonte: autoria própria.
*os itens tipo de notificação (1) e agravo ou doença (2) já apresentam seus campos preenchidos;
**os itens distrito (21), Geo campo 1 (26) e Geo campo 2 (27) e o item (32) País (se residente fora do Brasil) não foram preenchidos;
*** item 39: caso a vítima tenha deficiência, este item é de preenchimento obrigatório conforme o instrutivo, neste estudo não foi necessário;
****os itens distrito (42), Geo campo 1 (47) e Geo campo 2 (48) não precisavam ser preenchidos;
*****Itens 67 e 68 não foram preenchidos, pois não havia relação com o trabalho.
A partir do bloco “dados finais”, não há no instrutivo a obrigatoriedade de preenchimento dos campos informações complementares e observações e notificador. Porém, para análise, foram considerados os seguintes campos de preenchimento da ficha:
- Informações complementares e observações - nesse bloco, consideraram-se três itens para preenchimento obrigatório: nome do acompanhante, vínculo/grau de parentesco e telefone, porém não se considerou o preenchimento das observações adicionais;
- Notificador - foram considerados quatro campos para preenchimento dos alunos: município e unidade, nome, função e assinatura para análise.
Ressalta-se que a análise foi feita mediante a porcentagem do total de fichas em cada ano para cada categoria em virtude da diferença do número de fichas de notificação recolhidas em cada ano do curso.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O teste estatístico Kruskal-Wallis (CONOVER, 1998) apontou a existência de diferença estatística entre os anos do curso no preenchimento nas variáveis: correto_notificação (p_ valor: 0,019), incompleto_notificação (p_valor: 0,040) , errado_dados da ocorrência (p_valor: 0,004), correto_autor da violência (p_valor: 0,047), errado_autor da violência (p_valor: 0,000), correto_encaminhamento (p_valor: 0,013), incompleto_encaminhamento (p_valor: 0,020), correto_dados finais (p_valor: 0,000), incompleto_dados finais (p_valor: 0,000), correto_informação_complementar (p_valor: 0,003), incompleto_informação_complementar (p_valor:0,003), correto_notificador (p_valor: 0,010), incompleto_notificado (p_valor: 0,009). Este resultado indica que ocorreram diferenças nas quantidades de preenchimento entre os anos. Para as demais variáveis, o teste estatístico não registrou diferenças nas quantidades de preenchimento correto, incompleto e errado entre os anos do curso, ou seja, independente dos anos, os estudantes demonstraram dificuldades parecidas no preenchimento da ficha SINAN. Houve semelhanças de preenchimento entre os grupos de alunos, ou seja, todos os grupos tiveram dificuldades, principalmente nos itens com p valor de 0,05%;
Na Tabela 2, em relação ao bloco de dados gerais, mais especificamente no item três (data da notificação), houve o preenchimento completo e correto da ficha em todos os anos do curso: maior que 90%. Em relação à categoria incompleta e incorreta, o primeiro ano apresentou 90% de preenchimento inadequado.
Categorias de Análise | Ano do Curso de Graduação em Enfermagem | ||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | |||||||
F | % | F | % | F | % | F | % | F | % | ||
Data de notificação | com_cor | 9 | 90 | 17 | 100 | 21 | 91 | 13 | 93 | 28 | 97 |
incomp_incor | 1 | 10 | 0 | 0 | 2 | 9 | 1 | 7 | 1 | 3 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Unidade de federação | com_ incor | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 7 | 0 | 0 |
com_cor | 6 | 60 | 10 | 59 | 16 | 70 | 5 | 36 | 20 | 69 | |
incomp_incor | 4 | 40 | 7 | 41 | 7 | 30 | 8 | 57 | 9 | 31 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Município de notificação | com_ incor | 1 | 10 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 7 | 1 | 3 |
com_cor | 7 | 70 | 13 | 76 | 20 | 87 | 9 | 64 | 23 | 80 | |
incomp_incor | 2 | 20 | 4 | 24 | 3 | 13 | 4 | 29 | 5 | 17 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Unidade notificadora | com_ incor | 1 | 10 | 0 | 0 | 6 | 26 | 1 | 7 | 1 | 3 |
com_cor | 8 | 80 | 16 | 94 | 12 | 52 | 10 | 59 | 26 | 90 | |
incomp_incor | 1 | 10 | 1 | 6 | 5 | 22 | 3 | 18 | 2 | 7 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Nome da unidade notificadora | com_ incor | 3 | 30 | 0 | 0 | 2 | 9 | 1 | 7 | 1 | 3 |
com_cor | 7 | 70 | 15 | 88 | 19 | 83 | 10 | 71 | 25 | 86 | |
incomp_incor | 0 | 0 | 2 | 12 | 2 | 9 | 3 | 21 | 3 | 10 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Unidade de saúde | com_ incor | 1 | 10 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 |
com_cor | 9 | 90 | 14 | 82 | 15 | 65 | 6 | 43 | 21 | 72 | |
incomp_cor | 0 | 0 | 1 | 6 | 2 | 9 | 3 | 21 | 0 | 0 | |
incomp_incor | 0 | 0 | 2 | 12 | 6 | 26 | 5 | 36 | 8 | 28 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Data da ocorrência da violência | com_ incor | 1 | 10 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 |
com_cor | 7 | 70 | 15 | 88 | 17 | 74 | 11 | 79 | 29 | 100 | |
incomp_incor | 2 | 20 | 2 | 12 | 6 | 26 | 3 | 21 | 0 | 0 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 |
Fonte: autoria própria.
