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Regae: Revista de Gestão e Avaliação Educacional

versión On-line ISSN 2318-1338

Regae: Rev. Gest. Aval. Educ. vol.12 no.21 Santa Maria  2023  Epub 08-Abr-2024

https://doi.org/10.5902/2318133874398 

Artigo

ESTÁGIO SUPERVISIONADO EM GESTÃO ESCOLAR NO CENTRO PEDAGÓGICO DA UFMG: DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA COLÉGIOS DE APLICAÇÃO

SUPERVISED INTERNSHIP IN SCHOOL MANAGEMENT AT THE UFMG PEDAGOGICAL CENTER: CHALLENGES AND PERSPECTIVES FOR LABORATORY SCHOOLS

¹Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: luizasch@ufmg.br.

²Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: marcossala@geo.igc.ufmg.br.


Resumo

O Centro Pedagógico da Universidade Federal de Minas Gerais - CP/UFMG -, no contexto de Colégio de Aplicação, se posiciona como campo de observação, sistematização, análise, elaboração e implantação de itinerários formativos de diversos profissionais da educação. Dentre eles, destacamos os gestores escolares que atuam no âmbito pedagógico e administrativo, eixo necessário às práticas docentes contemporâneas. O objetivo central deste trabalho é apresentar o estágio supervisionado em Gestão Escolar no CP/UFMG como forma de fomentar, tanto nos gestores-orientadores, quanto nos estagiários, uma análise crítico-reflexiva da estrutura organizacional da escola. Nesse sentido, elencamos, descrevemos e analisamos as atividades teórico-práticas vivenciadas pelos estagiários no CP/UFMG voltadas para a gestão administrativa e pedagógica do espaço escolar. Partindo dessa premissa, introduzimos aos estagiários reflexões e experiências que demonstram o exercício democrático da gestão colaborativa e as responsabilidades advindas da democratização das instâncias colegiadas; os desafios e as possibilidades da reconstrução conjunta do projeto político-pedagógico e do regimento interno com a comunidade escolar; a importância da parceria entre diretor e vice-diretor como interlocutores e agentes de transformação no diálogo com as instâncias colegiadas e a comunidade escolar de forma ampla. Como conclusões do percurso experimentado como orientadores e supervisores de estagiários em gestão escolar, destacamos as possibilidades de analisar sob novas lentes e perspectivas a realidade do trabalho que a direção de um colégio de aplicação enfrenta no desempenho de sua função profissional.

Palavras-chave: gestão escolar; colégio de aplicação; estágio curricular supervisionado

Abstract

The Pedagogical Center of the Federal University of Minas Gerais - CP/UFMG -, in the context of Laboratory School, stands as a field of observation, systematization, analysis, elaboration and implementation of training itineraries of several education professionals. Among them, we highlight the school managers who work in the pedagogical-administrative scope, a very necessary axis for contemporary teaching practices. The central objective of this work is to present the supervised internship in School Management at the CP/UFMG as a way to encourage both in supervisor-managers and interns-graduates a critical-reflexive analysis of the school's organizational structure. In this sense, we list, describe and analyze the theoretical-practical activities experienced by the interns at the CP/UFMG focused on the administrative-pedagogical management of the school space, taking into account the differentiated context of the institution's directive autonomy as CAP. Based on this premise, we introduce the interns to reflections and experiences that demonstrate the democratic exercise of collaborative management and the responsibilities arising from the democratization of collegiate bodies; the challenges and possibilities of the joint reconstruction of the Political-Pedagogical Project and the Internal Regulation with the school community; the importance of the partnership between principal and deputy principal as interlocutors and agents of transformation in the dialogue with collegiate bodies and the school community in general. As conclusions of the journey experienced as advisors-supervisors of interns in School Management, we highlight the possibilities of analyzing under new lenses and perspectives the reality of the work that the Board of an application school faces in the performance of its professional function.

Key-words: school management; laboratory school; supervised curricular internship

Introdução

Centro Pedagógico da Universidade Federal de Minas Gerais - CP/UFMG -, teve sua origem no Ginásio de Aplicação, fundado em 1954 para cumprir o decreto n. 9.053/1946, que determinava às faculdades de Filosofia federais a obrigatoriedade de manterem uma escola destinada à prática docente dos alunos matriculados no curso de didática. O termo Ginásio foi substituído por Colégio de Aplicação em 1958 e, com a reestruturação da UFMG em 1968, o Colégio foi transformado em Centro Pedagógico, integrado à Faculdade de Educação. Em 1972 o CP/UFMG recebeu um prédio próprio no campus Pampulha e, desde 1993, os estudantes passaram a ser admitidos por sorteio, visando a impedir mecanismos de seletividade que pudessem favorecer a quaisquer grupos sociais.

O CP/UFMG teve aprovada a sua desvinculação da Faculdade de Educação no ano de 2000, o que possibilitou sua autonomia administrativa, com a missão de continuar sendo campo de estágio, de formação, de pesquisa e de inovação educacional. O Centro Pedagógico da UFMG passou a integrar, junto com o Colégio Técnico - Coltec - e o Teatro Universitário, a Escola de Educação Básica e Profissional - Ebap - da UFMG, conforme a resolução n. 5/2007 da UFMG.

O tempo integral foi implantado no CP/UFMG em 2011 e, desde então, seguem sendo finalidades e objetivos da escola ministrar o Ensino Fundamental, estruturado em três ciclos de formação humana, que funcionam em período integral, de sete horas diárias, tendo-o como base investigativa para produção de conhecimento, de ensino, de pesquisa e de extensão; constituir-se como campo de reflexão e investigação sobre a prática pedagógica e sua inovação, isto é, continuar sendo espaço de novas experimentações educacionais, gerando projetos de ensino, pesquisa e extensão que subsidiem avanços e reflexões sobre a prática educativa; ser um campo de experimentação, aplicação e qualificação para a formação de professores e outros profissionais que tenham o espaço escolar como campo de trabalho e de pesquisa.

