Introdução
Enquanto na década de 1970 a preocupação pela qualidade da educação superior era centrada em iniciativas para reconhecimento de diplomas entre países e regiões, a partir da década de 1980 a educação superior começou a ser objeto de políticas nacionais de avaliação/acreditação1.
Até aquele momento, segundo Neave (2001) havia na Europa confiança nos acadêmicos para definir a excelência, a qual estava relacionada com a possibilidade de formar os graduados que os Estados Nacionais precisavam, tanto para o setor privado, quanto para a administração pública.
Stubrin (2005) descreve os mecanismos de garantia da qualidade que vigoravam antes de 1980 diferenciando dois tipos: 1) os existentes em países de matriz sociocêntrica como os Estados Unidos e a Inglaterra, baseados na avaliação e na acreditação de instituições e cursos, cujo modelo é o estadunidense e; 2) o de países com organização estadocêntrica, com autorização e reconhecimento estatais das instituições e das titulações acadêmicas com prazo indefinido, reguladas pela existência de currículos nacionais e com professores que eram funcionários públicos.
[...] a partir de um dado momento, esses mecanismos começaram a ser recriados em sistemas com matrizes diferentes. Então, numa matriz estadocêntrica, se criaram agências, como na França, e, numa estrutura sociocêntrica, foi incluído certo controle estatal, como nos Estados Unidos. O autor [Stubrin] relaciona o fato com a crescente internacionalização da educação superior, especialmente a transnacional. (BARREYRO, 2017, p.34)
O surgimento das políticas nacionais de avaliação/acreditação foi concomitante à hegemonia do ideário neoliberal, iniciada no último terço do século XX, e suas propostas para a educação2, especialmente para a educação superior, visando à regulação e à prestação de contas pelos recursos públicos recebidos. Para Afonso (2000, p. 51) foi a avaliação uma das formas de “introduzir a lógica de mercado na esfera do Estado e da educação pública”, em um momento em que se promovia a diminuição das responsabilidades do Estado com a educação.
Cabe lembrar a influência de documento do Banco Mundial propondo reformas para a educação superior em que, entre outros, se recomendava a criação de agências de acreditação de instituições e de cursos, assim como também eram propostos procedimentos como autoavaliação e avaliação externa por pares, à moda da acreditação estadunidense (WORLD BANK, 1998)3.
Naquele momento, então, a criação de políticas de acreditação/avaliação de instituições e cursos ocorreu em escala nacional em países desenvolvidos, especialmente os europeus. Essas políticas estatais e nacionais constituíram o que Guy Neave (1988) chamou de Estado avaliador. Ele esteve atrelado a governos neoconservadores e neoliberais que incorporaram estratégias de gestão advindas do setor privado e que focavam em resultados ou produtos, ignorando os processos. Preocupados em diminuir custos, criaram mecanismos de responsabilização e controle, em que a avaliação é um pré-requisito, pois sem a elaboração de objetivos definidos não seria possível elaborar indicadores para mensurar os resultados (AFONSO, 2000).
Essas políticas nacionais de avaliação/acreditação adotaram diferentes formas, como mostram os exemplos da França, Holanda e Inglaterra desenvolvidos na década de 1980, na Europa e os de Argentina, Chile e Brasil na América do Sul, na década de 1990; peculiaridades e diferenças que enfatizam o caráter nacional dessas políticas (BARREYRO, 2017). Por razões de espaço, baste aqui assinalar a peculiaridade brasileira (única no mundo) de que os resultados de uma prova aplicada aos formandos da educação superior (Provão e Enade) constitui o eixo central da política de avaliação/regulação desde finais da década de 1990 (BARREYRO; ROTHEN, 2014)4.
Após a constituição do Estado avaliador nas décadas de 1980 e 1990, observou-se uma transformação que levou a autores como Marquina (2006, p. 27) analisar o que denominou como “um novo round do Estado Avaliador” e a Afonso (2013) a prever a emergência do pós-Estado Avaliador devido às transformações econômicas que implicam nova relação entre o nacional e o global.
Dado o antes assinalado, este texto pretende descrever e analisar algumas das estratégias que a acreditação/avaliação tem desenvolvido na esfera global no século XXI.
Ele está baseado em pesquisa bibliográfica, análise documental e entrevistas com experts internacionais e nacionais e participantes na elaboração de algumas das políticas5.
