INTRODUÇÃO
A importância da expressão emocional foi percebida primeiramente por Charles Darwin. O naturalista descreveu que ela tinha influência na sobrevivência e adaptação das espécies, sendo que o espécime com maior aptidão teria mais oportunidades de se reproduzir, conservando, assim, as mutações benéficas para sua espécie (SBIE, 2019). Desde a teoria evolutiva de Darwin, compreende-se que mesmo que as manifestações emocionais tenham influências culturais, existem expressões, especialmente as faciais, que são inatas, tanto para os seres humanos quanto para os chimpanzés e outros primatas (Miguel, 2015).
Muitos pesquisadores e teóricos estudaram e se aperfeiçoaram sobre esse conceito ao longo dos anos. No entanto, foi no ano de 1990 que Peter Salovey e John Mayer publicaram um artigo que conceituou inteligência emocional (IE), trazendo grande repercussão no mundo todo (SBIE, 2019). A IE foi descrita como uma capacidade inter e intrapessoal, constatando que quem possui qualidades como negociação e empatia podem alcançar o sucesso com mais facilidade (Goleman, 2012).
As primeiras práticas de IE mostraram que as pessoas possuíam habilidade em identificar emoções através de formas, rostos, cores e também investigaram como compreendiam as emoções de personagens. Foi entre os anos 1994 e 1997 que aconteceu a popularização do termo, período em que Daniel Goleman publicou seu livro com o título Emotional Intelligence (1996), causando a mudança de conceito da IE, que passou, então, a abranger aspectos da personalidade. Atualmente, debates sobre a IE dão enfoque às contribuições que ela oferece para a compreensão sobre o bem-estar e o sucesso escolar e também profissional do indivíduo (Tessaro e Lampert, 2019; Carvalho, 2020; Queirós et al., 2021).
Nesse sentido, as escolas exercem um papel ativo no desenvolvimento emocional de crianças e jovens, pois é um processo muito influído pelo meio. A educação emocional (EE) em escolas já é praticada como disciplina do currículo em alguns países, por exemplo, Estados Unidos, Cingapura, Malásia, Hong Kong, Japão, Coreia, Reino Unido, Austrália, Nova Zelândia e África, sendo nomeada como A Ciência do Eu ou Alfabetização Emocional. Em contrapartida, outras escolas a trazem como programas relacionados à resolução criativa de conflitos e ao desenvolvimento e à competência social (Goleman, 2012).
A EE deve ir além de desenvolver habilidades nos educandos, deve também levá-los a conhecerem-se emocionalmente, fazendo com que as crianças consigam lidar com sintomas de estresse e ansiedade, diminuir comportamentos agressivos, entre outros (Santos, 2018; Mira-Galvañ e Gilar-Corbi, 2020). Além disso, desenvolver habilidades socioemocionais na infância é uma alternativa para gerar resiliência e diminuir a possibilidade de desenvolver transtornos mentais na adolescência e vida adulta. A EE vem se mostrando um influente instrumento de mudança social, desenvolvendo nos indivíduos características empáticas, colaborativas e mais humanitárias (Caminha, Caminha e Dutra, 2017).
A partir do momento que o professor é capaz de reconhecer as emoções dos alunos, irá criar um laço fértil e acessível para uma ótima interação (Osher et al., 2020). Para isso, deve-se organizar estratégias e utilizar materiais apropriados para as faixas etárias de cada turma, por exemplo, ao trabalhar com crianças menores, é importante usar ferramentas que possam concretizar as emoções (Instituto Ayrton Senna, 2019). Assim, qualificar os professores no seu âmbito emocional, através de programas de formação, é muito indicado, além de também ser uma necessidade notada por eles (Goldberg et al., 2019).