Nesse cenário, o CP/UFMG, enquanto Colégio de Aplicação - CAp -, possui um setor denominado Formação Docente e Profissional, cuja principal função é atender a essas demandas, sendo também procurado por estudantes que necessitam realizar estágio supervisionado em gestão escolar. Cabe destacar que existem diversos modelos de gestão escolar ao redor do mundo. Em se tratando de colégio de aplicação, a gestão é feita por docentes, muitos dos quais não receberam formação, treinamento ou preparo prévio para exercer esta atividade, portanto, realizar ações de orientação e supervisão em gestão escolar nos colégios de aplicação, cujos interessados geralmente pertencem ao curso de Pedagogia e outras licenciaturas, constituem-se como desafios adicionais, pois é necessário promover experiências e discussões que possam contribuir para que as observações, discussões e debates possíveis de serem feitos num colégio de aplicação possam serem relevantes aos estudantes em sua formação.

Os colégios de aplicação com isso, têm uma responsabilidade quase que exclusiva de oferecer estágios de gestão em escolas que, por definição, são campos de experimentação para a formação de professores. Nesse ponto, marcamos o paradoxo em oferecer estágio de gestão num colégio de aplicação, sendo que muito provavelmente a experiência profissional do estagiário não acontecerá num colégio de aplicação. Como fazer da experiência dos estagiários em gestão escolar suficientemente relevante para o vindouro trabalho desses estudantes em formação? É possível formar futuros líderes ou gestores? De que maneira? São as indagações sobre as quais nos debruçamos ao longo deste artigo.

Metodologia e resultados: analisar a organização pedagógica e administrativa de uma escola, uma parceria entre estagiário e gestor

Em linhas gerais, partimos do pressuposto que a cultura organizacional se refere às necessidades humanas da instituição que, em conjunto, estabelece, defende e forma valores, comportamentos, hábitos e pontos de vista em comum no ambiente escolar, preestabelecidos em coerência com as missões e valores institucionais, sendo estes a base que garante a autonomia de funcionamento e a dinâmica específica para atender às necessidades de cada instituição escolar. Já o clima organizacional é a percepção de cultura que pode ser mensurada em documentos e pesquisas, abordando, tanto aspectos emocionais, quanto técnicos que levam à efetivação das missões, finalidades e objetivos institucionais.

A metodologia dessa pesquisa pautou-se na observação participante, respaldada pedagogicamente no sócio-interacionismo de Vygotsky, uma vez que a complexidade do tema demanda uma perspectiva que enfatize a interrelação entre as dimensões afetivas, relacionais e sociais da atuação do docente-gestor, bem como sua ressignificação diante do conjunto de crenças e valores que orientam a ação do sujeito e sua formação inicial e continuada. Segundo Marietto (2018), a observação participante é um método qualitativo com raízes na pesquisa etnográfica, pelo qual o pesquisador “emprega múltiplas e sobrepostas estratégias de coleta de dados a serem totalmente engajadas em experimentar (sentir ou vivenciar) o arranjo contextual (a participação)”, e, ao mesmo tempo, “observa e conversa com outros participantes sobre o que está acontecendo” (p. 5). O termo foi usado pela primeira vez na década de 1920 pelo antropólogo social Malinowski e a abordagem foi, posteriormente, desenvolvida por Howard Becker nos anos 1950:

Essa abordagem permite ao pesquisador (fieldworker) utilizar o contexto sociocultural do ambiente observado (os conhecimentos socialmente adquiridos e compartilhados disponíveis para os participantes ou membros deste ambiente) para explicar os padrões observados de atividade humana. Ou seja, consiste na inserção do pesquisador no interior do grupo observado, tornando-se parte dele, interagindo por longos períodos com os sujeitos, buscando partilhar o seu cotidiano para sentir o que significa estar naquela situação. (Marietto, 2018, p. 5)

Vygotsky (2004) nos diz que educar significa organizar a vida: sendo justa a organização da vida, as pessoas têm a possibilidade de crescerem justas. Este projeto se pautou pela proposição de que os docentes-gestores e os estagiários em gestão escolar, mediante interlocução estabelecida com seus pares, pudessem vir a desenvolver competências relacionais e éticas que propiciassem seu maior envolvimento no seu processo de formação profissional e na participação junto à comunidade escolar e aos grupos sociais em que se inserem. Além disso, o trabalho exigiu a compreensão da temática abordada a partir da auto-observação dos próprios gestores-supervisores. Para tanto, a participação efetiva também dos estagiários de gestão na organização dos tempos/espaços dialógicos no contexto educativo é crucial. Nessa organização, as etapas do processo foram as seguintes:

definição de tempo e espaço de reflexão e diálogo entre os supervisores-gestores e os estagiários-supervisionados, de modo a se formarem grupos focais que possibilitam a escuta, a discussão de textos e dados, e o registro das falas dos participantes o cotidiano administrativo-pedagógico da instituição escolar. nesse momento, a ideia é que o próprio grupo estabelecesse questões que gostariam de discutir e investigar, a partir do plano de trabalho da disciplina de gestão escolar;

interlocução com os estudantes sobre os documentos norteadores do cotidiano da prática escolar: plano de desenvolvimento institucional em fase de construção pelo coletivo escolar; manual de competências em fase de revisão nas instâncias colegiadas no CP/UFMG; regimento interno em fase de aprovação nas instâncias externas ao - CP/UFMG -, bem como a implantação diária do projeto político-pedagógico, que já se encontra validado nas instâncias internas do CP/UFMG;

Discussão dos dados obtidos no processo de pesquisa, bem como das possibilidades de melhorias no processo de gestão administrativa e pedagógica do CP/UFMG, avaliando a possibilidade de estender o diálogo sobre gestão escolar com outros Colégios de Aplicação;

Divulgação dos resultados obtidos mediante apresentação de trabalhos em congressos e escrita artigos científicos pelos pesquisadores-gestores-supervisores. Em razão do propósito de constituição de sujeitos com maior autonomia e participação efetiva, todas as etapas acima propostas estavam sujeitas a mudanças com base no que for deliberado pelos participantes.