Em relação à unidade de federação, constatou-se uma variação entre o percentual de preenchimento correto e completo entre os anos, destacando-se o terceiro ano, com 87% de acertos.
No item “município da notificação”, a porcentagem de preenchimento completo e correto foi acima de 64% entre os anos do curso.
Referente ao nome da unidade notificadora, observou-se preenchimento correto e completo, variando de 70% a 88% entre os anos do curso. No item “nome da unidade de saúde”, o primeiro ano teve 90% de preenchimento completo e correto.
No item “data da ocorrência da violência”, o quinto ano realizou 100% do preenchimento completo e correto; nos demais anos, este preenchimento variou de 70% a 88%. O preenchimento incompleto e incorreto foi maior no terceiro ano: 26% das fichas. O bloco da notificação individual tem os itens 10 a 14 considerados de preenchimento obrigatório. No item “nome do paciente”, observou-se 100% de preenchimento completo e correto em todos os anos, com exceção do quarto ano: apenas 4% (Tabela 3).
No item “idade da vítima”, o preenchimento incompleto e incorreto foi de 38% das fichas do quinto ano do curso. O item “sexo do paciente” apresentou 100% de preenchimento completo e correto em todos os anos, com exceção do quarto ano, com 4% de preenchimento completo e incorreto e 4% de preenchimento incompleto e incorreto. No item relacionado à informação “gestante”, o preenchimento completo correto variou de 52% a 93% entre os anos do curso.
Categorias de Análise | Ano do Curso de Graduação em Enfermagem | ||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | |||||||
F | % | F | % | F | % | F | % | F | % | ||
Nome do paciente | com_ incor | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 4 | 0 | 0 | 0 | 0 |
com_cor | 10 | 100 | 17 | 100 | 22 | 96 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Data de nascimento | com_ incor | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 4 | 0 | 0 | 0 | 0 |
com_cor | 9 | 90 | 17 | 100 | 21 | 92 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
incomp_incor | 1 | 10 | 0 | 0 | 1 | 4 | 0 | 0 | 0 | 0 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Idade | com_ incor | 0 | 0 | 0 | 0 | 2 | 9 | 0 | 0 | 3 | 10 |
com_cor | 8 | 80 | 16 | 94 | 13 | 57 | 8 | 57 | 13 | 45 | |
incomp_cor | 2 | 20 | 0 | 0 | 7 | 30 | 4 | 29 | 2 | 7 | |
incomp_incor | 0 | 0 | 1 | 6 | 1 | 4 | 2 | 14 | 11 | 38 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Sexo | com_ incor | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 4 | 0 | 0 | 0 | 0 |
com_cor | 10 | 100 | 17 | 100 | 21 | 92 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
incomp_incor | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 4 | 0 | 0 | 0 | 0 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Gestante | com_cor | 7 | 70 | 15 | 88 | 12 | 52 | 11 | 79 | 27 | 93 |
incomp_cor | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 7 | 0 | 0 | |
incomp_incor | 3 | 30 | 2 | 12 | 11 | 48 | 2 | 14 | 2 | 7 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 |
Fonte: autoria própria.
