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Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade

versión impresa ISSN 0104-7043versión On-line ISSN 2358-0194

Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade vol.32 no.71 Salvador jul./sept 2023  Epub 22-Abr-2024

https://doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2023.v32.n71.p92-104 

Educação e aprendizagem da docência

APRENDIZAGENS DE TUTORAS SOBRE OS PROCESSOS DE ASSESSORAMENTO E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DE MENTORAS

APRENDIZAJES DE TUTORAS SOBRE PROCESOS DE ASESORÍA Y DESARROLLO PROFESIONAL DE MENTORES

Brenda Karla Reis de Carvalho1 

Doutoranda e mestra em Educação pela UFSCar. Graduada em Letras/Inglês pela UESPI. São Carlos, São Paulo, Brasil. E-mail: brendacarvalho@estudante.ufscar.br


http://orcid.org/0000-0003-1434-0017

Aline Maria de Medeiros Rodrigues Reali2 

Doutora em Psicologia pela (USP). Professora Titular do Departamento de Teorias e Práticas Pedagógicas (UFSCar). Editora da Revista Eletrônica de Educação (REVEDUC), vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UFSCar. São Carlos, São Paulo, Brasil. E-mail: alinereali@gmail.com


http://orcid.org/0000-0003-4915-8127

1Universidade Federal de São Carlos

2Universidade Federal de São Carlos


RESUMO

O escopo deste estudo foi analisar os conhecimentos construídos sobre o acompanhamento e o desenvolvimento profissional de mentores, na perspectiva de tutoras de umPrograma Híbrido de Mentoria (PHM). A pesquisa desenvolvida é do tipo exploratória de abordagem qualitativa. Os dados analisados são provenientes de narrativas de três tutoras/TT3 que atuaram como formadoras de mentores no PHM. O processo analítico foi inspirado nas técnicas da análise de conteúdo. O estudo das narrativas escritas revelou alguns elementos constitutivos da base de conhecimentos para tutoria: a escrita de feedbacks formativos e reflexivos; desenvolvimento de uma escuta sensível e empática; conhecimento acerca das demandas formativas das mentoras; reflexões sobre como ajudar as mentoras a construir autonomia; conhecimento sobre a importância da reflexão e acerca de como promover processos reflexivos; bem como sobre o poder da escrita de narrativas na formação/investigação de/com professores.

Palavras-chave: formador de docentes; aprendizagem profissional; base de conhecimento

RESUMEN

El objetivo de este estudio fue analizar el conocimiento construido sobre la tutoría y el desarrollo profesional de los mentores, desde la perspectiva de los tutores de un Programa Híbrido de Mentoria (PHM). La investigación desarrollada es de tipo exploratorio con un enfoque cualitativo. Los datos analizados proceden de las narraciones de tres tutores/TT3 que actuaron como formadores de mentores en el PHM. El proceso analítico se inspiró en las técnicas del análisis de contenido. El estudio de las narrativas escritas reveló algunos elementos constitutivos de la base de conocimientos para la tutoría: la escritura de feedbacks formativos y reflexivos; el desarrollo de una escucha sensible y empática; el conocimiento sobre las demandas formativas de los mentores; reflexiones sobre cómo ayudar a los tutores a construir autonomía; el conocimiento sobre la importancia de la reflexión y sobre cómo promover procesos reflexivos; así como sobre el poder de la narrativa en la formación/investigación de/con profesores.

Palabras claves formador de profesores; aprendizaje profesional; base de conocimientos

ABSTRACT

The scope of this study was to analyze the knowledge constructed about mentoring and professional development of mentors, from the perspective of tutors of a Hybrid Mentoring Program (HPM). The research is of the exploratory type with a qualitative approach. The analyzed data come from narratives of three tutors who acted as mentors’ educators in the PHM. The analysis process was inspired by content analysis techniques. The study of the written narratives revealed some constitutive elements of the knowledge base for mentoring mentors: the writing of formative and reflective feedback; development of sensitive and empathetic listening; knowledge about the formative demands of mentors; reflections on how to help mentors build autonomy; knowledge about the importance of reflection and about how to promote reflective processes; as well as about the power of narrative writing in the training/research of/with teachers.

Keywords: teacher educator; professional learning; knowledge base

Introdução

Este Educação e aprendizagem da docência é resultado de um estudo extensivo conduzido no programa de pós-graduação em Educação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). O Programa Híbrido de Mentoria (PHM)1, lócus da investigação, foi um programa de indução docente desenvolvido entre 2017 e 2020 na UFSCar em São Paulo - Brasil. O escopo do programa foi promover o desenvolvimento profissional docente de professores iniciantes e experientes. Nesta perspectiva, os professores experientes passaram por formações contínuas para servirem como mentores e auxiliarem os professores novatos no processo de inserção profissional.

