SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.8Escrevivencias en torno a la Educación Básica: memorias, saberes y prácticas sociológicasLos ritos como proceso formativo y pedagógico: reto educativo en Guinea-Bisáu índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Compartir


Educação & Formação

versión On-line ISSN 2448-3583

Educ. Form. vol.8  Fortaleza  2023  Epub 06-Abr-2024

https://doi.org/10.25053/redufor.v8.e10994 

Artigos

Conselho de classe: espaço-tempo de formação docente em escola militarizada

Consejo de clase: espacio-tiempo para la formación de profesores en una escuela militarizada

Rhaíssa Sheri Freire de Souza Rocha

Graduada em Pedagogia. Especialista em Orientação Educacional. Mestra em Educação pela UnB, na linha de pesquisa Profissão Docente, Currículo e Avaliação. Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisa em Docência, Didática e Trabalho Pedagógico (Prodocência) da Faculdade de Educação da UnB, cadastrado no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Desenvolve pesquisas na área da Educação com ênfase na organização do trabalho pedagógico na educação básica.

, Concepção, coleta de dados, análise de dados, recebimento de financiamento, pesquisa, redação do manuscrito e redação-revisão e edição1 
http://orcid.org/0000-0001-9403-126X; lattes: 4309000268127460

Edileuza Fernandes Silva

Doutora em Educação pela UnB. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação (FE) da UnB, linha Profissão Docente, Currículo e Avaliação. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa em Docência, Didática e Trabalho Pedagógico (Prodocência) da FE da UnB, cadastrado no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Coordena o Observatório de Educação Básica (ObsEB) da FE da UnB.

, Concepção, administração do projeto, supervisão e redação-revisão e edição2 
http://orcid.org/0000-0003-0576-1119; lattes: 8952690372824382

1Universidade de Brasília, Brasília, DF, Brasil

2Universidade de Brasília, Brasília, DF, Brasil


Resumo

No bojo da expansão da militarização de escolas públicas, o governo do Distrito Federal aderiu ao projeto em 2019, compartilhando a gestão de escolas com forças militares. Essa proposta tem gerado debates efervescentes, especialmente no que concerne à atividade docente e à organização do trabalho pedagógico. Este artigo objetivou discutir o conselho de classe como espaço-tempo de organização do trabalho pedagógico e de formação docente em uma escola pública militarizada do Distrito Federal. Os dados do estudo foram produzidos por meio de: análise documental; observação de reuniões de conselho de classe; entrevista semiestruturada com professores, coordenadora pedagógica e gestor disciplinar; e grupo de discussão com estudantes. Verificou-se que o conselho de classe se constitui colegiado integrante da gestão democrática e tem relevante papel na formação docente, podendo fomentar reflexões acerca de questões relacionadas aos princípios e práticas de uma escola militarizada.

Palavras-chave conselho de classe; formação docente; avaliação; militarização escolar.

Resumen

Ante la expansión de la militarización de las escuelas públicas, el gobierno del Distrito Federal se suma al proyecto en 2019, compartiendo la gestión de las escuelas con las fuerzas militares. Esta propuesta ha generado efervescentes debates, especialmente en lo que se refiere a la actividad docente y a la organización del trabajo pedagógico. Este artículo tiene como objetivo discutir el consejo de clase como espacio-tiempo para organizar el trabajo pedagógico y la formación docente en una escuela pública militarizada del Distrito Federal. Los datos del estudio se produjeron por medio de: análisis documental; observación de reuniones del consejo de clase; entrevista semiestructurada con profesores, coordinador pedagógico y gestor disciplinar; y grupo de discusión con alumnos. Se verificó que el consejo de clase es un colegiado integral de la gestión democrática y tiene un papel importante en la formación de los profesores, promoviendo reflexiones sobre cuestiones relacionadas a los principios y prácticas de una escuela militarizada.

Palabras clave consejo de clase; formación docente; evaluación; militarización escolar.

Abstract

In the wake of the expansion of the militarization of public schools, the Federal District government joins the project in 2019, sharing the management of schools with military forces. This proposal has generated effervescent debates, especially regarding the teaching activity and the organization of pedagogical work. This article aims to discuss the class council as a space-time to organize pedagogical work and teacher training in a militarized public school in the Federal District. The study data were produced through: document analysis; observation of class council meetings; semi-structured interviews with teachers, pedagogical coordinator, and disciplinary manager, and discussion group with students. It was verified that the class council is an integral collegiate of the democratic management; and has an important role in teacher training, being able to foster reflections about issues related to the principles and practices of a militarized school.

Keywords class council; teacher training; evaluation; school militarization.

1 Introdução

Este artigo decorre de estudo realizado no mestrado no período de janeiro de 2021 a dezembro de 20221 e objetiva discutir o conselho de classe como espaço-tempo de organização do trabalho pedagógico e de formação docente em uma escola2 pública militarizada, localizada no Distrito Federal (DF). Em face da polêmica em torno da militarização, a temática tem sido foco de debates e embates, o que justifica a urgência de estudos voltados à compreensão do modelo de escolas públicas que tiveram sua gestão transferida para a Corporação da Polícia Militar (PM), Corpo de Bombeiros Militar ou Forças Armadas do Brasil (FA). O estudo contemplou uma unidade escolar localizada em uma Região Administrativa do DF (RA)3 que foi militarizada pelo Pecim - programa de militarização escolar vinculado ao Governo Federal, no ano de 2020 (Seedf, 2021)4.

