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Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade

versión impresa ISSN 0104-7043versión On-line ISSN 2358-0194

Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade vol.32 no.71 Salvador jul./sept 2023  Epub 22-Abr-2024

https://doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2023.v32.n71.p219-236 

Educação e aprendizagem da docência

APRENDIZAGEM DA DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: UMA PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL

LEARNING TO bE A HIGHER EDUCATION TEACHER: A HISTORICALCULTURAL PERSPECTIVE

APRENDIZAJE DE SER DOCENTE DE EDUCACIÓN SUPERIOR: UNA PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL

Carla Rosane Paz Arruda Teo1 

Doutora em Ciência de Alimentos. Professora do Curso de Graduação em Medicina e dos Programas de Pós-Graduação em Ciências da Saúde e em Educação da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó), Chapecó, SC, Brasil. E-mail: carlateo@unochapeco.edu.br


http://orcid.org/0000-0002-1534-6261

Solange Maria Alves2 

Doutora em Educação. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação e do Curso de Graduação em Pedagogia da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), Chapecó, SC, Brasil. E-mail: solange.alves@uffs.edu.br


http://orcid.org/0000-0002-5222-6066

1Universidade Comunitária da Região de Chapecó

2Universidade Federal da Fronteira Sul


RESUMO

Com o objetivo de reconhecer possibilidades para qualificar o estágio de docência com vistas à formação de professores bacharéis para a educação superior, foi realizado estudo exploratório-descritivo qualitativo com 11 professores com experiência em supervisão de estágio de docência de pós-graduandos da área da saúde, em Santa Catarina, utilizando instrumento online com três questões abertas sobre potencialidades, fragilidades e possibilidades do estágio. O conteúdo foi analisado e interpretado por cotejamento ao referencial teórico histórico-cultural. Os resultados indicaram a experiência prática como principal potencialidade; como fragilidades, a curta duração e a não obrigatoriedade. Concluiu-se que a possibilidade de qualificar o estágio como estratégia formativa está em sua transformação em atividade de aprendizagem colaborativa e dialógica da docência para pós-graduandos, supervisores e orientadores, em uma lógica de formação inicial, continuada/permanente.

Palavras-chave: desenvolvimento humano; formação de professores; teoria da atividade

ABSTRACT

With the aim of recognizing possibilities to qualify the teaching internship with a view to training bachelor teachers for higher education, a qualitative exploratory-descriptive study was carried out with 11 teachers with experience in supervising teaching internships for graduate students in the health area, in Santa Catarina state, using an online instrument with three open questions about the strengths, weaknesses and possibilities of the internship. The content was analyzed and interpreted by comparing it to the historical-cultural theoretical framework. The results indicated practical experience as the main potential; such as fragility, the short term and non-obligation. It was concluded that the possibility of qualifying the internship as a training strategy lies in its transformation into a collaborative and dialogical teaching activity for graduate students, supervisors and advisors, in a logic of initial, continued/permanent training.

Keywords: human development; teacher training; activity theory

RESUMEN

Con el objetivo de reconocer posibilidades de calificación de la pasantía docente con miras a la formación de docentes licenciados para la educación superior, se realizó estudio cualitativo, exploratorio-descriptivo, con 11 docentes experimentados en la supervisión de pasantías docentes para estudiantes de posgrado en el área de la salud, en Santa Catarina, utilizando instrumento en línea con tres preguntas abiertas sobre potencialidades, debilidades y posibilidades de la pasantía. El contenido fue analizado e interpretado comparándolo con el marco teórico histórico-cultural. Los resultados indicaron la experiencia práctica como principal potencial; como fragilidad, el corto plazo y la no obligación. Se concluyó que la posibilidad de calificar la pasantía como estrategia de formación radica en su transformación en una actividad de aprendizaje colaborativo y dialógico de la docencia para graduados, supervisores y asesores, en una lógica de formación inicial, continuada/permanente.

Palabras clave: desarrollo humano; formación de profesores; teoría de la actividad

Introdução1

A aprendizagem da docência é um tema sensível, independentemente do nível e da modalidade de educação. No caso em tela, o lugar de onde emerge o trato com essa questão é a educação superior, em cursos de bacharelado e, mais especificamente, na área da saúde. Argumentamos, aqui, que as tensões que afetam a formação de professores são acirradas por esta delimitação, uma vez que os egressos desses cursos, embora não tenham formação pedagógica, irão atuar na formação de nível superior de outras gerações de profissionais de mesma área. Além disso, os conhecimentos pedagógicos que faltam neste percurso formativo poderão afetar também a prática profissional em espaços específicos da área voltados para a educação como estratégia de prevenção e promoção da saúde humana, tão cara ao Sistema Único de Saúde (SUS). Em ambos os casos, teremos um bacharel atuando com a educação como ato deliberado de formação humana e, mais especificamente, quando se trata de docência na educação superior, teremos, muito provavelmente, um bacharel atuando como docente.

Um critério relevante na seleção de um bacharel para a docência na educação superior costuma ser o reconhecimento da qualidade da atuação profissional em sua especialidade (RODRIGUES et al., 2020). Assim, um bacharel, ao ingressar na docência, passa a conduzir-se nesse território por modelos configurados a partir de professores que teve ao longo de sua própria formação e/ou de concepções socialmente compartilhadas sobre professores (DAMIANCE et al., 2016). Cabe destacar que esses modelos podem ser positivos (o professor que se quer ser) ou negativos (o professor que não se quer ser). Nesse percurso, o bacharel que ingressa na docência pode perpetuar essa reprodução de modelos como base para sua prática ou, a depender de condições materiais específicas, pode sensibilizar-se ou ser incentivado a buscar formação para a docência.

Cumpre, nesse ponto, o registro de que uma orientação sobre a formação de professores para a educação superior é dada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN): “a preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pósgraduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.” (BRASIL, 2020, Educação e aprendizagem da docência 66). Porém, documentos da pós-graduação avaliam o sucesso da formação de professores para a educação superior a partir de indicadores relacionados ao número de mestres e doutores titulados (BRASIL, 2010a), como se esta titulação acadêmica implicasse, diretamente, um processo de formação pedagógica.

A despeito das várias críticas que possam ser feitas (e têm sido feitas) a esse pressuposto, a nosso juízo equivocado (de que o mestre e o doutor têm formação adequada para a docência na educação superior), o fato é que na mesma fonte (documentos da pós-graduação) surge uma brecha para considerarmos a formação de professores da educação superior. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), em 1999, instituiu o estágio de docência no âmbito da pós-graduação stricto sensu (BRASIL, 1999). Desde então, a CAPES tem reafirmado o estágio de docência como componente da formação pós-graduada, visando à preparação para a docência e à qualificação do ensino de graduação, estabelecendo sua obrigatoriedade para doutorandos (ou, na ausência destes, para mestrandos) bolsistas que não possuam experiência comprovada como professores no ensino superior (BRASIL, 2002; 2010b; 2012; 2017).