Em relação ao bloco “dados da residência”, dois campos são de preenchimento obrigatório. O item 19, “unidade de federação”, teve preenchimento completo e correto, variando de 70% a 90% entre os anos do curso (Tabela 4).
Categorias de Análise | Ano do Curso de Graduação em Enfermagem | ||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | |||||||
F | % | F | % | F | % | F | % | F | % | ||
Unidade de federação | com_cor | 7 | 70 | 15 | 88 | 15 | 65 | 12 | 86 | 26 | 90 |
incomp_cor | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 2 | 14 | 0 | 0 | |
incomp_incor | 3 | 30 | 2 | 12 | 8 | 35 | 0 | 0 | 3 | 10 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Município de residência | com_ incor | 1 | 10 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 7 | 0 | 0 |
com_cor | 8 | 80 | 16 | 94 | 22 | 96 | 13 | 93 | 27 | 93 | |
incomp_incor | 1 | 10 | 1 | 6 | 1 | 4 | 0 | 0 | 2 | 7 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 |
Fonte: autoria própria.
No item 20, onde deveria ser descrito o município de residência, o preenchimento completo e correto variou de 80% a 96% entre os anos.
No bloco “dados da pessoa atendida”, os itens 36 e 37 deveriam ser obrigatoriamente preenchidos. No item 36, “orientação sexual da vítima”, o preenchimento completo e correto variou de 74% a 93% entre os anos do curso.
No item “identidade de gênero da vítima”, houve 87% de preenchimento completo e correto no quinto ano do curso, e 82% de acerto no segundo ano. Já no terceiro ano, observou-se 43% e 36% de preenchimento entre os alunos do quarto ano, de forma incompleta e incorreta (Tabela 5).
Categorias de Análise | Ano do Curso de Graduação em Enfermagem | ||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | |||||||
F | % | F | % | F | % | F | % | F | % | ||
Orientação sexual | com_ incor | 0 | 0 | 1 | 6 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 |
com_cor | 9 | 90 | 15 | 88 | 17 | 74 | 13 | 93 | 27 | 93 | |
incomp_cor | 0 | 0 | 1 | 6 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | |
incomp_incor | 1 | 10 | 0 | 0 | 6 | 26 | 1 | 7 | 2 | 7 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Identidade de gênero | com_ incor | 1 | 10 | 1 | 6 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 3 |
com_cor | 7 | 70 | 14 | 82 | 13 | 57 | 9 | 64 | 25 | 87 | |
incomp_cor | 0 | 0 | 2 | 12 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | |
incomp_incor | 2 | 20 | 0 | 0 | 10 | 43 | 5 | 36 | 3 | 10 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 |
Fonte: autoria própria.
No bloco “dados da ocorrência”, os itens obrigatórios, segundo o instrutivo de preenchimento, relacionavam-se aos itens 40, 41, 52; entretanto observou-se que, no item 40 (unidade de federação), 80% das fichas do primeiro ano foram preenchidas de forma completa e correta, e no item 41 (município de ocorrência), variou de 79% a 90% entre os anos do curso.
No item 52, ”local da ocorrência da violência”, o preenchimento completo e correto variou de 79% a 90% entre os anos do curso (Tabela 6).
Categorias de Análise | Ano do Curso de Graduação em Enfermagem | ||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | |||||||
F | % | F | % | F | % | F | % | F | % | ||
Unidade de federação | com_ incor | 0 | 0 | 1 | 6 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 3 |
com_cor | 8 | 80 | 12 | 70 | 8 | 35 | 9 | 64 | 16 | 55 | |
incomp_incor | 2 | 20 | 4 | 24 | 15 | 65 | 5 | 36 | 12 | 42 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Município de ocorrência | com_cor | 9 | 90 | 15 | 88 | 21 | 91 | 11 | 79 | 25 | 87 |
com_incor | 1 | 10 | 1 | 6 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 3 | |
incomp_incor | 0 | 0 | 1 | 6 | 2 | 9 | 3 | 21 | 3 | 10 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Local de ocorrência | com_ incor | 1 | 10 | 2 | 12 | 1 | 4 | 0 | 0 | 0 | 0 |
com_cor | 9 | 90 | 15 | 88 | 19 | 83 | 12 | 86 | 28 | 97 | |
incomp_incor | 0 | 0 | 0 | 0 | 3 | 13 | 2 | 14 | 1 | 3 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 |
Fonte: autoria própria.