Compreende-se que o início da docência, na perspectiva de Marcelo (2002), corresponde aos primeiros cinco anos de atuação. Constitui uma etapa do desenvolvimento profissional docente que possui características próprias e precisa de um olhar mais atento. Isto porque frequentemente, professores iniciantes se sentem solitários, inseguros e despreparados para o exercício do magistério (HUBERMAN, 2000; MARIANO, 2006; LIMA, 2007). Sob esta perspectiva, a mentoria pode ser uma oportunidade promissora para o apoio e desenvolvimento profissional de professores iniciantes e mentores. (REALI; TANCREDI; MIZUKAMI, 2008).

O PHM foi elaborado em uma perspectiva híbrida, pois envolveu a junção de elementos do ensino presencial e virtual (VAUGHAN, 2010). Além disso, buscou estabelecer vínculos mais fortes entre teoria e prática, bem como aproximar escola e universidade como espaços privilegiados de construção de conhecimentos (ZEICHNER, 2010; NÓVOA, 2019). Em âmbito virtual, o PHM teve por contexto o Portal dos Professores da UFSCar (Portal dos Professores (ufscar.br)), um portal que permite acesso a diversificados tipos de informações sobre educação, assim como viabiliza processos formativos a professores em diferentes etapas da carreira, elaborados por professores e discentes da pósgraduação da UFSCar. Em âmbito presencial, aconteciam reuniões semanais entre grupo de pesquisa do programa com as mentoras.

O PHM estava inserido em uma pesquisa intervenção, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Um dos pressupostos teóricos do programa era o construtivo-colaborativo, que concebe tantos conhecimentos de professores quanto de formadores relevantes para a construção e desenvolvimento da investigação (COLE; KNOWLES, 1993).” O programa contou também com a participação de tutoras, bolsistas de treinamento técnico nível três2 (TT3) da FAPESP, que acompanhavam o desenvolvimento das mentoras e processos de mentoria junto das iniciantes. Entre as funções realizadas pelas tutoras é possível destacar: interação com as mentoras por meio de feedbacks, o oferecimento de orientações, sugestões de materiais, trocas de ideias; faziam mediação, quando necessário, entre professoras iniciantes e mentoras; realizavam coleta, sistematização e análise de dados; ofereciam detalhes dos status das interações das díades (mentoras-professoras iniciante) a equipe de pesquisa; e apresentavam sugestões para o encaminhamento da pesquisa-intervenção. As tutoras que atuaram no programa foram selecionadas mediante avaliação da participação em um curso de formação prévia ao exercício do trabalho de tutoria, da metodologia da pesquisa, dos procedimentos de coleta e análise de dados.

Isto posto, o propósito deste trabalho foi analisar os conhecimentos construídos sobre o acompanhamento e desenvolvimento profissional de mentores. Na perspectiva de tutoras de um Programa Híbrido de Mentoria (PHM). Dada a contextualização teórico-metodológica do cenário da pesquisa aqui descrita, convém pontuar os aportes teóricos.

Concernente aos conhecimentos docentes, destaca-se que são construídos ao longo da vida em processos de aprendizagem contínuos (COLE; KNOWLES, 1993). Múltiplas situações e contextos podem se configurar em oportunidades de aprendizagem da docência. As etapas consagradas do desenvolvimento do professor são a socialização prévia com a profissão como aluno, a formação inicial, a indução docente e a formação continuada (VAILLANT; MARCELO, 2015). Esses processos envolvem diferentes fatores que podem influenciar na aprendizagem, incluindo cognitivos, afetivos, éticos, de desempenho, crenças e valores dos professores e do contexto em que atuam (COLE; KNOWLES, 1993).

Este Educação e aprendizagem da docência se apoia nos estudos de Shulman (1987), sobre a base de conhecimento para ensino. Assim, professores, em seus diversificados níveis de atuação, precisam apresentar uma base de conhecimento para o ensino, que consiste em um corpo de compreensões, conhecimentos, habilidades e disposições necessários para que o professor ensine. Essa base envolve conhecimentos de características distintas, essenciais para a atuação docente, porque está em constante construção e desenvolvimento. Inicialmente, é mais limitada, contudo, com os processos de desenvolvimento contínuos, torna-se mais aprofundada, diversificada e flexível (SHULMAN, 1986; 1987; MIZUKAMI, 2004).

O propósito dos estudos de Shulman (1986;1987), “é desenvolver um modelo explicativo e descritivo dos componentes que se encontram na base da docência, focando, em especial, como o professor transforma suas representações acerca dos conteúdos educacionais em ensino” (ALMEIDA et. al, 2019, p. 132). Nesse sentido, é possível perceber contribuições destes estudos para a aprendizagem da docência. De forma mais específica, a pesquisa aborda o conhecimento necessário para o ensino e os processos que envolvem a sua aprendizagem.

Os conhecimentos necessários ao ensino podem ser classificados em conhecimento do conteúdo específico, conhecimento pedagógico geral, conhecimento do currículo, conhecimento pedagógico do conteúdo, conhecimento dos alunos e suas características, conhecimento dos contextos educacionais, conhecimento dos fins, propósitos e valores educacionais. Tais categorias foram agrupadas em três, a saber: conhecimento do conteúdo específico, conhecimento pedagógico geral e conhecimento pedagógico do conteúdo. Esses conhecimentos assumem uma relação de interdependência e precisam ser articulados entre si para haver um bom ensino, pois isoladamente não são efetivos (SHULMAN, 1986; 1987).

O conhecimento pedagógico do conteúdo consiste no conhecimento do componente curricular que o professor leciona. Envolve domínio dos conceitos, termos, processos, procedimentos e das estruturas inerentes à disciplina. Abrange também as estruturas substantivas definidas como modelos explicativos de uma área do conhecimento; e as sintáticas relativas aos padrões que orientam a pesquisa nesta respectiva área do saber (SHULMAN, 1986; 1987).

O conhecimento pedagógico geral implica saber teorias e princípios relacionados aos processos de ensino e aprendizagem; as características dos alunos; os contextos educacionais; temas transversais; políticas públicas; currículo, dentre outros. É fundamental para um formador esse tipo de conhecimento, pois viabiliza o planejamento adequado ao contexto e conteúdo de forma alinhada ao assunto trabalhado e seus respectivos materiais e métodos de suporte (SHULMAN, 1986; 1987).

O conhecimento pedagógico do conteúdo é uma das categorias de maior interesse de pesquisadores. Visto que envolve entrelaçamento do “conhecimento do conteúdo e da pedagogia na compreensão, por exemplo, de como tópicos particulares, problemas ou assuntos são organizados, representados e adaptados aos interesses e às diversas habilidades dos aprendizes, nas situações de ensino” (ALMEIDA et. al. 2019, p. 134-135). Dessa maneira, o professor é peça central da construção do conhecimento pedagógico do conteúdo, cujo desenvolvimento é fundamental para os processos de aprendizagem da docência (MIZUKAMI, 2004).

O conhecimento é construído gradualmente e envolve algumas fontes provedoras. Isso inclui o conteúdo das áreas de conhecimento, materiais e estruturas organizacionais, literatura sobre os processos de escolarização, de ensino e aprendizagem, assim como ao desenvolvimento humano, bem como sobre os fundamentos normativos, filosóficos e éticos da educação. Além disso, a prática desempenha um papel fundamental na aprendizagem da docência, sendo os formadores responsáveis por promover a aprendizagem de outros professores (MIZUKAMI, 2004). É importante ressaltar que essa base de conhecimento do mentor pressupõe:

i. conhecimento do conteúdo específico para a mentoria - ou seja, o domínio das áreas referentes às necessidades formativas do iniciante, conhecer o que ele deve aprender; ii. conhecimento dos contextos formativos escolares; iii. conhecimento de processos de aprendizagem da docência para promovê-los em diferentes contextos sendo fundamental saber utilizar ferramentas que propiciem ao iniciante seu envolvimento em processos reflexivos; iv. conhecimento sobre políticas públicas educacionais, seus processos históricos de construção e suas bases teóricas; v. conhecimento pedagógico do conteúdo (SOUZA; REALI; 2020, p. 1918).

Embora a referência mencionada faça menção explícita à base de conhecimentos de mentor, é possível transpor tais definições para pensar a base de conhecimentos do tutor que contribui com a formação de mentores, uma vez que formadores são compreendidos como “todos os profissionais envolvidos nos processos formativos de aprendizagem da docência de futuros professores ou daqueles que já estão desenvolvendo atividades docentes” (MIZUKAMI, 2006, p. 3).

Aprender a aprender através de processos reflexivos sobre a experiência é essencial para o desenvolvimento profissional do professor. A prática pode ser um espaço rico de oportunidades para construção de conhecimentos. Assim como propõe Schön (1983), a prática não é mero lugar de aplicação de conhecimentos técnicos, pois isso significaria ignorar toda uma complexidade de situações específicas de cada contexto e a singularidade de cada experiência:

(...) é importante considerar, portanto, o conhecimento da experiência como uma categoria da base de conhecimento. A experiência está presente em todo o processo de raciocínio pedagógico e é condição necessária (embora não suficiente) para a construção do conhecimento pedagógico do conteúdo por parte do professor (TANCREDI; REALI, 2011, p. 42).

Obviamente, os conhecimentos técnicos e científicos são fundamentais e indispensáveis para o exercício profissional, contudo, não são suficientes para uma prática bem-sucedida e assertiva, isso porque, demandam reflexões que atribuam sentido à experiência da prática (SCHÖN, 1983).

Refletir sobre a experiência é um modo de atribuir valor às situações da vida. A reflexão se constitui, portanto, em um processo de produção de sentido entre uma experiência e outra, levando o indivíduo a estabelecer compreensões e relações entre teorias, ideias e vivências. Esse processo permite a continuidade da aprendizagem (RODGERS, 2002).

A reflexão pode ser construída com base na ativação do conhecimento na ação, um saber difícil de apreender e codificar, posto em ação em momentos de resolução de situações complexas da prática profissional que exigem mais do que conhecimento técnico.

O processo de reflexão impulsiona o profissional a se tornar mais consciente do que é tácito, perceber melhor sua prática, avaliar suas ações e redefinir seus significados, descobrir se seus referenciais estão coerentes com suas crenças e compreensões pessoais e até mesmo produzir novos conhecimentos a partir das reflexões (MARCOLINO, 2009, p. 18).

A reflexão na ação é uma forma rigorosa de pensar vinculada a uma ação rotineira que demanda uma outra ação qualitativamente diferente. Neste sentido, é um tipo de pensamento bem específico, voltado para a prática. Assim, a reflexão pode ter também um caráter mais intencional, quando o indivíduo reflete sobre sua prática posteriormente de forma organizada, sistemática e analítica, processo denominado de reflexão sobre a ação (SCHÖN, 1983; MARCOLINO, 2009).

À vista disso, os conhecimentos profissionais podem ser construídos em um movimento contínuo que envolve conhecimento técnico-científico e reflexão sobre a prática. Ressalta-se que os processos reflexivos devam ocorrer coletivamente com vistas ao crescimento individual e coletivo; ademais, pressupõe características individuais como mente aberta, sinceridade, disposição e curiosidade para aprender (RODGERS, 2002).

Metodologia e Procedimentos Metodológicos

A pesquisa qualitativa (BOGDAN; BIKLEN, 1994), do tipo exploratória (GIL, 2007), buscou analisar narrativas escritas por três tutoras que atuaram no PHM no intuito de conhecer os momentos marcantes (BOLÍVAR, 2002) que elas vivenciaram no programa, caracterizados por serem situações geradoras de aprendizagens. O critério de escolha das três participantes para realização da pesquisa foi o tempo de atuação como tutora no programa a saber: 24 meses entre os anos de 2017, 2018 e 2019 e a indicação da pesquisadora coordenadora do PHM.

Em relação ao perfil das participantes, destaca-se que a tutora Lúcia3 é graduada em pedagogia (2006-2010), mestre em Educação (2016-2018) e ingressou no doutorado na mesma área em 2019. A tutora Marina, é graduada em pedagogia (2016-2018), mestre em educação (2018-2019) e ingressou no doutorado também em educação em 2020. A tutora Eliza, é graduada em pedagogia (2010-2014), mestre em Educação (2015-2016), e ingressou no doutorado na mesma área no ano de 2018. Lúcia, teve experiências profissionais como professora na Educação Infantil, coordenadora em uma organização não governamental (ONG) e como professora estagiária no ensino superior no curso de pedagogia. Marina, atuou como tutora virtual em um programa que visava o diálogo intergeracional entre licenciandos, professores experientes e iniciantes. Eliza, por sua vez, não teve experiências profissionais prévias ao PHM.

Cada tutora recebeu dois roteiros para orientar a construção da narrativa escrita. A principal ferramenta para coleta dos dados da investigação focada neste Educação e aprendizagem da docência. O primeiro solicitava o preenchimento de uma linha do tempo, desenvolvida pelas pesquisadoras, para que indicassem, no mínimo, cinco momentos marcantes que vivenciaram no programa e que, de alguma forma, impactaram seus processos de aprendizagem profissional. Posteriormente, lhes foi enviado o segundo roteiro, que continha as perguntas orientadoras para construção da narrativa escrita. As questões do roteiro versavam sobre aspectos como: formação acadêmica, experiências profissionais, as características do PHM, trabalho de tutoria, além de solicitar que as tutoras construíssem a narrativa sobre os momentos marcantes indicados na linha do tempo. O contato com as participantes ocorreu por e-mail, exceto em algumas situações mais específicas de dúvidas sobre a construção da narrativa em que houve trocas de mensagens via WhatsApp.

Após o recebimento das narrativas, foram realizadas leituras iniciais com objetivo de ganhar familiaridade com as histórias narradas e esboçar as primeiras análises (BARDIN, 2004). Posteriormente, uma leitura minuciosa de cada narrativa foi empreendida para a verificação dos temas surgidos e escolha das unidades de análise. Para este trabalho foram escolhidos alguns excertos das narrativas que vão ao encontro do objetivo proposto: analisar os conhecimentos construídos sobre o acompanhamento e o desenvolvimento profissional de mentores, na perspectiva de tutoras do PHM. O processo analítico teve por base teórica as contribuições de Bardin (2004) sobre análise de conteúdo. As análises dos excertos permitiram desenvolver um eixo analítico: a construção de conhecimentos sobre os processos de assessoramento e desenvolvimento profissional de mentoras. A próxima seção dedica-se a demonstrar as análises empreendidas acerca das narrativas.

Análises e discussões: a construção de conhecimentos sobre os Processos de Assessoramento e Desenvolvimento Profissional de Mentoras

O trabalho realizado pelas tutoras envolvia, predominantemente, a proposição e acompanhamento das atividades realizadas pelas mentoras no AVA, a indicação de textos e encaminhamentos que pudessem colaborar com os processos de desenvolvimento profissional das mentoras e que contribuísse com o apoio dado aos iniciantes. Neste sentido, é possível inferir que as tutoras puderam construir conhecimentos específicos acerca dos processos que permeiam o desenvolvimento profissional das mentoras no PHM. Considerando que a prática é um espaço privilegiado para construção de aprendizagens (SCHÖN, 1983; RODGERS, 2002), as narrativas sugerem que o exercício da tutoria fomentou o desenvolvimento profissional de formadoras, categoria profissional do tutor.

Cada mentora tinha a tarefa de escrever em seu diário reflexivo sobre as atividades do PHM e da escola em que atuava. Era função da tutora escrever feedbacks a esses diários. Essa não era uma tarefa fácil, pois embora tivessem tido uma formação inicial que orientou acerca da escrita de feedbacks, foi bem desafiador para Lúcia:

Sempre me questionava se as questões que eu colocava nos meus feedbacks contribuíam para o processo formativo das mentoras. Fui ganhando maior confiança à medida que elas escreviam que eu estava colaborando com o trabalho delas de alguma forma (Narrativa Escrita, Lúcia, 2020)

Me lembro que um dia, após a reunião presencial, falaram que a expectativa delas era fazer feedbacks para as suas PIs [professoras iniciantes] semelhantes com aqueles que eu dava, porque eram bem escritos e as tranquilizava. Aquilo me acalmou muito! Que bom que os meus feedbacks traziam conforto, questionamentos, etc. (Narrativa Escrita, Lúcia, 2020, grifos nossos).

Lúcia indica que havia uma preocupação de sua parte sobre o aspecto formativo do feedback para o desenvolvimento das mentoras. O feedback formativo é um tipo de resposta repleta de informações e conhecimentos direcionado a uma ação que tem por objetivo sugerir mudanças de comportamento ou pensamento com vistas a melhorar o aprendizado. Deste modo, sugere-se que seja oportuno, específico e ofereça apoio sem caráter avaliativo (SHUTE, 2008).

Para Lúcia, a boa avaliação do seu trabalho, aferida pelas mentoras, contribuiu para que desenvolvesse mais confiança no momento da escrita. Outro ponto importante a destacar é o movimento de reflexividade demonstrado por Lúcia ao questionar sobre a efetividade de seus feedbacks em relação aos processos formativos das mentoras (SCHÖN, 1983; MARCOLINO, 2009). A reflexão pode ter contribuído para que Lúcia analisasse sua escrita de forma mais direcionada e assertiva. Dessa forma, para escrever os feedbacks, as tutoras precisavam conhecer amplamente os processos de mentoria realizados pelas mentoras junto aos professores iniciantes, conhecer e ajudar a desenvolver as atividades realizadas para as mentoras com as pesquisadoras do PHM, assim como era fundamental ter uma boa comunicação.

Interessante pontuar que as mentoras - que Lúcia acompanhava - utilizavam os feedbacks da própria tutora como modelo para construírem os feedbacks que deveriam oferecer às professoras iniciantes. Neste aspecto, a tutora teve sua escrita retificada pelas mentoras como um trabalho bem realizado e que trazia conforto - provavelmente devido a algumas situações de tensão que as mentoras vivenciavam nos processos de mentoria (SILVA, 2020). O trabalho da tutora se tornou um modelo para as mentoras que assessorava.

Outro conhecimento perceptível a partir das narrativas foi sobre o desenvolvimento de uma escuta sensível e empática para com as mentoras. Ao se preocuparem em manter o contato com elas, questionando se estavam precisando de ajuda e relembrando as tarefas que deveriam fazer:

Devido à ausência de alguns mentores nas reuniões presenciais, essas mensagens [aquelas enviadas às mentoras] eram bastante úteis e necessárias para informarem como a atividade deveria ser feita e qual seria o prazo de postagem no ambiente virtual. Muitos mentores nos davam o retorno de que essas mensagens eram imprescindíveis, pois eles se esqueciam e/ou se perdiam em sua execução e prazo final (Narrativa Escrita, Eliza, 2020, grifos nossos).

Eliza menciona que, a partir de uma experiência vivida com um mentor, teve uma nova compreensão acerca de sua abordagem como tutora. Este mentor apresentou dificuldades em cumprir as tarefas propostas e em auxiliar a professora iniciante em suas demandas, exigindo da tutora uma postura diferenciada:

Diante de toda essa realidade vivida com este mentor, posso afirmar que aprendi a ser mais firme nas solicitações e “cobranças”, procurando compreender ainda mais o contexto de atuação do professor para além da mentoria. Acredito que todas as vivências do mentor influenciam em seu trabalho na escola, bem como na mentoria e, portanto, considero ser importante conhecer e compreender os aspectos que o envolvem. Isso, com certeza, faz parte de um bom relacionamento e acompanhamento do mentor (Narrativa Escrita, Eliza, 2020).

Nesse sentido, é possível inferir que a tutora aprendeu a desenvolver um posicionamento mais empático em relação ao modo de se reportar ao mentor ao inferir que é preciso considerar todos seus contextos de atuação, não só a mentoria. Para a tutora, o desenvolvimento dessa postura foi essencial para o seu trabalho e possivelmente para o desenvolvimento do mentor. Destaca-se que Eliza enfatiza a importância desse posicionamento para manutenção de boas relações interpessoais e para os processos de assessoramento. Sobre esta interface da aprendizagem da docência vale destacar que:

Nas profissões de desenvolvimento humano, o desempenho profissional é interativo, isto é, o trabalho com pessoas é feito através da interação com essas mesmas pessoas, sendo essa interação o meio e parte significativa do próprio conteúdo do desempenho. Assim, a vontade, o afeto e a emoção, e a inteligência destas mesmas pessoas são um fator natural do sucesso (ou insucesso) da intervenção (FORMOSINHO, 2013, p. 16).

Isto posto, a aprendizagem de Eliza parece estar relacionada com um aspecto importante do ensino: a interação humana, assim como as características cognitivas e emocionais que lhes são inerentes. Portanto, esses fatores demonstram ser essenciais para o desenvolvimento efetivo das intervenções.

Aprender a conhecer as demandas formativas das mentoras e a formas de potencializar as aprendizagens parece ter sido uma aprendizagem significativa para tutora Lúcia:

Referente às mentoras, também noto a importância de a cada semana abordarmos com elas temas que geraram dúvidas, ficaram em aberto, provocaram dificuldades, etc. De fato, esse modelo [currículo aberto baseado nas demandas formativas apresentadas] demanda muito mais trabalho, tempo e parceria de toda a equipe, mas demonstra ser muito mais significativo ao processo formativo (Narrativa Escrita, Lúcia, 2020, grifos nossos).

Ainda sobre as demandas formativas das mentoras, Lúcia destacou um episódio que lhe provocou reflexões acerca de seu trabalho como tutora:

N 4 teve - se não me engano - três tutoras: P, C e eu. Na entrevista, [realizada em 2019 pelo grupo de pesquisa PHM para com as mentoras] ela elogiou o trabalho de todas e afirmou que cada uma tinha uma maneira de fazer o feedback. Afirmou ainda que quando começou a fazer os seus feedbacks para as PIs [professoras iniciantes] se inspirava nos modelos adotados por suas tutoras. No início, fazia parecidos com os meus. Depois passou a realizá-los semelhantes aos da P (retomando frases das narrativas com algumas questões) e percebeu que surtiu mais efeito com as PIs. A sua fala me trouxe a sensação de que ela tinha maior afinidade com esse outro tipo de feedback. Percebi, naquele momento, que com a N eu poderia ter escrito feedbacks dessa outra maneira, principalmente em seus diários, já que talvez seriam mais significativos a ela. Essa situação me fez questionar se algum dia eu já havia perguntado se ela se identificava com os meus feedbacks, se eram claros, formativos, etc. Sinceramente, não me recordo. Lembro de fazer isso de uma maneira mais geral: “Você entendeu as sugestões que eu escrevi?” Ou “Espero que tenha ajudado” ou “Consegui tirar a sua dúvida?”. Hoje, eu agiria de outra forma. Perguntaria logo no começo da minha relação com as mentoras sobre os meus feedbacks para saber o que eu poderia mudar, adequar, melhorar. Acho que o feedback expressa a sua identidade. A maneira como eu escrevo, me representa enquanto Lúcia, pedagoga, doutoranda, formadora/tutora. Ao mesmo tempo, também devo organizar essa escrita de forma que melhor se adeque às necessidades daqueles que eu estou em interação formativa. Não é porque a maneira como eu elaborava o meu feedback era ótimo para a G e a C que poderia ser igualmente significativo para a N (Narrativa Escrita, Lúcia, 2020, grifos nossos).

O trecho da narrativa demonstra o processo reflexivo de Lúcia sobre a escrita de feedbacks para uma das mentoras. A reflexão ocorreu posteriormente à ação, quando Lúcia percebeu que poderia ter questionado mais a mentora N sobre o potencial formativo de seus feedbacks (SCHÖN, 1983). Ao refletir dessa forma, Lúcia percebeu que poderia ter dado maiores direcionamentos à sua prática de tutoria (MARCOLINO, 2009). Lúcia parece demonstrar que é essencial que o feedback seja construído com base nos conhecimentos acerca das demandas de cada mentora, considerando a especificidade de cada contexto.

Vale destacar um aspecto relevante da aprendizagem das tutoras relacionado aos processos de ajudar os mentores a construir autonomia:

Lembro uma vez que eu mandei uma mensagem para uma mentora avisando que ficaria uns dias sem conseguir responder o WhatsApp, pois estava organizando um congresso e, logo depois, seria o casamento do meu irmão. Ela me retornou falando que eu a ajudava muito e brincou dizendo que eu não poderia tirar folga, teria que ser igual ao plantão de médico. Isso mostrou a confiança que ela tinha no meu trabalho, mas ao mesmo tempo, me fez pensar: Será que estou oferecendo algum tipo de encaminhamento que pode não estar favorecendo a autonomia dela em relação a algum aspecto? Isso aconteceu em 2018. (Narrativa Escrita, Lúcia, 2020).