É esse recorte, precisamente, que interessa a este estudo, na medida em que diversos autores têm apontado para contribuições do estágio de docência para a formação de professores universitários na área da saúde, considerando-o como rara oportunidade institucionalizada para este fim no âmbito da pós-graduação stricto sensu. Contudo, os autores também têm sido unânimes em apontar fragilidades dessa estratégia formativa, revelando que o estágio tem se constituído como momento de treino ou de ensaio de uma docência tecnicista, conteudista e transmissiva (FRIESTINO et al., 2015; LIMA et al., 2015; BRAGA; PINHEIRO; FEITOSA, 2016; ALVES et al., 2019; ANGELIM et al., 2019; AMORIM et al., 2020; FREITAS; RIBEIRO, 2021).

Frente aos elementos apresentados, questionamos: quais são as possibilidades de produzir mudanças no estágio de docência, no sentido de qualificá-lo como estratégia de formação de professores bacharéis para a educação superior? Como o estágio de docência pode ser fortalecido como objeto para o atendimento das necessidades de formação desses professores/futuros professores?

Na busca por oferecer respostas ou pistas para responder a estas perguntas, este texto se constitui, operando com o objetivo de reconhecer possibilidades para qualificar o estágio de docência com vistas à formação de professores bacharéis para a educação superior. Nesta dinâmica, o texto está organizado por meio desta seção introdutória, seguida por uma que apresenta o contexto de estudo e os fundamentos teóricos assumidos, uma metodológica, uma de apresentação e discussão dos achados e uma última, em que são tecidas algumas considerações finais.

Trabalho: uma categoria para pensar a atividade de aprendizagem da docência

Ao tratar da formação de professores, é preciso iniciar elucidando a respeito de qual professor se fala, superando-se uma abordagem sloganizada, ainda mais frequente do que seria desejável. Esse é um tema complexo, inserido em uma realidade também complexa, e que precisa ser explorado para além de sua superfície, de sua aparência. Ponderamos que, se abordado de forma ingênua, pouco ou nenhum avanço pode ser esperado da formação de professores para a educação superior. Por isso, reiteramos, é preciso ter em mente de que professor se está falando porque esse professor representa um projeto de sociedade que se coloca em perspectiva.

Na delimitação que interessa a este estudo - a educação superior em saúde -, pensar sobre o professor que se pretende requer levar em conta, como já indicado, algumas especificidades desta área, as quais cabe, portanto, registrar, embora de forma breve. Inicialmente, é importante reforçarmos que o SUS é o ordenador da formação profissional em saúde (BRASIL, 1990) e, com base em seu marco legal, foram definidos os documentos e as estratégias que guiam essa formação, como as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a graduação e as políticas e programas de reorientação da formação na área (BRASIL, 2001a; 2001b; 2001c; 2005; 2008).

Decorre dessa base legal o perfil esperado do profissional de saúde, que se configura, em linhas gerais, como generalista, humanista, crítico e reflexivo, preparado para atuar de forma humanizada e acolhedora no processo saúdedoença, em acordo com o sistema de saúde, nos diferentes níveis de atenção, com ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação à/da saúde, na perspectiva da integralidade da assistência e pautando-se por princípios éticos (BRASIL, 2001a; 2001b; 2001c).

Isto posto, consideramos que, apesar dos desafios do processo, está explícito que tipo de profissional de saúde se pretende formar, ou seja, há um perfil profissional detalhadamente descrito e coerente com o projeto de uma sociedade em que se consolide a saúde como direito básico universal, uma saúde que supere a ótica da ausência de doença e que se edifique sobre os princípios da dignidade humana. O mesmo não é verdade quando se trata do perfil docente. Não há descrição, nos documentos que compõem o marco legal desse campo, sobre a formação e as características esperadas do professor, que é, em última instância, o ator social mais diretamente implicado na formação do perfil profissional mencionado. Isso significa que é preciso deduzir, do perfil profissional definido, indicativos do perfil docente.

A esse respeito, Alves e Teo (2020, p. 4, grifo no original), ao refletirem criticamente sobre as demandas decorrentes da lógica das políticas formativas em saúde, afirmam que,

Essas proposições, colocadas no horizonte da formação profissional, requerem, por sua vez, outro perfil de docência, agora não mais centrada no professor ou professora, mas no aluno como ser ativo, autônomo. Não cabe mais, aqui, o professor ou a professora da aula expositiva [apenas], do silêncio, da transmissão do conhecimento, que submete o aluno a ouvir, anotar e reproduzir o que lhe foi transmitido. Demandase uma docência menos dura, mais flexível e, ao menos aparentemente, talvez, mais dialógica [...].

Da leitura atenta do raciocínio que as autoras empreendem a partir da citação apresentada, o deslocamento do polo de atenção do processo educativo do professor para o aluno compõe uma das críticas que fazem, quando argumentam na direção da superação da visão liberal de educação inerente aos documentos orientadores da formação em saúde. A centralidade no aluno como ser ativo, segundo elas, constitui um dos elementos de esvaziamento de conhecimentos nos processos educativos e um dos fatores de supervalorização de procedimentos metodológicos ou didáticos considerados ativos, para os quais, argumentam as autoras, falta um suporte teórico-metodológico forte. Frente a esses elementos, as autoras defendem a possibilidade da teoria históricocultural da atividade, da Escola de Vigotski, como fundamento para pensar, propor, criar processos pedagógicos centrados na atividade de ensino como tarefa precípua da docência na relação dialética e funcional com a atividade de aprendizagem (ALVES; TEO, 2020).

A nosso juízo, essas proposições encontram espaço nas DCN dos diversos cursos de graduação da área que, em geral, sinalizam para um professor que adote metodologias problematizadoras, ativas, interativas, que seja mediador da relação do estudante com o conhecimento, que trabalhe com os conteúdos no sentido de convertê-los em instrumentos cognitivos para o desenvolvimento do pensamento crítico, analítico, reflexivo, da capacidade de análise, síntese, generalização dos estudantes - no âmbito técnico-científico da profissão, mas também no da ética, da humanização, da colaboração etc. Esse movimento requer um professor que se interesse por saber como o estudante aprende e se desenvolve, por refletir sobre sua prática mediado por fundamentos teóricos, filosóficos, metodológicos e epistemológicos, compreendendo efetivamente a natureza do trabalho docente, para poder, a partir do exercício da (auto)crítica, fazer emergir uma prática melhor. Esse professor não surge por geração espontânea ao adentrar na sala de aula, pois, como ensina Freire (1991, p. 58), “ninguém começa a ser educador numa certa terça-feira às quatro da tarde. Ninguém nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão sobre a prática.”.

No entanto, isso não significa que a prática, per se, se justifique como processo formativo robusto. É de outra formação que precisamos, uma formação que tome a prática - compreendida como prática social (práxis) de seres humanos historicamente situados - como ponto de partida e igualmente de chegada para, intencionalmente, confrontá-la, teorizá-la, em um movimento de compromisso ético com o próprio desenvolvimento docente. Uma prática que se configure como parâmetro e critério de verdade da teoria, dos conhecimentos produzidos na prática social. Concordamos, neste sentido, com a expressão de Marx (2007, p. 537), ao afirmar que

A questão de saber se ao pensamento humano cabe alguma verdade objetiva [gegenständliche Wahrheit] não é uma questão da teoria, mas uma questão prática. É na prática que o homem tem de provar a verdade, isto é, a realidade e o poder, a natureza citerior [Diesseitigkeit] de seu pensamento. A disputa acerca da realidade ou não realidade do pensamento - que é isolado da prática - é uma questão puramente escolástica (MARX, 2007, p. 537, grifos no original).

