Introdução
Este artigo apresenta alguns resultados da segunda fase do Projeto Universal1 intitulado Mapeamento e estado da arte da pesquisa brasileira sobre o professor que ensina matemática, cujo objetivo principal é mapear, descrever e sistematizar as pesquisas brasileiras produzidas no âmbito dos programas de Pós-Graduação Stricto Sensu das áreas de Educação e Ensino da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), no período de 2001 a 2012, tendo como foco de estudo o professor que ensina Matemática (PEM). O projeto foi desenvolvido sob a coordenação do Prof. Dr. Dario Fiorentini, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (FE/Unicamp), e contou com uma equipe nacional de 32 pesquisadores brasileiros, dentre os quais as professoras pesquisadoras que integram o Grupo de Estudo e Pesquisa em Formação de Professores que Ensinam Matemática (GEPFPM/FE/Unicamp). A primeira fase do projeto consistiu no mapeamento de pesquisas brasileiras que tomaram o PEM como objeto de estudo e de análise, circunscritas ao período de 2001 a 2012. Foram levantados e fichados 858 trabalhos de pesquisa, sendo 588 trabalhos de mestrado acadêmico, 92 trabalhos de mestrado profissional e 178 trabalhos de doutorado2. A segunda fase do projeto consistiu na produção de estudos metanalíticos, com o objetivo de produzir sínteses e sistematizações acerca das pesquisas sobre o PEM.
Este artigo traz alguns dos resultados de um desses estudos da segunda fase. Mais precisamente, focamos os objetos investigados pelas pesquisas e os seus principais resultados, que articulam a formação inicial e continuada de professores que ensinam matemática.
Abordar a formação inicial e continuada de professores nas pesquisas selecionadas no presente artigo significa compreender a formação inicial e continuada do professor sob a perspectiva teórica de Cochran-Smith e Lytle (1999), que pressupõe diferentes ‘imagens’ da relação entre o conhecimento e a prática do professor e do próprio conhecimento do professor, relacionando-as à sua essência e à sua origem (MISKULIN, 2009). Consideramos os espaços coletivos de formação em que acontecem, ao mesmo tempo, situações que envolvem a formação inicial de alguns participantes da pesquisa e a formação continuada de outros. Para as autoras, nos espaços coletivos, acontecem aprendizagens compartilhadas, reflexões coletivas e aprendizagens docentes. Cochran-Smith e Lytle (1999) abordam a primeira concepção da aprendizagem do professor, baseada nas inter-relações entre o conhecimento e a prática, que devem ser pensadas como “conhecimento para a prática”, ao partirem do pressuposto, comumente aceito, de que os pesquisadores nas universidades geram conhecimentos e teorias que são legitimados pela comunidade acadêmica como teorias e conhecimentos formais para serem utilizados pelos professores das escolas, objetivando desenvolver e aprimorar a prática profissional desses professores. A aprendizagem do professor, quando concebida como aquisição de ‘conhecimento para a prática’, pode estar relacionada à concepção de que saber mais sobre conteúdos, metodologias, recursos didáticos, teorias de aprendizagens, estratégias de ensino, entre outros, orienta o professor a desenvolver uma prática mais eficaz. Tal concepção se sustenta no paradigma da racionalidade técnica.
Uma segunda concepção de aprendizagem do professor (COCHRAN-SMITH; LYTLE, 1999) é o ‘conhecimento na prática’, a qual postula que alguns dos conhecimentos mais essenciais no ensino são aqueles conhecidos como conhecimento prático ou os conhecimentos que ‘os professores competentes’ sabem, uma vez que estão imbuídos em suas práticas e/ou nas reflexões que fazem sobre elas.
A terceira concepção da aprendizagem do professor, baseada nas relações entre o conhecimento e a prática, envolve o conceito que as referidas autoras denominam de ‘conhecimento da prática’. Essa concepção não pode ser compreendida em termos de um universo de conhecimento que divide conhecimento formal de um lado e conhecimento prático do outro. Esse ‘conhecimento da prática’ é constituído pelos professores quando consideram suas próprias salas de aula locais propícios a uma investigação intencional, ao mesmo tempo em que entendem o conhecimento e a teoria produzidos por outros como uma possível fonte geradora de distintas interpretações e questionamentos. Assim, conforme as autoras citadas, os professores aprendem quando geram conhecimento local ‘da’ prática, trabalhando dentro do contexto de comunidades de investigação, refletindo, teorizando e construindo seu trabalho, de forma a relacioná-lo às questões sociais, culturais e políticas mais gerais (COCHRAN-SMITH; LYTLE, 1999, p. 250).
Ainda nessa mesma perspectiva, na concepção de ‘conhecimento da prática’, Cochran-Smith e Lytle (1999) consideram que o cerne dessa concepção é que professores e outros trabalhem em conjunto para investigar suas próprias suposições, seu próprio ensino, suas próprias expectativas e anseios, suas possíveis abordagens curriculares, assim como as políticas e práticas de suas escolas e comunidades.