Esse percurso metodológico objetivou contribuir para a discussão e a ressignificação do papel do docente-gestor nas escolas, tendo em vista uma formação humana mais crítica e cidadã tanto no âmbito pedagógico quanto no administrativo. Por isso, a orientação realizada com os estudantes participantes tem sido realizada semanalmente, de modo que sua atuação acontecesse em constante interação reflexiva. Nessas reuniões, além da orientação e planejamento do trabalho, estudamos textos afins ao campo do conhecimento e que contribuem para a formação dos estudantes bem como para o aprimoramento e avaliação do trabalho em curso.

Avaliamos que o gestor, mesmo assumindo funções e formações específicas, tem em seu trabalho características genuinamente interativas, estando a serviço das pessoas e da organização institucional. A gestão pedagógica e administrativa é apenas um dos fatores que determina o fluxo escolar, visando a garantir o funcionamento da organização educativa como um todo. Busca-se a valorização de uma prática de gestão pedagógica e administrativa que seja significativa para a sociedade, apresentando-se efetivamente como um diferencial na resolução dos problemas enfrentados pela comunidade escolar como um todo.

A gestão escolar, ao assumir que a escola é esse espaço de aprendizagem, compreende também que nem sempre onde há diversidade e democracia, há entendimento e autogerenciamento dos conflitos. Todos os sujeitos participantes da comunidade escolar possuem direitos e deveres de aprendizagem, em constante desenvolvimento, que devem ser favorecidos e colocados em condições para que reflitam e interajam como interlocutores colaborativos para o bom andamento da implantação dos planejamentos da gestão, que é apenas um dos fatores que determina o fluxo e o funcionamento da organização escolar.

Uma das mais importantes atribuições hoje do docente-gestor é gerir educativa e pedagogicamente o espaço escolar, desencadeando práticas administrativas eficazes e consoantes com a missão escolar, buscando assegurar uma sólida socialização no ambiente educacional e uma melhor aprendizagem da competência do diálogo colaborativo em prol do clima escolar. De acordo como Libâneo (2004), “uma escola bem-organizada e bem gerida é aquela que cria condições pedagógico didáticas, organizacionais e operacionais que propiciam o bom desempenho dos professores em sala de aula, de modo que todos os seus alunos sejam bem-sucedidos na aprendizagem escolar” (p. 10).

O docente-gestor na educação básica e a formação de professores-gestores: a gestão como uma competência a ser adquirida

A Base Nacional Comum Curricular - BNCC - indica “que as decisões pedagógicas devem estar orientadas para o desenvolvimento de competências” (Brasil, 2017, p.13), que explicitadas, oferecem “referências para o fortalecimento de ações que assegurem as aprendizagens essenciais” (Brasil, 2017, p.13) no ambiente escolar. O conceito de competência segundo o documento, se refere à “mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho” (Brasil, 2017, p.8). Tendo isso em perspectiva, a BNCC estrutura-se em dez competências gerais que interligam todas as habilidades a serem desenvolvidas pelas áreas de conhecimento distribuídas ao longo de todos os anos da educação básica que versam sobre os seguintes temas gerais: conhecimento; pensamento científico, crítico e criativo; repertório cultural; comunicação; cultura digital; trabalho e projeto de vida; argumentação; autoconhecimento e autocuidado; empatia e cooperação e responsabilidade e cidadania.

Essas competências, para serem de fato apreendidas pelos estudantes, deveriam nortear a prática diária de todos os sujeitos no ambiente educacional, de forma a criar um clima escolar democrático, em que todos valorizem e contribuam para a qualificação e efetivação do processo de ensino e aprendizagem do corpo discente. No entanto, a complexidade do desenvolvimento dessas competências começa na dificuldade do termo em si ser apreendido e colocado em funcionamento, empiricamente. Segundo Macedo (2018) em entrevista a Perez (2018), o termo competência “trata-se de uma abstração a ser traduzida em práticas que resolvem problemas, tomam decisões, levando em conta o contexto, a capacidade das pessoas, as metas e os objetivos que buscam alcançar nas circunstâncias do mundo atual” (p. 90). Dessa maneira, adquirir uma competência implica imbuir-se de capacidades e habilidades, que no caso deste texto seriam àqueles referentes à gestão escolar, e aplicá-las quando necessário. Ou seja, possuir competência, nesse contexto, significa

enfrentar situações e tarefas muitas vezes desconhecidas ou novas, agrupar de maneira diferenciada e integrada habilidades, atitudes, conceitos, valores, pessoas, prazos, planejamentos, riscos a correr. Sua resultante é o desenvolvimento da autonomia, da autogestão no sentido de autodependência, ou seja, cada um depende de si, conta consigo mesmo, mas, ao mesmo tempo, em um contexto coletivo, interdependente, que inclui ações individuais e coletivas. (Macedo in Perez, 2018, p. 90)