Destaca-se a relevância de conhecer programas de educação emocional (PEE) e a percepção de professores sobre o tema, pois entende-se que a criança que reconhece e expressa o que sente aprende a lidar com situações do cotidiano de forma mais saudável, implicando também no modo como gerenciará seus sentimentos na vida adulta (Osher et al., 2020; Souza, Ferreira e Souza, 2021). Dessa forma, o presente estudo teve como objetivo analisar as percepções de professores sobre os impactos e as mudanças de comportamento após a realização de um PEE com crianças matriculadas na educação infantil.
METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa de cunho qualitativo e exploratório (Sampieri, Collado e Lucio, 2013). As participantes foram selecionadas pelo critério de conveniência, ou seja, participaram da pesquisa cinco professoras que realizaram um PEE com crianças de 3 a 5 anos matriculadas na educação infantil em uma escola particular localizada na região norte do Rio Grande do Sul. Os critérios de inclusão foram: professoras que tinham formação no curso de Pedagogia, maiores de 18 anos e que atuaram em um PEE com alunos matriculados na educação infantil no ano de 2019. Excluíram-se professoras que não acompanharam a turma durante todo o período letivo. Com o intuito de preservar o anonimato das participantes, seus nomes foram trocados pela letra “P”. Os números correspondem à identificação numérica de cada participante, conforme o Quadro 1.
Participante | Idade | Estado civil | Tempo de formação | Especialização | Idade das crianças |
---|---|---|---|---|---|
P1 | 37 | Casada | 15 anos | Psicopedagogia Clínica e Institucional | 5 anos |
P2 | 30 | Casada | 5 anos | Educação Infantil e Anos Iniciais | 3 anos |
P3 | 45 | Casada | 15 anos | Educação Infantil e Anos Iniciais | 3 anos |
P4 | 44 | Casada | 10 anos | Alfabetização | 5 anos |
P5 | 44 | Casada | 8 anos | Psicopedagogia Clínica e Institucional | 4 anos |
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Para alcançar o objetivo desta pesquisa, foi utilizada uma entrevista semiestruturada on-line. A entrevista on-line foi feita de forma síncrona, ou seja, a pesquisadora entrou em contato com cada participante em uma sala de bate-papo e realizou a entrevista enquanto ambas estavam on-line. Nesse formato, a conversa acontece de forma mais natural, é possível analisar elementos como o estado emocional do participante, há uma maior interação entre ambos e as questões podem ser mais bem discutidas (Flick, 2017).
Optou-se pela escolha do aplicativo Zoom Meeting, que proporciona aos seus usuários um alto padrão de privacidade, garantindo, assim, o sigilo da pesquisa. As reuniões não podem ser monitoradas ou armazenadas pelo aplicativo, ao menos que seja solicitado por seu provedor. Caso opte por gravar a conversa, o palestrante é responsável por obter o consentimento dos participantes, e o Zoom possui também uma ferramenta que indica quando a gravação está ativada. Por isso, no Termo de Consentimento Livre foi esclarecido como a pesquisa iria ocorrer, antes do consentimento da entrevistada (ibidem).
A pesquisadora entrou em contato com a direção da escola para apresentar os objetivos da pesquisa e a diretora e a coordenadora da escola autorizaram a realização do estudo. Após, obteve-se a aprovação do Comitê de Ética mediante Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE) 32362920.4.0000.5319, parecer número 4.109.961.
Posteriormente, a pesquisadora realizou ligações telefônicas para as professoras da educação infantil informando sobre o objetivo da pesquisa e as convidou para participarem. Diante do aceite, as entrevistas foram agendadas e realizadas, individualmente, pela plataforma Zoom. Na data agendada, foram retomados os objetivos do estudo e esclarecidas dúvidas das participantes. Ainda foram reforçadas questões como sigilo, preservação da identidade dos participantes e garantia de que os resultados do estudo seriam usados apenas para fins de pesquisa. Informou-se, a todos os participantes, que a entrevista seria gravada e que, após a análise das transcrições, os arquivos seriam apagados. A coleta de dados ocorreu no mês de julho de 2020. Cada entrevista teve duração de, aproximadamente, 40 minutos.