No Distrito Federal, o conselho de classe é um órgão colegiado da gestão democrática “[...] e se destina a acompanhar e avaliar o processo de educação, de ensino e de aprendizagem, havendo tantos conselhos de classe quantas forem as turmas existentes na escola” (Distrito Federal, 2012, art. 35, p. 8). É, portanto, instância de avaliação escolar que integra o trabalho pedagógico da escola e configura-se como espaço-tempo de formação docente. Conselho de classe é um colegiado que se articula às demais instâncias colegiais responsáveis pela efetivação da gestão democrática escolar, como: coordenação pedagógica, assembleias, conselhos escolares, entre outros, e caracteriza-se por ser espaço-tempo de avaliação dos estudantes, dos docentes e das equipes gestoras e de apoio pedagógico. As informações que são analisadas e os encaminhamentos que são propostos nesse colegiado têm grande potencial de influência sobre o alcance dos objetivos propostos para o trabalho pedagógico da escola, consequentemente, influenciam na organização do trabalho do professor e na formação processual e contínua do docente.

2 Metodologia

O estudo se desenvolveu em uma abordagem qualitativa (Triviños, 2013), delineado por meio de estudo de caso (Yin, 2015). Os dados da pesquisa foram produzidos a partir da análise documental dos projetos político-pedagógicos da escola (PPP) (Seedf, 2019, 2021); observação de 85 horas de reuniões de pré-conselho e conselho de classe participativo; entrevista semiestruturada com três professores, uma coordenadora pedagógica e um gestor disciplinar - profissional responsável pelo corpo de monitores militares atuantes na escola (Lüdke; André, 1986). A escuta dos estudantes ocorreu com a realização de grupo de discussão (Weller, 2006). Para preservar as identidades dos sujeitos participantes da pesquisa, foram adotados nomes fictícios em sua identificação.

As narrativas dos sujeitos da pesquisa foram organizadas a partir dos “núcleos de significação” (significados e sentidos dos sujeitos) propostos por Aguiar e Ozella (2013), com o objetivo de identificar aspectos contraditórios, semelhantes ou complementares dos sentidos constituídos pelos sujeitos em relação ao papel do conselho de classe na organização do trabalho pedagógico de uma escola pública militarizada.

O artigo estrutura-se em três seções. Na primeira, busca-se explicitar conceitos de trabalho e suas reverberações na constituição da docência. Na segunda, apresenta-se a análise do conselho de classe a partir do PPP da escola. Por fim, discutem-se as percepções dos sujeitos sobre conselho de classe e formação docente.

3 Discussão sobre os resultados: o trabalho pedagógico e as reverberações na constituição da docência

Em Marx (2013), tem-se que trabalho é a relação que o homem exerce sobre a natureza com o fim de satisfazer as suas necessidades, incorrendo em transformá-la e, assim, transformando-se, de forma que promova constante construção e reconstrução da essência humana; “[...] é pelo trabalho, então (como mediação, e não como fim em si), que o homem produz a própria existência, produzindo tudo aquilo que não está posto naturalmente” (Paro, 2015, p. 32).

A escola também realiza um trabalho, de natureza pedagógica. Por ser um espaço social permeado por conflitos e confrontos de interesses diversos, “[...] no caso do trabalho pedagógico, o professor fica reduzido a uma pequena unidade participante de um processo relativamente complexo, definido pelas administrações de sistemas de ensino em níveis federal, estadual e municipal [...]” (Villas Boas, 2017, p. 18). Faz-se necessária, portanto, a articulação do trabalho do professor com o trabalho desenvolvido pelos demais trabalhadores atuantes na escola, incluindo os estudantes que também desenvolvem ações que alteram o meio e por elas são alterados.

A escola, portanto, espaço de relações e interações, exerce forte influência sobre a constituição da docência, pois valores, concepções e práticas assumidas no PPP compõem o conjunto de saberes e experiências que contribuem para a formação docente. Ou seja, pelo e no trabalho pedagógico o docente também aprende a ser professor; há no exercício da sua atividade possibilidades de ensinar, mas também de aprender. Nele desencadeia-se um processo formativo em que “[...] a prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer” (Freire, 1998, p. 48). Assim entendida, “[...] a docência é tecida na e pelas relações humanas, o que a caracteriza como ação de natureza essencialmente humana” (Fernandes Silva; Bento, 2020, p. 21).

Os conhecimentos e as experiências construídas no exercício da docência devem ser compreendidos em sua relação dialética com a própria constituição do ser professor. Nesse movimento, teorias, ideias e práticas, defendidas pelos professores ou por grupos de interesses muitas vezes antagônicos, como é o caso dos interesses que levaram à militarização de escolas públicas no DF5, podem exercer influência sobre a formação desses profissionais e, consequentemente, sobre o trabalho pedagógico que realizam.

3.1 O conselho de classe no PPP da escola

A proposta de trabalho da escola pesquisada, sistematizada no seu PPP, anuncia que sua elaboração se deu de forma coletiva e participativa, envolvendo representantes de todos os segmentos da comunidade escolar. Do ponto de vista do proposto, a escola assume o princípio da gestão democrática, com vistas a uma prática pedagógica “[...] centrada no diálogo, nas decisões coletivas e na promoção da autonomia desta Unidade de Ensino” (Seedf, 2021, p. 3).

O trabalho pedagógico realizado na sala de aula não pode ser dissociado do trabalho pedagógico da escola, e esta, por sua vez, não deixa de se correlacionar com a sociedade. Da mesma forma, a avaliação educacional apresenta níveis que se articulam: avaliação em larga escala, avaliação institucional e avaliação da aprendizagem (Freitas et al., 2009), que devem ser considerados a partir dos resultados da própria escola, sem a preocupação em ranquear os estudantes e a instituição.