Utiliza-se do conceito de política supranacional (DALE, 2005) como aquela que não se reduz a soma dos interesses dos estados membros nem a os interesses de um estado-nação, sendo própria da globalização. Assim, se trata de uma governança multiescalar em que diversos níveis (escalas) como o estatal, o regional, o nacional, o sub-nacional ou o local podem estar envolvidos. Da mesma forma, as instituições que participam desta governança multiescalar não são apenas os estados nacionais e seus órgãos como também instituições financeiras internacionais, organizações internacionais, empresas, fundações, consultores, ONG´s, etc. Contudo, deve ser considerada a importância dos estados nacionais que são quem coordenam e cumprem diferentes papéis nestes processos (ROBERTSON; DALE, 2015a e b).
Acreditação/avaliação da educação superior para além da escala nacional
Um fato que teve influência nas mudanças de escala quanto às políticas de avaliação/acreditação da educação superior foi o Acordo Geral sobre Comércio de Serviços (AGCS) ou GATS (General Agreement on Trade in Services), iniciado em 19956. Dentre a liberalização de mais serviços para o comércio internacional, a educação e, especialmente, a educação superior, foi incluída nas negociações para ser liberada7.
A partir do Acordo, houve incremento da mobilidade acadêmica na educação superior em quatro modalidades: 1) a educação à distância ou franchising sem deslocamento físico do provedor ou do consumidor; 2) mobilidade estudantil tradicional em que o consumidor se desloca ao exterior; 3) filiais de instituições de educação superior em outros países em parceria com instituições locais e 4) oferta de serviços educacionais por parte de professores e pesquisadores, com deslocamento físico (ALTBACH; KNIGHT, 2007).
Desta forma, a educação transnacional, principalmente na modalidade de mobilidade estudantil e na de educação à distância geraram recursos financeiros bilionários na economia global. Ambas tem desafiado a questão de garantir a qualidade da educação superior fora dos âmbitos nacionais e regionais. Ambas redimensionaram a questão da qualidade e suas políticas na educação superior que já havia alcançado importância dado o papel deste nível de educação na economia do conhecimento (DIAS SOBRINHO, 2005).
Na educação superior transnacional a verificação da qualidade adquire novas questões acerca de: a) os códigos de boas práticas (se seriam suficientes), b) o lugar em que devem ser acreditados os provedores externos (país de destino ou de origem), c) os critérios de qualidade a serem exigidos (país de destino ou origem) e d) a necessidade ou não de criar organismos regionais ou internacionais para acreditação (ALTBACH; KNIGHT, 2007).
Perante esse cenário, as novas políticas e propostas surgidas nesta fase global da acreditação/avaliação da educação superior, pós AGCS são: as acreditações globais e regionais e a criação de agências, redes de agências e diretrizes8, que serão tratadas a seguir:
Acreditações globais e regionais
Como foi dito, após o AGCS e do desenvolvimento da educação transnacional, surgiu a ideia de criar um sistema de acreditação em nível global para garantia de qualidade da educação à distância.
Glenn Jones, que comerciava produtos educacionais, convocou uma reunião com interessados na acreditação e na qualidade de cursos à distância, em decorrência da qual, em 1995 surgiu a Global Alliance for Transnational Education (Gate). A Gate foi integrada por diversas instituições: ONG´s, empresas, organismos de garantia de qualidade e objetivava desenvolver processos de acreditação transnacional (UVALIC-TRUMBIC, 2006; VAN DAMME, 2002).
Segundo Blumenstyk e Mcmurtrie (2000) o conselho da instituição era composto por membros de instituições que davam credibilidade, especialmente membros de universidades ou de agências internacionais ou nacionais de acreditação9. Glenn Jonnes apoiou e financiou o grupo, embora também tenha havido fundos da Coca Cola (BLUMENSTYK; MC. MURTRIE, 2000). Chama atenção, na criação e desenvolvimento da Gate, a participação de entidades diversas: desde empresas comerciais até agências nacionais de acreditação e avaliação, incluindo ONG´s, fundações, organismos internacionais e universidades, coexistindo em pé de igualdade na tentativa de participar da regulação da qualidade da educação superior. Conforme a governança global da educação mostra, esses atores participam abertamente e não na forma de lobbies! (ROBERTSON; DALE, 2015a).