No contexto delineado (a educação superior), um elemento importante a ser considerado, por mais que possa parecer evidente à primeira vista, é que o professor é um adulto. E, desde a perspectiva teórica na qual procuramos sustentar nossa análise, a vida adulta constitui uma etapa importante do desenvolvimento do psiquismo humano, ao lado de outras, da infância à velhice. Cada etapa ou tempo histórico do desenvolvimento humano, no escopo da teoria histórico-cultural, se caracteriza por uma atividade-guia ou principal. De acordo com Leontiev (2021, p. 103-104),

A atividade é uma unidade molar, não aditiva, da vida do sujeito corporal e material. Num sentido mais estrito, ou seja, no nível psicológico, é uma unidade da vida mediada pelo reflexo psíquico, cuja função real consiste em orientar o sujeito no mundo objetivo. Em outras palavras, a atividade não é a reação ou um conjunto de reações, mas um sistema que tem estrutura, transições e transformações internas e desenvolvimento próprio.

Constitui, assim, um elo que marca e liga, de modos diferentes em diferentes tempos, o indivíduo (ser social) ao mundo objetivo. Assim, em termos genéricos, temos uma atividade-guia diferente para a infância, para a adolescência, a juventude, a vida adulta, a velhice (MARTINS; ABRANTES; FACCI, 2016), representando, pois, a totalidade sintética do desenvolvimento humano (PASQUALINI, 2016). A atividadeguia não é qualquer atividade, mas é aquela atividade mais importante, que distingue e caracteriza o modo de relação entre indivíduo e mundo objetivo2.

Importa sublinhar ainda que, para Leontiev (2021, p. 123, grifos no original),

[...] o objeto da atividade é seu motivo efetivo. É claro que ele pode ser tanto material quanto ideal, dado na percepção ou existente apenas na imaginação, no pensamento. Importa que por trás dele sempre há a necessidade, que ele sempre responde a tal ou qual necessidade. Assim, o conceito de atividade está necessariamente ligado ao conceito de motivo. Não existe atividade sem motivo; atividade “não motivada” não é uma atividade desprovida de motivo, mas uma atividade com motivo subjetiva e objetivamente oculto.

Desse modo, estritamente ligada ao conceito de motivo, a atividade se estrutura por motivos, ações e operações. As ações humanas, insiste Leontiev (2021), são os componentes principais da atividade e estão subordinadas aos resultados que se deseja alcançar. Por isso, estão diretamente ligadas a uma finalidade. “Assim como o conceito de motivo está correlacionado com o conceito de atividade, o conceito de objetivo está correlacionado com o de ação.” (LEONTIEV, 2021, p. 123). Já as operações estão relacionadas às condições para a realização das ações. Nas palavras do autor,

[...] a ação que se realiza responde à tarefa; a tarefa é o objetivo, dado em condições determinadas. Por isso, a ação tem uma qualidade especial, que a “formula” de modo especial, e justamente os modos pelos quais ela se realiza. Eu denomino operações os modos de realização. (LEONTIEV, 2021, p.127, grifos no original).

Essa estrutura da atividade psicológica de que nos fala Leontiev (2021) tem, a nosso ver, implicações importantes quando pensamos a aprendizagem da docência superior como atividade de aprendizagem vinculada a uma atividade de ensino orientada para o desenvolvimento da pessoa na fase adulta do seu desenvolvimento. Ela nos informa sobre a necessária geração e organização de motivos para apreender a ser professor e sobre ações e operações que esse processo demanda. Se motivos estão ligados à atividade, ou seja, se motivo é o que mobiliza para uma dada atividade, e se, ainda, os motivos vinculam-se a necessidades humanas historicamente produzidas, isso quer dizer que motivar para aprender a docência exige problematizar este fazer humano nas condições concretas de existência3.

Ainda é preciso dizer que o conceito de atividade-guia (principal), no âmbito da teoria histórico-cultural, tem raízes na categoria de trabalho em Marx. Não o trabalho alienado como configurado no contexto liberal capitalista de produção, mas o trabalho criador, inventivo, realizado por um ser ativo que, ao trabalhar, muda a natureza física e a sua própria natureza humana. Como afirma Marx (2020, p. 293-294),

Antes de tudo, o trabalho é um processo entre o homem e a natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, medeia, regula e controla seu metabolismo com a natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural como uma força natural. Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza. [...]. No fim do processo de trabalho obtém-se um resultado que já no início deste existiu na imaginação do trabalhador, e, portanto, idealmente. Ele não apenas efetua uma transformação da forma da matéria natural; realiza, ao mesmo tempo, na matéria natural seu objetivo [...]. Os elementos simples do processo de trabalho são a atividade orientada a um fim ou o trabalho mesmo, seu objeto e seus meios. (MARX, 2020, p. 293-294).

Na mesma direção, Duarte (2013) afirma que o trabalho é a atividade vital humana, que distingue o ser humano de todos os outros animais. Por meio do trabalho, o ser humano reproduz a si mesmo, como ser biológico singular, e a sua espécie, ao assegurar as condições materiais da existência. No entanto, não basta ao ser humano existir ou sobreviver. Assim, no processo de garantir a existência física, os indivíduos estabelecem vínculos sociais e, dessa forma, a atividade vital humana (trabalho) cumpre duas funções: “assegurar a existência individual e a existência da sociedade” (DUARTE, 2013, p. 23).

Isso significa que a origem do que é humano, em cada ser individual, reside nas conexões estabelecidas com outros indivíduos, mediadas pelo ato de trabalhar, enquanto ato criador e recriador de artefatos materiais e simbólicos, em sua relação com o mundo. Por meio do trabalho, indivíduos em relação operam coletivamente para realizar uma finalidade que anteciparam (projetaram). Nesse processo, apropriam-se do conhecimento humano produzido (objetivado) pelas gerações precedentes, se comunicam, se conscientizam, criam uma nova realidade (se objetivam nela). Pari passu, se transformam, se humanizam. Sob esse prisma, afirma-se que a base da constituição do ser social é o trabalho, concebido como atividade vital humana - vital por ser a atividade que garante a (re)produção do humano em cada indivíduo e na qual estão intimamente combinadas a consciência e a linguagem (ALVES; TEO, 2020). Elucida-se, assim, o caráter ontológico do trabalho.

A esse respeito, Duarte (2011, p. 140) ainda se pronuncia, afirmando que

O homem, ao produzir os meios para a satisfação de suas necessidades básicas, ao produzir uma realidade humanizada pela sua atividade, humaniza a si próprio, na medida em que a transformação objetiva requer dele uma transformação subjetiva. Cria, portanto, uma realidade humanizada tanto objetiva quanto subjetivamente.