A avaliação em larga escala avalia os sistemas de educação no contexto macro. Também chamadas de “avaliações externas”, são instrumentos que visam ao acompanhamento global das redes de ensino, predominantemente realizadas no contexto da federação, dos estados e do DF. Esse tipo de avaliação objetiva constituir um histórico de desenvolvimento dos sistemas de ensino e analisá-los com vistas ao desenvolvimento de políticas públicas (Freitas et al., 2009).

A avaliação institucional pode configurar-se em um nível de abrangência intermediário. Enquanto a avaliação externa visa analisar redes de ensino como um todo, a avaliação institucional tem como enfoque o PPP da escola. É uma avaliação realizada pela própria escola tendo todos os seus atores envolvidos e busca analisar e negociar problemas vivenciados pela própria escola (Freitas et al., 2009). A avaliação institucional é, portanto, uma autoavaliação da escola e objetiva conduzi-la à reflexão coletiva do trabalho pedagógico desenvolvido. Nesse sentido, a autorreflexão constitui-se em prática contributiva à formação dos sujeitos: professores, estudantes, gestores, famílias, que dela participam.

Em nível micro, geralmente centrada na figura do professor, a avaliação de sala de aula deve refletir o êxito da organização do trabalho pedagógico da escola na aprendizagem dos estudantes, analisando o processo de desenvolvimento dos discentes a partir dos objetivos de aprendizagem previstos no plano de trabalho docente. Embora centrada nos discentes, é preciso considerar que os resultados e reflexões produzidos na e pela avaliação de sala de aula também exerçam influência na constituição da docência, à medida que possibilitem a avaliação do trabalho docente e a (re)organização do trabalho pedagógico.

Nesse sentido, o PPP da escola (Seedf, 2019, 2021) aponta a avaliação como um processo indispensável para a continuidade do trabalho da escola e direciona a prática do conselho de classe participativo como componente central no processo de reflexão coletiva de todos os envolvidos no fazer pedagógico, de forma que:

Ao final de cada bimestre letivo esta Unidade de Ensino realiza com todas as turmas as assembleias de classe nas quais os alunos e alunas fazem a avaliação institucional bem como a autoavaliação das ações desenvolvidas durante todo o bimestre letivo. Em seguida nos reunimos durante uma semana em conselhos de classe participativos onde pais, professores, alunos e alunas, Equipe Gestora, Serviço de Orientação Educacional, analisam a avaliação das aprendizagens de alunos e alunas, a avaliação institucional e a autoavaliação das turmas. E através do debate pedagógico são propostas as estratégias para a solução das fragilidades e reafirmação das potencialidades (Seedf, 2021, p. 38).

O conselho de classe foi constituído nas escolas do DF objetivando apontar problemas de aprendizagem e, posteriormente, passou por modificações significativas que o transformaram em uma comissão de avaliação da ação pedagógica e da aprendizagem com o objetivo de buscar novos caminhos para o ensino-aprendizagem. As alterações no Regimento Escolar, datadas dos anos de 1990, 1994, 2000, 2001, 2004 e 2006, apontaram aspectos relacionados à avaliação e à composição do conselho de classe provocados pelos altos índices de evasão, reprovação e fracasso escolar (Santos, 2006).

Posteriormente, em 2009, o Regimento das Instituições Educacionais da Rede Pública de Ensino do DF normatizou o conselho de classe como um colegiado de professores com o objetivo de avaliar o processo de educação, de ensino e de aprendizagem, podendo ser participativo com a presença de alunos, pais/mães e/ou responsáveis (Distrito Federal, 2009). Portanto, essa natureza colegial e participativa é relevante, pois pode oferecer elementos teóricos e práticos que reverberem na formação docente e no trabalho pedagógico de sala de aula e da escola como um todo.

No âmbito federal, o Plano Nacional de Educação (PNE), Lei nº 13.005, de 2014, contempla a gestão democrática na Meta 19, prevendo sua efetivação até o ano de 2016 e incluindo a ampla participação da comunidade nos conselhos escolares para promover a participação e a fiscalização na gestão escolar e educacional (Brasil, 2014). No DF, com a aprovação da Lei nº 4.751/2012 - que institui a gestão democrática no sistema público de ensino -, o conselho de classe é apresentado, em seu artigo 9º, como um colegiado da gestão democrática (Distrito Federal, 2012).

Na mesma direção, em sua versão mais recente, o Regimento Escolar (Distrito Federal, 2019, p. 30) afirma que “[...] o conselho de classe é órgão colegiado integrante da Gestão Democrática e se destina a acompanhar e avaliar o processo de educação, de ensino e das aprendizagens”, sendo composto por:

I - todos os docentes de cada turma e representante da equipe gestora, na condição de conselheiros natos; II - Pedagogo - Orientador Educacional; III - representante da carreira Assistência à Educação; IV - representante das famílias e/ou responsáveis legais; V - representante dos estudantes a partir do 6.º ano do Ensino Fundamental ou do primeiro segmento da Educação de Jovens e Adultos, escolhidos por seus pares, garantida a representatividade dos estudantes de cada uma das turmas; VI - representantes dos serviços de apoio especializado (Distrito Federal, 2019, p. 30).

Nesse sentido, a composição do conselho de classe indica a representatividade de toda a comunidade escolar, possibilitando um ambiente propício ao trabalho coletivo e à formação docente e discente. Na prática, a escola atende à proposta do Regimento, adotando ainda o critério optativo da realização do conselho de classe participativo, disposto em seu artigo 30, em que possibilita a atuação de todos os estudantes e professores de uma mesma turma (Distrito Federal, 2019).