Ainda, a Gate elaborou uma pesquisa sobre comércio de serviços educativos a pedido da Organização Mundial de Comércio. Ela foi apresentada em Londres em 1996 e prestigiada por diversas instituições10 e, posteriormente organizou uma reunião paralela à Conferência Mundial sobre Educação Superior da Unesco, em 1998 em Paris, financiada pela OCDE (UVALIK TRUMBIC, 2006), em que participaram representantes da Fundação Soros (GINKEN; DIAS, 2006).
Mas, a Gate desandou, pois se tornou uma empresa do grupo de Glenn Jones, apresentou conflitos de interesses ao comerciar outros produtos enquanto acreditava cursos. Também, vários dos membros do conselho participavam de outras empresas do grupo e houve fraudes em acreditações (BLUMENSTYK; MCMURTRIE, 2000). “Finalmente a Jones Internacional transferiu suas funções para uma Agência Estadunidense de Educação a Distância, segundo Van Damme (apud GINKEN; DIAS, 2006), naufragando, assim, a ideia do “acreditador” global” (BARREYRO, 2017, p. 56)
Houve outras propostas como a de criação de um Registro de Qualidade Mundial, visando o reconhecimento de agências de acreditação com critérios globais que não foi adiante por restrições da Unesco, que teria que participar junto a outras associações sem fins lucrativos (VAN DAMME, 2002). Após dois Fóruns acontecidos em 2002 (Fórum OCDE/EUA e Fórum Mundial de Acreditação da Unesco), foi criada a Global Initiative for Quality Assurance Capacity11 (GIQAC) com financiamento do Banco Mundial e da Unesco com objetivo de apoiar o desenvolvimento de sistemas de acreditaçao em países em desenvolvimento, mediante a divulgação de conhecimentos e atividades acerca da garantia de qualidade. (UNESCO, 2008).
Por outra parte, em nível regional e com desdobramentos globais12, a emergência do Processo de Bolonha teve consequências para a educação superior e também para a acreditação/avaliação desse nível de ensino.
Com o objetivo de favorecer a circulação de pessoas e de contribuir à empregabilidade dos egressos europeus, o Processo de Bolonha (1999) adotou postulados da Declaração de Sorbone (1988) com a finalidade de constituir o Espaço Europeu de Educação Superior (EEES) até o ano 2010. Também pretendia concorrer com os Estados Unidos para atrair estudantes estrangeiros e se adaptar à Economia do conhecimento (LIMA; AZEVEDO; CATANI, 2008; DIAS SOBRINHO, 2005).
Propôs medidas para favorecer a comparabilidade e compatibilidade dos sistemas de educação superior nacionais, tais como: criação de dois ciclos de estudos: o primeiro de três anos de duração e que habilita para o mercado de trabalho e o segundo de pós-graduação em níveis de mestrado e doutorado; promoção da mobilidade acadêmica e a criação de sistema de créditos visando à mobilidade estudantil; equivalência de graus acadêmicos; criação de um suplemento ao diploma, explicitando as diferenças dos sistemas e, no que fiz respeito à qualidade, adoção de patamares comparáveis entre os sistemas nacionais.
Nesse contexto, tornou-se importante a acreditação, para fazer possível a comparabilidade, mas, sendo a educação uma atribuição dos Estados nacionais e não da União Europeia (UE) e sendo Bolonha desenvolvido por universidades e não pela UE e contando com instituições de fora da UE, outra estratégia foi elaborada (HIZUME; BARREYRO, 2018). Com efeito, em 2000, foi criada uma agência regional europeia: a European Association for Quality Assurance in Higher Education13(ENQA), promovida pelo Conselho Europeu, instituição que trata da integração em temáticas sociais. A ENQA foi organizada como uma ONG e segue a legislação belga, sendo sediada em Bruxelas, cidade que hospeda diversas instituições pertencentes à União Europeia (HIZUME; BARREYRO, 2018). Além de estar em Bruxelas, o que traz dúvidas sobre a sua independência, ela recebeu a solicitação dos Ministros de Educação da União Europeia para redigir diretrizes para atuação das agências nacionais ou subnacionais de acreditação. Em decorrência disto, surgiram as Standards and Guidelines for Quality Assurance in the European Higher Education Area14, elaboradas com a participação da European Association of Institutions in Higher Education15 (EURASHE), a European University Association16 (EUA),) e a European Students’ Union (ESU)17 e que foram aprovadas pelos Ministros em 2005. (HIZUME, BARREYRO, 2018)
Complementarmente, as agências nacionais e subnacionais devem passar por meta-acreditação dessa agência europeia ENQA para que as acreditações que emitam em nível nacional sejam válidas. É só após essa meta-acreditação que elas podem se cadastrar no European Register for Quality Assurance Agencies (EQAR)18, criado em 2004, sem o qual as acreditações não têm reconhecimento europeu (MICHAVILA; ZAMORANO, 2006).