Ao explicitar novos enfoques sobre a formação de professores, Cochran-Smith e Lytle (1999, p. 278, tradução e destaques nossos) consideram que a aprendizagem do professor, baseada nas inter-relações entre o conhecimento e a prática, concebida como ‘conhecimento da prática’, envolve aspectos fundamentais como a cultura das escolas, o próprio trabalho docente e a escola como instituição:
[...] “novas visões” de formação de professores e de desenvolvimento profissional têm emergido ao longo das últimas décadas. Da perspectiva do conhecimento da prática, estas novas visões encontram fundamentos nas explorações sobre as culturas das escolas, do trabalho docente e do local de trabalho dos professores. Elas sugerem que o que se faz necessário em termos de desenvolvimento profissional são oportunidades para que os professores explorem e questionem suas (e dos outros) ideologias, interpretações e práticas (Grimmett e Neufeld, 1994; Hargreaves e Fullan, 1991; Lieberman e Miller, 1994; Little, 1993; Little e McLaughlin, 1993; McLaughlin, 1993). Isto significa que os professores aprendem ao desafiar suas próprias suposições; identificando questões importantes da prática; propondo problemas; estudando seus próprios estudantes, salas de aula e escolas; construindo e reconstruindo currículo; e assumindo papéis de liderança e ativismo na busca da transformação das salas de aula, das escolas e das sociedades.
Com essas perspectivas, buscando compreender as articulações entre a formação inicial e continuada de professores que ensinam Matemática, no contexto das pesquisas do Projeto Universal, tomamos como base para a nossa análise as 178 teses de doutorado, por compreendermos que elas podem ser representativas do conjunto das pesquisas sobre o PEM. Inicialmente, organizamos as pesquisas de doutorado em contextos, conforme foi considerado na primeira fase do projeto:
Contexto | Ano | Total | |||||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
2001 | 2002 | 2003 | 2004 | 2005 | 2006 | 2007 | 2008 | 2009 | 2010 | 2011 | 2012 | ||
FI (1) | 1 | 1 | 2 | 2 | 3 | 1 | 5 | 8 | 6 | 11 | 8 | 15 | 63 |
FC (2) | – | 2 | 4 | 1 | 2 | 2 | 6 | 3 | 3 | 3 | 7 | 12 | 45 |
FIC (3) | – | 1 | – | 2 | – | 1 | 2 | – | 1 | 1 | – | 1 | 9 |
OC (4) | 3 | 1 | – | 1 | 4 | 6 | 10 | 5 | 13 | 6 | 4 | 8 | 61 |
Subtotal | 4 | 5 | 6 | 6 | 9 | 10 | 23 | 16 | 23 | 21 | 19 | 36 | 178 |
Fonte: Projeto Universal, 2017 Notas:.(1) Formação Inicial; (2) Formação Continuada; (3) Formação Inicial e Continuada; (4) Outros contextos e aspectos do PEM. Sinal Convencional utilizado: – Dado numérico igual a zero não resultante de arredondamento.
Notamos certa uniformidade na quantidade de pesquisas que consideram o ambiente de formação inicial e continuada conjuntamente, representando uma pesquisa por ano, em média.
Neste texto, discutimos quais os tipos de perguntas/questões investigativas evidenciadas nas pesquisas3 de doutorado – nove, ao todo – que tratam dos processos conjuntos de formação inicial e continuada (FIC) de professores que ensinam Matemática. Consideramos o período sob a perspectiva dos seguintes eixos: saberes e competências; atitudes, crenças e concepções; identidade e profissionalidade do PEM; formação, aprendizagem e desenvolvimento profissional do PEM; atuação, pensamento ou saberes do formador de PEM.
Tais eixos foram definidos durante a primeira fase do projeto e fizeram parte do formulário de fichamento das pesquisas. Foi necessário acrescentar a essa investigação um sexto eixo, que diz respeito às representações mentais e cognitivas do PEM, classificado na ficha pela categoria ‘outros’. Esses eixos caracterizam a pesquisa sobre o PEM e, portanto, podem ser considerados também neste artigo. Além desses, outros eixos foram destacados no formulário, como: cursos/programas/projetos de formação inicial e continuada, características e condições do trabalho docente do PEM, performance ou desempenho docente do PEM, história de professores que ensinam Matemática, história da formação do PEM. Entretanto, eles não foram considerados, pois não encontramos pesquisas de doutorado que tratem da formação inicial e continuada de PEM e sejam caracterizadas por esses eixos. Além das questões investigativas, apresentamos os resultados dessas pesquisas em relação a essas perguntas/questões.
Elencamos a seguir os trabalhos acadêmicos que dizem respeito à formação inicial e continuada do PEM, segundo os eixos apontados nos formulários de fichamento das pesquisas, já apresentados, destacando as questões de investigação e os resultados das pesquisas.
Saberes e competências
No eixo que trata dos saberes e competências de professores e futuros professores que ensinam Matemática, encontramos três pesquisas (JIMENEZ, 2002; SOUSA, 2004; ANDRADE, 2012)
A pesquisa de Andrade (2012, p. 11, destaque nosso) apresenta como questão de investigação:
Que saberes são mobilizados e/ou (trans)formados na aprendizagem da docência, situada em um contexto de trabalho (com)partilhado na atividade de estágio supervisionado de um curso de Licenciatura em Matemática? Que elementos atuam ou possibilitam a aprendizagem da docência e o desenvolvimento profissional nesse cenário?