3.2 Percepções de professores sobre conselho de classe e formação docente

As entrevistas realizadas com os professores demonstraram aproximações entre as suas percepções acerca do trabalho realizado no conselho de classe e a organização do trabalho pedagógico desenvolvido na sala de aula, apontando-o como um espaço-tempo de avaliação e replanejamento de suas ações pedagógicas. A integração e a coletividade são características latentes em suas falas.

O conselho de classe, para mim, é a oportunidade que os professores têm de compartilhar suas perspectivas da sala de aula. Como é feito por sala de aula, a gente consegue debater os problemas da sala em particular, ver os problemas dos alunos em particular, ver como a gente pode ajudar em uma perspectiva coletiva e tentar achar uma forma de trabalhar em cima disso para não ficar um trabalho individualizado e centralizado em um professor só. No conselho, temos a oportunidade de tentar achar o caminho que vai direcionar a gente para a solução de um determinado problema. Do mesmo jeito, a gente consegue também exaltar as qualidades que a gente encontra nos alunos e ver como que o aluno é em todas as disciplinas (Professor João Pedro - negrito da pesquisadora).

Para mim, vai ser um momento de transformação, porque vai dar essa característica mesmo de unificação do trabalho entre toda a equipe e vai trazer também essa característica de a gente também entender a visão do outro professor e vai fazer essa construção dessa interdisciplinaridade (Professor Lucas - negrito da pesquisadora).

O compartilhamento de perspectivas a respeito de um determinado aluno ou turma faz do conselho de classe um lugar de execução do trabalho colaborativo, mas também se configura como um lugar de avaliação disciplinar em uma escola militarizada. A atuação do gestor disciplinar no conselho de classe intensifica o foco disciplinar e atitudinal da avaliação desenvolvida a respeito do estudante. As observações dos militares, realizadas fora de sala de aula, influenciam na constituição da nota discutida no conselho de classe a respeito do desempenho do educando ao longo do bimestre. Essa prática aponta para um leilão de notas atribuídas ao comportamento do estudante pelos professores, considerando as observações realizadas pelos monitores militares.

Nas reuniões de pré-conselho realizadas com os professores, identificou-se a participação dos militares, especificamente, informando a relação de suspensões e advertências de cada turma. Essa lista foi entregue para a coordenadora no primeiro dia de reuniões de cada bimestre e nela foram verificadas as punições registradas de cada aluno, a partir das quais se descontaria da “nota formativa” a pontuação negativa atribuída a cada sansão disciplinar aplicada aos estudantes “infratores”.

Nesse sentido, foi possível identificar que as avaliações realizadas pelos monitores acerca do aspecto disciplinar dos estudantes são utilizadas para a composição da nota do estudante, o que, para esses estudantes, é injusto, tendo em vista que os critérios de punição utilizados pelos militares são relativos.

Tem um aluno; esse, por exemplo, não é o primeiro ano que ele está aqui. Mesmo ele bagunçando muito e desrespeitando todo mundo, ele só saiu por causa das reclamações dos representantes. Eu vejo que, quando é uma coisa grande, é só uma advertência e, quando é uma coisa pequena, suspensão. Não dá para entender. Não dá para saber qual o critério que eles usam (Estudante Cleiton - negrito da pesquisadora).

O pior é que a reclamação de um aluno é a mesma da outra. Ele fez muito pior do que o outro que já foi expulso e ainda está aqui. É completamente injusto (Estudante Isabela - negrito da pesquisadora).

O problema é que, se acontecer qualquer coisa com outra pessoa, leva advertência, sai da escola, sendo que não chega nem perto do que o outro faz, do que esse que a gente está falando especificamente faz (Estudante Júlia).

É nesse aspecto que os estudantes apontam a necessidade de maior frequência na reunião denominada “conselho dos representantes”6, de forma que pudessem se posicionar em relação aos critérios utilizados pelos militares e pelos professores para definirem as notas que atribuem aos alunos. Ou seja, os estudantes que historicamente são alijados dos processos avaliativos na escola estão na escola militarizada submetidos a um duplo julgamento - pedagógico, feito pelos professores -, e disciplinar, realizado por militares.

Embora a realidade pesquisada tenha apresentado um leilão de notas e comportamentos, o desenvolvimento do conselho de classe também se mostrou significativo na avaliação dos professores acerca de suas estratégias pedagógicas e de seu desenvolvimento como profissional docente.

Além disso, os professores enxergam o conselho de classe como um espaço- -tempo de articulação das suas propostas pedagógicas em relação a um mesmo objetivo, a aprendizagem do estudante, como se pode apreender, quando afirmam que: se consegue debater os problemas da sala e a partir daí encontrar o caminho que possibilitará a solução de problemas particulares em um coletivo comprometido com as aprendizagens de todos, inclusive dos próprios docentes. Exemplo disso é a manifestação do professor Lucas: de que é um momento de transformação possível pelo trabalho coletivo, pelas diferentes visões sobre o mesmo problema/situação, até mesmo avançando para um trabalho interdisciplinar.

Atitude de busca de alternativas para conhecer mais e melhor; atitude de espera frente aos atos não consumados; atitude de reciprocidade que impele à troca, que impele ao diálogo, com pares idênticos, com pares anônimos ou consigo mesmo; atitude de humildade frente à limitação do próprio saber; atitude de perplexidade frente à possibilidade de desvendar novos saberes; atitude de desafio, desafio frente ao novo, desafio em redimensionar o velho; atitude de envolvimento e comprometimento com os projetos e com as pessoas neles envolvidas; atitude, pois, de compromisso em construir sempre da melhor forma possível, atitude de responsabilidade, mas, sobretudo, de alegria, de revelação, de encontro, enfim, de vida (Fazenda, 1991, p. 14).