Na Tabela 7, em relação ao bloco da violência, os campos obrigatórios incluíram os itens 55 e 56. No item 55, onde deveria ser assinalada a motivação da violência, 40% dos alunos do terceiro ano preencheram de forma completa e incorreta; os alunos do primeiro ano preencheram 70% de forma completa e correta; e 43% dos alunos do quarto ano preencheram de forma incompleta e incorreta.
No item 56, onde deveria ser assinalado o tipo de violência ocorrida, o segundo e o quarto ano apresentaram 29% de preenchimento completo e correto; o quinto ano, 28% de preenchimento incompleto e incorreto; e o primeiro ano, 70% de preenchimento completo, mas incorreto.
Categorias de Análise | Ano do Curso de Graduação em Enfermagem | ||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | |||||||
F | % | F | % | F | % | F | % | F | % | ||
Violência motivada por | com_ incor | 2 | 20 | 6 | 35 | 9 | 40 | 2 | 14 | 5 | 17 |
com_cor | 7 | 70 | 7 | 41 | 7 | 30 | 4 | 29 | 18 | 63 | |
incomp_cor | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 4 | 2 | 14 | 1 | 3 | |
incomp_incor | 1 | 10 | 4 | 24 | 6 | 26 | 6 | 43 | 5 | 17 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Tipo de violência | com_ incor | 7 | 70 | 4 | 24 | 5 | 22 | 1 | 7 | 6 | 21 |
com_cor | 1 | 10 | 5 | 29 | 2 | 9 | 4 | 29 | 3 | 10 | |
incomp_cor | 1 | 10 | 6 | 35 | 12 | 52 | 7 | 50 | 12 | 41 | |
incomp_incor | 1 | 10 | 2 | 12 | 4 | 17 | 2 | 14 | 8 | 28 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 |
Fonte: autoria própria.
O bloco “dados do provável autor da violência” (Tabela 8) apresentou três itens de preenchimento obrigatório. No item 60, relacionado ao número de envolvidos, 80% dos alunos do primeiro ano preencheram de forma completa e correta; o quinto ano preencheu 80% de forma completa, mas incorreta; e o segundo ano apresentou 12% de preenchimento incompleto e incorreto.
Categorias de Análise | Ano do Curso de Graduação em Enfermagem | ||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | |||||||
F | % | F | % | F | % | F | % | F | % | ||
Número de envolvidos | com_ incor | 2 | 20 | 5 | 29 | 14 | 61 | 4 | 29 | 23 | 80 |
com_cor | 8 | 80 | 10 | 59 | 7 | 30 | 9 | 64 | 5 | 17 | |
incomp_incor | 0 | 0 | 2 | 12 | 2 | 9 | 1 | 7 | 1 | 3 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Grau de parentesco com a vítima | com_ incor | 2 | 20 | 2 | 12 | 2 | 8 | 3 | 21 | 2 | 7 |
com_cor | 3 | 30 | 6 | 35 | 5 | 22 | 6 | 43 | 9 | 31 | |
incomp_cor | 4 | 40 | 6 | 35 | 8 | 35 | 3 | 21 | 12 | 41 | |
incomp_incor | 1 | 10 | 3 | 18 | 8 | 35 | 2 | 15 | 6 | 21 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Sexo do provável autor da violência | com_ incor | 0 | 0 | 1 | 6 | 2 | 9 | 0 | 0 | 1 | 3 |
com_cor | 9 | 90 | 14 | 82 | 19 | 82 | 12 | 86 | 27 | 94 | |
incomp_cor | 1 | 10 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | |
incomp_incor | 0 | 0 | 2 | 12 | 2 | 9 | 2 | 14 | 1 | 3 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 | |
Autor da violência | com_ incor | 1 | 10 | 2 | 12 | 4 | 17 | 2 | 14 | 4 | 14 |
com_cor | 9 | 90 | 14 | 82 | 16 | 70 | 11 | 79 | 25 | 86 | |
incomp_incor | 0 | 0 | 1 | 6 | 3 | 13 | 1 | 7 | 0 | 0 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 |
Fonte: autoria própria.
No bloco 61, relacionado ao “vínculo e grau de parentesco com a pessoa atendida”, o preenchimento completo e correto desse item variou de 30% a 43% entre os anos. Já o preenchimento incompleto e incorreto variou de 10% a 35%. Em relação ao item 62, “sexo do provável autor da violência”, o preenchimento completo e correto variou de 82% a 94% entre os anos do curso.