A entrevista foi composta das seguintes questões norteadoras: o que são emoções?; o que você pensa sobre a inclusão da EE no currículo escolar?; como foi a realização do PEE com as crianças em sua sala de aula? que idade elas tinham? quais as reações delas?; você notou mudanças nas crianças após a realização do programa? quais?; qual a importância das emoções no processo de aprendizagem da criança?; você percebe com facilidade seus próprios sinais emocionais?; você acredita ser necessário conhecer e desenvolver a própria competência emocional para exercer sua profissão?
As entrevistas foram transcritas com fidedignidade e os dados foram analisados pelo método de análise de conteúdo proposto por Bardin (2011). A análise de conteúdo se caracteriza como um conjunto de técnicas de análise da comunicação e tem como objetivo alcançar conhecimentos específicos sobre as condições de produção ou recepção dessas mensagens. Esse método possui três etapas: a pré-análise; a exploração do conteúdo; e o tratamento dos resultados, inferência e interpretação. A primeira etapa envolve a organização, ou seja, a escolha dos documentos a serem utilizados nas formulações das hipóteses e dos objetivos e a elaboração de indicadores que auxiliem na interpretação dos resultados finais. A exploração do conteúdo é a fase em que se utiliza o material já escolhido na pré-análise e são definidas codificações, enumerações e regras para a classificação do material abordado. No último estágio, é realizada a separação dos dados que serão utilizados na análise e também é o momento em que se faz o levantamento crítico do conteúdo (Bardin, 2011).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir da análise de dados, foram elencadas cinco categorias, sendo elas: Conceituando emoções; Percepção sobre a inclusão da EE no currículo escolar; Estratégias para a realização do PEE com as crianças em sua sala de aula; Mudanças nas crianças e professoras após a realização do programa; Professor: trabalhando suas próprias emoções.
CONCEITUANDO EMOÇÕES
Essa categoria buscou investigar como as professoras da educação infantil entendem o conceito de emoções. Todas as participantes associaram as emoções aos sentimentos, conforme os depoimentos:
P2 - Para mim, emoção é o que nos move em muitos dias, porque, assim, se a gente está bem, tudo bem, a gente consegue trabalhar e fazer tudo que tem que fazer, mas quando alguma coisa não está bem, que está triste com alguma coisa, que aconteceu alguma coisa, parece que não se tem aquele ânimo para fazer as coisas.
P3 - Emoções são o que a gente sente, são os nossos sentimentos, tipo se eu estou alegre, se alguma coisa me transmite alegria, é um sentimento, é uma emoção.
P4 - Para mim, é o interior da pessoa, é o sentimento, o que a pessoa sente. Muitas vezes, a pessoa não consegue expressar o que está sentindo e, às vezes, ela precisa de um auxílio, de uma ajuda para demonstrar o seu sentimento.
O significado da palavra “emoção” pode parecer irrefutável, contudo, ao ter que explicá-la, percebe-se que não é uma tarefa simples (Roazzi et al., 2011; Miguel, 2015). Mesmo que as pessoas usem expressões iguais ao tentar defini-la, não quer dizer que a compreensão seja a mesma (Roazzi et al., 2011). É necessário entender que a emoção não é mais percebida como uma reação única, mas sim um processo que envolve múltiplas variáveis. Nesse sentido, a emoção pode ser definida como uma condição complexa e efêmera que surge na vivência, através de características emocionais que levam a mudanças em vários campos das funções mentais e físicas, preparando os indivíduos para a ação (Miguel, 2015). A expressão emocional traz como o indivíduo percebe e se relaciona com o mundo (ibidem).