Isso equivale a dizer que a realidade desafia, gera necessidades que compõem motivos, os quais levam homens e mulheres à atividade - primeiro, exterior (prática, interpsíquica), depois, interior (subjetiva, da consciência, intrapsíquica). Nesses termos, segundo Leontiev (2021, p. 104), “é evidente que a atividade de cada pessoa individualmente depende de seu lugar na sociedade, das condições que lhe cabem, de como isso se organiza em circunstâncias individuais únicas”.

O trabalho, neste sentido, é um ato criativo. É a atividade vital por meio da qual o gênero humano se produz e reproduz, e caracteriza-se, fundamentalmente, por sua intencionalidade (VIGOTSKI, 2000). Residem, aqui, dois elementos importantes para nossa reflexão neste texto. Primeiro, a atividade-guia da vida adulta (de professores, portanto) é o trabalho. É por meio desta forma de atividade que se põe em movimento, nos indivíduos adultos, os modos de relação com os contextos sociais dos quais são parte constituída e constitutiva. Segundo, esta atividade é marcada pela intencionalidade, ou seja, pela consciência e arbitrariedade em relação à sua ação no mundo. É sempre em referência a essa forma de atividade predominante em cada etapa do desenvolvimento que o trabalho docente (seja com a criança, o jovem ou o adulto) efetiva-se como ato de produção da humanidade em cada indivíduo singular (SAVIANI, 2013) e como ato intencional, deliberado, na direção da promoção do desenvolvimento tipicamente humano, voltado para a assunção de funções superiores de pensamento (memória lógica, atenção arbitrária, imaginação, criação, generalização etc.).

Assim, embora seja aparentemente óbvio afirmar que o professor é um adulto, já não parece tão óbvia a compreensão do que é a vida adulta. O que é um ser humano adulto? Como aprende? Como se desenvolve? Se, a partir da base histórico-cultural, esse desenvolvimento se faz pela mediação da atividade-guia, então, isso há que ser considerado no processo de aprender a ser professor. Ao aprender (e se desenvolver como docente), o sujeito o faz no curso de sua atividade-guia ou principal, que é o trabalho (trabalho docente), sua atividade de produção social. Desse modo, ponderamos que o trabalho docente é campo gerador de necessidades e motivos que estão no cerne do processo de aprendizagem da docência, uma aprendizagem propulsora do desenvolvimento docente.

Nesse sentido, o estágio de docência é tomado, aqui, como estratégia potente de desenvolvimento docente, de formação docente (inicial, continuada e permanente). Isso é especialmente importante em uma área como a da saúde, em que a formação pedagógica é incipiente e, no mais das vezes, a aprendizagem da docência segue a dinâmica do aprender fazendo.

Ao tomarmos a aprendizagem da docência como propulsora do desenvolvimento docente, também assumimos que todo desenvolvimento humano ocorre no curso da atividade, entendida como atividade vital humana, ou seja, trabalho. Isso significa que, na atividade, o humano mobiliza suas capacidades (cognitivas/psíquicas, práticas/instrumentais etc.) para agir no mundo, transformando-o em atendimento a suas necessidades, produzindo cultura e transformando a si próprio, ampliando suas capacidades, desenvolvendo-se. Nesse processo, novas necessidades são criadas, em um continuum histórico-dialético. Histórico porque existe em condições concretas, circunstanciadas nos e pelos contextos que, por sua vez, são - eles também - produções históricas cujos resultados são, de modos desiguais, disponibilizados às gerações humanas, por meio de bens materiais e simbólicos, culturais, igualmente históricos. Dialético porque não está em linha reta. Trata-se de um processo marcado pela complexidade de relações contraditórias da existência em que é constituído ao mesmo tempo em que constitui.

É pertinente, então, problematizarmos o que significa uma formação pelo trabalho e, ainda, o que é o trabalho do qual se espera que seja motor de aprendizagem e desenvolvimento. Importa retomar, então, uma condição relevante para os propósitos deste estudo, que é o fato de os professores serem, como já dito, adultos, pois as pessoas, a cada tempo histórico-social de seu desenvolvimento, se relacionam com o mundo de um modo particular (TULESKI; EIDT, 2016). Assim é que cada etapa do desenvolvimento humano é organizada por uma atividade-guia que, embora não seja a única, é aquela que se apresenta como dominante “no processo de ativar transformações no modo característico de o indivíduo vincular-se com a realidade” (ABRANTES; BULHÕES, 2016, p. 242).

Portanto, é a partir da atividade-guia (o trabalho docente) que caracteriza seu tempo histórico que o professor se relaciona com o mundo, age no mundo e se reorganiza como indivíduo singular e como parte do gênero humano universal. Nessa premissa se funda a argumentação de que o estágio de docência é estratégia relevante e pertinente para a promoção de uma aprendizagem que impulsione o desenvolvimento docente. É o que se pretende discutir a partir da materialidade empírica que suporta esse texto e cujo percurso de produção é descrito na próxima seção.

Itinerário da investigação: a produção da materialidade empírica

Foi realizado estudo exploratório-descritivo de abordagem qualitativa para o qual foram convidados, por e-mail, 15 professores com experiência como supervisores de estágio de docência de pós-granduandos (mestrandos e/ou doutorandos) de um Programa de Pós-Graduação (PPG) stricto sensu da área da saúde de uma Universidade no estado de Santa Catarina. Aceitaram participar 11 professores (identificados pela letra P justaposta a um número sequencial), dentre os quais, sete mulheres (P2, P3, P5, P7, P8, P9, P11), 10 com formação na grande área de Ciências da Saúde (Ciências Biológicas, Educação Física, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia e Nutrição) e um em Ciências Humanas (Filosofia), oito com titulação acadêmica em nível de doutorado e três de mestrado (P3, P7, P11), todos com ampla experiência docente, variando de oito a 34 anos, sendo que apenas dois deles tinham menos de dez anos de experiência (P6, P7) e nove tinham experiência igual ou superior a catorze anos.

A produção de dados empíricos aconteceu no segundo semestre de 2022, por meio de um instrumento aberto aplicado pela plataforma Google Forms. Esse instrumento de pesquisa foi enviado aos professores por e-mail e continha três proposições que deveriam ser completadas pelos respondentes, apontando potencialidades (que bom que o estágio de docência ...), fragilidades (que pena que o estágio de docência ...) e possibilidades (que tal se o estágio de docência ...) do objeto a partir de suas experiências prévias como supervisores. Os professores que aceitaram participar do estudo receberam acesso ao instrumento de pesquisa apenas após a assinatura virtual do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O projeto que originou este estudo foi apreciado e aprovado por Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos (CAAE: 61408022.1.0000.0116).

Concluída esta etapa, as respostas dos participantes foram extraídas da plataforma Google Forms e organizadas em editor de texto, iniciando-se, a seguir, o processo de análise e interpretação do conteúdo produzido, em cotejamento ao referencial teórico histórico-cultural.