No contexto da BNCC, baseando-se nos parâmetros que esse documento norteador aponta para os sujeitos responsáveis por empreender a gestão escolar, Macedo (2018) destaca também que “as competências são pessoais, mas um ‘pessoal’ inserido em um contexto coletivo, com projetos, prazos, tomadas de decisão e uma vida para ganhar ou manter sentido” (Macedo in Perez, 2018, p. 90). Nesse panorama, faz-se necessário distinguir o relacionamento entre docentes, discentes, técnicos e familiares e a resolução de conflitos no ambiente da escola visando contribuir para a valorização do gestor no enfrentamento dos problemas, conflitos e impasses do cotidiano escolar:

Existe uma situação, que penso pouco conversada, no tópico de competências. Porque uma coisa é desenvolver competências e aprender habilidades necessárias à sua manifestação; outra é a expressão das competências em um contexto tão complexo como a instituição escolar. Uma visão simplificada é que alunos desenvolvam competências e que professores e gestores as expressem bem nos diferentes desafios que encontram para ensinar e gerir. Espera-se, assim, que tenham habilidades aprendidas e competências desenvolvidas o suficiente para enfrentar com sucesso as demandas a que devem responder na escola. A realidade, porém, mostra que professores e gestores também precisam se formar continuamente e desenvolver competências e habilidades para responder a problemas novos. Uma resposta conhecida nem sempre dá conta de um problema novo, sobretudo na sociedade atual. Daí a importância da formação continuada de professores e gestores, da valorização de seu trabalho em todos os sentidos. (Macedo in Perez, 2018, p. 90)

Cabe destacar que a gestão pedagógica e administrativa de um colégio de aplicação é diferente da gestão das outras escolas públicas e mais ainda das escolas privadas, pois além das dificuldades normais de uma gestão, o colégio de aplicação, enquanto uma escola pública inserida no âmbito universitário, enfrenta desafios específicos como, por exemplo, no diálogo com sua comunidade escolar. A própria estrutura organizacional do CP/UFMG demonstra uma particularidade de autonomia de gestão colegiada e democrática não existente em outras instituições, sejam elas públicas ou privadas. Quando se pensa a integração dos saberes e fazeres pedagógicos de um colégio de aplicação e sua importância enquanto campo de estágio supervisionado também na área de formação docente no âmbito da gestão escolar, vem à tona um interrogante: o que é um docente-gestor e qual é o seu papel na educação básica ofertada por uma universidade?

A gestão do CP/UFMG está organizada em instâncias administrativas e pedagógicas, setores técnicos e núcleos de ensino que, por sua vez, possuem competências e atribuições específicas, coordenação ou chefia com equipes próprias, horários de funcionamento, de trabalho e de reuniões diferenciadas. A direção, nesse organograma, é responsável por organizar, planejar, orientar e dinamizar todo o trabalho escolar das instâncias colegiadas, núcleos e setores, fornecendo orientações e diretrizes de trabalho, buscando otimizar as funções e tarefas a fim de solucionar conjuntamente os problemas intrínsecos ao funcionamento de qualquer instituição. Por isso, vemos que, embora tenha organicidade própria, a gestão escolar de um colégio de aplicação contribui para a ampliação do olhar sobre as múltiplas possibilidades de resolução de problemas que podem nortear a formação e a prática dos estagiários aqui supervisionados, orientando-os de forma a que adquiram a competência de saberem adequar e aplicar os conhecimentos aqui aprendidos a outras realidades educacionais.

Cabe refletir “sobre as condições que os gestores escolares precisam gerar para criar na escola um ambiente institucional e práticas que contribuam para que crianças e jovens se estabeleçam como sujeitos centrais e ativos em seu processo de desenvolvimento e aprendizagem” (Perez, 2018, p. 8), uma vez que as ações para assegurar a efetivação dos direitos educacionais dos estudantes desencadeiam “uma série de processos nas diferentes instâncias educativas que devem convergir para esse mesmo fim” (p. 8). Todos devem apreender esse saber diariamente na vivência de suas funções, atribuições, metas e objetivos. As competências são, então, ao mesmo tempo, apreendidas e ensinadas.

Assim, imbuída dessa missão, a gestão pedagógica e administrativa se mostra de suma importância no ambiente escolar, pois define diretrizes de mão dupla para o desenvolvimento das relações entre corpo docente, técnico e discente, favorecendo o diálogo entre partes e gerenciando o funcionamento dos vários setores da escola de modo que todos adquiram e reformulem conhecimentos, saberes e competências diante de cada novo desafio que vier a aparecer. Nesse sentido, a gestão se põe a serviço da comunidade escolar, coordenando a ação coletiva do trabalho desenvolvido pelo corpo docente e pelos demais funcionários da escola, proporcionando tanto apoio administrativo e logístico quanto didático e pedagógico. Os momentos de reunião são, nesse cenário de gestão colegiada, concebidos como trocas de conhecimento em prol de uma gestão mais humanizada e como o planejamento conjunto de práticas para colocar as intencionalidades educativas em funcionamento.

