SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.44 número153Hombres en la educación infantil: miradas de sospecha e intentos de segregaciónFúlvia Rosemberg (1942-2014) índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Compartir


Cadernos de Pesquisa

versión impresa ISSN 0100-1574

Cad. Pesqui. vol.44 no.153 São Paulo jul./set. 2014

https://doi.org/10.1590/198053142856 

Outros Temas

Educação infantil e relações raciais: a tensão entre igualdade e diversidade

Educación infantil y relaciones raciales: la tensión entre igualdad y diversidad

Fúlvia Rosemberg1  2 

1Pesquisadora consultora da Fundação Carlos Chagas

2professora titular da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP; coordenadora do Núcleo Gênero, Raça e Idade - Negri


RESUMO

Este artigo tem porobjetivo tensionar as implicaçõesepistemológicas e políticas dos conceitos de igualdade/desigualdade e diversidade. Para tanto, focaliza as implicações de cada um deles no campo da educação infantil brasileira. O artigo, apoiando-se nos enfoques teóricos de Nancy Fraser e Antônio Flávio Pierucci, esboça um modelo para compreensão das desigualdades raciais na educação brasileira. Tais perspectivas teóricas são usadas para analisar normativas e padrões de oferta da educação infantil do ponto de vista das relações raciais.

Palavras-Chave: Igualdade; Diversidade; Educação Infantil; Relações Raciais

RESUMEN

El propósito del artículo es tensionar las implicaciones epistemológicas y políticas de los conceptos igualdad/desigualdad y diversidad. Por este motivo focaliza las implicaciones de cada uno de ellos en el ámbito de la educación infantil brasileña. El artículo, que se apoya en los enfoques teóricos de Nancy Fraser y Antonio Flavio Perucci, esboza un modelo para la comprensión de las desigualdades raciales en la educación brasileña. Tales perspectivas teóricas se utilizan para analizar normativas y estándares de oferta de la educación infantil desde el punto de vista de las relaciones raciales.

Palabras-clave: Igualdad; Diversidad; Educación Infantil; Relaciones Raciales

ABSTRACT

This paperaims to challenge epistemological and political implications for concepts of equality/inequality and diversity. For this it focuses on implications of both in the field of Brazilian early childhood education. Drawing upon Nancy Fraser's and Antônio Flávio Pierucci's theoretical approaches, the paper sketches a model for understanding race inequalities in the Brazilian education. These theoretical perspectives help us to analyze rules and patterns for offering early childhood education through race relations point of view.

Key words: Equality; Diversity; Early Childhood Education; Race Relations

Talvez uma das poucas certezas que nos permitem expressar na atualidade é que vivemos tempos... incertos. Vivemos um tempo no qual são frequentes e sistemáticos os questionamentos sobre certezas, verdades, interpretações - as metanarrativas - sobre o passado e o presente do universo, da terra, das sociedades humanas, do ser humano, bem como aquelas referentes a prognósticos lineares sobre o futuro.

Alguns diagnosticam que estaríamos vivendo uma nova era - a da pós-modernidade (LYOTARD, 1993) -; para outros(as),1 a modernidade não teria sido superada, e seu avanço não implicaria ruptura (HABERMAS, 1990); ou que a pós-modernidade seria apenas "um estado de espírito, mais do que uma realidade cristalizada (ROUANET, 1987); outros(as) enfatizam, ainda, que viveríamos uma época de transição (GATTI, 2005, p. 3).

No plano de produção do conhecimento, enfoques metateóricos e teorias são revistos: os prefixos "neo" e "pós" batizam correntes de pensamento contemporâneas que se entrechocam para oferecer a interpretação dominante de nossa época: pós-estruturalismo, pós-feminismo, pós-colonialismo, neomarxismo, neogramscianismo, entre muitos outros. Por vezes, a ruptura é assignada pelo adjetivo "crítico": a Pedagogia crítica, o multiculturalismo crítico são algumas das variadas formas de diferenciar o "tradicional" do contemporâneo, o passado do futuro neste labirinto de produções teóricas e propostas políticas atuais. O conhecimento anterior é relegado à condição de "tradicional" e propõe-se a ruptura de fronteiras disciplinares, do organizado, e parte-se para o uso do conceito de caos.