Que bom que, que pena que, que tal se: perscrutando o objeto para repensar a atividade de aprendizagem da docência

O objetivo desse estudo foi reconhecer possibilidades para qualificar o estágio de docência com vistas à formação de professores bacharéis para a educação superior em saúde, tendo como horizonte o pressuposto de que, para avançar/qualificar, é preciso conhecer. Sob este prisma, nesta oportunidade, optamos por conhecer/apreender o objeto a partir da perspectiva de professores que tenham atuado como supervisores de estágio de docência. Eles foram considerados bons informantes sobre o tema por serem, como afirma Luna (2010), parte importante do problema, no sentido de estarem implicados nele, o que confere, a priori, fidedignidade aos dados produzidos.

Inicialmente, questionamos os participantes sobre aspectos positivos do estágio de docência, favoráveis à aprendizagem da docência na pós-graduação. Na análise dos dados, chama a atenção o destaque conferido por todos os participantes à característica do estágio de docência como experiência, vivência e prática da docência, como ilustrado a seguir:

Que bom que o estágio de docência propicia ao estudante experiências na docência. (P1).

Que bom que o estágio de docência aprimora o estudante para a prática de ser docente/professor. (P3).

Embora, em um primeiro momento, isso pudesse sugerir uma visão praticista, com um peso de desvalorização da complexidade do estágio de docência, ponderamos que o estágio tem sua potência, precisamente, ao se configurar como prática, atividade exterior, social, que é fio condutor para a subjetivação. Como sinalizamos, anteriormente, com o aporte histórico-cultural, consideramos que tais falas sinalizam para a potência do estágio como tempo-espaço motivador da atividade de aprendizagem da docência, visto que estamos num percurso formativo que, a rigor, verticaliza-se mais no escopo da especificidade da área e do objeto de pesquisa do qual se ocupam mestrandos e doutorandos em Ciências da Saúde e que não tem a docência como foco principal. A nosso ver, esta imagem positiva do estágio de docência pode constituir-se num importante elemento de prática social, gerador de problematizações referentes à docência como práxis profissional e de motivações que coloquem em movimento, nos sujeitos, um conjunto de ações e operações voltadas a apreender a docência como profissão4. Trata-se da prática de pensar a prática no sentido de compreender o ato de pensar como atividade, como prática de pensamento e, portanto, de apropriação/ internalização/produção de conhecimento, articulando o desenvolvimento do sujeito docente. Isso, notadamente, implica compreender o conhecimento em bases marxistas. A esse respeito, nos parece elucidativa a afirmação de Leontiev (2021, p. 44) de que

A reviravolta profunda realizada por Marx na teoria do conhecimento consiste em que a prática humana passou a ser compreendida como base da cognição humana, como processo em cujo desenvolvimento surgem tarefas cognitivas que engendram e desenvolvem a percepção e o pensamento humano e que, ao mesmo tempo, carregam em si o critério de adequação e veracidade do conhecimento: na prática, diz Marx, a pessoa deve provar a verdade, a realidade, o poder e a universalidade de seu pensamento.

Na transição da atividade (de exterior para interior), o humano ativo/em atividade constrói sentidos, que se fundem aos significados socialmente compartilhados e vão produzindo novos modos de ser professor. Entendemos sob essa perspectiva a referência que um dos participantes faz ao estágio de docência como gerador de “[...] oportunidades de aprendizagens significativas sobre o ensino em saúde vivenciadas na prática” (P9).

Sobre isso, Martins (2015, p. 70) explica que “o pensamento desenvolve-se a partir da operação prática, em direta ligação com ela, para, então, paulatina e relativamente, ir dela se independendo e se afirmando enquanto atividade teórica”. A autora complementa, afirmando que “o pensamento teórico representa a transição do particular para o universal e do universal para o particular, pela qual se movimentam e se articulam as ideias, dando origem aos conceitos. O conceito, que existe na forma de palavra, representa o conteúdo específico do pensamento” (MARTINS, 2015, p. 70). Nesse processo, é superada a compreensão imediata da realidade (empírica) pela incorporação de um conhecimento amplo e generalizado (abstrato) sobre ela. Trata-se de elevar o pensamento do concreto imediato ao concreto pensado por meio da abstração. Esse é o movimento que caracteriza o processo de aprendizagem, ancorado por operações superiores de pensamento - análise, síntese, generalização (MARTINS, 2015).

Desse modo, compreende-se a potência do estágio de docência como espaço e tempo de aprendizagem do ser professor, a partir da experiência/vivência, como referido pelos participantes. Importa explicar que a vivência é entendida, aqui, na perspectiva vigotskiana5, como algo que é experimentado e que afeta o sujeito de alguma forma, na medida em que ele compreende e atribui sentido ao vivido, o que implica também um componente emocional (MARQUES; CARVALHO, 2014).

Para além da marca colocada pelos participantes no estágio de docência como prática e preparação para a prática, ainda há que se sublinhar que o estágio é entendido por eles como uma prática total, contemplando tanto questões técnico-operacionais da docência quanto questões de afetos e relações, como os excertos a seguir evidenciam:

Que bom que o estágio de docência permite o exercício de metodologias de ensino, experiência em sala, contato com os estudantes de graduação (pós-graduando), a oxigenação das práticas da disciplina, olhares e experiências (docente e discente). (P5).

Que bom que o estágio de docência contribui para o mestrando e doutorando desenvolverem a prática pedagógica, possibilitando sua aproximação e entendimento do processo de formação, desde o entendimento da ementa da disciplina, elaboração do plano de ensino e do plano de aula, a construção da aula, potencializando metodologias diferenciadas, a ministração da aula e processo de avaliação e fechamento do componente. Creio que a maioria dos pósgraduandos nunca teve o contato diretamente com a docência, sendo considerado o estágio de docência uma das práticas que melhor potencializa esta aproximação, além do diálogo com outro docente, a fim de estabelecer estratégias que minimizem o medo e angústia que acabam gerando esse momento. (P6).

Que bom que o estágio de docência traz a partilha de novas ideias, percepções e possibilidades de outras estratégias para serem utilizadas na tarefa docente; permite a integração com outras profissões/formações; aproxima e vincula temáticas trabalhadas no stricto sensu com a formação inicial; estabelecimento de uma rede de ‘saberes e conhecimentos’. (P7).

Que bom que o estágio de docência acontece na pós-graduação. É uma oportunidade para o pós-graduando que nunca esteve em sala de aula como docente. Estuda, planeja, executa, vivencia, relata. Essa pode ser a descoberta de que realmente quer seguir a vida docente (ou não). (P8).

Que bom que o estágio de docência desenvolve habilidades e competências sobre o ser e o fazer da docência. (P9).

Que bom que o estágio de docência proporciona capacitação do aluno-estagiário, vínculo afetivo com os estudantes de graduação, conhecimento sobre o fazer docente (plano de ensino, planejamento da aula, didática, montagem dos materiais de apoio), bem como sobre como montar e produzir avaliações. (P10).