Em cada emoção, o organismo apresenta três reações: uma no nível psicológico, a outra no nível físico e a terceira no nível comportamental. No primeiro nível, há uma experiência psicológica emocional, que pode ser de agitação ou lentidão. No nível físico, o corpo experimenta reações internas durante as mudanças emocionais, e a pessoa pode sentir o coração bater mais rápido e a respiração aumentar. Outra reação que a emoção determina é a mudança de comportamento, surgindo uma tendência para a aproximação ou o afastamento do objeto que produz o estímulo (Santos, 2000). Ainda a emoção remete a um sentimento e seus diferentes pensamentos, estados psicológicos e biológicos e a uma série de predisposições para se comportar (Goleman, 2012).
Embora as emoções e os sentimentos façam parte de um ciclo homogêneo, eles são processos distintos (Damásio, 2012). As emoções são responsáveis pela caracterização do comportamento diante de algum acontecimento, o que pode acontecer de forma inesperada - por exemplo, a pessoa se emociona e demostra de forma evidente, que pode ser notada por meio de um ou mais dos três níveis de reações (Hilário, 2012). Por outro lado, os sentimentos são as percepções do que ocorre no nosso corpo e mente quando uma emoção está em andamento. Em relação ao corpo, os sentimentos são imagens de ações, e não ações de fato. Embora determinados sentimentos estejam conectados com as emoções, muitos não estão, pois todas as emoções resultam em sentimentos, mas nem todos os sentimentos decorrem de emoções (Damásio, 2012).
Ainda as emoções antecedem os sentimentos porque, no desenvolvimento biológico, foi nessa ordem que vieram. As emoções são estabelecidas por meio de reações simples que promovem a sobrevivência dos organismos e foram facilmente aceitas através da evolução. O sentimento de emoção, em seu sentido mais puro, refere-se à ideia de que o corpo funciona de uma determinada maneira. De acordo com essa definição, a palavra “ideia” pode ser trocada por “pensamento” ou “percepção” (Damásio, 2011). As respostas fisiológicas e motoras também se adaptam aos pensamentos gerados por uma série de reações (Mendes, 2016).
PERCEPÇÃO SOBRE A INCLUSÃO DA EDUCAÇÃO EMOCIONAL NO CURRÍCULO ESCOLAR
Essa categoria englobou a percepção das professoras sobre a inclusão da EE no currículo escolar. As participantes destacaram a importância de haver EE na escola, segundo as falas:
P2 - Muito bom. A importância de trabalhar esse emocional desde pequeninho para a criança conseguir identificar o que ela está sentindo. Se ela ficou brava com o colega porque ele pegou o brinquedo, ela precisa entender que é normal ficar brava. É normal sentir raiva, mas temos que saber lidar com isso para que fique tudo bem, para a criança não sair batendo no colega.
P3 - Eu acho bem importante, a educação socioemocional é uma maneira de ensinar eles a lidar com as frustrações. A gente sempre trabalhou o abraçar, o pedir desculpas, e isso tudo é voltado às emoções.
P4 - Eu acho muito válido, muito válido mesmo, porque eu percebo, depois que nos ali da escola iniciamos esse projeto, esse trabalho de trabalhar as emoções com as crianças, a evolução que teve, tanto na maneira das crianças expressarem mais os seus sentimentos.
A EE aparece no ambiente escolar como um instrumento capaz de modificar comportamentos, por meio do qual os alunos aprendem pela prática e pelo treino, regulando, assim, as suas emoções (Andrade, Andrade e Leal, 2019; Possebon e Possebon, 2020). Sabe-se que a emoção é um componente inerente ao pensamento, à ação, à motivação, à comunicação e que, por meio da ação, se torna fundamental para uma aprendizagem relevante, ponderando que estudantes e professores necessitam estar envolvidos no processo educativo para que este seja atraente e bem-sucedido. Levar em conta as emoções no processo educativo é criar um desenvolvimento humano, que não se atenta exclusivamente para notas, mas que coloca o indivíduo no centro da discussão em toda a sua importância e sentimentalidade (Mendes, 2016; Pérez e Filella, 2019).