Refletir sobre o papel do professor enquanto gestor escolar passa, dessa maneira, por compreender que “o fenômeno educativo é gerido e gestado por todos os profissionais da educação, que se encontram trabalhando em uma unidade educacional” (Rangel, 2009, p. 26). O docente-gestor precisa aprender a lidar com a estrutura organizacional da escola, promovendo um clima institucional que favoreça o relacionamento interpessoal, a cooperação de todos os sujeitos envolvidos na comunidade escolar, sem perder de vista a função social da escola e a resposta prática à cultura organizacional que, em linhas basilares, norteiam e orientam a missão institucional. Conforme Ferreira (2009),

gestão significa tomar decisões, organizar, dirigir as políticas educacionais que se desenvolvem na escola comprometidas com a formação da cidadania [...] é um compromisso de quem toma decisões - a gestão -, de quem tem consciência do coletivo - democrática -, de quem tem responsabilidade de formar seres humanos por meio da educação. (p. 241)

Isso só ocorre mediante a aprendizagem constante, sistemática e sempre renovada de habilidades e competências que visem a consolidação do plano de desenvolvimento institucional, do regimento interno, do manual de competências e a implantação diária do projeto político-pedagógico. Esses documentos não são e nem devem ser só proforma, para atender necessidades legais e burocráticas. São normativas vivas e operantes no funcionamento orgânico da instituição escolar. E contribuem ativamente para a construção e consolidação de uma cultura e um clima organizacional coerente e coeso. Por isso, na nossa experiência enquanto gestores, retomamos a tarefa das gestões anteriores de reformulação desses documentos, através de comissões consultivas formadas por diversos membros da comunidade escolar - docentes e técnico-administrativos em educação do CP/UFMG, familiares de discentes bem como representantes da universidade -, colocamos em debate e em aprovação nas instâncias deliberativas da instituição.

Concordamos quando Perez (2018) afirma que “o projeto político-pedagógico (PPP) não é um documento de gaveta”, além de nortear, mapear e remeter “à identidade da escola, seus valores, culturas, condições, realidade socioeconômica e ambiental e se refletir na atmosfera escolar” (p. 17), deve pressupor sua posta em prática diária, já que “a escola é um espaço vivo! Os documentos que interferem em seu funcionamento (currículo, PPP e outros) devem contemplar o presente e olhar para o futuro” (p. 17), sendo suas concepções e princípios efetivados no cotidiano. E quando a realidade e a dinâmica desse dia-a-dia se mostra distante do expresso nos documentos, cabe reavaliar, tanto as práticas pedagógicas, quanto às novas demandas que passaram a norteá-las, buscando, enquanto gestão, a justa medida entre teoria e prática. Em outras palavras,

a dupla composta por diretor e coordenador pedagógico, que aqui vamos chamar de dupla gestora, em cooperação, promove a dinâmica de trabalho na escola, gera oportunidades para que as melhores práticas sejam exercidas e atua como guardiã das ações que visam às aprendizagens e ao desenvolvimento de todas as crianças e jovens participantes da comunidade escolar. (Perez, 2018, p. 59)

A partir de agora, vamos analisar os desafios de nossa atuação enquanto docentes-gestores de um colégio de aplicação, com cultura e o clima organizacional diferenciado, tendo em vista a metodologia de observação participante. Ademais, esboçamos as perspectivas dessa atuação, notadamente no que se refere ao envolvimento do gestor em prol do planejamento escolar e institucional como um todo.

Análise dos dados: o professor-gestor-observador em formação inicial e continuada, uma parceria entre orientador e orientandos

Nas supervisões de estágio realizadas foi possível, junto com os profissionais em formação, refletir sobre qual é o papel dos gestores de uma escola e como os docentes-gestores poderiam atuar de modo a situar os estudantes como sujeitos centrais e ativos no desenvolvimento de competências como definido na BNCC. Parece-nos que, para constituir uma cultura escolar de colaboração democrática e pertencimento ativo, todos os integrantes da comunidade devem ser incluídos no processo de reconstrução diária do clima organizacional mais produtivo possível para garantir um ambiente igualmente colaborativo e formativo.

Por estarmos consoantes com as ideias de que os exemplos mobilizam, tal como defende Perez (2018), quando destaca que “há uma correlação direta entre o que somos e como agimos e entre nossa atuação e o modo de ser e de agir de nossas crianças e jovens” (p. 61), no sentido de que se queremos que todos os estudantes desenvolvam competências de valorização do saber, motivação para aprender e interação voltada para exercício democrático, respeito dos direitos e cumprimentos dos deveres, ao longo do seu processo de escolarização, igualmente, “nós, educadores, precisamos colocá-las em prática no dia a dia. Valores e atitudes são aprendidos se vivenciados de maneira contínua e coerente” (p. 61). Assim, em vários momentos da sua estada na escola, convidamos os estagiários para estar frente a frente com diversas questões intrínsecas ao processo de gerir, em conjunto com instâncias colegiadas, uma escola.

Voltando aos possíveis impactos da ação conjunta da dupla gestora na realidade da instituição escolar, percebemos em nossa prática que, para além das tarefas de logística - administrativas e financeiras -, e de gestão de recursos humanos - técnicos e pedagógicos -, a otimização dos tempos e espaços, bem como a mediação da comunicação entre pares, são atividades frequentes e demandadas para a gestão. Muitos são os conflitos gerados devido à falta de um bom clima no ambiente de trabalho. Todavia, ao direcionar o crescimento da gestão no âmbito escolar e social, faz-se necessária a intervenção do reconhecimento das leis e do projeto político-pedagógico, para atender às mudanças, enfatizando o conhecimento docente, adaptado ao contexto social, com competência e proatividade. A todo instante o docente-gestor se depara com o desafio de refletir e solucionar conflitos, problemas de comunicação, conciliação de diferenças que, à primeira vista, podem parecer irremediáveis e, que por vezes, podem tornar inoperantes a realização profícua de tarefas importantes.