São requisitos para que a interdisciplinaridade expanda as barreiras do conhecimento limitado e, sem abrir mão das especificidades de cada componente curricular único, compreenda o que se aproxima ou se distancia para promover um trabalho efetivamente coletivo e colaborativo entre os pares. Esse espaço deveria proporcionar trocas em que os objetivos deixassem de ser individuais e passassem a ser alcançados coletivamente, além de possibilitar o acesso a uma totalidade maior e permitir a mediação de propostas pedagógicas exitosas.

Um dos objetivos específicos no Plano de Ação da Organização do Trabalho Pedagógico proposto no PPP da escola é “[...] superar a fragmentação do trabalho escolar a partir da interdisciplinaridade” (Seedf, 2021, p. 41); é esse também um dos sentidos que a coordenadora pedagógica e os professores atribuem ao conselho de classe.

A interdisciplinaridade pressupõe a ruptura da fragmentação do saber, desenvolvendo o processo de ensino-aprendizagem de forma crítica e dialógica, mediando aproximações e contradições dos conteúdos programáticos. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica (DCN) pontuam que:

[...] pela abordagem interdisciplinar ocorre a transversalidade do conhecimento constitutivo de diferentes disciplinas, por meio da ação didático-pedagógica mediada pela pedagogia dos projetos temáticos. Estes facilitam a organização coletiva e cooperativa do trabalho pedagógico (Brasil, 2013, p. 28).

Organização que favorece a visão global acerca do aluno e do processo de ensino-aprendizagem como um todo, conforme abordaram a coordenadora pedagógica e professores, enfatizando que o conselho de classe é um espaço de replanejamento coletivo a partir da avaliação realizada colaborativamente entre os profissionais da educação. Nessa direção, as Diretrizes das Escolas Cívico-Militares (Ecim) apontam como uma das competências do coordenador pedagógico: “[...] promover a interdisciplinaridade; estimular a realização de projetos conjuntos entre os professores; adotar medidas preventivas relacionadas a problemas de ensino e aprendizagem e adequar metodologias e práticas avaliativas” (Brasil, 2021, p. 59). O Manual das Ecim direciona a organização do espaço-tempo de coordenação por ano escolar, considerando que esta deve se desenvolver “[...] em um mesmo espaço que permita a interdisciplinaridade e a troca de informações sobre os alunos, colocando-os no centro do processo de ensino e aprendizagem” (Brasil, 2019, p. 52).

É possível verificar que essas ações do coordenador pedagógico estão presentes no espaço-tempo do conselho de classe, bimestralmente. Existem ações na escola que objetivam aproximar os diferentes componentes curriculares, mas o planejamento coletivo de ações que reorganizam o trabalho pedagógico vincula-se ao conselho de classe. Portanto, para evitar a realização de um planejamento pautado em um currículo engessado e descontextualizado, que visa homogeneizar e reproduzir fragmentando o conhecimento e excluindo possibilidades para esses educandos, a escola poderia promover planejamentos interdisciplinares na coordenação pedagógica para além do aprimoramento do trabalho que é possibilitado no conselho de classe. É possível que essa prática contribua para a democratização do ensino e para a construção de uma visão crítica de mundo mediada pelos conflitos do mundo do trabalho na sociedade capitalista.

Para além do trabalho colaborativo e da interdisciplinaridade, o trabalho do professor também deve ser avaliado pelos pares e pelo próprio professor com vistas ao desenvolvimento de ações que favoreçam as aprendizagens. Embora o espaço de tempo para a realização do conselho de classe seja reduzido a uma semana dentro do bimestre letivo, afetando a avaliação coletiva do trabalho pedagógico e direcionando-o para a avaliação específica do desempenho dos estudantes, foi possível observar que a equipe gestora e de coordenação pedagógica intencionam direcionar esse momento para uma avaliação mais ampla, incluindo o trabalho do professor desenvolvido em sala de aula, a atuação das equipes de apoio pedagógico e da orientação educacional. Também se observou que a atuação dos militares entra em discussão no conselho de classe, mesmo quando não integra o planejamento, e isso faz com que o trabalho de todos os sujeitos da escola seja avaliado, mesmo que de forma limitada.

Na perspectiva dos docentes, o conselho de classe possibilita avaliar o próprio trabalho e replanejá-lo. Nessa direção, o professor Lucas aponta que, no conselho de classe, “Tem como avaliar tanto nós professores como os próprios alunos”; a professora Larissa reflete sobre “O que eu estou fazendo de errado?” e indica a recondução de suas práticas pedagógicas a partir das discussões desse espaço-tempo. O apontamento do professor Lucas demonstra uma avaliação do próprio trabalho que repercute na possibilidade de mudanças no planejamento e nas atitudes frente à sua formação docente, a partir do replanejamento e da recondução do trabalho por novos caminhos.

Percebe-se nas entrevistas com os professores que ambos observam os pontos de vista dos colegas para avaliar o próprio trabalho e desenvolver estratégias que contribuam para a organização cotidiana do trabalho desenvolvido em sala de aula. Todos os professores entrevistados afirmam que o conselho de classe é um ambiente de compartilhamento de ideias e de estratégias didático-pedagógicas, o que indica que é um espaço de formação docente, cumprindo, assim, com um dos objetivos propostos pelo espaço-tempo de coordenação pedagógica, em que se desenvolve o pré-conselho de classe.