O processo todo é de interesse para análise dos processos de governança globais em que não apenas participam os estados nacionais e organismos públicos. Vejamos: embora a acreditação seja conduzida em níveis nacionais com agências nacionais e, em alguns casos, sub-nacionais19, foram um conjunto de ONG´s (sediadas em Bruxelas, onde funcionam vários órgãos da Comunidade Europeia) quem estabeleceram os critérios, a pedido dos ministros de educação europeus. É uma ONG, a ENQA, que acredita essas agências nacionais e subnacionais (HIZUME; BARREYRO, 2018). Também, é outra ONG que cadastra essas agências. Portanto, se trata de uma rede de governança em que a escala regional delega a um setor não governamental: duas agências, o ajustamento aos critérios regionais. Agências que são legitimadas pelo seu conhecimento técnico e experto, portanto “neutro”. É dessa forma que opera a divisão escalar do trabalho (DALE, 2005), quanto à acreditação, induzindo políticas da escala regional para a escala nacional e, nesse caso, se valendo de ONG´s.
A peculiar experiência europeia não se repetiu na acreditação desenvolvida no marco do Mercado Comum do Sul (Mercosul). Iniciada a construção em 1993, foi em 2008 que vigorou o Acordo sobre a criação e a implementação de um sistema de acreditação de cursos de graduação para o reconhecimento regional da qualidade acadêmica dos respectivos diplomas no Mercosul e Estados Associados (Arcu-Sul). Pelo Acordo, cursos de universidades dos países membros e associados, dentre eles o Brasil passam por processo de acreditação regional. Os cursos são das áreas de Medicina, Agronomia, Veterinária, Enfermagem, Engenharia e Arquitetura, desde o projeto piloto de 2003 tendo sido acrescentados outros em ciclos sucessivos. Mas, a acreditação Mercosul, não em todos os países participantes, coincide com a nacional que consta de processos específicos. Ainda assim, o caso paraguaio mostra a influência da escala regional, pois a participação nos processos do Mercosul derivou na criação da agência de avaliação no país. (BARREYRO; HIZUME, 2018b)20
Em síntese, a escala regional contribui na indução de políticas em nível nacional (LIMA; AZEVEDO; CATANI, 2008) de diversas formas, como mostram os casos da União Europeia e do Mercosul
Agências, redes e guias/diretrizes
As agências de acreditação são órgãos importantes para a operacionalização dos sistemas de avaliação e começaram a serem criadas nos sistemas nacionais desde o começo da vigência do Estado Avaliador. Inspiradas no modelo estadunidense, divulgado pelos documentos do Banco Mundial e financiadas por este na década de 1990 em alguns países, continuaram a existir no século XXI, em diversas regiões e países na fase pós- Estado Avaliador, e até reformuladas algumas existentes como o caso da de Portugal para se adaptar às características requisitadas na escala regional (BARREYRO; HIZUME, 2018a). Requisitos para as agências são determinados por Guias de Diretrizes, que serão analisadas mais a frente.
Além da ENQA, a agência europeia antes mencionada, deve ser lembrado o papel do estadunidense Council for Higher Education Accreditation (CHEA).
O CHEA, uma instituição sem finalidade lucrativa, surgiu em 1997 com a finalidade de atuar na meta-acreditação das agências do país21, que são quem a financiam. Os processos de transnacionalização da educação superior têm gerado impactos e transformações no Conselho. A pesar de desenvolver um discurso contra a exportação de modelos de acreditação, especialmente do estadunidense, o CHEA criou um Guia para atuação de agências estadunidenses que operam em outros países acreditando cursos e instituições, na tentativa de fomentar uso de boas práticas e também de contabilizar essas agências e números de acreditações. (BARREYRO, 2017)
Contudo, as acreditações realizadas por agências de país diferentes do da instituição, também é um exemplo de indução de práticas em diversas escalas. Blanco Ramírez (2013) mostra o processo de acreditação de uma universidade mexicana que passou por acreditação de uma agência estadunidense o que derivou não apenas na transformação da instituição para se adequar aos patamares exigidos, mas também gerou consequências em outras instituições mexicanas que imitaram a acreditada.