Ainda neste bloco, o item 64 (relacionado ao ciclo de vida do provável autor da violência) indicou que a porcentagem de preenchimento completo e correto variou entre 70% e 90% nos diferentes anos do curso. No bloco 65, “encaminhamentos”, a porcentagem de preenchimento completo e correto variou de 28% a 40%. O preenchimento incompleto e incorreto variou entre 10% e 22% (Tabela 9).
Categorias de Análise | Ano do Curso de Graduação em Enfermagem | ||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | |||||||
F | % | F | % | F | % | F | % | F | % | ||
Encaminhamentos | com_ incor | 5 | 50 | 3 | 18 | 0 | 0 | 5 | 36 | 5 | 17 |
com_cor | 4 | 40 | 9 | 53 | 9 | 39 | 4 | 29 | 8 | 28 | |
incomp_cor | 1 | 10 | 2 | 12 | 5 | 22 | 1 | 7 | 4 | 14 | |
incomp_incor | 0 | 0 | 3 | 18 | 9 | 39 | 4 | 29 | 12 | 41 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 |
Fonte: autoria própria.
Considerado obrigatório para preenchimento, o item 69 do bloco dados finais, apresentado na Tabela 10, referiu-se à data do encerramento. Verificou-se porcentagem de preenchimento completo e correto de 60 a 86% entre os cinco anos do curso.
Observou-se que muitos alunos não preencheram adequadamente a ficha por não utilizarem os dados descritos no caso fictício, como, por exemplo, nome do município, unidade notificadora, e apresentaram dificuldade em interpretar o texto para preenchimento de dados do provável autor da violência, encaminhamento, entre outros itens.
Categorias de Análise | Ano do Curso de Graduação em Enfermagem | ||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | |||||||
F | % | F | % | F | % | F | % | F | % | ||
Dados finais | com_ incor | 0 | 0 | 1 | 6 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 |
com_cor | 6 | 60 | 14 | 82 | 7 | 30 | 11 | 79 | 25 | 86 | |
incomp_incor | 4 | 40 | 2 | 12 | 16 | 70 | 3 | 21 | 4 | 14 | |
Total | 10 | 100 | 17 | 100 | 23 | 100 | 14 | 100 | 29 | 100 |
Fonte: autoria própria.
Constata-se uma variação de preenchimento em cada item e em cada ano do curso. Não se pode afirmar que um ano específico da graduação preencheu mais corretamente ou teve mais dificuldade em preenchê-la adequadamente. Por outro lado, houve mais preenchimentos completos e corretos nos itens obrigatórios do bloco de notificação individual (10/11), que registraram 100% na maioria dos anos do curso.
Os itens unidade de saúde (8), idade (12), orientação sexual (36), motivação da violência (55), tipo de violência (56), vínculo e grau de parentesco com a vítima (61), sexo do provável autor da violência (62) e encaminhamento (65) apresentaram as quatro categorias de análise, o que leva a considerar que houve maior dificuldade por parte dos alunos no preenchimento desses campos.
Diante dessa análise, é importante ressaltar que o ensino sobre o preenchimento de fichas de notificação deve fazer parte da formação de profissionais, mais especificamente dos enfermeiros, visto que há detalhes que precisam ser reforçados, como o preenchimento de campos obrigatórios, os quais auxiliarão na análise de dados epidemiológicos pela gestão, por isso esses dados devem ser preenchidos corretamente para serem considerados confiáveis.
Em 2019, o Ministério da Saúde publicou um documento denominado: “Qualidade dos dados de notificação de violência interpessoal e autoprovocada, Brasil - 2016”, no qual descreve que o preenchimento da ficha no país é considerado regular.
No total de notificações de violência interpessoal e autoprovocada realizadas no Brasil, em 2016, o percentual médio de preenchimento foi “excelente” para os blocos de variáveis sobre zona de residência e violência sexual, “regular” para os blocos de variáveis sobre notificação individual, dados da pessoa atendida, dados da ocorrência, violência, dados do provável autor da agressão e encaminhamento. No entanto, o percentual médio do preenchimento do bloco de variáveis sobre dados finais foi classificado como “ruim” (BRASIL, 2019a, p.18- 19).