Para mim, é interessante porque você começa com determinada perspectiva didática. Por exemplo, eu detesto passar coisas no quadro, então eu sempre estou dando aula na televisão, nos slides, aí acaba que no conselho você consegue compreender e intercalar determinadas intervenções didáticas, determinadas estratégias que servem para determinada turma. Então, você consegue fazer isso em alguma turma que, às vezes, quando você está na sala de aula, você percebe que aquela turma não se dá muito bem com slide e aí o conselho de classe vai perceber que isso não acontece só na sua aula. E aí no conselho de classe você consegue ver isso e consegue ver também qual estilo que cada professor tem, qual o estilo de aula e quais as estratégias de intervenção que eles estão usando que estão dando certo. Então, não é copiar o trabalho do colega, mas você consegue ver qual o trabalho que está dando certo e como você vai engrandecer a sua aula e saber utilizar todos os recursos que estão disponíveis para você (Professor João Pedro - negrito da pesquisadora).

As contribuições produzidas no conselho de classe direcionam para que sejam discutidas estratégias de intervenção didática promotoras das aprendizagens dos estudantes que apresentam dificuldades em determinado conteúdo. Os professores têm a oportunidade de avaliar se a dificuldade apresentada se refere ao modelo de aula utilizado, ao conteúdo da disciplina ministrada ou a uma demanda do aluno de ser acompanhado por um profissional especializado.

O conselho de classe, para mim, é a oportunidade que os professores têm de compartilhar suas perspectivas da sala de aula. Como é feito por sala de aula, a gente consegue debater os problemas da sala em particular, ver os problemas dos alunos em particular, ver como a gente pode ajudar em uma perspectiva coletiva e tentar achar uma forma de trabalhar em cima disso para não ficar um trabalho individualizado e centralizado em um professor só (Professor João Pedro - negrito da pesquisadora).

Nesse sentido, os professores reconhecem no conselho de classe a oportunidade para expressarem suas dificuldades e angústias de forma que outro professor ou a equipe de apoio pedagógico possa intervir e auxiliá-lo no desenvolvimento de seu trabalho pedagógico. Os encaminhamentos dados no conselho de classe podem sanar dificuldades que estão sendo enfrentadas sem sucesso e possibilita ao professor o conhecimento de novos recursos e estratégias que podem ser agregados em seus planos de ensino e de aula. Além disso, proporciona a informação de possíveis investigações médicas a respeito de determinado aluno, de forma que os trabalhos da orientadora educacional e da psicopedagoga também contribuam para o replanejamento de ações que são desenvolvidas em sala de aula. Isso permite que o professor compreenda o aluno em suas totalidades e direcione suas práticas pedagógicas mediadas por instrumentos e procedimentos que auxiliem na formação desse educando, confrontando aspectos limitadores que intencionam padronizar os sujeitos e excluir suas possibilidades de avanços.

Os estudantes também pleiteiam espaço de fala na avaliação com vistas à reorganização do trabalho pedagógico. Ao enfatizarem que mudariam a frequência com que o conselho de representantes de turma é realizado, pontuam que esses encontros seriam fundamentais para que pudessem avaliar os professores, os alunos e o trabalho desenvolvido “No quesito que eles estão dando aula de um jeito que a gente aprenda do jeito certo e de avaliar os alunos também” (Estudante Ysabelli). Para exemplificar, mencionam o caso de um professor cujas práticas didáticas não condiziam com o que era proposto, o qual precisou ser retirado da escola, sendo essa situação tratada no conselho de representantes realizado entre estudantes e diretora escolar.

Destaca-se, nesse contexto, a importância do conselho de classe, em que os segmentos da escola podem atuar no processo avaliativo, pormenorizando aspectos que não seriam mencionados caso a participação de um dos segmentos da escola fosse suprimida. Nessa direção, Araújo (2020, p. 70) ressalta em sua pesquisa que, “[...] diferente do que eles [professores] imaginavam, a participação dos alunos foi uma ferramenta positiva para repensar suas práticas pedagógicas”, o que revela que a atuação discente na avaliação do trabalho pedagógico é subestimada, quando poderia ser usada de forma muito efetiva no âmbito do conselho de classe. A autora também aponta a percepção dos professores entrevistados de que a representação dos estudantes que atuam no conselho de classe, ao retornarem com feedback das deliberações desse colegiado para os demais alunos da turma, atribui maior credibilidade nas atividades desenvolvidas no colegiado, expressando percepções positivas por parte dos docentes quanto à participação discente no conselho. Essas percepções dos professores revelam que estão aprendendo com as avaliações realizadas no conselho de classe, o que qualifica ainda mais os processos vivenciados nesse coletivo e as contribuições na constituição do ser professor, especificamente no que concerne à relação pedagógica professor-aluno. A esse respeito, Magnata e Abranches (2018, p. 756-757) alertam:

O que é gerado a partir da avaliação que os estudantes fazem sobre os docentes pode servir como reflexão e ajustes da prática docente, mas também pode servir para manter a relação de poder já existente em sala de aula. Isso vai depender das concepções que os docentes têm sobre educação e avaliação que fundamentam suas práticas.

Portanto, para contribuir democraticamente com a reorganização do trabalho pedagógico da escola, o recurso da participação discente deve ser considerado com muita responsabilidade pelos docentes para que se cumpra o objetivo proposto. Essa participação pode ser considerada tanto para a avaliação do trabalho pedagógico desenvolvido pelo professor quanto para dar uma visão mais ampla do trabalho desenvolvido pelo aluno ou dar a ele a oportunidade de ser ouvido, assim como o coletivo de professores e os demais segmentos da comunidade escolar.

Nesse sentido, os estudantes destacaram os registros realizados pelos militares, mencionados anteriormente, como um dos aspectos que influencia a avaliação dos professores e enfatizaram que a militarização da escola limitou o espaço de fala discente. Consequentemente, a organização do trabalho pedagógico da escola é também influenciada pela presença dos militares no cotidiano escolar, pois a rotina escolar é afetada pela organização disciplinar, que prevê um monitor responsável por cada turma, planejamento de atividades cívicas de formação e regras que incluem a apresentação7 da turma para cada professor ao entrar em sala de aula.