Na gestão da escola pública federal, é de suma importância o papel do docente enquanto gestor escolar na resolução de conflitos. Sugere-se mais atenção à gestão aos conflitos no que se refere à gestão da escola pública, pois os conflitos educacionais, sociais e familiares tomam uma dimensão muito maior num ambiente em que a diversidade é mais acentuada. Além disso, a função da escola atualmente vai além de ensinar. Segundo Paro (2001),

é preciso que se coloque no centro das discussões (e das práticas) a função educativa e global da escola. Assim, se entendemos que a educação é atualização histórico-cultural dos indivíduos e se estamos comprometidos com a superação do estado geral de injustiça social que, em lugar do bem viver, reserva para a maioria o trabalho alienado, então é preciso que nossa escola concorra para a formação de cidadãos atualizados, capazes de participar politicamente, usufruindo daquilo que o homem histórico produziu, mas ao mesmo tempo dando sua contribuição criadora e transformando a sociedade. (p. 25)

Muitas dessas questões demandam “o posicionamento e a atitude da dupla gestora na promoção de um clima institucional marcado pelo respeito, pela valorização da diversidade, da autonomia e da confiança na aprendizagem de todos” (Perez, 2018, p. 73). Ou seja, têm o desafio de criar soluções para problemas cada vez mais ímpares e diversos, precisando reinventar-se para conseguir criar condições nas quais consigam em parceria com a comunidade escolar traçar rotas para caminho educacional, com a premissa de que “o cuidado, o respeito, a empatia e a confiança na capacidade do outro - para citar apenas alguns princípios - devem estar presentes nas relações entre todos os atores” (Perez, 2018, p. 73).

Sobre as concepções e as práticas de gestão culturalmente arraigadas nas escolas de modo geral, é perceptível o quanto a administração escolar, mesmo em ambiente universitário, recebeu ampla influência de modelos tais como o taylorismo e do fordismo, pela racionalização, rotinização e parcelamento do trabalho para otimizar a produção, estabelecendo uma cisão, muitas vezes contraproducente, entre quem pensa e quem faz. Buscou-se garantir melhor precisão e controle em todas as fases, otimizando os processos, porém, perdeu-se, nessa concepção, a perspectiva de autonomia e diálogo com a comunidade escolar. Ou seja, resvala numa atuação desligada do contexto social, com práticas vazias de conteúdo, sendo essas: repletas de alienação e de rotinização, sem construção de sentido pedagógico-educativo do trabalho, pautadas em registros e controles burocráticos, que impactam negativamente, cerceando a autonomia de autogestão do professor e culminam numa legislação esvaziada de aplicação prática, um planejamento feito de forma externa, no qual o docente se torna meramente um executor e não propriamente um gestor de sua sala de aula.

No funcionalismo estrutural, as organizações funcionariam como um sistema desprovido de erros provenientes do fator humano, que tenderiam automaticamente ao equilíbrio e ao consenso, impondo ao indivíduo o remodelamento do seu comportamento para se adequar ao grupo. Dessa maneira, o sujeito teria as tendências ou seu viés político silenciado, o seu ciclo biológico de funcionamento laboral se ancoraria na produtividade, no prestígio e na autorrealização, fazendo dessa com que o conflito se tornasse meramente uma questão de reajuste individual. No entanto, esse indivíduo, que se situa em constante busca pelo equilíbrio e pela despolitização dos seus processos de tomada de decisão, acaba fragilizado pelas imprevisibilidades inerentes a todo e qualquer processo de gestão. Ao negar o imprevisto e enfatizar a possibilidade de controle absoluto, os conflitos são convertidos em questões técnicas de falhas não solucionáveis, que demandariam ainda mais coesão normativa e coercitiva, com ênfase na centralidade burocrática na eterna busca por uma suposta neutralidade, que acaba por ser frustante, por ser sempre inalcançável.

As avaliações externas são bem importantes, embora haja uma falta de informação das escolas quanto ao bom uso desses indicadores como formas de aprimorar o processo de ensino e aprendizagem. Os problemas gerados pelo reducionismo dessas avaliações aos números sem contextualização e reflexão crítica e embasada cientificamente, acaba por rotular o processo educacional em termos de mérito e demérito, com foco no treinamento dos alunos para a realização dessas avaliações, gerando modos de burlar o processo para buscar a aceitação do mercado: apenas os melhores alunos fazem a prova, estreitamento do currículo que passa a ser subordinado às provas (e não o contrário), escolarização reducionista com projetos direcionados apenas aos conteúdos instrumentais das disciplinas de português e matemática, por exemplo. Assim, a política de medir eficiência dos sistemas via provas não garante melhorias, causando, não sem motivo, certa resistência do corpo docente e discente quanto às avaliações externas.

Em todos esses cenários diretivos descritos anteriormente, as políticas e os indicadores de larga escala acarretam impactos e desafios para toda e qualquer Gestão Escolar. No entanto, as ações dos professores diante dos dados estão diretamente relacionadas à mediação da dupla gestora, que pode impactar negativa ou positivamente na construção e na avaliação das competências adquiridas. Quando o diretor e o vice se assumem como corresponsáveis pelos resultados e dividem as pressões da política de responsabilização, o trabalho coletivo avança. Advém daí a importância da adesão prática e cotidianamente reflexiva do projeto político-pedagógico e a cultura institucional norteada por ele. A falta de direcionamento e coesão no clima institucional face à implantação diária do PPP geram fatores como: pouco comprometimento com os resultados; alta taxa de rotatividade do corpo docente, técnico e discente que gera uma equipe sempre inexperiente; ausência de líderes proativos, culminando numa liderança frágil ou deslegitimada e em escolas altamente instáveis no seu funcionamento institucional. Isso acontece muito em regiões geográficas bastante segregadas e sem coesão entre a comunidade escolar.

A nosso ver, os fatores que podem contribuir para a adesão ao trabalho coletivo que visa a garantia de funcionamento institucional incidem na existência de um corpo docente e técnico comprometido com a melhoria das relações institucionais de forma micro e com a educação, de forma macro; a colaboração de todos os sujeitos da comunidade escolar para garantir um clima institucional estável; o entendimento de que os indicadores não são sinônimos de qualidade, mas podem ser usados como referência nas práticas de aprimoramento e inovação do ensino. Os resultados das avaliações internas e externas podem ser usados com uma finalidade pedagógica, dando um raio-x do momento atual do aluno, sujeito sempre em processo de aprendizagem, em contínua formação cognitiva, afetiva, física e humana.