Sobre as bases dessas considerações, ponderamos que o estágio constitui oportunidade de aprendizagem da docência em uma perspectiva ampla, que supera a dimensão técnica, operacional, metodológica, e alcança o nível dos afetos e das emoções. Ou, dizendo de outro modo e recuperando o conceito de atividade em Vigotski e Leontiev, afirmamos que alcança o nível do que faz sentido aprender, do que é significativo aprender, na medida em que promove o movimento do pensamento à prática social dos seres humanos historicamente situados. A esse respeito, Martins (2015) reforça a centralidade do trabalho no desenvolvimento humano e afirma que

[...] a atividade material prática (externa) é primária em relação à atividade mental (interna). [...]. Do ponto de vista de sua origem, a atividade humana parte de determinados motivos e encaminha-se para determinados fins, exprimindo nessa trajetória uma dada relação do homem com seu meio (MARTINS, 2015, p. 62).

E, com base em Vigotski, a autora complementa:

Pela atividade de transformação da realidade, a humanidade constrói um vínculo com o universo em que vive, firmando-o como dado de sua subjetividade [...]. Solidifica esta subjetivação na forma de pensamento para, até mesmo, melhor atuar. Esse processo, por sua vez, é acompanhado de reações emocionais e sentimentos, ou revela-se também como vivência emocional (MARTINS, 2015, p. 71).

É nesse movimento que, conforme declara um dos participantes, o estágio de docência “qualifica a formação, prepara o estudante para a docência e desenvolve autonomia” (P2). Ou seja, é na “unidade necessária entre os aspectos cognitivos e afetivos presentes na atividade [trabalho] e na consciência” (MARTINS, 2015, p. 74) que o sujeito, em sua integralidade, vai se desenvolvendo, ao apreender a docência.

Por outro lado, os participantes também indicaram fragilidades do estágio de docência, mencionando sua breve duração: normalmente, um semestre letivo (P1, P4, P5, P7, P10, P11). Sobre isso, cabe sublinhar o depoimento de um dos participantes: “Que pena que o estágio de docência seja muito rápido, apenas uma vez, pois seria importante ter tanta relevância na formação quanto a pesquisa e a extensão.” (P4).

Importa, a esse respeito, problematizar o propósito da pós-graduação - formar pesquisadores e docentes para a educação superior. Frente a esse objetivo, de fato, há que se considerar que o estágio de docência é limitado no tempo. Afinal, o pós-graduando passa de dois a quatro anos, respectivamente, no mestrado e no doutorado, implicado com atividades de pesquisa. Ou seja, como bem apontado por P4, há uma disparidade entre a formação do pesquisador e a do professor na pós-graduação, o que, a nosso ver, sinaliza também alguns questionamentos: qual é o lugar da formação para a docência? De que docência fala uma legislação que orienta um curto espaço de tempo para esta formação, e no modelo de estágio? Se a docência é um trabalho e, como trabalho educativo, tem como tarefa central o desenvolvimento da humanidade em cada indivíduo singular (SAVIANI, 2013), como apreendê-la em uma prática de estágio de 40 ou 60 horas? Que concepção de docência se manifesta nesta orientação legal? Por que não ensinamos engenharia, medicina, nutrição, fisioterapia, em algumas horas de estágio?

Contudo, o que defendemos, aqui, não é deslocar a centralidade na pós-graduação da pesquisa até a docência. Talvez, um relativo equilíbrio pudesse ser cogitado. Porém, em tempos de encurtamento de prazos, em geral, e de mudança de perfil do estudante da pósgraduação - cada vez mais, um estudante trabalhador -, para operar com as condições objetivas disponíveis, argumentamos que o tempo de duração, mesmo restrito, pode ser o suficiente para tornar o estágio de docência propulsor de desenvolvimento docente importante para esta fase da carreira do (futuro) professor. Certamente, para tanto, alguns recursos podem ser engendrados - isso é o que se pretende explorar mais adiante, neste texto.

Ainda no campo das fragilidades do estágio de docência, os participantes (P2, P6, P8) mencionaram o fato de ele não ser obrigatório para todos os pós-graduandos, como bem ilustra o depoimento apresentado a seguir: “Que pena que o estágio de docência somente é uma exigência para bolsistas (algumas modalidades), fazendo com que muitos pós-graduandos não tenham essa aproximação em ministrar uma aula, entender um plano de ensino, um plano de aula.” (P6).

Sobre isso, a CAPES determina que o estágio de docência é obrigatório para bolsistas que não tenham experiência docente (BRASIL, 2002; 2010b; 2012; 2017). Nesse ponto, ponderamos que, frente à atribuição de formar professores para a educação superior (BRASIL, 2020), não faz sentido a pós-graduação não adotar como norma a existência, nos projetos dos cursos de mestrado e doutorado, de um componente curricular/disciplina de formação docente e, também, o estágio para todos os pós-graduandos, independentemente de sua condição de bolsistas ou de sua experiência docente. Com relação, especificamente, à experiência como professor, a dispensa da CAPES, nesse caso, carrega um não-dito importante: a de que alguém não tem mais o que aprender uma vez que atue como professor. Juntas, essas determinações sobre o estágio e a ausência de uma orientação sobre disciplinas específicas informam sobre o lugar que é dado à formação para a docência na pós-graduação. Esse cenário, certamente, condiciona a valorização que a aprendizagem da docência recebe de pós-graduandos e, às vezes, até de seus orientadores: “Que pena que o estágio de docência tenha um tempo curto, receio do estagiário para desenvolver atividades de modo independente e, por vezes, pouco reconhecimento da turma para esta modalidade importante. (P10, grifo nosso).

É como se houvesse um saber ser professor que dispensasse formação específica, que surgisse em cada um e cada uma ao adentrar em uma sala de aula (tenha ela a configuração que tiver), um saber que se desenvolvesse por vocação. Então, o que observamos, na pós-graduação, é que os estudantes, de forma geral, fazem uso dos recursos colocados à disposição (pela própria CAPES) para serem dispensados do estágio de docência. Os que não acessam esses recursos cumprem o estágio, como um requisito a ser atendido para que possam se dedicar àquilo que, de fato, parece ter valor na pós-graduação - a pesquisa. Embora essas ponderações sejam fruto de generalização, argumentamos que retratam um cenário bastante frequente. Em contraposição, tornar o estágio de docência obrigatório para todos surtiria algum efeito benéfico? Acreditamos que sim, afinal, embora pudesse gerar algum desagrado ou resistência inicial entre os estudantes, convém considerar que são as necessidades humanas que vão determinar os objetivos educacionais, a intencionalidade do processo educativo. Ainda, como afirma Saviani (2013), os estudantes são sínteses de relações sociais que eles próprios não escolheram. Nesses termos, questionamos, então: quais são as necessidades humanas que orientam a intencionalidade educativa na pós-graduação? Acrescentemos, aqui, que nem sempre aquilo pelo que os pósgraduandos manifestam mais interesse, na condição de estudantes, é o que corresponde aos seus interesses concretos no sentido de seu máximo desenvolvimento humano.