Além disso, foi possível identificar que a relação professor-aluno passa a ser mediada pelo militar atuante no ambiente escolar. Os professores estão acionando os monitores militares para mediarem situações que, na visão dos estudantes, não necessitam de tal atuação e que são da natureza do trabalho didático-pedagógico do professor. A figura do monitor está sendo posta entre o professor e o aluno, e isso implica embates que podem afetar diretamente o desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem, tendo em vista que afeta a relação pedagógica professor-aluno. Mediar conflitos dentro da sala de aula faz parte das atribuições do professor, aproximando os estudantes no sentido de que se sintam copartícipes do processo didático, o que pode favorecer seu desenvolvimento e aprendizagem. Se o professor terceiriza essa mediação da relação pedagógica, pode-se criar barreiras nas relações necessárias para o seu desenvolvimento.

Esses elementos indicam que precisa haver adaptações nos planejamentos dos trabalhos dos professores que considerem as alterações geradas pela atuação dos monitores militares, bem como a própria organização do estudante, que é afetada pelos procedimentos adotados. Em contrapartida, o posicionamento da coordenadora pedagógica demonstra que algumas das rotinas que compõem a gestão disciplinar executada na escola já aconteciam antes da implantação do Pecim e que os monitores passaram a integrar o quantitativo de pessoal atuante nas rotinas escolares preexistentes.

Outros estudos, realizados no âmbito das escolas militarizadas do DF, têm indicado que as mediações das dificuldades enfrentadas no interior da escola pública poderiam ser dadas de forma distinta: os recursos financeiros utilizados para a contratação de militares poderiam ser destinados a profissionais cuja formação contribuiria pedagogicamente para o ambiente escolar (Serafim, 2021); a gestão pedagógica das escolas que vivenciam uma gestão compartilhada com a disciplinar poderia ser fortalecida com ganho de pessoal na equipe gestora eleita (Gomes, 2021); e a atuação dos militares seria completamente coerente nos arredores da escola, na comunidade, e não dentro dos muros da escola, uma vez que ela reflete a violência existente na sociedade (Mendonça, 2019).

O posicionamento da coordenadora pedagógica reforça a necessidade de investimento nos profissionais da educação, principalmente no que tange à demanda de trabalho desproporcional à quantidade de profissionais atuantes no ambiente escolar. Introduzir militares dentro da escola não é a solução para sanar problemas como salas de aula lotadas, desinteresse dos estudantes pela escola e até mesmo adoecimento dos profissionais da educação.

Os docentes concordam que “A coordenação fica mais focada em ajudar os professores” (Professor João Pedro), enquanto os militares cuidam da questão disciplinar, para que a escola funcione como o organismo que ela é, em que cada parte trabalha para um mesmo fim coletivo. Esse posicionamento fortalece a concepção de que há uma sobrecarga sobre os profissionais da educação no interior das escolas e que o trabalho poderia ser coordenado com maior eficácia, caso a escola contasse com quantitativo suficiente de profissionais de apoio pedagógico.

4 Considerações finais

O movimento e as transformações que se dão na humanidade impossibilitam que sejam dadas conclusões definitivas acerca de qualquer contexto histórico-social. A aproximação à realidade pesquisada, articulada aos referenciais teóricos, proporcionou a compreensão do conselho de classe como espaço-tempo de avaliação, trabalho docente colaborativo e formativo no âmbito de uma escola militarizada, localizada no DF.

As análises dos documentos mais recentes que norteiam o funcionamento e a finalidade do conselho de classe na escola atual contemplam-no como um colegiado integrante da gestão democrática da escola pública do DF e que se destina a: avaliar o processo de ensino-aprendizagem; avaliar o trabalho pedagógico da escola em sua totalidade, com vistas ao seu replanejamento; articular a avaliação em seus três níveis: larga escala/externa, institucional e das aprendizagens; subsidiar a construção de novas aprendizagens dos professores a partir das discussões, das experiências e das práticas de avaliação compartilhadas entre os pares, ou seja, o conselho de classe é também espaço-tempo de formação docente.

Considera-se também que o contexto escolar público militarizado promove a precarização do trabalho docente, bem como evidencia práticas avaliativas meritocráticas e excludentes. Essa realidade tem exigido reflexões e proposições dialógicas nos contextos distrital e federal para combater o programa de militarização das escolas públicas.

Por fim, espera-se que o conselho de classe seja lugar de avaliação do trabalho da escola e do desenvolvimento do educando no processo de ensino-aprendizagem, mas também seja espaço de acolhida, direcionamento, ajuste e potencialização do trabalho do professor, permitindo trocas significativas entre os pares e promovendo formação a partir da avaliação e das discussões realizadas.

Como citar este artigo (ABNT)ROCHA, Rhaíssa Sheri Freire de Souza; SILVA, Edileuza Fernandes da. Conselho de classe: espaço-tempo de formação docente em escola militarizada. Educação & Formação, Fortaleza, v. 8, e10994, 2023. Disponível em: https://revistas.uece.br/index.php/redufor/article/view/e10994

1 Pesquisa submetida ao comitê de ética pela Plataforma Brasil e aprovado sob Certificado de Apresentação de Apreciação de Ética (CAAE) nº 55982622.5.0000.5540, financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

2 Este trabalho adotou a denominação “escola” ou “unidade escolar” para referir-se ao estabelecimento destinado ao ensino público ou particular. Essa opção se justifica pelo fato de seu emprego ser mais comum no âmbito do Distrito Federal.