O trecho da narrativa demonstra que as indagações de Lúcia indicam uma reflexão acerca de como favorecer os processos de autonomia das mentoras. Isto reporta-se às práticas de “dar o peixe” - oferecer informações mais direcionadas - ou “ensinar a pescar” - oferecer tarefas que evidenciem os processos reflexivos e a construção da autonomia (MASSETTO, 2018). Isso pode ter ampliado a visão da tutora sobre os processos de aprendizagem da docência, uma vez que aponta para suas reflexões acerca de suas práticas em relação ao apoio dirigido às mentoras. Assim sendo, as reflexões de Lúcia sugerem ainda que o exercício da tutoria não significa dar respostas prontas, mas sim promover ações que favoreçam a reflexividade e o desenvolvimento profissional.

Outro aspecto importante refere-se à aprendizagem sobre promover reflexão nas mentoras e sobre o poder da escrita de narrativas para incentivar tais processos:

Então, as narrativas escritas são muito boas para o desenvolvimento da pesquisa. Em segundo lugar, a literatura aponta que os usos de narrativas escritas podem ser muito bons para a Formação de Professores. Então, é perceptível que o uso de narrativas escritas é bom tanto para a pesquisa quanto para a formação de mentores e de PIS. Porque as narrativas têm potencial formativo (Narrativa Escrita, Marina, 2020).

Nesse sentido, Clandinin e Connelly (2011) explicam que trabalhar com narrativa é uma forma de investigar como os seres humanos experimentam o mundo. Narrar tais experiências é uma forma do indivíduo se reafirmar e construir novas histórias (OLIVEIRA, 2011). Ademais, a narrativa pode ser tanto um fenômeno a ser estudado como um método de investigação com propósitos formativos. Sobre isto, vale destacar que:

[...] essa perspectiva de trabalho, [...] configurase como investigação porque se vincula à produção de conhecimentos experienciais dos sujeitos adultos em formação. Por outro lado, é formação porque parte do princípio de que o sujeito toma consciência de si e de suas aprendizagens experienciais quando vive, simultaneamente, os papéis de ator e investigador da sua própria história (SOUZA, 2006, p. 139).

O PHM utilizava narrativas escritas e orais nas perspectivas da investigação e formação. Compreende que são instrumentos poderosos para promover processos de aprendizagem a partir da experiência e da reflexão, bem como para compreensão das trajetórias docentes e teorias pessoais. Por isso, infere-se que aprender os potenciais das narrativas na formação de professores foi um conhecimento construído pelas tutoras.

Concernente às aprendizagens acerca dos processos reflexivos de mentores, o excerto abaixo indica a concepção de Eliza sobre a finalidade de seus feedbacks: promover a reflexão das mentoras e fomentar a construção de novas aprendizagens a partir de uma postura inquisitiva sobre a prática de mentoria:

Nós líamos as atividades dos mentores e construíamos um feedback (...) apresentando este retorno ao que eles escreviam, cujo conteúdo era composto por detalhes, teorias e, também, por indagações/reflexões. Uma das funções do feedback dado ao mentor era fazer com que ele refletisse sobre um determinado tema/assunto a fim de propiciar diferentes/novas ideias e respostas. Ademais, essas reflexões incidiam nas demandas que os próprios mentores apresentavam (Narrativa Escrita, Eliza, 2020).

A narrativa de Eliza parece indicar que escrever os feedbacks pressupõe conhecer amplamente as atividades realizadas no AVA tanto pelas professoras iniciantes quanto pelas mentoras que as acompanham bem como seus contextos de atuação escolar. Para que o feedback seja formativo deve considerar aspectos como teorias e indagações/reflexões com vistas a fomentar novas ideias. Nesse sentido, Eliza parece ter aprendido a relevância de incentivar a reflexão e desenvolvido a compreensão de que refletir sobre práticas rotineiras constitui uma postura essencial para transformá-las com a atribuição de novos significados (SCHÖN, 1983).

Um trecho da narrativa de Lúcia aponta os processos e conteúdo que precisou aprender para exercer as funções da tutoria:

Conforme as mentoras traziam determinados assuntos nos encontros presenciais e nas atividades formativas, notava que havia alguns temas que eu não tinha e/ou tinha pouco conhecimento, como questões relacionadas à educação especial, autismo, [Base Nacional Curricular Comum] BNCC, alfabetização. Perceber as suas necessidades formativas a partir de situações de sala de aula relatadas por professores experientes e iniciantes é muito bom! Isso me tira de uma “zona de conforto” e faz com que eu pense: “Se eu fosse professora, como abordaria esses temas com meus alunos, com os pais?”; “Sendo formadora, como me posiciono em relação a isso?”. Nessas situações eu buscava auxílio da equipe de pesquisa que sempre estava disponível para discutir, trazer novos conhecimentos, indicar leituras. Tais questões também me impulsionaram a estudar (Narrativa Escrita, Lúcia, 2020, grifos nossos).