No âmbito do tema tratado nesse estudo, afirmamos que o estágio de docência pode não ser, de pronto, do interesse do estudante empírico, mais focado na realidade imediata que o circunda, mas seguramente corresponde aos interesses do estudante concreto que, na síntese das relações sociais, vive em uma sociedade que, cada vez mais, requer um professor cuja prática social coadune com aquela saúde mencionada no início deste texto, que é direito de todos e que opera na perspectiva da dignidade humana. Desse modo, criar oportunidades de acesso a conhecimentos que sejam instrumentos para o desenvolvimento das máximas possibilidades do estudante é a tarefa maior da educação (SAVIANI, 2013). No caso da pós-graduação, o desenvolvimento do estudante está (ou deveria estar) orientado pelo projeto de formação do professor-pesquisador.

Cabe, ainda, o registro do que afirmam Tuleski e Eidt (2016), ao abordarem a atividade como propulsora do desenvolvimento. As autoras explicam, com base em Leontiev, que os motivos que estão na base da atividade (motivos realmente eficazes) podem surgir a partir de motivos ligados a ações (motivos apenas compreensíveis ou estreitos). Os motivos apenas compreensíveis atuam durante pouco tempo e sob circunstâncias diretas - por exemplo, concluir a pós-graduação. Os motivos realmente eficazes são mais constantes (atuam durante muito tempo) e não dependem de situações causais imediatas - por exemplo, preparar-se para o trabalho docente. Os motivos apenas compreensíveis estimulam à ação imediata (fazer o estágio de docência), e os motivos realmente eficazes dão sentido ao estágio de docência e à pós-graduação (formar-se um professor-pesquisador). Os dois tipos de motivos podem atuar simultaneamente, formando um sistema único de motivos. Porém, quando isso não acontece (ou enquanto isso não acontece), um motivo apenas compreensível pode ser o disparador da ação imediata e, na medida em que o estudante realiza a ação, pretende-se que ocorra uma transformação de motivos, alcançando-se (para o estágio de docência) um motivo realmente eficaz. Nas palavras das autoras,

No exemplo anteriormente citado, temos que uma ação (fazer a tarefa) adquiriu um novo motivo que a direcionou; então a ação transformou-se em atividade. Por isso a compreensão do caráter dinâmico da atividade [...] é de fundamental importância [...] para os educadores de modo geral. Se é por meio da atividade que o homem atua sobre a realidade circundante, visando satisfazer suas necessidades físicas e psíquicas, não há apenas uma forma de relação do homem com a realidade. Em cada momento do desenvolvimento nos relacionamos com o mundo de um modo particular e irrepetível. (TULESKI; EIDT, 2016, p. 49-50).

Para além dessas questões, os participantes apontaram outras fragilidades, relacionadas com o fato de, eventualmente, o estágio de docência ser supervisionado por um professor que não atua na pós-graduação e, ainda, a condição de o estagiário ser tomado como tarefeiro a serviço do professor supervisor. Alguns depoimentos ilustram essas considerações:

Que pena que o estágio de docência tem muitos docentes que recebem pós-graduandos e que não realizaram ou não têm formação docente ou têm pouca prática docente, o que acaba por, ao invés de ajudar, aumentar a angústia e o medo [do estagiário] em relação a ser docente. Muitos docentes acabam utilizando-se do pósgraduando para fazer outras atividades ou, até mesmo, para deixarem de dar aula, não acompanhando o pós-graduando, que acaba sendo avaliado pelo parâmetro da turma. Observo que alguns docentes sentem receio de que o pós-graduando ministre uma aula melhor do que a sua, fazendo com que esse momento seja solitário ao invés de colaborativo, dialógico... Por fim, o pós-graduando sai com mais dúvidas do que começou. (P6).

Que pena que o estágio de docência não está configurado na modalidade de disciplina - com acompanhamento de professor do programa. (P9).

Ademais, os participantes indicaram que falta, aos pós-graduandos, “preparo prévio [ao estágio de docência]” (P5) e que “os supervisores nem sempre são preparados para receber o estudante” (P2). As fragilidades elencadas reafirmam a pertinência de que seja repensada a formação docente na pós-graduação, na direção de reorganizar e/ou criar estratégias que fortaleçam a aprendizagem da docência neste contexto.

Nessa direção, os participantes também discorreram sobre possibilidades de qualificação do estágio de docência, sugerindo que passe a integrar, efetivamente, a pós-graduação para todos os estudantes (P2, P4, P6, P8), que proporcione ao estudante experienciar diferentes realidades da graduação (P1, P3), que seja antecedido de uma oficina preparatória (P5), que considere a expertise do estudante na seleção do componente curricular de realização do estágio (P11), que “seja orientado por profissionais capacitados” (P2). Alguns depoimentos são apresentados para ilustrar as considerações dos participantes sobre esse tema:

Que tal se o estágio de docência se tornasse algo permanente na pós-graduação stricto sensu, como parte da formação integral do professor -pesquisador? (P4).

Que tal se o estágio de docência fosse uma prática obrigatória? Além disso, penso que poderia ter uma disciplina que apoiasse todas as etapas, como plano de ensino, plano de aula, como preparar uma aula (conteúdo e tempo), quais metodologias seriam melhores serem trabalhadas, processo avaliativo (P6).

Que tal se o estágio de docência fosse obrigatório para todos os pós-graduandos, mesmo os que são docentes? É uma oportunidade diferente daquela que está já acostumado a trabalhar (P8).

Que tal se o estágio de docência tivesse maior tempo de permanência [do estagiário] com o professor supervisor, maior engajamento para produção do plano de ensino e materiais didáticos, bem como maior autonomia e pró-atividade? Ainda, [que tal] melhorar a sensibilização dos alunos em aula para construir juntos esta prática de ensino? (P10).

Com base nessas proposições, explicamos a defesa aqui desenvolvida do estágio de docência e de sua elevação à condição de componente curricular na pós-graduação, para todos os estudantes, independentemente de serem ou não bolsistas e/ou docentes. Argumentamos, inclusive, que aqueles que têm experiência docente podem, por meio do estágio, refletir sobre sua prática e contribuir para a formação daqueles que não têm ou que têm menor experiência como professores. Além disso, todos, independentemente de terem ou não experiência docente, podem contribuir para o processo de formação permanente dos professores supervisores. Ou seja, colaborativamente, estagiários e supervisores podem (re)pensar e (re)inventar suas práticas, em diálogo, em confronto com a teoria, (re)criando a teoria. Parece que, em alguma medida, essa contribuição do estagiário já vem sendo reconhecida, visto que os participantes mencionaram “oxigenação das práticas da disciplina” (P5), “partilha de novas ideias, percepções e possibilidades de outras estratégias” (P7) e “novas ideias de metodologias” (P11).