O objetivo principal da pesquisa foi o de analisar as potencialidades de um trabalho (com)partilhado entre professores em exercício e futuros professores; os saberes e as reflexões desencadeadas nesse processo; e as contribuições para o estágio supervisionado, para a formação continuada e para o ideário de Matemática escolar desses atores. O pesquisador utiliza a disciplina de Estágio Supervisionado como um espaço para articulação entre a formação inicial e continuada de professores de Matemática. Como resultados, aponta:
[...] constatamos que o trabalho (com)partilhado ocorreu em vários níveis de interação e que dependeu muito do contexto escolar, das perspectivas, concepções, necessidades e/ou condições de trabalho do professor supervisor e da postura dos estagiários frente ao aprendizado da profissão que estavam propondo exercer, quando optaram pela Licenciatura em Matemática, o que, por sua vez, parece estar associado às perspectivas e concepções que cada um trazia até o momento da pesquisa. (ANDRADE, 2012, p.172).
Destaca, ainda, como resultado: “pode-se perceber como é fundamental a interação do professor-supervisor com os estagiários para que se consiga potencializar uma aprendizagem mais significativa da docência para os futuros professores e para delinear uma perspectiva de desenvolvimento profissional autônomo dos atores envolvidos” (ANDRADE, 2012, p.173).
Sousa (2004, p. 20, destaque nosso) busca investigar “que relações podem ser estabelecidas entre o conhecimento de professores e os conceitos algébricos enquanto vivenciam e analisam atividades de ensino numa perspectiva lógico-histórica da álgebra?”. Sua pesquisa foi realizada com um grupo de professores-alunos (professores e futuros professores do Ensino Fundamental) inseridos em uma disciplina de Didática no Ensino Superior. Os resultados indicam “que o lógico-histórico do pensamento algébrico se constituiu em atividade formadora de professores e de pesquisa” (SOUSA, 2004, resumo) e que
[...] as elaborações feitas pelos professores-alunos mostram ainda que há atividades de ensino que contribuem para que os professores-alunos façam relações mais gerais com a vida e o conteúdo, onde o afetivo com o objeto estudado vem à tona e trazem mobilidade ao sujeito que inicia um novo movimento com o seu próprio conhecimento de álgebra. Não há medo de se expor, dos sujeitos, nem mesmo de explicitar as dificuldades e perguntas frente ao desconhecido. (SOUSA, 2004, p. 273).
Relata ainda que
[...] há uma certa regularidade no modo de transformação dos sujeitos: a incomodação com a verdade, com o movimento e com a ambiguidade. É a partir dessa incomodação que a maioria dos professores-alunos se autolocalizam em seus desconhecimentos matemáticos e fazem relações tanto com o movimento mais geral de suas vidas como com sua vida profissional. (SOUSA, 2004, p. 277).
A investigação de Jimenez (2002, p. 66, destaque nosso) apresenta como questão de investigação:
Como professores de Matemática da escola e da universidade aprendem sobre a complexidade da prática docente nas escolas e sobre o processo de educação contínua de professores, num ambiente de mutualidade, partilha e trabalho colaborativo? Quais os significados partilhados pelos sujeitos? Como se dá o processo de troca e re-significação recíproca de saberes, idéias e práticas? Como se constroem novos saberes, na interação de professores escolares e acadêmicos?
A pesquisa foi desenvolvida com um grupo de pesquisa-ação em álgebra elementar. Como material de investigação, o pesquisador utiliza as narrativas/histórias de Matemática escritas por professores e futuros professores. Com relação aos resultados, destaca:
a investigação mostrou a importância da reflexão coletiva tanto para os professores escolares quanto para os acadêmicos. Além disso, quando foram levadas em conta, nesses encontros reflexivos, também as vozes dos alunos dos professores escolares, as discussões transformaram-se e enriqueceram-se grandemente e os processos de re-significação e de reciprocidade tornaram-se mais significativos. Mas os melhores elementos de reflexão e de re-significação de saberes e de reconhecimento/compreensão da complexidade da prática escolar do ensino da Matemática aconteceram quando os professores escolares produziram registros reflexivos sobre as argumentações dos alunos e estes foram objeto de discussão no Grupo. (JIMENEZ, 2002, p. 195).
As três pesquisas elencadas nesse eixo de investigação aconteceram no interior de grupos que congregam futuros professores e professores em exercício, em espaços institucionalizados (ANDRADE, 2012; SOUSA, 2004) ou não formais (JIMENEZ, 2002). As questões de investigação buscam analisar saberes, aprendizagens e conhecimentos de futuros professores e professores que ensinam Matemática partilhados no grupo, podendo ter um foco específico de conteúdo matemático em discussão, como é o caso da pesquisa de Sousa (2004), que enfatiza o conteúdo de álgebra.
Os resultados revelam contribuições e aprendizagens de professores e futuros professores da escola básica, ao partilharem conhecimentos expressos em relatos, registros reflexivos, narrativas/histórias de aulas, práticas compartilhadas e na interação com os professores-supervisores de estágio, o que permite concluir que, de fato, as pesquisas que tratam dos saberes e conhecimentos de professores e futuros professores reconhecem a importância da partilha, da interação, da aprendizagem com o outro, das práticas compartilhadas nos grupos de formação (disciplinas e/ou grupos). Representam indícios de conhecimento da prática, na perpectiva de Cochran-Smith e Lytle (1999), uma vez que reconhecem o papel da aprendizagem docente nas comunidades de investigação.
Atitudes, crenças e concepções
Neste eixo, que trata das atitudes, das crenças e das concepções de professores e futuros professores que ensinam Matemática, encontramos somente uma pesquisa – que aborda as atitudes (FARIA, 2006). Não encontramos pesquisas que investigam crenças e concepções de professores e futuros professores.
A pesquisa de Faria (2006, p. 20, destaque nosso) investiga: “as atitudes em relação à Matemática se modificam durante a formação e durante a profissionalização? Há diferenças entre as atitudes dos professores e as dos futuros professores em relação à Matemática?”. O ambiente de coleta de dados foram escolas e instituições de Ensino Superior. Foi utilizada a escala de atitudes em relação à Matemática para a coleta de dados (questionários, entrevistas, autobiografias). Como resultado, o pesquisador aponta que
[...] pode haver alguma relação entre as circunstâncias e a avaliação (favorável ou desfavorável) do objeto da atitude. Com efeito, as razões de escolha do curso superior, os fatores que dificultam o ensino da Matemática, as razões que levam a lecionar Matemática e os relatos autobiográficos que expõem as relações entre o sujeito e a Matemática revelam a possibilidade de haver alguma correspondência entre as atitudes para com a Matemática e as circunstâncias em que a pessoa se encontra em determinado momento da vida estudantil ou profissional. Nesse contexto há razões para supor que a atitude em relação à Matemática se modifica em decorrência das circunstâncias. (FARIA, 2006, p. 163).
Na questão de investigação, o interesse está centrado em investigar a atitude de professores e futuros professores em relação à Matemática. Os resultados não apenas revelam o quanto tais atitudes são influenciadas pelas circunstâncias temporais (vida estudantil e profissional) mas também contribuem para repensar os programas de formação inicial de professores, principalmente tendo em conta que “futuros professores devem estar cientes de que necessitam manter um desenvolvimento profissional” (FARIA, 2006, p. 169). Se, por um lado, reconhecemos a importância de o futuro professor e o professor serem os protagonistas de seu desenvolvimento profissional, destacamos os cuidados necessários para não culpabilizá-los ou mesmo responsabilizá-los unicamente por esse desenvolvimento. Há necessidade de pensar nas condições profissionais necessárias para que o professor aprenda ou mesmo se desenvolva.
Identidade e profissionalidade do PEM
No eixo que trata da identidade e da profissionalidade docentes de professores e futuros professores de Matemática, encontramos uma pesquisa (SOUSA, 2009), cujo foco está centrado na constituição identitária profissional do PEM. A pesquisa tem como objetivo: “identificar quais componentes do Projeto de Licenciaturas Parceladas contribuíram para a constituição identitária profissional docente e para a ressignificação da prática em sala de aula do professor de Matemática a partir do eixo ensino pela pesquisa” (SOUSA, 2009, resumo). As questões investigativas foram: “a) como as trajetórias pessoais e profissionais contribuem para a constituição da identidade profissional docente?; b) a proposta do ensino pela pesquisa trouxe mudanças na concepção de conhecimento e de prática no trabalho do professor de Matemática na sala de aula?” (SOUSA, 2009, p. 162. destaque nosso). O Projeto de Licenciaturas Parceladas é destinado a professores de Matemática em exercício que não possuam a licenciatura na disciplina. Dessa forma, a pesquisa analisa a proposta de ensino pela pesquisa sobre a prática do professor como eixo da formação inicial.
Os resultados apontam que
[...] o projeto não é o único configurador do ser docente, pois a trajetória de vida, o contexto regional são, também, configuradores da identidade profissional docente e que os cursos de formação inicial exercem um papel significativo na constituição da vida profissional do futuro professor e no processo de constituição da sua identidade profissional, fortalecida pelas experiências vividas em seu lugar de circulação, nesse caso, no espaço de formação no projeto de Licenciaturas Parceladas e no espaço de atuação profissional – as escolas. (SOUSA, 2009, resumo).
E demonstram também que, “para os entrevistados, a formação na Parceladas e o ensino pela pesquisa, mesmo diante de dificuldades, mostraram-se relevantes no sentido de contribuir para organização de seu trabalho, ressignificação da prática e para a constituição da identidade profissional docente” (SOUSA, 2009, p. 254).
Embora a pesquisa não apresente discussões centradas na profissionalidade docente e tenha um eixo centrado na constituição identitária profissional, aspectos dessa profissionalidade emergem nas entrevistas e nas práticas dos professores em formação. O projeto Licenciaturas Parceladas tem, em sua concepção, a possibilidade de formação inicial e continuada ao mesmo tempo. Dessa forma, podemos identificar na pesquisa de Sousa (2009) um importante resultado, que permite considerar que os aspectos da constituição da identidade profissional docente estão diretamente relacionados com a profissionalidade do professor e com sua formação na Licenciatura. Em uma perspectiva da relação com o conhecimento da prática, os contextos de formação, como a Licenciaturas Parceladas, possibilitam aos professores, embora em processos de formação inicial, uma formação continuada que toma a própria prática como contexto de estudo e de reflexão.
Formação, aprendizagem e desenvolvimento profissional do PEM
No eixo que trata da formação, da aprendizagem e do desenvolvimento profissional de professores e futuros professores que ensinam Matemática, identificamos duas pesquisas: Santos (2007) e Castro (2010).
Santos (2007, resumo, destaque nosso) buscou investigar: “quais as contribuições para a formação do professor de Matemática no Brasil frente à análise das teorias de P. Freire, U. D’Ambrosio e do processo de construção sócio-cultural do brasileiro?” O estudo é teórico e analisa as contribuições das teorias e dos estudos de Paulo Freire e de Ubiratan D´Ambrosio para a formação de professores que ensinam Matemática no Brasil. Não há destaque à formação inicial ou continuada. Na pesquisa, entende-se a formação de professores como um continuum, em que as duas modalidades, inicial e continuada, são feitas concomitantemente. Segundo demonstram os resultados,
[...] a formação do professor de matemática é vista como resultado de um processo histórico-cultural que mantém ainda uma forte herança de elementos de uma sociedade colonial, corroborado pela não participação democrática do povo brasileiro em seu processo de constituição sócio-cultural numa sociedade capitalista e excludente. E o trabalho demonstra que os atuais processos de formação de professor de matemática ainda são fortemente sedimentados numa formação alienada aos ditames de uma sociedade de classes, que não permite ao futuro professor compreender e fazer uso da necessária autonomia inerente à sua atuação, o que o faz atuar como um intelectual orgânico a serviço da consolidação da hegemonia da classe dominante. Nesse sentido, os constructos teóricos de P. Freire e de U. D’Ambrosio mostram-se como indicadores de encaminhamentos possíveis no processo de formação de um professor de matemática crítico/libertador e, por isso, consciente de sua tarefa como agente ativo na formação de um educando não especialista em matemática, mas inserido em sua realidade social como um sujeito transformador e em transformação, que encontra na matemática uma ferramenta para o processo dialético de sua própria construção. (SANTOS, 2007, resumo).
Dessa forma, a pesquisa traz resultados indicativos para a formação inicial e continuada do professor que ensina Matemática, sem abordar os aspectos da aprendizagem e do desenvolvimento profissional.
A pesquisa de Castro (2010, p. 23, destaque nosso) teve como questão investigativa: “Como se deu a confluência da experiência profissional com a formação acadêmica, identificando o processo de mobilização e ressignificação do trabalho docente de um grupo de professores que ensinam Matemática?”. Embora o estudo tenha sido realizado com professores em exercício (denominados, na pesquisa, de professores discentes), concluintes do curso de licenciatura em Matemática de 2004, as discussões remeteram tanto à formação inicial quanto ao contexto da prática profissional desses professores de Matemática. A pesquisadora construiu narrativas das trajetórias/histórias de formação dos sujeitos e analisou-as do ponto de vista da formação inicial docente e em uma perspectiva que se aproxima dos processos de desenvolvimento profissional docente.
Como resultado desse processo de reflexão, constata-se que houve um processo de mobilização e ressignificação do trabalho docente. De fato, a experiência profissional mobilizada na escola permitiu que professores discentes ressignificassem seu ofício com base na formação acadêmica. Espera-se, assim, colaborar com o aprofundamento da temática, a fim de que se possa melhor qualificar o trabalho do professor-formador – grupo de profissionais do qual esta pesquisadora faz parte – e, quiçá, propiciar aos egressos e discentes da Licenciatura de Matemática mais um aporte teórico sobre o fazer pedagógico do professor de Matemática em sala de aula. (CASTRO, 2010, p. 9).
Os resultados da pesquisa também remetem à ação da pesquisadora, formadora de professores, trazendo indicativos da necessidade de um trabalho colaborativo no interior das universidades que formam professores:
A Universidade deve, ainda, possibilitar aos professores formadores uma formação que considere a complexidade do conhecimento e sua aplicação com base nos interesses e necessidades formativas dos estudantes, bem como que o professor-formador exerça a autocrítica de suas ações. Para tanto, há de se considerar a necessidade de instituir a ação colaborativa no processo de trabalho na universidade. (CASTRO, 2010, p. 249).
Esse resultado está diretamente relacionado ao próximo foco de pesquisa, que trata da atuação e do desenvolvimento ou dos saberes do formador do PEM.
Finalizando as discussões desse eixo, podemos dizer que as pesquisas sobre formação inicial e continuada de professores que ensinam Matemática estão enfocadas nos processos de formação e de desenvolvimento profissional docente. Os processos de aprendizagem, muitas vezes, aparecem no foco que trata dos saberes e do conhecimento do professor, discutidos anteriormente.
Os resultados das duas pesquisas apontam indicativos para a reformulação de programas, projetos e cursos de formação inicial e continuada de professores que ensinam Matemática, tanto do ponto de vista dos aportes teóricos e concepções de cursos, como as teorias de Paulo Freire e Ubiratan D´Ambrosio, quanto do ponto de vista das relações/interações necessárias – colaborativas e compartilhadas – entre formadores de professores.
Atuação, pensamento ou saberes do formador do PEM
Neste eixo, destaca-se uma única pesquisa que aborda a questão do formador de professores que ensinam Matemática, em uma perspectiva que relaciona a formação inicial e a continuada: Roos (2007, resumo, destaque nosso) buscou investigar “quais (re)significações sobre formação docente em matemática são promovidas em formadores de professores por suas interações com professores e licenciandos em um grupo de estudos e discussões sobre o fazer docente em matemática?”. Os dados foram produzidos em encontros entre a pesquisadora e dois professores formadores que participaram de uma experiência em um grupo de formação que reunia licenciandos e professores.
Os resultados indicam as ressignificações produzidas pelos formadores:
[...] as interações ali ocorridas (grupo) me ensinaram que ser formador de professores não é apenas ensinar conceitos, conteúdos e metodologias de ensino, acreditando que aqueles que são formados por nós necessitam apenas se apropriar daquilo que nós defendemos e ensinamos. É um processo muito mais complexo. (ROOS, 2007, p. 118).
Percebo, também, que não é o bastante ter títulos ou participar de cursos de formação continuada, nem dominar técnicas e metodologias. É necessário ter desejo de refletir sobre nossa docência, problematizando-a e buscando meios de compreendê-la e melhorá-la constantemente. Embora nem sempre seja fácil ter coragem e humildade para rever e querer (re)significar concepções sobre formação e prática docente, posso afirmar que o desenvolvimento desta pesquisa trouxe contribuições significativas nesse sentido, não apenas para mim, mas também para os demais participantes da mesma [...] não basta promover espaços de interação apenas para levantar e discutir questões atitudinais ou procedimentais. É fundamental que façamos reflexões profundas sobre questões epistemológicas, cognitivas e pedagógicas que permeiam a área do conhecimento matemático. (ROOS, 2007, p. 119).
Reflexões e discussões que ocorreram no grupo das formadoras mostraram que, de certa forma, ainda temos muito presente uma visão simplista de formação de professores e do processo ensino-aprendizagem de matemática. Do mesmo modo, o convívio com professores e futuros professores de matemática, em um grupo de estudos, foi fundamental para perceber que ainda temos raízes positivistas; visões e raízes que, algumas vezes, nos impedem de visualizar questões de fundo epistemológico, questões necessárias para uma melhor compreensão de conceitos matemáticos, tanto para nós formadores quanto para professores e futuros professores de matemática [...] a interação com professores e futuros professores de matemática mobilizou, principalmente em nós, a certeza de que necessitamos do outro para (re)ver e melhorar nossa formação e prática docente em matemática. Ou seja, a participação de sujeitos pertencentes a diferentes lugares, com diferentes visões de formação, de ensino e de aprendizagem matemática serviu para mostrar que a reflexão e o trabalho coletivo podem ser uma estratégia poderosa de formação para todos, e, principalmente, para formadores de professores. (ROOS, 2007, p. 120-121).
Destaca-se nos resultados encontrados a importância da participação de formadores de professores em grupos que assumem uma experiência colaborativa e que possibilitam espaços para a ressignificação de todos os participantes: professores de Matemática, futuros professores e professores formadores. Os resultados de tais reflexões, como aponta a pesquisadora, trouxeram contribuições para se repensar o currículo da licenciatura e os processos de formação inicial.
Outros: representações mentais/cognitivas do PEM
Um dos trabalhos que tratam da formação inicial e continuada de professores que ensinam Matemática não pôde ser inserido em nenhum foco destacado na primeira fase do Projeto Universal. Trata-se da pesquisa desenvolvida por Kaleff (2004), classificada no foco ‘outros’.
Kaleff (2004, p. 85, destaque nosso) investigou
[...] de que forma professores de Matemática do Ensino Fundamental e Médio organizam representações mentais de conceitos geométricos, apresentados proposicionalmente em situações introdutórias ao aprendizado de conceitos geométricos não euclidianos? Em que medida os aspectos imagísticos inerentes ao processo de representação semiótica afetam o desempenho de adultos de cuja formação profissional os conhecimentos geométricos euclidianos são pressuposto, no desenvolvimento de uma atividade matemática introdutória aos conceitos geométricos não euclidianos?
Os dados da pesquisa foram produzidos por meio da aplicação de questionário e de entrevistas realizadas com professores de Matemática e com licenciandos.