Participar dos processos formativos das mentoras e das iniciantes foi uma forma de perceber as próprias necessidades formativas. Essa percepção quanto ao que precisava saber para ensinar as mentoras, conduziu Lúcia a reflexões projetivas sobre sua postura como docente em situações que talvez precisará de tal conhecimento. Tais reflexões propiciaram um posicionamento autônomo na busca de construir aprendizagens, demonstrando o compromisso com seu desenvolvimento profissional e com seu papel de formadora de mentoras ao buscar apoio do grupo do PHM e ao estudar os assuntos que não conhecia.

Considerações Finais

Este estudo propôs-se a elucidar as aprendizagens de três tutoras que participaram de um Programa Híbrido de Mentoria, focando nos processos de supervisão e no desenvolvimento profissional dessas mentoras.

Diante disso, assume-se que os conhecimentos docentes vão sendo construídos processualmente ao longo da vida. Implicam processos formais e informais, características pessoais, contextos, condições objetivas de vida e de trabalho, dimensões coletivas, etc. (TANCREDI, 2009). Ademais envolve a construção de uma base de conhecimentos sólida e flexível como condição indispensável para o exercício da profissão.

Quando se trata da base de conhecimentos de um formador, este processo de construção pode ser ainda mais complexo, pois envolve outras especificidades, como por exemplo: ensinar a ensinar, para destacar a função primária de formadores.

À face do exposto, infere-se, por meio da análise das narrativas das tutoras do PHM, que estavam desenvolvendo uma base de conhecimentos acerca da formação e do acompanhamento de mentoras. Alguns elementos constitutivos desta base são: a escrita de feedbacks formativos e reflexivos; desenvolvimento de uma escuta sensível e empática para direcionamento de ações; conhecimento acerca das demandas formativas das mentoras; reflexões sobre como ajudar o mentor a construir autonomia; conhecimento sobre a importância da reflexão e como promover processos reflexivos; e conhecimento sobre o poder da escrita de narrativas na formação/ investigação de professores.

Constata-se que os feedbacks foram um meio promissor para manter as interações e promover reflexões nas mentoras. Diante disso, ter clareza do potencial formativo dos feedbacks e aprender como incentivar a reflexão por meio deles dá indícios de um conhecimento fundamental necessário ao tutor de mentores. Destaca-se, assim, que escrever tais feedbacks pressupunha conhecer amplamente os contextos das professoras iniciantes e das interações entre as díades (mentora-professora iniciante), ter uma base de conhecimentos ao exercício da docência.

Acredita-se que a base de conhecimentos para o exercício da docência também é fundamental para as tutoras, pois trabalham com docentes da Educação Básica. Possivelmente, as tutoras têm uma base composta por conhecimentos constituída de formação inicial e da pós-graduação. Isto se deve, em partes, ao fato que somente Lúcia atuou como professora antes de ser tutora, portanto, é plausível categorizar as tutoras como professoras iniciantes (HUBERMAN, 2000).

Consequentemente, as interações com as mentoras se mostraram, inclusive, uma oportunidade de aprender sobre as caraterísticas da escola, conteúdos específicos (relacionadas à educação especial e alfabetização) e políticas públicas educacionais (BNCC).

As tutoras precisaram desenvolver um tipo de conhecimento pedagógico para a tutoria: aprender a identificar as demandas formativas das mentoras para promover processos de aprendizagem, desenvolver uma escuta sensível e empática, bem como e escolher práticas de tutoria específicas para o desenvolvimento de autonomia das mentoras.

Cabe, ainda, pontuar que os feedbacks formativos, se enquadram na categoria de conhecimentos acerca dos processos de aprendizagem da docência (SOUZA; REALI, 2020), um tipo de conhecimento para um formador, pois é a partir dele que irá promover processos reflexivos e propiciar estratégias formativas assertivas.

As aprendizagens construídas pelas tutoras do PHM reafirmam que a aprendizagem profissional ocorre processualmente no percurso de vida por meio das experiências e da reflexão. Os processos de construção dos conhecimentos das tutoras estiveram relacionados ao exercício da tutoria e ao apoio do grupo de pesquisadores do programa que orientaram e direcionaram as ações do grupo para o seu desenvolvimento. Tendo em vista, um dos pressupostos teórico-metodológicos cruciais do PHM: a construção colaborativa e mútua dos conhecimentos.

1A pesquisa-intervenção foi aprovada pelo comitê de ética da UF (número do processo: 68415717.8.0000.5504Y).

2As bolsas TT3 visam a formação científica e são destinadas a graduados de nível superior que não possuem reprovações em seu histórico escolar nem vínculo empregatício. A carga horária, pode variar entre 16 e 40 horas semanais de apoio ao projeto de pesquisa, com período máximo de 24 meses de vigência.

3Para preservar a identidade das participantes, foram utilizados pseudônimos.

4As pessoas mencionadas pelas participantes serão referidas pela letra inicial do primeiro nome para preservar a identidade.

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Recebido: 07 de Fevereiro de 2023; Aceito: 26 de Junho de 2023

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