Para isso, é necessário também um cenário de equilíbrio, não só social - dos recursos humanos, propriamente ditos -, mas também financeiro. Na pandemia (2020-2021) e na pós-pandemia (2022), as demandas de saúde mental foram agravadas pelas demandas de recursos materiais. Um cenário que exigiu dos gestores mais do que planejando em como seriam usados os recursos de uma forma sustentável, demandou busca de soluções em um cenário empobrecido de financiamento público, com enfraquecimento das instituições políticas e em plena crise econômica mundial. O planejamento, essencial também para pensar em possíveis despesas e gastos periódicos, e além disso, estipulando uma reserva de emergência, foi colocado em desafios muito maiores do que os anteriormente vivenciados até então.

Em nossa gestão no CP/UFMG, avaliamos que vivemos o paradoxo da gestão escolar democrática: centralização versus descentralização. Existem muitos desafios para a construção da gestão participativa. É preciso estabelecer os pilares da gestão democrática de uma escola, entendendo a democracia como de fato uma construção coletiva realizada pela comunidade escolar. Os valores - ética, equidade, solidariedade, compromisso, empatia, coletivo atuante, maturidade social, autonomia e autogestão das instâncias colegiadas em conjunção com o projeto maior de escola - foram desafiados e postos em perspectiva a todo instante. Mais do que nunca, a gestão escolar, no biênio 2021-2022, tendo em vista os complexos desafios do contexto pós-pandemia, objetivou desenvolver o sujeito em seu direito de formação humana e cidadã, com destaque para as demandas de saúde mental e o do espírito da coletividade na escola, contemplando as dimensões de participação política, pedagógica e técnica de forma indissociáveis.

Ficou evidenciada a importância dos órgãos colegiados que auxiliam nas decisões e inclui a participação dos pais, professores e funcionários, integrando dessa maneira a escola e a comunidade. Isso porque, percebemos que não se pode implantar esse processo democrático de participação apenas parcialmente. A descentralização é um dos pilares da gestão democrática, para garantia da transparência dos processos, favorecendo os municípios e tendo a democracia como um pilar. Na gestão descentralizada o poder é distribuído de forma compartilhada com colaboração dos estados, distrito federal e município, tendo a união como uma assistência técnica e permitindo assim uma maior otimização dos recursos, agilidade, transparência e eficiência. E também, ela busca uma capacidade organizacional para a construção de um projeto educacional, por meio da gestão compartilhada e fazendo uma gestão direta dos recursos.

É preciso entender que a gestão democrática pressupõe progressivos graus de autonomia que lidam com o paradoxo de descentralização que não significa apenas redistribuir responsabilidades, mas sim repensar a estrutura macro e o funcionamento micro dos sistemas de organização do trabalho na escola. A autonomia é inerente à gestão democrática e apresenta importantes mecanismos para garantir isso, sendo eles: a eleição de diretores, a formação de órgãos colegiados e a descentralização dos recursos financeiros. A mesma também demanda para sua autonomia na gestão a confiança recíproca, o amadurecimento, a transparência e a transcendência dos interesses pessoais.

Assim, a descentralização precisa ser vista sob a ótica emancipatória na educação e buscar consonância na diversidade de sujeitos e na redistribuição do poder, marcada pela bidirecionalidade e pela participação em macro e micro das instâncias. Ademais, a gestão escolar precisa buscar analisar a capacidade organizacional para elaboração de um projeto que ocorre por meio da gestão compartilhada e, mesmo quando realiza a gestão direta dos recursos, promove em todas as instâncias da escola, sejam elas consultivas ou deliberativas, a participação, o espírito de coletividade e a co-responsabilidade organizacional, que necessita de comunicação eficiente e atmosfera favorável ao diálogo face um projeto de escola exequível, que nasce do reconhecimento da realidade da escola, o que se quer mudar e os recursos necessários no momento para implementar essas mudanças.

Sobre a nossa prática enquanto gestores e formadores de futuros gestores de uma escola, refletimos que liderança inclui o reconhecimento do poder contido na função. Para o exercício do poder é preciso confiança, práticas emancipatórias, coerência e condições efetivas de trabalho. A escola precisa se imbuir da tarefa de manter o espírito de equipe elevado em prol da missão educativa, cabendo aos gestores o intento de alargar os horizontes das pessoas que atuam na escola, incentivar a promoção de uma cultura escolar favorável, motivar as pessoas a se envolverem com o projeto educativo, dinamizar a comunicação dialógica, aberta e reflexiva, acompanhar e dar feedbacks sobre os trabalhos realizados. Dessa forma, a gestão escolar, na prática diária, se traduz na tolerância, na valorização e no reconhecimento das diferenças.

As demandas mais evidentes para a gestão do CP/UFMG, em termos de perspectivas futuras, são as mudanças na forma de pensar e projetar o papel da escola, promover formação docente, realizar estudo constante, exaltar a diversidade, compreender e agir de acordo com a noção de que é preciso implementar o projeto de colégio de aplicação reconhecendo as diferenças, buscar a acessibilidade nos espaços e linguagens e por fim comunicar-se e constantemente com os as famílias.