3 A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 32, veda a divisão do Distrito Federal em municípios e indica sua regência por Lei Orgânica que dispõe da organização do Distrito Federal em Regiões Administrativas com vistas à descentralização administrativa.

4 Formato utilizado para referenciar dados obtidos no projeto político-pedagógico da escola, com o objetivo de assegurar a não identificação da instituição pesquisada.

5 A gestão compartilhada ou militarizada confronta os princípios da Lei de Gestão Democrática do Sistema Público de Ensino do DF - Lei nº 4.751/2012, aprovada pela Câmara Legislativa do DF.

6 Momento destinado à escuta, por parte diretora da escola, dos estudantes escolhidos como representantes de turmas.

7 O aluno líder dá voz de comando para que a turma fique de pé, informa ao professor a quantidade de presentes e, em seguida, solicita que os estudantes voltem aos seus lugares.

5 Referências

AGUIAR, W. M. J.; OZELLA, S. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos núcleos de significação. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, DF, v. 94, n. 236, p. 299-322, 2013. [ Links ]

ARAÚJO, I. S. R. Conselho de classe: as significações de professores e estudantes acerca da presença e da participação discente: um estudo na perspectiva da sócio-histórica. 2020. 87 f. Dissertação (Mestrado em Educação: Formação de Formadores) - Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: Formação de Formadores, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2020. [ Links ]

BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Básica. Brasília, DF: MEC, 2013. [ Links ]

BRASIL. Diretrizes das escolas cívico-militares. Brasília, DF: MEC, 2021. [ Links ]

BRASIL. Lei n.o 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação - PNE e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, p. 1, Edição Extra, 26 jun. 2014. [ Links ]

BRASIL. Manual das escolas cívico-militares. Brasília, DF: CGU, 2019. [ Links ]

DISTRITO FEDERAL. Lei n.o 4.751, de 07 de fevereiro de 2012. Dispõe sobre o Sistema de Ensino e a Gestão Democrática do Sistema de Ensino Público do Distrito Federal. Diário Oficial do Distrito Federal, nº 29, Brasília, DF, 8 fev. 2012. p. 1-14. [ Links ]

DISTRITO FEDERAL. Regimento Escolar das Instituições Educacionais da Rede Pública de Ensino do Distrito Federal. Brasília, DF: Seedf, 2009. [ Links ]

DISTRITO FEDERAL. Regimento da rede pública de ensino do Distrito Federal Brasil. Brasília, DF: Seedf, 2019. [ Links ]

FAZENDA, I. C. A. Interdisciplinaridade: um projeto em parceria. São Paulo: Loyola, 1991. [ Links ]

FERNANDES SILVA, E.; BENTO, A. L. Concepções e discursos sobre a docência: tensões, embates e perspectivas. Ensino em Re-Vista, Uberlândia, v. 27, n. 1, p. 15-39, 2020. [ Links ]

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1998. [ Links ]

FREITAS, L. C. et al. Avaliação educacional: caminhando pela contramão. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2009. [ Links ]

GOMES, A. R. Militarização de escolas públicas no Distrito Federal (2019 - 2020): o que dizem os professores?. 2021. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2021. [ Links ]

LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. Métodos de coleta de dados: observação, entrevista e análise documental. In: LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. p. 25-44. [ Links ]

MAGNATA, R. C. V.; ABRANCHES, A. F. P. S. Conselho de classe com participação estudantil: compreensões sobre avaliação da aprendizagem. Estudos em Avaliação Educacional, São Paulo, v. 29, n. 72, p. 738-773, 2018. DOI: https://doi.org/10.18222/eae.v29i72.4907. [ Links ]

MARX, K. O capital: crítica da economia política: Livro I. 31. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. [ Links ]

MENDONÇA, E. F. Militarização de escolas públicas no DF: a gestão democrática sob ameaça. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, Porto Alegre, v. 35, n. 3, p. 594-611, 2019. [ Links ]

PARO, V. H. Crítica da estrutura da escola. São Paulo: Cortez, 2015. [ Links ]

SANTOS, F. R. V. Conselho de classe: a construção de um espaço de avaliação coletiva. 2006. 137 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2006. [ Links ]

SEEDF. Projeto Político Pedagógico da escola. Brasília, DF: SEEDF, 2019. [ Links ]

SEEDF. Projeto Político Pedagógico da escola. Brasília, DF: SEEDF, 2021. [ Links ]

SERAFIM, G. O. L. A práxis de uma diretora na gestão de uma escola militarizada. 2021. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2021. [ Links ]

TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à Pesquisa em Ciências Sociais: a Pesquisa Qualitativa em Educação - O Positivismo, A Fenomenologia, O Marxismo. Revista Formação, v. 1, n. 20, p. 3-6, 2013. DOI: https://doi.org/10.33081/formação.v1i20.2335. [ Links ]

VILLAS BOAS, B. O dia a dia do trabalho pedagógico: contribuições para a formação do professor e dos estudantes. In: VILLAS BOAS, B. Avaliação: interações com o trabalho pedagógico. Campinas: Papirus, 2017. p. 13-24. [ Links ]

WELLER, W. Grupos de discussão na pesquisa com adolescentes e jovens: aportes teórico-metodológicos e análise de uma experiência com o método. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 32, n. 2, p. 241-260, 2006. [ Links ]

YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2015. [ Links ]

Recebido: 07 de Julho de 2023; Aceito: 10 de Novembro de 2023; Publicado: 28 de Dezembro de 2023

Editora responsável: Lia Machado Fiuza Fialho

Pareceristas ad hoc: Telmo Marcon e Bernardino Galdino de Sena Neto

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons.