Introdução
O estudo do crescimento do ensino secundário deve levar em conta as diversidades regionais que se ligam aos desiquilíbrios do desenvolvimento econômico e social do país. Assim é que, em 1960, os estados da região sudeste - Espírito Santo, Rio de Janeiro, Guanabara, São Paulo e Minas Gerais - concentravam 60% da matrícula total do secundário e 56,4% do total de estabelecimentos. (SILVA, 1969, p. 314).
A advertência de Geraldo Bastos Silva nessa epígrafe não pode ser ignorada no estudo histórico da expansão do secundário público no Brasil. De fato, o notável crescimento das matrículas e do número de estabelecimentos dessa modalidade de ensino ocorrido no país entre as décadas de 1940 e 1960 se caracterizou pela desigualdade regional, pelo crescimento marcante das escolas particulares e confessionais, pela atuação diferenciada dos poderes públicos em cada Estado e pela diferenciação social das oportunidades de acesso à educação de nível médio.
De acordo com Silva (1969), entre 1933 e 1942, as matrículas no secundário no Brasil se elevaram de 66 mil para 199 mil alunos e, em 1965, chegaram a 1.553.000 alunos. Não obstante, esse crescimento acelerado recrudesceu as desigualdades educacionais no país. Vale ressaltar a importância da iniciativa privada e a reação paulatina da iniciativa estatal em muitos estados. Enquanto o Sudeste concentrava a maior parte das matrículas e dos estabelecimentos do secundário, as demais regiões experimentavam um desenvolvimento acentuadamente menor. Isso pode ser constatado na comparação estabelecida por Silva (1969, p. 315) entre as regiões Nordeste e Sul, levando em conta o número de matrículas e a densidade demográfica:
O confronto entre as regiões Nordeste - onde incluímos os Estados da orla marítima, desde o Maranhão à Bahia, - e Sul - donde excluímos São Paulo - permite certas verificações interessante. As duas apresentam as porcentagens respectivas de 18,37 e 16,82 da matrícula total, e de 20,85 e 16,78 do total de estabelecimentos. A pequena superioridade do Nordeste decorre diretamente do maior contingente demográfico envolvido: 31,6% do total do país, contra 16,73% na região Sul.
Contrastando o Norte e o Centro-Oeste, o autor registrou “2,05% e 2,76% da matrícula de todo o país e 1,94% e 6,25% do total de estabelecimentos” (SILVA, 1969, p. 315).
As anomalias desse crescimento foram criteriosamente analisadas por Jayme Abreu, técnico do Departamento de Educação, uma década antes, em um estudo detalhado elaborado para ser apresentado no Seminário Interamericano de Educação Secundária, realizado em Santiago do Chile, em 1955, promovido pela Organização dos Estados Americanos. Analisando dados do IBGE, Abreu (1955) ressaltou a existência, em 1954, de 1.771 escolas secundárias no país, sendo 435 públicas e 1.336 particulares. Desse número, todas ofereciam o primeiro ciclo do secundário (o curso ginasial), enquanto apenas 714 (40,3%) ministravam o curso colegial (segundo ciclo). Além do total déficit dessa modalidade escolar na zona rural, Abreu (1955) sublinhou a concentração de escolas secundárias nas capitais em detrimento do interior dos estados, apontando a existência de um grande número de municípios brasileiros sem um só ginásio.
Os dois estudos mencionados anteriormente apontam como a interiorização do secundário no Brasil foi um processo desigual, lento e conflituoso. No estado de Pernambuco, como intentaremos demonstrar neste texto, tal processo ocorreu tardiamente, comparado a outros estados brasileiros, e contou com a participação de vários atores políticos e sociais, destacando-se a Campanha dos Educandários Gratuitos e a atuação expressiva dos municípios.
Até meados da década de 1940, havia em Pernambuco apenas dois estabelecimentos públicos de ensino secundário localizados no Recife: o Colégio Estadual de Pernambuco, considerado uma das mais prestigiosas escolas secundárias do estado, e o Instituto de Educação, que, embora especializado na formação de professores, também oferecia o curso ginasial e o colegial. A expansão dos ginásios se intensificou na década de 1950, mas se manteve em patamares insuficientes para atender à demanda social pela escola secundária. Em 1954, de acordo com o Serviço de Estatística do Ministério da Educação e Cultura, Pernambuco tinha 80 unidades de ensino ginasial particulares, seis unidades municipais e apenas três estaduais (BRASIL, 1955). Em 1958, segundo a Sinopse Estatística do Ensino Médio, havia no estado 116 cursos ginasiais mantidos por particulares, 16 municipais, cinco estaduais e um estabelecimento federal (BRASIL, 1959).
O crescimento dos estabelecimentos de secundário público e a interiorização dos ginásios oficiais ocorreram no estado a partir do final da década de 1950, intensificando-se no início da década de 1960. A análise desse processo inicial de expansão do secundário no estado de Pernambuco é o objetivo deste texto, que se fundamenta na Nova História Política nos termos propostos por René Rémond (2003), isto é, ocupando-se das relações de poder, mas levando em conta o sujeito, a cultura política e o “político” entendido como o lugar de gestão da sociedade. No Brasil, como salientam Ferreira (1992) e José Barros (2011), os caminhos dessa renovação historiográfica se encontram em plena discussão. Neste texto, partimos do entendimento de que a história política da educação se volta à compreensão das relações entre educação e Estado, entendendo o poder e suas manifestações não só como soberania do Estado, mas como um assunto social que afeta os sujeitos particulares e coletivos.
A história do ensino secundário em Pernambuco tem sido investigada na perspectiva da história das instituições educativas (BARROSO FILHO, 2008; LEAL, 2017; MENEZES, 2015; SOUZA, S., 2005). Ao propor uma análise de conjunto sobre o início da expansão do secundário público interrogando a atuação dos atores sociais e políticos, busca-se contribuir com o aprofundamento do conhecimento histórico sobre a democratização da educação secundária. Este estudo se ancora nas seguintes fontes documentais: Anais da Assembleia Legislativa de Pernambuco, legislação educacional, relatórios de governadores, projetos de leis de criação de ginásios, Sinopses Estatísticas do Ministério da Educação e Cultura e nos periódicos - Diário Oficial de Pernambuco e Cadernos Região e Educação do Centro Regional de Pesquisas Educacionais de Pernambuco.
A primeira parte do texto discorre sobre as iniciativas provenientes da sociedade civil e dos Poderes Públicos a fim de ampliar a oferta de cursos secundários no estado de Pernambuco, levadas a termo na década de 1940. A segunda parte trata da incipiente expansão e interiorização dos ginásios públicos, tendo em vista as iniciativas dos Poderes Públicos em âmbito estadual e municipal, e das disputas e debates travados na sociedade pernambucana acerca dessa expansão.
As lutas pelo secundário público em Pernambuco na década de 1940
Nos anos 1940, Pernambuco vivia sob um projeto educacional alinhado com o discurso político do Estado Novo, baseado no nacionalismo e no trabalho. Para Prado (1995), a relação vida-educação-Estado se constituiu em base para um discurso no qual a “verdadeira vida” seria a vida sob o Estado Novo, o educar para a vida significava educar para o Estado. A educação para a integração do homem à vida no Estado passava pelo compromisso com o trabalho e também pelo compromisso com o país, notando-se que o nacionalismo foi uma das categorias mais marcantes na ideologia do Estado Novo. O Brasil, nesse período, direcionou suas ações para um modelo de educação profissional, acompanhando as diretrizes do desenvolvimentismo de Getúlio Vargas. O Estado se voltou para a consolidação de uma indústria de base, investindo e modernizando economicamente o país, tornando-se promotor da industrialização e interventor nas diversas esferas da vida social (FERREIRA; DELGADO, 2003).
O Estado Novo em Pernambuco, segundo Almeida (2001), utilizou as políticas públicas para educação como instrumentos para a construção de um consenso e da legitimação social do regime inaugurado em 1937. A proposta educacional do Interventor Agamenon Magalhães esteve em sintonia com a proposta do Governo Federal, sob os auspícios de Gustavo Capanema, ministro da Educação e Saúde (1934-1945). Os princípios educacionais assumidos em Pernambuco tiveram caráter conservador sustentado pela Igreja Católica, como também as políticas estadonovistas direcionadas à educação profissional. Segundo o relatório de 1939, foi instaurado o ensino profissional em Pernambuco, que devia ser dividido em: Ensino Industrial, Ensino Rural e Ensino Doméstico. Cada uma dessas modalidades visava formar o novo brasileiro segundo as premissas nacionalistas do Estado Novo, além de defender que cada um ocupasse seu “local social”, fator crucial para a instauração da ordem desejada (ARAÚJO, 2014).
Vivia-se em Pernambuco um processo ativo de mudanças, fluxo migratório intenso, enorme êxodo rural, resultado de uma expansão dos centros industriais e comerciais, verificando-se novas condições de vida, o aperfeiçoamento técnico e o desejo de mobilização social (ARAÚJO, 2014).
Em 1943, ainda sob a égide do Estado Novo, foi criada a Campanha do Ginasiano Pobre (CGP), iniciativa do estudante Felipe Tiago Gomes somada a outros estudantes residentes na Casa dos Estudantes de Pernambuco, com a finalidade de pressionar os Poderes Públicos para promoverem a expansão do secundário. Posteriormente, a campanha passou a se denominar Campanha dos Educandários Gratuitos,1 transformando-se na Campanha Nacional de Escolas da Comunidade (CNEC), logrando abrangência nacional.
A mobilização dos estudantes pernambucanos em prol do ensino secundário foi intensa e constituiu um aspecto de grande relevância a ser considerado na história da educação nesse estado. Além da Campanha do Ginasiano Pobre, outro grupo de estudantes criou o Conselho da União dos Estudantes Secundários de Pernambuco, cuja instituição elegeu, no Congresso Anual de Estudantes Secundários, a nova diretoria que visava defender os interesses da classe em prol de ações para o acesso ao ensino secundário.2
A atuação dos estudantes mobilizou a opinião pública para o grave problema do secundário no estado. Não obstante, somente no início da década de 1950 os Poderes Legislativo e Executivo passaram a atuar de forma mais incisiva em relação à política educacional para o secundário, apresentando projetos de lei, criando ginásios e concedendo auxílios à iniciativa municipal.
Em 1945, com o fim do Estado Novo, o Brasil passava pelo processo de redemocratização, que marcou profundamente os contornos da sociedade. Essas remodelações políticas na sociedade brasileira tiveram reflexos na educação e novas disputas estavam postas no campo educacional em várias regiões do país. O cenário político de Pernambuco estava inserido em reajustamentos, como a mudança de regime político, a predominância política dos “coronéis” presente em um modelo democrático ainda frágil em meio à persistência de dispositivos ditatoriais e às práticas autoritárias (MATTA, 2013).
Segundo Barroso Filho (2008), os movimentos em defesa da criação de ginásios públicos ou gratuitos foram intensos na década de 1950 e estiveram vinculados às ideias de progresso e desenvolvimento em voga na sociedade brasileira, em que a educação passou a sobressair como fator decisivo para a superação da pobreza, da ignorância e do “atraso”, sendo propagandeada como remédio para superar os desequilíbrios econômicos e sociais do país. Entende-se, dessa maneira, como o ensino secundário, ainda muito elitizado no Brasil, tornara-se objeto de disputa e demanda de vários grupos sociais que viram no acesso aos cursos ginasiais e colegiais uma possibilidade de ascensão social.
Os dados estatísticos sobre o secundário no estado de Pernambuco são muito imprecisos, por isso os poucos registros apresentados neste texto são tomados como dados aproximados. Para o ano de 1945, um levantamento de dados realizado pela Divisão de Ensino Secundário do Departamento Nacional de Educação apontava a existência, em todo o país, de 538 ginásios e 289 colégios.3 Pernambuco tinha 37 unidades, sendo 20 estabelecimentos com o curso ginasial e 17 com os cursos ginasial e colegial (O ENSINO..., 1945, p. 283). Uma vez que havia apenas dois estabelecimentos públicos que ofereciam o secundário no estado, localizados na capital - o Colégio Estadual de Pernambuco e o Instituto de Educação de Pernambuco -, pode-se depreender que a maioria dos ginásios e colégios em funcionamento eram particulares, alguns localizados em municípios do interior, mas boa parte concentrada na região da capital (Recife).
Somente a partir de 1948 o Governo do Estado iniciou ações efetivas, embora ainda muito tímidas, para a ampliação do secundário público em Pernambuco. Uma dessas ações foi o acordo firmado entre o Governo do Estado e a União, na oportunidade da visita do Presidente da República a Pernambuco, quando foi assegurada a concessão de Cr$ 6.000.000,00 para a construção de 100 prédios escolares, de acordo com as plantas e especificações estabelecidas pelo próprio Ministério da Educação, que estimava em Cr$ 60.000,00 o custo de cada prédio. O Ministério exigia que os prédios fossem construídos nos municípios indicados no mapa geral elaborado pelo Instituto de Estudos Pedagógicos (Inep), tomando como ponto de referência o déficit da população em idade escolar.
Em relação ao ensino secundário, o acordo concedia o auxílio para a construção de três edifícios destinados ao ensino normal a serem edificados nos municípios de Afogados da Ingazeira, Floresta e Salgueiro. Tais recursos eram destinados à instalação de Escolas Normais Rurais funcionando sob o regime de internato e externato, mantendo ainda Cursos Práticos de Comércio. O acordo previa também um montante de Cr$ 600.000,00 para a construção de um prédio destinado ao primeiro ciclo do curso secundário, no município de Serra Talhada. O ginásio deveria ser instalado em uma área de 250 mil m2, construído de acordo com as especificações e plantas do Ministério da Educação, e manter um curso Prático de Comércio (PERNAMBUCO, 1951).
A criação do ginásio de Serra Talhada prevista no acordo mencionado mobilizou inúmeros debates entre os parlamentares. Deputados e representantes locais de vários municípios disputaram a instalação do ginásio oficial na sua localidade, propondo requerimentos e projetos de lei a respeito da localização do ginásio acordado com a União. Alguns exemplos, tomando como base os projetos de lei apresentados por deputados à Assembleia Legislativa, são denotativos desses embates. Por exemplo, o Projeto de Lei n° 110/1948 (PERNAMBUCO, 1948a), de autoria do deputado Diomedes Gomes Lopes (PSD), estabelecia a criação do Ginásio Estadual de Sertânia, enquanto o Projeto de Lei n° 112/1948 (PERNAMBUCO, 1948b), do deputado Metódio Godoi (PSD), indicava a criação do ginásio em Serra Talhada, como previsto inicialmente. Os dois projetos contemplavam a região do sertão, justificando a pobreza da região, a importância socioeconômica dos respectivos municípios e a carência de escolas nessas localidades.
Na defesa da instalação do Ginásio em Serra Talhada, o deputado Metódio Godoi argumentou:
[...] logo, por um dever de humanidade, ainda pela distância que separa aquêle rincão do nosso Estado de educandários equiparados e mais ainda o acendrado desejo que possui aquela gente sofredora, faz com que voltemos as nossas vistas para esses desprotegidos da sorte proporcionando-lhes meios de minorar a sua falta de sorte. E esta é uma oportunidade que se afigura bem própria para que levemos aos nossos irmãos distantes o apreço que eles bem merecem, preenchendo uma grave lacuna que é a falta de um colégio para aquelas bandas. (PERNAMBUCO, 1948c, p. 613).
Contudo o debate se estendeu na Comissão de Educação e Saúde para outras localidades, como a indicação para a criação do ginásio em Caruaru, discutida na Assembleia Legislativa:
O SR. PONTES VIEIRA - Sr. Presidente: não vejo necessidade de adiarmos a discussão do requerimento, que é apenas uma sugestão ao Governador para que localize o Ginásio Oficial a ser construído de acordo com a verba estipulada no recente convênio no município de Caruarú, município central que bem o merece. É uma mera sugestão ao Governador, que localizará se quiser e a aceitará a decisão da Assembleia se quiser.
O SR. MOURY FERNANDES - Sr. Presidente: adiantarei as palavras do deputado Pontes Vieira o seguinte: uma sugestão ao Governador, partida da facção majoritária desta Assembleia, é alguma cousa mais do que uma simples sugestão. Eu não me oporia nunca às pretensões de Caruarú, mas vejamos o resto do Estado: há na zona sertaneja cidades inteiramente desprovidas de estabelecimentos secundários e a instalação desse colégio poderia ser feita numa dessas cidades sertanejas. Caruarú tem o seu estabelecimento secundário em pleno funcionamento num edifício mais ou menos compatível com as suas necessidades. Essa é que é a verdade.
[.... ]
O SR. NILO COÊLHO - Sr. Presidente, desejava dar um esclarecimento rápido à casa. É que em conversa particular com o Ministro da Educação, tive um informe que, pode ser que tenha entendido mal, como sempre costuma acontecer, mas eu entendi que a localização tanto das escolas rurais, dos três ginásios e das duas escolas normais rurais obedecerão apenas à fornecidas pelo IBGE.
O Sr. Diocleciano Pereira Lima - V. Excia.., me permite um à parte?
O SR. NILO COÊLHO - Pois não.
O Sr. Diocleciano Pereira Lima - Mas isso não impede que a Assembleia sugira ao Governador uma outra localização.
O SR. NILO COÊLHO - Será uma sugestão imperante. Estou dando à Casa uma informação à guisa de esclarecimento; não é oficial, mas essa localização obedece a dados federais. Aliás, as escolas rurais, já destribuídas, não tiveram interferência do Executivo Estadual. (PERNAMBUCO, 1948d, p. 1333).
Possivelmente pressionado pelas elites caruaruenses, o governador Alexandre Barbosa Lima Sobrinho havia sugerido que a criação do ginásio oficial fosse em Caruaru. No entanto, alguns deputados acorreram em defesa das cidades sertanejas, constantemente desprivilegiadas nas políticas de distribuição de estabelecimentos públicos de ensino. A propósito, o deputado Pontes Vieira criticou a atuação dos deputados que pleiteavam, por razões de política eleitoral, criação de ginásios em diferentes municípios do interior:
O ideal seria que o Estado tivesse recursos para instalar dez ou doze ginásios no interior do Estado, porque verificamos que, cada deputado reivindica para seu município a localização do ginásio oficial. Ainda ontem V. Excia. (se referindo ao Deputado Pe. Luis Simões) defendia que o município primordial para a localização do ginásio seria Arcoverde, o deputado Metodio Godoi pretende que seja em Serra Talhada, o deputado Heráclio do Rego acha que deve ser em Limoeiro, o deputado Pedro Afonso acha que a localização ideal seria em Palmares [...] (PERNAMBUCO, 1948e, p. 1340).
O discurso da interiorização se pautava, portanto, na prática política populista dos deputados que, em nome do desenvolvimento regional dos municípios, justificavam a criação do ginásio oficial para seus redutos eleitorais. Alguns deputados criticavam abertamente a centralização do ensino nas zonas centrais do estado como Caruaru, Recife e Garanhuns, onde a escolarização era maior. Por exemplo, o deputado Pedro Afonso, da bancada Coligação Pernambucana, em diversas vezes nos debates em torno da localização das escolas, valeu-se do termo “proibitivo” para se referir à ausência de estabelecimentos em outras regiões: “Há municípios onde há proibição para sua mocidade educar-se”. Apesar de se contrapor à centralização dos estabelecimentos de ensino nas áreas litorâneas e mais desenvolvidas do estado, esse deputado apresentou, em 1948, um projeto de lei para a criação de um ginásio em Palmares utilizando os seguintes argumentos:
[...] o art. 141 da Constituição do Estado estabelece a obrigação que tem o Estado de auxiliar com os municípios a criação de estabelecimentos secundários oficias de ensino, Palmares, cidade das mais importantes e incontestavelmente a mais populosa e bem localizada na zona Sul (zona da mata) está situada no ponto central da ferrovia que liga Recife a Garanhuns cidade da qual dista 140 quilômetros. Não há nenhum estabelecimento de ensino secundário na região além de um ginásio para meninas na referida cidade de Palmares e em regime de inspeção preliminar. É, portanto, o local privilegiado para a criação de um estabelecimento. (PERNAMBUCO, 1948f, p. 1533).
O deputado utiliza argumentos exaltando a excelência da cidade, apresentando o orçamento de arrecadação que a cidade disponibiliza e demostrando que a Câmara Municipal já projetava discutir em breve um projeto de lei prestando o mesmo auxílio. Essa prática gerou uma posição contrária de alguns deputados na Comissão de Educação e Saúde, como podemos observar no pronunciamento do deputado Osvaldo Lima Filho (PSD) em referência ao posicionamento do deputado Pedro Afonso e demais deputados que argumentavam em defesa da criação de um ginásio em determinados municípios ressaltando a arrecadação municipal e a posição regional estratégica da localidade.
Não se trata aqui de interesses regionais, puramente locais, de pequenos municípios. Nós aqui, não iríamos reivindicar uma medida legislativa dessa natureza para um município pequeno, como por exemplo, Belo Jardim, que é aquele que represento, quando o município de Caruaru tem maiores possibilidades e poderia prestar maiores serviços. (PERNAMBUCO, 1948g, p. 1249).
Fato é que a questão regional esteve no centro dos debates políticos sobre a expansão do secundário público e consiste em dimensão relevante na análise da distribuição dos estabelecimentos oficiais de ensino em Pernambuco. A divisão do estado, de acordo com suas características fisiológicas e econômicas em vigência nos anos 1950 e 1960, estabelecida pelo IBGE, compreendia três áreas: o Sertão, o Agreste e a Zona da Mata. A região do Agreste e a Zona da Mata tinham alta densidade demográfica e economia em destaque nas produções pernambucanas. A Zona da Mata consistia em uma das regiões mais férteis e produtivas do estado, com economia baseada na agroindústria canavieira. O Agreste, localizado no planalto da Borborema (conhecido como chapada pernambucana), compreendia a região de transição entre o Sertão e a Zona da Mata, apresentando economia baseada na produção de cereais. Por sua vez, o Sertão, região de população mediana, apresentava menor desenvolvimento econômico, com predomínio da agricultura e pecuária, sendo uma região castigada pelas secas.4
A despeito dos debates travados na Assembleia Legislativa de Pernambuco, o ginásio oficial previsto no convênio entre o Governo do Estado e a União foi criado em Serra Talhada - Lei nº 507, de 25 de junho de 1949 (PERNAMBUCO, 1949a). No ano de 1948, foram apresentados vários projetos de lei para a criação de ginásios oficiais, resultando alguns deles em leis estabelecendo auxílio do governo estadual para que os municípios criassem ou mantivessem ginásios com a colaboração ou não da iniciativa particular. Por exemplo, a Lei nº 284, de 21 de outubro de 1948, estabeleceu auxílio ao Ginásio Municipal 3 de Agosto, da cidade de Vitória de Santo Antão, Zona da Mata: “Art. 1.º - Fica o Governo do Estado autorizado a conceder um auxílio de cento e cinquenta mil cruzeiros ao Ginásio Municipal 3 de Agosto, estabelecimento de ensino secundário oficial, da cidade de Vitória de Santo Antão.” (PERNAMBUCO, 1948h, p. 285). Na mesma data, foi promulgada a Lei nº 289, autorizando o Estado a conceder auxílio para o Ginásio de Limoeiro: “Art. 1.º - Fica o Poder Executivo autorizado a conceder um auxílio de vinte e cinco mil cruzeiros ao Ginásio de Limoeiro ocorrendo a despesa por superávit do atual orçamento.” (PERNAMBUCO, 1948i, p. 286). Outras iniciativas nessa mesma direção foram instituídas em Palmares e Arcoverde, conforme consta no Quadro 2.5
Ainda em 1948, o Governo do Estado instituiu normas para a subvenção dos estabelecimentos de ensino secundário e normal localizados em municípios do interior do Estado (Lei nº 372, de 24 de dezembro de 1948), iniciativa que assinala o quanto foi importante a ação dos poderes públicos municipais na expansão do secundário e como a iniciativa particular buscou apoio do Estado para manter escolas secundárias. A transcrição que segue, apesar de longa, detalha a legislação mencionada:
ART. 1.º - Fica estabelecido o regime de subvenção aos estabelecimentos de ensino secundário e normal, localizados em municípios do interior sob inspeção preliminar ou permanente dos governos da União e do Estado.
ART. 2.º - Os estabelecimentos de que trata o artigo anterior serão organizados nos termos da legislação federal como ginásios ou colégios e como escolas normais do primeiro ou do segundo ciclo.
ART. 3.º - O estabelecimento de ensino que pretender o regime de subvenção deverá formular o seu pedido ao Governo do Estado, acompanhado dos seguintes documentos:
a) - Prova de que se acha em regime de inspeção preliminar ou permanente;
b) - Prova de que se encontre em situação financeira que lhe não permite aparelhar-se eficientemente para ampliar a sua esfera na ação;
c) Demonstração de estado geral do educandário e das suas possibilidades.
ART. 4.º - Concedido o regime de subvenção, a Diretoria do estabelecimento adotará o plano de reformas julgadas necessárias pelo Departamento de Educação para sua execução imediata.
ART. 5.º - Serão os estabelecimentos em regime de subvenção, obrigados a manter:
a) - matrículas gratuitas a candidatos de comprovada pobreza que deverão importar em metade da soma fixada pelo governo, como subvenção anual;
b) - gabinete médico e dentário, para atender, sem nenhum ônus, aos alunos matriculados gratuitamente;
c) - biblioteca aparelhada de modo a satisfazer as necessidades do ensino;
d) - cooperativa de consumo, que fornecerá indistintamente, a todos os alunos, livros didáticos e material escolar por preço inferior ao do comércio e varejo. (PERNAMBUCO, 1948j, p. 298).
Os efeitos dessa medida foram ressaltados pelo governador Alexandre José Barbosa Lima Sobrinho, em mensagem apresentada à Assembleia Legislativa, em 15 de março de 1951 (PERNAMBUCO, 1951), na qual registrava os estabelecimentos favorecidos com subvenções do Estado: Ginásio São José, no município de Nazaré da Mata; Ginásio de Caruaru, sediado no município do mesmo nome; Ginásio Regina Coeli e Ginásio de Limoeiro, no município de Limoeiro; Escola Normal Rural Santa Maria, no município de Timbáuba; Colégio Santa Sofia, no município de Garanhuns; e também a Prefeitura Municipal de Barreiros no município do mesmo nome. Afirmava ainda o governador que, para tais subvenções, fora aberto um crédito especial conforme Ato nº 1.272, de 9 de abril de 1949 (PERNAMBUCO, 1949b).
Em suma, a criação e a subvenção de ginásios ocorrida em Pernambuco no final da década de 1940 foram frutos de disputas e lutas de vários atores sociais, dentre eles, vale ressaltar, a participação da Campanha dos Educandários Gratuitos, possibilitando educação para a população que não tinha condições de pagar mensalidades nos diversos ginásios particulares que havia no estado. Na década seguinte, a expansão do secundário ganharia notável impulso, particularmente pela iniciativa particular. No entanto, é preciso reconhecer a expressiva atuação dos municípios e do governo estadual, criando e apoiando ginásios públicos.
A lenta expansão e interiorização dos ginásios oficiais
Ygor Leal (2017) destacou o importante papel desempenhado pela imprensa na defesa da expansão e interiorização do secundário público no estado de Pernambuco. Em uma das muitas críticas tecidas pelos articulistas do Diário de Pernambuco, vale assinalar a nota publicada em 1953, sobre a relevância da criação do Ginásio de Ouricuri:
Pode-se, diante destas demonstrações, aqui, relatar as dificuldades que os pais de famílias enfrentam quando tentam educar um filho. As raras Bolsas Escolares concedidas não proporcionam o bastante para a educação de uma criança, vez que paga exclusivamente as taxas de ensino, enquanto o mais oneroso, como pensão ou internato, corre por conta do aluno. [...]. Se nos dermos o trabalho de proceder um inquérito sobre as possibilidades econômicas das famílias sertanejas, chegaremos a desoladora conclusão que 1% não dispõe de recursos para custear as elevadas somas, que teriam de despender com o internato de um filho. [...] Com o objetivo de estimular a educação no sertão, dando combate ao analfabetismo que tanto nos avulta, afastando uma vez por todas estas dificuldades que assoberbam os seus habitantes, é que propomos a edificação de um Ginásio na cidade de Ouricuri, a fim de possibilitar ensino acessível aos habitantes dos municípios de Bodocó, Araripina, Exu e Parnamirim, marcando uma nova era de progresso [...]. Já contamos com uma subvenção Federal, na importância de Cr$ 200.000.00 [...] resta agora, esperarmos pela ajuda do Estado [...]. (LEAL, 2017, p. 28-29).
Como foi ressaltado no jornal, a instalação de um ginásio no interior representava um enorme benefício para as populações sertanejas, que enfrentavam muitas dificuldades para arcar com os custos de manutenção dos filhos na capital ou em outras cidades onde haviam ginásios, arcando com os custos de manutenção de um internato e/ou mensalidades de escolas particulares. Na década de 1950, governadores de Pernambuco e demais atores políticos intensificaram ações em prol da interiorização do secundário.
No âmbito da Campanha Nacional de Educandários Gratuitos (CNEG), é importante sublinhar os subsídios financeiros concedidos pelo Governo Federal ao movimento, em 1951 (Lei nº 1.490/1951), beneficiando vários ginásios vinculados à campanha em diferentes Estados brasileiros. No estado de Pernambuco foi beneficiado o Ginásio Olavo Bilac, de Sertânia, conforme consta na legislação citada:
Art. 1.º - É concedido à Campanha Nacional de Educandários Gratuitos, com sede na cidade de Recife, Estado de Pernambuco, o auxílio de Cr$ 1.770.000,00 (um milhão, setecentos e setenta mil cruzeiros) destinado a custear a manutenção dos seguintes estabelecimentos de ensino: h) Ginásio Olavo Bilac, em Sertânia, Estado de Pernambuco....... 50.000,00. (BRASIL, 1951).
Posteriormente, em 1953, esse ginásio, sob a Lei nº 1.112, de 15 de novembro de 1953 (PERNAMBUCO, 1953), foi encampado pelo Estado, transformando-se em estabelecimento oficial com a denominação de Ginásio Estadual de Sertânia, sob a jurisdição da Secretaria de Educação e Cultura. No levantamento realizando na Assembleia Legislativa de Pernambuco (ALEPE), foi possível encontrar, até o momento, 30 projetos de lei relacionados ao ensino secundário propostos entre os anos de 1953 e 1963.6 Esses projetos de lei consubstanciaram em propostas de diversas naturezas: criação de cursos ginasiais, auxílio financeiro para a construção de prédios de ginásios municipais, subvenções, bolsas de estudos e abertura de crédito para as prefeituras realizarem a manutenção dos ginásios municipais. Dessa maneira, pode-se afirmar que prevaleceu em Pernambuco o hibridismo de políticas em relação ao ensino secundário.
O governador Etelvino Lins de Albuquerque, que esteve no poder entre dezembro de 1952 e janeiro de 1955, priorizou a questão educacional no Estado. Ele se preocupou com o enorme déficit escolar existente no interior e na capital do estado, configurado no número insuficiente de professores, de prédios escolares e materiais didáticos. Para superar essas deficiências estruturais da educação, foram firmados acordos entre o Governo do Estado e a União, por meio do Inep, possibilitando assim a construção de Grupos Escolares Rurais, Escolas Típicas Rurais, Escolas Regionais em todo o estado, instalados de preferência em municípios onde não existiam escolas em número suficiente. (PERNAMBUCO, 1955a).
Assim, durante seu governo foram concluídos, construídos e mobiliados inúmeros prédios escolares, e criados ginásios no interior, com auxílio de verbas federais. Em 1953, foi criado o Ginásio de Jaboatão (município vizinho ao Recife), estabelecimento de ensino público que iniciou suas atividades letivas em fevereiro de 1954. No ano seguinte, o Governo do Estado baixou o Decreto nº 263, de 21 de janeiro de 1955 (PERNAMBUCO, 1955b), autorizando o funcionamento de cursos de ensino gratuito, do 1º ciclo, na capital e no interior, subordinados à Secretaria de Estado dos Negócios de Educação e Cultura. A criação desse estabelecimento, e de outros que se seguiram, estava ligada às transformações do panorama socioeconômico do Estado. Os anos de 1950 significaram tempos de mudança em Pernambuco em diversas áreas, como a política e a economia. Como afirma Barroso Filho (2008, p. 81-82):
[...] a economia pernambucana já não ocupava a posição que fizera da Província um dos esteios da nação. A economia urbano-industrial oferece um novo suporte para a produção cultural e os arautos do Brasil Moderno exigiam uma nova cultura, uma nova educação, uma nova escola.
Esse período também foi marcado pela instituição de um Departamento de Ensino Médio (DEM) na Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco, que passou a coordenar, inspecionar e orientar técnica e administrativamente os estabelecimentos estaduais de ensino secundário, normal, industrial e artesanal, indicando, assim, a importância maior que o secundário foi progressivamente adquirindo no âmbito do sistema público de ensino. Ainda no início da década de 1950, surgiram os primeiros ginásios públicos nos subúrbios de Recife - o Ginásio Estadual de Beberibe e o Ginásio Dom Vital (no bairro de Casa Amarela), ambos criados em 1955. Esses “colégios de subúrbio” eram assim chamados como expressão diferenciadora dos “colégios de centro”, como o Ginásio Pernambucano e o Instituto de Educação de Pernambuco, identificados como instituições secundárias modelares (BARROSO FILHO, 2008).
Os dados da Tabela 1 evidenciam o número expressivo de unidades do ensino secundário comparado aos demais ramos do ensino médio, reafirmando o mesmo verificado para o conjunto do país, isto é, a preferência do alunado pela formação geral (cursos ginasial e colegial) em detrimento da formação técnica. Enquanto havia 125 unidades de ensino secundário no estado, o ensino agrícola contava apenas com três unidades, apesar da proeminência da agricultura na economia pernambucana. Outro aspecto importante a ressaltar é o pequeno número de conclusões do secundário, expressão marcante da elevada seletividade dessa modalidade de ensino médio.
Secundário | Comercial | Industrial | Agrícola | Normal | |
---|---|---|---|---|---|
Unidades | 125 | 26 | 14 | 03 | 45 |
Corpo docente | 1.803 | 325 | 122 | 28 | 460 |
Matrículas em 1956 | 28.097 | 3.311 | 750 | 208 | 3.230 |
Conclusões de curso em 1955 | 3.937 | 524 | 87 | 63 | 689 |
Fonte: Barroso Filho (2008, p. 4).
Apesar da expansão ocorrida durante a década de 1950, para Barroso Filho (2009, p. 103), a situação do ensino secundário pernambucano era ainda muito precária:
[...] Pernambuco estava muito distante de possuir uma rede pública de ensino secundário. A expansão da rede primária atuava como fator de pressão para implementação de uma efetiva rede de escolas públicas capaz de cobrir as necessidades de escolarização média da população do Estado, mas as ofertas existentes resumiam-se a um pequeno número de estabelecimentos oficiais que abrigavam uma população escolar ínfima diante do conjunto das crianças e adolescentes em idade de frequentar esse nível de ensino.
Vale também assinalar a diferenciação regional interna no processo de expansão, o qual ocorreu privilegiando a Capital e municípios próximos, permanecendo a população sertaneja distante de uma escolarização de nível ginasial.
A ampliação das oportunidades de escolarização secundária só viria a se consolidar no início da década de 1960. O governador Cid Sampaio ampliou as políticas de financiamento para a educação firmando um convênio com o governo norte-americano e instituindo o Serviço Educacional Aliança para o Progresso.7 Esse acordo previa a construção de um ginásio de dez salas em Jaboatão e outro no interior de Catende, localizado na Zona da Mata pernambucana. Foi concedido ao estado de Pernambuco o valor de Cr$ 132.500.000,00, aplicado a construções de prédios escolares e aquisição de mobiliário e equipamento escolar. Para a constituição de um fundo conjunto, a essa quota referida o Governo do Estado contribuiu com Cr$ 11.900.000,00. Além do plano de construções escolares, foi instituído um órgão de estudos, fiscalização e execução, constituído de engenheiros e técnicos - Comissão Coordenadora de Construções Escolares da Aliança para o Progresso - do Departamento de Obras e Secretaria de Viação. Dessa maneira foi possível, em menos de um semestre, por meio de uma ação intensiva, rápida e sistematizada, a edificação de 60 salas de aula, e, posteriormente, mais 250 salas distribuídas pela Capital e por todo o interior do estado (PERNAMBUCO, 1963).
Dados da Inspetoria Seccional do Ensino Secundário de Pernambuco, referentes ao ano de 1960, assinalaram a existência de unidades de ensino secundário no Estado, como podemos observar no Quadro 1.
Entidade | Nº de Estabelecimentos |
---|---|
Públicos | 32 |
Federal | 1 |
Estadual | 9 |
Municipal | 21 |
Autarquias | 1 |
Campanha dos Educandários | 21 |
Fonte: Elaborada pelas autoras deste artigo com base em Vasconcelos e Gonçalves (1961).
Na mensagem do governador, de 1963, consta a criação de ginásios estaduais no Estado:
a) Criação do Ginásio Estadual ‘Anibal Fernandes’, em um dos bairros mais populosos do Recife (Santo Amaro);
b) Funcionamento dos Cursos Clássicos e Científicos do Ginásio Estadual ‘Joaquim Nabuco’ no Recife;
c) Inauguração do novo prédio do Ginásio Estadual de Garanhuns, que funcionava com o título de Ginásio do Arraial no mesmo município;
d) Funcionamento do Ginásio Estadual de Salgueiro no sertão pernambucano; [...] (PERNAMBUCO, 1963).
É importante destacar a precariedade material e a falta de professores habilitados nesses ginásios públicos que funcionavam em prédios de grupos escolares ou prédios alugados e adaptados.
Considerações finais
Como buscamos argumentar neste texto, a expansão do secundário público no estado de Pernambuco foi lenta e contou com a participação de vários atores sociais e políticos, destacando-se, de modo especial, a Campanha dos Educandários Gratuitos, a ação dos municípios e deputados estaduais. Em relação às iniciativas do Poder Público estadual, pode-se dizer que essa atuação se caracterizou inicialmente pela suplência, concedendo auxílios e subvenções. Somente no final da década de 1950, e início década seguinte, a iniciativa estatal se consolidaria assumindo como prioridade a política educacional de criação de ginásios públicos em várias localidades.
A interiorização do secundário, atendendo os municípios longínquos da capital e do sertão, foi objeto de disputas e ocorreu gradativamente em sintonia com o desenvolvimento econômico do estado, reafirmando as desigualdades regionais.
Dialogando com a historiografia do secundário no estado e cotejando diferentes fontes documentais, algumas inéditas, como os projetos de lei apresentados pelos deputados e governadores à Assembleia Legislativa do Estado, além de levantamentos produzidos pelo Centro Regional de Pesquisas Educacionais de Pernambuco, os resultados de pesquisa apresentados neste texto reiteram a potencialidade do investimento investigativo sobre a história política da expansão do secundário no período de redemocratização do país, entre as décadas de 1940 e 1960, quando se intensificaram as oportunidades educacionais de nível médio. Em que pesem as limitações dos dados estatísticos disponíveis, o estudo confirma pequeno crescimento dos estabelecimentos e matrículas do secundário gratuito no estado.
Não obstante esse número limitado, e tendo em vista as condições precárias de instalação e funcionamento desses primeiros ginásios públicos nos subúrbios do Recife e nas cidades do interior, no sertão e no agreste, pode-se dizer que essas instituições educativas modificaram substancialmente o cenário educacional pernambucano e contribuíram de modo significativo para a ampliação da escolarização de centenas de adolescentes e jovens de diferentes classes e setores sociais. Sob o signo do prestígio, da distinção e das promessas de ascensão social, os ginásios públicos constituíram uma conquista árdua e paulatina para a sociedade pernambucana.
Os tortuosos caminhos da democratização do ensino médio nesse estado põem em questão a face simbólica e sociocultural das desigualdades educacionais no país e, por corolário, o reconhecimento do lugar estratégico da educação de nível médio, no passado e no presente, na necessária luta pela democracia e pela cidadania.