Ainda, O CHEA criou um grupo de trabalho sobre Qualidade em nível internacional (CHEA International Quality Group), em 2012, integrado por experts na temática de diversos países e conduzido pela assessora internacional do CHEA, antes Unesco, Stamenka Uvalic-Trumbik. O grupo tem realizado encontros de divulgação e publicação de boletins sobre a temática (CIQG, 2014), abordando assuntos emergentes sobre qualidade (por exemplo: rankings acadêmicos, provas de resultados de aprendizagem, empregabilidade de graduados, cursos abertos a distância, etc.), e oferecendo serviços de consultoria.
Quanto à estratégia de rede de agências, ela permite mais flexibilidade do que instituições globais e contribui a divulgar as práticas de acreditação da qualidade da educação superior de forma mais sutil. Destas redes, a já mencionada INQAHE atua em nível global e atualmente faz também meta-acreditação de membros de sua rede de agências que voluntariamente decidem participar, além de encontros de divulgação.
Cabe mencionar também as redes regionais de agências, como a Rede Iberoamericana para a Acreditação da Qualidade da Educação Superior (RIACES) e a Rede da Zona do Caribe para a Garantia da Qualidade da Educação Superior (CANQATE), na América Latina (WELLS, 2014).
Na África, existe a Rede Africana de Garantia de Qualidade, surgida da Associação das Universidades Africanas e outras sub-regionais como o Conselho Interuniversitário do Leste da África o Conselho Africano e Malgaxe para a Educação Superior. Há planos de criar uma agência africana de acreditação da educação superior e projetos inter-regionais como o Conexão Qualidade Europa África (em cooperação com a Associação Europeia de Universidades) e a Estratégia Africana de Harmonização do Ensino Superior (WELLS, 2014).
Nos países árabes, há a Rede Árabe para Garantia de Qualidade da Educação Superior; a Associação das Agências de Garantia da Qualidade do Mundo Islâmico, do Conselho Árabe de Garantia da Qualidade, e a Rede Árabe de Garantia e Acreditação de Qualidade (WELLS, 2014).
Na Ásia-Pacífico tem-se a Rede de Qualidade da Ásia-Pacífico, a Rede de Reconhecimento Acadêmico da Ásia-Pacífico, com sede na Coréia do Sul, e a Rede de Garantia da Qualidade. (WELLS, 2014)
Essas redes regionais possuem características diversas, sendo que, em alguns casos, incluem agências nacionais e em outros universidades ou processos de acreditação. Mas, têm em comum a indução da acreditação da educação superior.
Outra forma de indução de políticas ou práticas de avaliação da qualidade mediante acreditação tem sido a de elaboração de Guias de boas práticas ou Diretrizes, disponibilizadas em acesso aberto orientando práticas e divulgando parâmetros a serem livremente utilizados.
A INQAAHE apresentou o Guidelines of Good Practice in Quality Assurance22 em 2003 visando orientar as agências de acreditação tanto para realizarem acreditações em seus locais de atuação como para, se desejarem, se submeterem a meta-acreditação. Foram atualizadas em 2006 e em 2016, acrescentando a acreditação transnacional.
O Guia da INQAAHE descreve as três atividades que são consideradas necessárias: a autoavaliação institucional, a avaliação externa e a divulgação dos resultados. Também lista requisitos que as agências devem cumprir para obter legitimidade, inclui especificidades da educação superior transnacional e seus critérios de qualidade. (INQAAHE, 2016)
Interessante notar que o Guia propõe um modelo de agência semelhante ao estadunidense, em que elas devem ser independentes do governo, pois estariam desenvolvendo questões técnicas, ignorando, contudo, que alguns Estados Avaliadores criaram agências dependentes dos governos: (França, Argentina e outros).