Propomos, então, que se possa fazer avançar esta contribuição, fortalecendo o estágio de docência como espaço e tempo de aprendizagem da docência para pós-graduandos, professores supervisores e/ou professores orientadores, de modo que sejam criados momentos, ao longo do estágio, de encontro entre estes diferentes atores sociais, para diálogo e reflexão crítica teoricamente fundamentada sobre temas importantes da docência. Certamente, explorar questões técnicas, metodológicas e operacionais do fazer docente é relevante, especialmente para os menos experientes. Contudo, surge como fundamental também a organização de alguns encontros ampliados, que contemplem o debate sobre a função social do professor, os dilemas da profissão docente, a alienação do trabalho docente, entre tantos outros que aqui não foram sequer tangenciados por não constituírem objeto deste texto. Porém, o que defendemos é que o estágio de docência não precisa ser encaixotado, pasteurizado ou formatado, mas, seguramente, precisa ser repensado e reorganizado, no âmbito da pós-graduação, com vistas a cumprir o propósito de formação de professores para a qualificação da educação superior. Reside aí, a nosso juízo, a possibilidade maior de atuar sobre o estágio de docência, transformando-o de uma ação imediata, requisito para conclusão da pós-graduação, em uma atividade efetiva de aprendizagem da docência superior. Reforçamos que isso ganha ainda mais relevo quando se considera o contexto de produção deste estudo, a área da saúde.

Esse repensar e reorganizar pode se valer de estratégias diversas, como oficinas pedagógicas preparatórias, disciplinas, grupos de diálogo, construção de portfólios reflexivos, entre outras. No entanto, a nosso ver, o essencial, mesmo, é que o estágio de docência se oriente pelo trabalho como princípio educativo, que tenha a atividade como princípio de aprendizagem da docência, e que seja um processo formativo robusto para todos os envolvidos - formação inicial para uns e continuada/permanente para outros. Por essa via, o estágio de docência poderia contribuir para a elevação da pós-graduação a um novo patamar de impacto social, relevante e produtor de outros mundos possíveis.

Considerações Finais

Este estudo esteve interessado no estágio de docência e em possibilidades de qualificá-lo como estratégia de formação de professores bacharéis para a educação superior na área da Saúde. Isso, por si só, já se impõe como um desafio considerável, dadas as especificidades da área, além das condições históricas herdadas e que determinam, sobremaneira, o modo como vem se concebendo a docência, marcada, em geral, pela hegemonia de concepções liberais ou, mesmo, de visões ingênuas que se espalham pelo imaginário coletivo e pelas políticas educacionais, apontando a docência mais como dádiva do que como profissão, como trabalho cujo produto final é a humanidade. A ideia da docência como dom materializa-se nos formatos que esse trabalho assume nos diferentes tempos-espaços de percursos formativos, aparecendo, frequentemente, como penduricalho nos currículos de formação de professores, seja na graduação ou na pós-graduação, dando vida à lógica de que para ser professor basta, quando muito, fazer aqueles componentes curriculares pedagógicos, didáticos etc. para aprender umas dinâmicas que tornem mais prazeroso e movimentado o aprendizado de um dado conteúdo.

Seguimos impregnados por essas visões, temos ciência disso. Mas, também, exatamente pela consciência do que significa o trabalho docente para a humanidade, nos posicionamos na direção contrária a essas visões e nos colocamos nas trincheiras das concepções críticas, de modo especial, nas que concebem a docência como um trabalho criador, como uma atividade intencional, deliberada e comprometida com o desenvolvimento humano, compreendido na complexidade das condições históricas de constituição do gênero humano.

Assim, se nossas reflexões se originaram, aqui, na realidade da área da saúde, sublinhamos a convicção de que as questões tratadas contemplam outros contextos com outros objetos de estudo e pesquisa, que são nossos motivos para seguir investigando, aprendendo, estudando.

Importa destacar que o percurso de pesquisa em que produzimos este texto constitui (e vem se constituindo), já em si, um processo de aprendizagem da docência (mas não só) das autoras, na medida em que vem se materializando num esforço coletivo de estudar, apreender, compreender e operar a profissão da docência na educação superior (e em outras modalidades e espaços), sobre bases teóricometodológicas e epistemológicas marxistas e no escopo da Escola de Vigotski.

Nesses termos, se esta reflexão perseguiu a prática como foco central, temos ciência de que outros elementos se originam nos mesmos dados e podem/devem ser tomados como objetos para novos estudos, análises e sínteses. É o caso, nos parece, de ampliar o argumento em torno de como podemos traduzir a concepção de prática de estágio em prática social e conteúdo de problematização de atividade de ensino e de atividade de aprendizagem; ou, ainda, o sentido da atividade de trabalho como atividade-guia do tempo do desenvolvimento psíquico da pessoa adulta, caracterizado no e na estudante da pós-graduação, bem como os processos de ensinar e de aprender na relação entre graduação (que é onde irão atuar como docentes) e pós-graduação. Esses elementos merecem tratamento mais adequado, na continuidade de nosso estar em atividade, no cotejamento com a base teórica que nos sustenta e medeia nossa análise e nossas aprendizagens.

1A pesquisa que originou este estudo atendeu a todos os princípios e procedimentos éticos, tendo sido o projeto apreciado e aprovado por Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos (CAAE: 61408022.1.0000.0116).

2São atividades-guia: nos bebês, a comunicação emocional direta com os adultos próximos; na primeira infância, a atividade objetal manipulatória; no período pré-escolar, a brincadeira e o jogo simbólico; na fase escolar, o estudo; na adolescência inicial, a comunicação íntima pessoal; na adolescência final e vida adulta, a atividade profissional de estudo ou atividade trabalho/estudo; na velhice, o trabalho (MARTINS; ABRANTES; FACCI, 2016).

3Pensar a aprendizagem da docência sob este prisma requer, seguramente, um espaço específico para o necessário aprofundamento que não cabe nos limites deste texto. Sobre este tema, estamos nos debruçando com mais rigor, o que será objeto de novas reflexões. Para um aprofundamento do tema, sugerimos estudos da obra citada (LEONTIEV, 2021). Também são fundamentais os estudos de comentadores, como Roberto Valdés Puentes e Andrea Maturano Longarezi, entre outros autores, cujos trabalhos têm contribuído sobremaneira para pensar e propor mudanças na concepção e na organização da atividade de ensino e na atividade de aprendizagem por meio de discussões, traduções e pesquisas sobre a didática desenvolvimental de base histórico-cultural.

4Tratamos, aqui, da docência como uma profissão específica, como uma atividade/trabalho, cujo produto principal resulta na humanidade em cada indivíduo singular. Nestes termos, apoiamo-nos em Saviani (2013, p. 13), quando afirma que o ato educativo é “o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens.”

5Não cabe, no escopo deste estudo, uma análise mais elaborada dos conceitos de vivência e experiência em Vigotski. Contudo, uma necessária atenção a este conteúdo está sendo dada e será objeto de outras análises, consideradas as traduções mais recentes dos escritos deste importante pensador do desenvolvimento psíquico humano e do papel da educação neste desenvolvimento. Por ora, sinalizamos a relevância deste aprofundamento e sugerimos leituras de Pino (2010), Marques e Carvalho (2014), Roberti (2019) e Bittencourt e Fumes (2021).

REFERÊNCIAS

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Recebido: 18 de Março de 2023; Aceito: 05 de Julho de 2023

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