Com relação ao eixo que investiga a formação de professores que ensinam Matemática, interessa-nos apenas o primeiro objetivo: “de que forma professores de Matemática do Ensino Fundamental e Médio organizam representações mentais de conceitos geométricos, apresentados proposicionalmente, em situações introdutórias ao aprendizado de conceitos geométricos não euclidianos?” (KALEFF, 2004, p. 85, destaque nosso). O interesse é por uma análise que envolva as representações mentais de conceitos geométricos por parte de professores e futuros professores quando estão em situações de aprendizagem de conceitos geométricos não euclidianos. Dessa forma, há um conteúdo específico implicado no processo de aprendizagem dos professores e futuros professores: conceitos geométricos não euclidianos. Vários são os resultados que a pesquisa oferece, do ponto de vista semiótico e de aprendizagem de conceitos geométricos. Um deles traz um eixo analítico interessante à formação docente:
[...] esta pesquisa aponta que seria necessário se voltar a atenção para atividades mais avançadas das Geometrias não euclidianas e do desenvolvimento de outras situações-problema, as quais permitam permear procedimentos relacionados às práticas matemáticas, visando a direcioná-las para o Ensino Médio. Para se formar professores mais capacitados a acessarem os novos conhecimentos geométricos, acredita-se que haja necessidade de se transformar a sua formação, considerando-se tanto os próprios conhecimentos geométricos, quanto os aspectos relacionados aos obstáculos cognitivos e à aquisição destes conhecimentos. (KALEFF, 2004, p. 337).
O trabalho de Kaleff (2004) discute as representações mentais e cognitivas do professor e do futuro professor que ensinam Matemática. A discussão sobre representações mentais do PEM é pouco explorada no campo de investigação da pesquisa sobre formação de professores que ensinam Matemática.
Considerações sobre a pesquisa
Um dos principais resultados desta pesquisa diz respeito aos eixos privilegiados de investigação. Os estudos que investigam a formação inicial e continuada de professores que ensinam Matemática, no período de 2001 a 2012, traduzidos em teses de doutorado, têm como eixos de investigação: os saberes e conhecimentos do professor e futuro professor que ensinam Matemática; atitudes de professores e futuros professores em relação à Matemática e sua aprendizagem; constituição da identidade e profissionalidade do PEM; formação e desenvolvimento profissional do PEM; pensamento do formador de PEM e representações mentais e cognitivas do PEM.
Os dados dessas pesquisas foram produzidos, na sua maioria, por meio de entrevistas, questionários ou narrativas/histórias de trajetórias em grupos que congregam futuros professores e professores que ensinam Matemática ou em disciplinas de cursos de formação de professores, como os Estágios Supervisionados. Isso evidencia que as questões de investigação estão diretamente relacionadas às possibilidades oferecidas pelo contexto. Se nesses espaços participam e interagem os diferentes atores, era esperado que os questionamentos fossem sobre saberes, atitudes, aprendizagem e conhecimento compartilhados pelo professor e futuro professor, bem como ressignificações de formadores sobre os processos de ensinar e aprender Matemática.
Os resultados também revelam implicações na formação do PEM, tanto na inicial quanto na continuada. Esse debate se torna importante principalmente no momento em que as novas diretrizes curriculares nacionais para a formação inicial e continuada dos profissionais do Magistério da Educação Básica são implantadas (BRASIL, 2015), nas quais se propugna uma articulação entre ambas as formações, cuja responsabilidade pela promoção está a cargo da instituição formadora:
[...] enfatiza-se, neste parecer, a organicidade no processo formativo e sua institucionalização ao entender que o projeto de formação deve ser elaborado e desenvolvido por meio da articulação entre a instituição de educação superior e o sistema de ensino e instituições de educação básica, envolvendo a consolidação de Fóruns Estaduais e Distrital Permanentes de Apoio à Formação Docente, em regime de cooperação e colaboração. (BRASIL, 2015, p.24).
Nessa perspectiva, Gatti (2016), no site oficial do III Congresso Nacional de Formação de Professores (CNFP) e XIII Congresso Estadual Paulista sobre Formação de Educadores (CEPFE) – “Profissão de Professor: cenários, tensões e perspectivas” –, traz uma reflexão importante sobre esses novos rumos que se abrem para a educação brasileira, pontuando que
[...] esses documentos [referindo-se, dentre outros documentos, às diretrizes a que aludimos] partem de dados e análises do cenário educacional atual e das pesquisas sobre formação, carreira de professores e condições de trabalho na educação básica, como também trazem em seu interior uma perspectiva filosófico-política para a educação nacional, considerando os variados contextos sociais e as diversidades socioculturais. Abrem perspectivas para políticas de ação futura que permitem vislumbrar possibilidades de mudanças na situação atual da educação brasileira, cujo quadro geral ainda mostra que estamos um tanto longe de oferecer formação escolar de qualidade para todos os brasileiros. Haverá um espaço de tempo para que ações derivadas dessas proposições normativas possam se efetivar e outro espaço de tempo para se avaliar as consequências dessas ações no cenário da educação escolar em geral e em suas diferentes etapas, na formação inicial e continuada de professores, em suas carreiras e remunerações e nas condições de trabalho nas escolas. Estas ações não serão desenvolvidas sem tensões ante o cenário social em que estamos imersos, tensões que já estão colocadas e tensões que serão geradas no curso de movimentos e dinâmicas políticas e sociais que sobrevirão. Que elas não prevaleçam de modo aleatório e sem que perspectivas lhes deem sentido, é o que se espera. (GATTI, 2016, p. 1).