A equipe gestora precisa sempre trabalhar de forma coletiva, nos conselhos da escola, nas reuniões de pais, no reforço e recuperação escolar, no estabelecimento de relações entre escola, família e sociedade, no uso de linguagens na prática didática pedagógica, na inserção de novas tecnologias. O gestor precisa estar em contato com o projeto político-pedagógico, na elaboração, implantação e coordenação do projeto pedagógico, planejando, executando e acompanhando projetos e programas educacionais e avaliando, implantando e encaminhando os resultados das ações pedagógicas. O gestor precisa se atualizar e construir cotidianamente com o coletivo o que está previsto no PPP.

A dimensão financeira do planejamento visa a garantir a sustentabilidade das escolas, fazendo com que o equilíbrio financeiro seja um dos objetivos da escola, pois o mesmo pode proporcionar melhores condições de ensino, a promoção da aprendizagem, necessitando de um planejamento educacional que pense na necessidade de recursos para estabelecer a qualidade de ensino, indo além da manutenção mínima. Há uma necessidade de formar gestores para planejarem e orientarem a prestação de contas, além de promover a descentralização dos recursos através de uma unidade executora, composta por escola ou comunidade.

A utilização destes recursos inclui uma deliberação colegiada sobre as demandas das verbas, pesquisa de preços em compras ou contratação de serviços, pagamentos e prestação de contas, aprovação do colegiado e publicização das contas, buscar planejamento equilibrado e gastos periódicos precisam estar previstos no orçamento, precisa também considerar uma reserva para possíveis imprevistos.

Alguns desafios são o ambiente desfavorável para concentração e atendimentos mais cuidadosos, as demandas exequíveis e algumas que se excedem na burocracia, os prazos para prestação de contas, preenchimento de sistemas ou de captação de recursos, a dificuldade com as tecnologias e o limite de equipamentos e conexão. A interação com o público acontece principalmente pela oralidade. Pontos positivos: fortalece as relações interpessoais e aproxima a gestão da comunidade e dos alunos, fortalece a liderança, torna a mensagem mais clara. Pontos negativos: escapam acordos ou orientações importantes, corre-se o risco de privilegiar um grupo em detrimento de outro, pode levar o distanciamento dos outros membros da equipe gestora, exige mais tempo fora de sala o que dificulta encontrar a liderança. Também é necessário reduzir a burocracia e apoiar quem está realizando boas práticas.

Conclusão

O CP/UFMG se situa no contexto de colégio de aplicação, como campo de observação, sistematização, análise, elaboração e implantação de projetos de formação de gestores escolares no âmbito pedagógico-administrativo, eixo necessário às práticas docentes atuais - que incluem funções administrativas de gestão -, bem como ao cenário abarcado pelo atual currículo das licenciaturas, que situa a gestão escolar como uma das funções de um docente ou pedagogo. Portanto, o objetivo central deste trabalho foi apresentar o estágio supervisionado em Gestão Escolar no CP/UFMG no âmbito da formação inicial dos licenciandos. Essa iniciativa buscou fomentar, tanto nos gestores-orientadores, quanto nos estudantes-estagiários, uma análise reflexiva da estrutura organizacional da escola.

Nesse sentido, elencamos, descrevemos e analisamos as atividades teórico-práticas vivenciadas pelos estagiários no CP/UFMG voltadas para a gestão administrativo-pedagógica do espaço escolar, tendo em conta o contexto diferenciado de autonomia diretiva da instituição enquanto colégio de aplicação. Partindo dessa premissa, introduzimos os estagiários à reflexões e experiências que demonstram o exercício democrático da gestão colaborativa e as responsabilidades advindas da democratização das instâncias colegiadas; os desafios e as possibilidades da elaboração conjunta do projeto político-pedagógico e do regimento interno com a comunidade escolar; a importância da parceria entre diretor e vice-diretor como interlocutores e agentes de transformação no diálogo com as instâncias colegiadas e a comunidade escolar de forma ampla.

O currículo de formação docente está ligado ao modelo de escola e sociedade e também molda a gestão. A formação de professores é um currículo em disputa com influências da BNCC, da formação docente, dos recursos didáticos, das avaliações, do controle e regulação. A formação docente precisa ter um caráter amplo, com consciência crítica da sociedade e uma sólida formação teórica, tanto nos estudos específicos, quanto pedagógicos. Ela precisa ter a pesquisa como potência formativa, realizar uma articulação entre a teoria e a prática, realizando também uma análise dos temas atuais da sociedade e fundamentais para o estabelecimento de uma gestão escolar democrática, inclusiva e que abriga a diversidade.

Os resultados aqui apresentados mostraram que, apesar dos colégios de aplicação, e em especial o Centro Pedagógico da UFMG, funcionarem sob condições muito específicas, as diversas experiências vividas neles podem ser aplicadas a outras realidades, além da proposição e execução de propostas pedagógicas inovadoras poderem se tornar incentivos para que os então estagiários de gestão possam multiplicar essas ações junto às escolas e comunidades onde irão atuar. Como conclusões do percurso experimentado como supervisores de estagiários em Gestão Escolar, destacamos as possibilidades de analisar sob novas lentes e perspectivas a realidade do trabalho que a direção de um colégio de aplicação enfrenta no desempenho de sua função profissional.

Faz-se necessário sinalizar, também, o relacionamento entre docentes, discentes, técnicos e familiares e a resolução de conflitos no ambiente escolar, visando à contribuir para valorização do gestor no enfrentamento dos problemas, conflitos e impasses do cotidiano escolar. Uma boa estratégia para lidar com esses conflitos é abrir espaço para a socialização de práticas de trabalho em equipe e que melhorem o clima organizacional da escola. Concluímos ser de fundamental importância a valorização das práticas pedagógicas e administrativas da equipe gestora de uma escola e atenção às questões sociais, que a educação da escola básica pública em contexto universitário enfrenta.

Referências

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Recebido: 03 de Março de 2023; Aceito: 20 de Junho de 2023

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