Essa produção teórica, que tenta flagrar e refletir sobre a complexidade de nossos tempos, parece-me, e a outros (CARLSON; APPLE, 2000), não apenas abundante como... complexa, intensamente abstrata para ser apreendida visando sua aplicação, dado o uso de novos termos e conceitos, seu emprego com múltiplos sentidos - veja-se, por exemplo, o termo "identidade", tão em voga nos debates sobre diversidade. Cada novo texto se inicia com uma introdução sobre os sentidos dos termos usados - diferença, diversidade, cultura, hibridismo, entre outros -, e, ao fim e ao cabo, chega-se à conclusão que são polissêmicos, polifônicos. Ou então criam-se "novos" neologismos.

Para nós, educadores e pesquisadores que frequentamos o "chão da escola", aí incluindo a pós-graduação, o fato de termos que destrinchar essas novas tendências (alguns falam em modismos) no campo das ciências humanas e sociais, incluindo a educação, solicita-nos grande investimento de tempo e energia, não somente porque tais debates têm estado pouco atentos à sua implementação nas práticas cotidianas e nas políticas, mas também porque estão sendo, majoritamente, produzidos e escritos nos idiomas ocidentais de países hegemônicos e referem-se, muitas vezes, a suas situações peculiares. Daí as observações de Barbosa Moreira (2001) quando destaca a distância entre a sofisticação teórica e seu impacto na prática escolar:

[...] o discurso [sobre currículos e multiculturalismo] elaborado no Brasil, nos anos 90, por seu caráter complexo e abstrato e pela escassez de proposições que oferece para os profissionais da educação, não chegou ainda a nortear novas práticas e reformas. (p. 118)

Além disso, essa ebulição não permanece circunscrita ao campo do conhecimento e do discurso, mas é instigada por e instiga outras práticas sociais, políticas e culturais: novas formas de comunicação e informação, novos arranjos familiares, novos movimentos sociais, novas religiões, novas formas de expressão artística, novas propostas educacionais etc. Parodiando Marx, "tudo o que parecia sólido e 'tradicional' se desmancha no ar".

E no meio desse burburinho inebriante, estamos nós educadores e pesquisadores. Mais do que isso: somos chamados a construir o "novo mundo", ou melhor, o "novo futuro para a humanidade", pois somos um dos "especialistas" que resta da modernidade a educar as jovens gerações. E é unânime, mesmo em tempos de incerteza, a posição central da educação em época de crise. Como dar conta dessa missão, já que o passado "se desmancha" no ar? Haveria algo de honrado, digno, "verdadeiro" no acúmulo de conhecimentos da humanidade que precedeu, e convive com esses tempos complexos e que poderíamos comunicar como legado às jovens gerações que estamos educando? Ou nossas incertezas são tão intensas que nos dificultam ou impedem amealhar um legado honrado e digno para as jovens gerações? Ou desistimos dessa função da educação escolar, aquela de sistematizar e transmitir conhecimentos acumulados pela humanidade que nos precedeu e por aquela que é nossa contemporânea? Selecionar, sistematizar, organizar e propor um núcleo de conhecimentos e práticas educacionais às novas gerações seria cometer o pecado do "universalismo"? Como partilhar do relativismo epistemológico, na formulação curricular para a educação, "sem esvaziar a educação de conteúdo"? (SACRISTÀN, 1996, p. 50).

Compartilho da posição daqueles que assumem, a despeito das intensas críticas que possamos efetuar à modernidade, que também acumulamos um legado cultural, ético, político e social que cabe também a nós, adultos, ser comunicado às jovens gerações que constroem sua crítica e superação. Desse legado destaco nossa comunidade humana a ser respeitada, bem como o direito de todos a uma educação escolar democrática e de qualidade, incluindo os bebês. Voltarei a eles adiante.

Texto na íntegra em PDF

REFERÊNCIAS

CANDAU, Vera Maria. Direitos humanos, educação e interculturalidade: as tensões entre igualdade e diferença. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 20, p. 45-56, 2002. [ Links ]

CURY, Carlos Roberto Jamil. Direito à educação: direito à igualdade, direito á diferença. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 116, p. 245-262, jul. 2002 [ Links ]

GATTI, Bernardete Angelina. Pós-modernidade, educação e pesquisa. Revista Psicologia da Educação, n. 20, v. 1, p. 139-151, 2005. [ Links ]

MOREIRA, Antonio Flavio Barbosa. A recente produção científica sobre currículo e multiculturalismo no Brasil (1995-2000) avanços, desafios e tensões. Revista Brasileira de Educação, n. 18, set./dez. 2001 [ Links ]

Recebido: Agosto de 2014; Aceito: Setembro de 2014

Creative Commons License This is an Open Access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution Non-Commercial License, which permits unrestricted non-commercial use, distribution, and reproduction in any medium, provided the original work is properly cited.