Segundo o MS, os dados de notificação digitados no SINAN permitem “diagnóstico dinâmico” de uma realidade epidemiológica de uma área geográfica específica, e auxilia no planejamento de ações de saúde com priorização de ações de intervenção e avaliação do impacto das atividades implementadas. (BRASIL, 2019b).
As doenças que devem ser notificadas compulsoriamente à autoridade de saúde estão descritas na Portaria nº 204, de 17 de fevereiro de 2016, e devem ser realizadas pelos médicos, profissionais de saúde ou responsáveis pelos estabelecimentos de saúde, públicos ou privados (BRASIL, 2016).
Em relação à literatura nacional, foram encontrados vários estudos que abordam a questão da análise do preenchimento das fichas de notificação de violências em determinados municípios, como, por exemplo, o estudo de Ribeiro e Silva (2018), que investigou o processo de notificação de violência contra crianças e jovens em uma cidade do Sul do Brasil. Eles referiram que, naquele contexto, a notificação era vista como denúncia e não como dado epidemiológico, por isso a notificação era feita após a apuração do caso por uma equipe multiprofissional, não de imediato na suspeita.
O estudo de Cezar, Arpini e Goetz (2017) também objetivou apresentar dados epidemiológicos relacionados à violência contra crianças e adolescentes no Sul do Brasil, no período de 2009-2013, para caracterizar o perfil das vítimas e agressores. Os autores concluíram que a notificação é um importante instrumento para efetivação das políticas de proteção à criança e adolescentes, mas ainda é um desafio para os profissionais da saúde pública.
Fattah e Lima (2020) realizaram um estudo sobre o perfil das notificações de violência no Sul do país e sugerem a realização de pesquisas sobre a violência autoprovocada e comportamento suicida entre adolescentes e jovens para auxiliar na prevenção destes eventos. Este estudo corrobora os dados do boletim epidemiológico (2019), que também aborda a questão da prevenção de violência autoprovocada neste público, pois os dados epidemiológicos mostram que houve “entre 2011 e 2017 um aumento no número de óbitos por suicídio entre os jovens de 15 a 29 anos, sendo 8,7% entre os homens e 7,3% entre as mulheres” (BRASIL, 2019, p.8).
Estudos internacionais, como, por exemplo, um estudo realizado nos Estados Unidos, por Sumner et al. (2015), descrevem que um dos motivos pelos quais a violência é pouco reconhecida no país é que os sistemas de denúncia de violência são compartimentalizados. Além disso, refere que os profissionais médicos, profissionais de saúde pública, a polícia, assim como a justiça e as organizações assistencialistas, educacionais e comunitárias, ainda não construíram mecanismos para respostas abrangentes e coordenadas à violência.
Estudos internacionais, como o de Feng et al. (2012), sobre desafios éticos e legais dos profissionais que denunciam o abuso infantil, realizado com uma equipe multiprofissional in Taiwan (incluindo profissionais da saúde e educadores), demonstrou que os profissionais não fazem a notificação imediata às autoridades, mesmo tendo o prazo de 24 horas após o atendimento para denunciar. Apesar de entenderem que os direitos das crianças devam ser garantidos, esses profissionais percebem que há costumes socialmente aceitáveis, como o de educar por meio da violência física (FENG et al., 2012).
Outro estudo constatou que 18 Estados americanos têm leis que regulamentam a respeito da notificação obrigatória em casos de abuso e negligência contra a criança; nos demais Estados, pode ser feita uma denúncia por meio de relatório elaborado por adultos. Os autores relatam que a subnotificação traz muitos prejuízos para a criança, pois não dá acesso à proteção. As pessoas, principalmente os profissionais da saúde, devem saber elaborar relatórios em casos de suspeita de violência e negligência contra a criança, garantindo, assim, acesso e segurança para essas vítimas (KRASE; DELONG-HAMILTON, 2015).
A questão legal da notificação de abuso infantil, nos Estados Unidos, também foi abordada no estudo de Palusci, Vandervort e Lewis (2016). Eles fazem referência a um Sistema Nacional de Abuso e Negligência de Crianças, “The National Child Abuse and Neglect Data System (NCANDS)”, que recebe todas as informações desencadeadas por profissionais, os quais têm dever legal em reportar esses eventos. Especificamente nesse estudo, os autores fazem uma análise dos dados desse sistema para verificar se, após a implantação da lei com a inclusão de denúncias por parte da igreja, houve aumento dessas notificações. Também afirmam que alguns Estados americanos não mantêm os dados atualizados no sistema nacional, o que dificulta a análise dessa base de dados, mas consideram que as mudanças ocorridas na lei auxiliam na identificação de novos casos (PALUSCI; VANDERVORT; LEWIS, 2016).