Essas tensões apontadas por Gatti (2016) podem ser evidenciadas nas pesquisas destacadas no contexto da formação inicial e continuada, uma vez que seus resultados mostram reformulações nos processos de formação inicial, no âmbito dos cursos de licenciatura, quais sejam: a importância da articulação e do trabalho compartilhado entre o futuro professor (estagiário) e o professor da escola de Educação Básica na disciplina de Estágio Supervisionado (ANDRADE, 2012); a importância da interaçāo em grupos em que há conversas matemáticas para que professores e futuros professores autolocalizem seus desconhecimentos matemáticos e produzam conhecimentos coletivamente (SOUSA, 2004); a importância de reflexão coletiva entre professores e acadêmicos sobre a complexidade da prática escolar do ensino de Matemática (JIMENEZ, 2002); a possibilidade de haver alguma correspondência entre as atitudes para com a Matemática e as circunstâncias em que a pessoa se encontra em determinado momento da vida estudantil ou profissional, o que implica que futuros professores devem estar cientes de que necessitam investir em seu desenvolvimento profissional (FARIA, 2006); o entendimento do eixo do ensino pela pesquisa da prática profissional docente como um processo formativo relevante para auxiliar a organizar o trabalho, ressignificar a prática e constituir a identidade profissional docente (SOUSA, 2009).
As pesquisas destacam: as contribuições das teorias de Paulo Freire e Ubiratan D´Ambrosio para a formação inicial e continuada de professores, para a formação do PEM crítico/libertador (SANTOS, 2007); a necessidade de um trabalho colaborativo no interior das universidades que formam professores, possibilitando aos professores formadores uma formação que considere a complexidade do conhecimento e sua aplicação com base nos interesses e nas necessidades formativas dos estudantes (CASTRO, 2010); a reflexão e o trabalho coletivo como estratégia poderosa de formação compartilhada para todos e, principalmente, para os formadores de professores (ROOS, 2007). Para formar professores mais capacitados a acessar os novos conhecimentos geométricos, como as geometrias não euclidianas, é necessário transformar a sua formação, “considerando-se tanto os próprios conhecimentos geométricos quanto os aspectos relacionados aos obstáculos cognitivos e à aquisição destes conhecimentos” (KALEFF, 2004, p. 337).
Por fim, trazemos neste texto alguns conceitos evidenciados nos trabalhos acadêmicos que se aproximam dos conceitos principais de Cochran-Smith e Lytle (1999). No trabalho de Andrade (2012), destacamos o conceito de trabalho compartilhado, denominado atualmente “trabalho colaborativo” por muitos autores que abordam questões da formação de professores.
O conceito de reflexão coletiva, segundo Jimenez (2002), mostra a relevância de escutar e dar voz aos professores escolares, e, do diálogo entre os professores da universidade e os da escola, emerge a ressignificação da prática do professor. O referido autor, em sua pesquisa, aproxima-se do conceito de trabalho compartilhado, conforme as suas palavras, expressas em sua própria questão de investigação.
Como professores de Matemática da escola e da universidade aprendem sobre a complexidade da prática docente nas escolas e sobre o processo de educação contínua de professores, num ambiente de mutualidade, partilha e trabalho colaborativo? Quais os significados partilhados pelos sujeitos? Como se dá o processo de troca e re-significação recíproca de saberes, idéias e práticas? Como se constroem novos saberes, na interação de professores escolares e acadêmicos? (JIMENEZ, 2002, p. 66).
Entendemos, assim, que as pesquisas reconhecem a importância da partilha, da interação, da aprendizagem com o outro, das práticas compartilhadas nos grupos de formação (disciplinas e/ou grupos). Portanto, corroborando as ideias de Cochran-Smith e Lytle (1999), os professores podem aprender ao transformar as suas próprias salas de aula em ambientes de investigação, de reflexão e de ressignificação da própria prática.
Das pesquisas de Santos (2007) e Castro (2010), segundo o eixo da Formação, aprendizagem e desenvolvimento profissional do PEM, depreendemos outra concepção presente na postura investigativa defendida por Cochran-Smith e Lytle (1999): a fomação inicial e a continuada devem se constituir em espaços formativos que geram reflexão e compartilhamento de desafios e perspectivas sobre a prática docente; e, muitas vezes, nesses espaços, os professores percebem que “futuros professores devem estar cientes de que necessitam manter um desenvolvimento profissional” (CASTRO, 2010, p. 169). Por essa razão, corroboramos as ideias da autora: a formação de professores deve ser, sim, concebida como um continuum, interligando suas duas formas – a inicial e a continuada.
Com relação às articulações entre conhecimento para/na/da prática em cada eixo investigado, percebemos que nem sempre foi possível observar tal articulação, ou porque se tratava de uma única pesquisa, ou porque a própria natureza do conjunto de investigações não possibilitava reconhecer a articulação, mas sim a exploração de uma única perspectiva, como nos eixos de: “atitudes, crenças e concepções”, “formação, aprendizagem e desenvolvimento profissional do PEM” e “Outros”.
As pesquisas resultaram em indicativos para a reformulação de programas, projetos e cursos de formação inicial e continuada de professores que ensinam Matemática, tanto do ponto de vista teórico quanto de práticas de formação na perspectiva do conhecimento da prática (COCHRAN-SMITH; LYTLE, 1999).