A Unesco e a OCDE desenvolveram as Guidelines for Quality Provision in Cross-border Higher Education23. Essas diretrizes, porém, foram assumidas apenas pela Secretaria da Unesco, pois a Conferência Geral, composta pelos países que integram a instituição não concordaram, sendo que os países do Sul se negaram a aprová-las na Assembleia Geral (UNESCO, 2005; GINKEN; DIAS, 2006), restando assim legitimidade à proposta (HARTMANN, 2010). Destinadas à educação transnacional, principalmente à distância, as Diretrizes promovem e orientam experiências de cooperação para garantia da qualidade e são orientadas a diversos destinatários e não apenas às agências de acreditação, incluindo, provedores, estudantes, governos e profissionais. Destacam o papel dos sistemas de acreditação nacionais, mas defendem sistemas governamentais ou não governamentais e colaboração entre país receptor e provedor de educação superior à distância. (UNESCO; OECD, 2005)
Além disso, como já foi mencionado, a agência européia (ENQA) elaborou os European Standards and Guidelines for Quality Assurance24 em 2005, destinados às agências dos países do EEES. Foram atualizadas em 2009 e 2015, respectivamente, sendo, para Wells (2014) são consideradas as mais completas e aceitas.
No documento, sugere-se às IES fazer políticas de garantia interna da qualidade, estabelecer patamares para os seus cursos, favorecer a capacitação docente, avaliar os estudantes com critérios públicos e desenvolver estratégias visando apoiar a aprendizagem dos estudantes (ENQA, 2005). No que diz respeito às avaliações externas, sugere que as instituições criem projetos próprios com patamares publicizados previamente. Também, devem ser considerados institucionalmente os resultados das avaliações e suas sugestões. Propõem avaliações periódicas e em ciclos. (ENQA, 2005).
Também se referem às agências de acreditação indicando que elas devem funcionar regulamente fazendo avaliações institucionais ou de cursos, contar com recursos, divulgar seus objetivos e sua missão e cumprir com a legislação do local em que funcionam, assim como serem reconhecidas oficialmente no Espaço Europeu de Educação Superior, cumprir com os requisitos jurídicos do local em que operam e prestar contas. Destaca-se que as agências devem atuar independentemente de governos, instituições de educação superior e ministérios (ENQA, 2005). Ainda são pautados os procedimentos para atuarem nas acreditações, sendo eles: autoavaliação, avaliação externa e confecção e divulgação de relatório. (ENQA, 2005)
Como indicado na análise, as Diretrizes postulam detalhadamente tanto as características quando os procedimentos das agências, mostrando assim como desde a escala regional é pautada a atuação na escala nacional, expondo assim a divisão escalar do trabalho.
Outras regiões também estabeleceram seus próprios guias indutores de avaliação tais como o Manual para a Garantia da Qualidade na Educação Superior, elaborado pelo Conselho Interuniversitário do Leste da África, em 2010, o Mecanismo Africano de Avaliação da Qualidade produzido pela União Africana (African Union), em 2013, o Curso de Treinamento e Manual de Garantia Externa de Garantia da Qualidade Externa, desenvolvido pela Association of African Universities e a UNESCO (WELLS, 2014.)
O Relatório Um guia para a garantia da qualidade nas universidades Árabes e o Relatório ANQAHE - DAAD - Melhorando a gestão da garantia da qualidade na região Árabe: as agências de garantia da qualidade, de 2009 são exemplos dos guias na região dos países árabes. (WELLS, 2014).
Em Ásia-Pacífico há os Princípios para a Garantia da Qualidade da Educação Superior na Região Ásia-Pacífico ou “Princípios CHIBA” e os Critérios para os membros da Rede da Qualidade de Ásia Pacífico, segundo Wells (2014).
Assim, as Diretrizes e Guias são uma forma de indução da política pela divulgação de pretensas questões técnicas da acreditação/avaliação, mas contribuem para a reescala das políticas de acreditação.
Considerações finais
O texto explicou, a partir do tratamento da questão da qualidade, como os processos de internacionalização/transnacionalização impulsionados pela globalização e o Acordo Geral de Comércio de Serviços, geraram políticas em diversas escalas e com diversos atores.
Assim a acreditação global atraiu empresas na sua criação e implementação e a acreditação regional, instituições regionais e ONG´s, mostrando a complexidade da governança da educação pelo envolvimento não apenas dos estados nacionais, mas de outras instituições.
Ainda, se explicou a atuação de agências de acreditação e de diretrizes diversas que divulgam e induzem à prática, os procedimentos para acreditação e avaliação da educação superior, surgidos na acreditação estadunidense.
Essas são novas formas de regulação que atuam em escalas globais. Outras que também envolvem a qualidade da educação superior, como os rankings internacionais e proposta de prova global para os estudantes são objeto de pesquisas e poderão acrescentar novas perspectivas à regulação da educação superior.