No Irã, a notificação de violência contra a criança não é obrigatória, e os enfermeiros têm se tornado responsáveis por essas denúncias à polícia, pois não há serviços de referências ou fluxos estabelecidos para assistência a essas crianças. Sendo assim, muitas vezes, considera-se que as denúncias realizadas pelas enfermeiras se perdem e não são averiguadas (BORIMNEJAD; FOMANI, 2015). Os autores desse estudo apontam que as enfermeiras iranianas ainda enfrentam barreiras culturais, sociais e religiosas no país e concluem que as leis e fluxos de atendimento precisam ser revistos. O medo de denunciar deve-se às retaliações (BORIMNEJAD; FOMANI, 2015).
Isso posto, observa-se que as barreiras para a notificação não estão presentes somente na população brasileira. Realmente, a violência é um fenômeno mundial e complexo, que necessita de vários atores e cenários, ou melhor, de serviços que trabalhem em rede para buscar melhoria da qualidade de vida para a vítima, acompanhamento e punição para os agressores, tais como: formação, treinamento e educação contínua para profissionais diretamente envolvidos nos cuidados com as crianças, para fortalecê-los e instrumentalizá-los sobre leis, processos de trabalho e respaldo para atuação diante desses casos.
O relatório mundial sobre a prevenção da violência da Organização Mundial de Saúde descreve que em muitos países há planos de enfrentamento para maus tratos contra criança, idosos e violência contra a mulher, além de atividades de prevenção primárias desenvolvidas em 50% dos países incluídos nesse relatório. Em 80% dos países participantes do estudo, estão em vigor serviços de referência para as vítimas em 50% deles (WHO, 2014). Considera-se isso um ponto positivo no combate à violência mundial. Esse relatório também destaca a importância da avaliação constante dos dados, a partir da alimentação dos sistemas de informação por cada país, e do compartilhamento e integração com outros programas de saúde, planejamento e execução de ações de prevenção, fazendo cumprir as leis e o incentivo à pesquisa na área. Faz referência ao incentivo à pesquisa e ao atendimento de qualidade em relação à violência, porém não prevê a abordagem dessas temáticas durante a formação dos profissionais que atuarão nessa área (WHO, 2014).
Dada a importância da notificação, Grabin et al. (2015) concluem que a notificação é importante para a relação da saúde com o sistema legal.
Torna-se imprescindível, portanto, que alunos dos cursos da saúde tenham conhecimentos sobre a importância do preenchimento correto da ficha de notificação de violência e saibam preenchê-la adequadamente para a condução adequada do caso, o que poderá proporcionar à vítima uma nova expectativa de vida, livre de sofrimento.
Os resultados apontaram que as dificuldades de preenchimento foram semelhantes quando se comparam os anos do curso. Daí a necessidade de o professor inserir em suas aulas os elementos que caracterizam as rotinas e os desafios do cotidiano da Enfermagem, desde os primeiros anos do curso.
CONCLUSÃO
Concluiu-se que a ação educativa realizada favoreceu o conhecimento e o preenchimento correto da ficha de notificação de violência interpessoal/autoprovocada, do SINAN, e permitiu identificar como os graduandos fizeram esse preenchimento. Desse modo, tal ação contribuiu para que o graduando e futuro profissional de saúde, especificamente o enfermeiro, esteja sensibilizado para a importância da ficha de notificação, que permitirá traçar o perfil epidemiológico e elaborar o planejamento de ações. Essas fichas são ferramentas de trabalho desse profissional, e seu preenchimento adequado fortalecerá ainda mais as suas ações.
Neste estudo, vale ressaltar que, embora o tamanho amostral de estudantes por série e o tipo de amostragem intencional dificultem a generalização dos resultados para uma população maior, os blocos de informação da ficha de violência interpessoal e autoprovocada, do SINAN, e seus respectivos campos possibilitaram a compreensão das dificuldades dos estudantes no preenchimento da ficha e podem auxiliar pontos que devem ser trabalhados com graduandos de enfermagem e de outros cursos da área da saúde. Assim, sugerem-se novos e ampliados estudos desta natureza.