Nesse sentido, é esperado da escola um relacionamento que aperfeiçoe o autoconhecimento através da regulação emocional à proporção que se reflete no desenvolvimento integral do indivíduo (Andrade, Andrade e Leal, 2019). A EE no âmbito escolar tem uma finalidade, antes de tudo, preventiva e almeja que o aluno desenvolva habilidades que auxiliem na identificação e no controle das emoções. Crianças que têm esse preparo são mais saudáveis e exibem um bom desempenho acadêmico e melhor relacionamento com outras pessoas, têm menos problemas de conduta e são menos tendentes à violência (Mendes, 2016; Pérez e Filella, 2019; Mira-Galvañ e Gilar-Corbi, 2020; Strahan e Poteat, 2020). Assim sendo, os professores não podem almejar que os alunos apenas reflitam e entendam a matéria, mas é preciso também possibilitar situações de aprendizagem em que os alunos sejam capazes de sentir o conteúdo estudado. Através da educação emocional pode-se viver de uma forma mais tranquila e conexa ao mundo, pois o controle das emoções colabora com a união das naturezas sensível e racional (Andrade, Andrade e Leal, 2019; Barrios-Tao e Pena Rodrigues, 2019).
ESTRATÉGIAS PARA A REALIZAÇÃO DO PROGRAMA DE EDUCAÇÃO EMOCIONAL COM AS CRIANÇAS EM SALA DE AULA
Essa categoria procurou compreender a forma como as professoras realizam o PEE. A partir dos depoimentos, pode-se identificar que a maioria utilizou a roda de conversa ou brincadeiras, focando algo mais lúdico, segundo os relatos abaixo:
P1 - Procurava sempre começar de um jeito diferente, fazer uma rodinha ou fazer uma música para introduzir, as histórias são poesias, narrações e canções. A gente tem esse recurso para começar a aula de um jeito diferente, sabe?
P2 - A contação das histórias sempre tem as atitudes saudáveis e as atitudes não saudáveis, então, geralmente, o personagem começa com uma atitude não saudável, pega o brinquedo sem pedir emprestado, daí ali já há uma briga, mas depois ele percebe que isso não é legal e ele muda a atitude, sabe? E, assim, as crianças conseguiam compreender. A educação socioemocional é muito de trocar, fazer carta para o colega, fazer cartão, brincar junto, fazer um jogo cooperativo.
P4 - A cada aula que tinha, trabalhava um tipo de emoção. E sempre fazia a roda de bate-papo, de conversas, e cada um podia se expressar, analisar o que foi trabalhado na leitura, na história, e cada um podia falar, expressar as suas emoções.
P5 - Por exemplo, se você vai trabalhar a gentileza, tem uma história, e daí tem todos os personagens, tem os animais da floresta viva, tem vários animais, e esses animais falam, tem sentimentos, enfim, e aí tem a história, você conta a história e toda lição tem história e tem música. A gente baixa no celular a música, canta, dança, é bem lúdico, né? E, geralmente, tem atividade ou de pintura, fazer máscara com eles, alguma atividade artística junto, né? Então, tem a história, a música, a brincadeira e a atividade.
O lúdico é de extrema importância para a saúde mental dos indivíduos, sendo um elemento ao conhecimento e a autorregulação das emoções (Andrade, Andrade e Leal, 2019). O brincar requer atenção de pais e educadores, pois é um espaço no qual a criança se expressa da forma mais genuína (Modesto, Silva e Fukui, 2020). Entende-se que é essencial a inserção do brincar na educação das emoções, visto que auxilia na compreensão das vivências conflituosas que surgem no convívio entre as pessoas. Dessa forma, é possível constituir conhecimentos e permitir às crianças pensarem para encontrar um comportamento mais assertivo de acordo com suas necessidades, pondo em prática a sua criatividade diante de situações adversas (Andrade, Andrade e Leal, 2019).
Para alcançar um ensino mais eficaz, é indispensável oferecer novas metodologias que sejam inovadoras e agradáveis. O lúdico, na educação infantil, tem se mostrado como uma das principais técnicas que auxiliam na promoção de um aprendizado diferenciado e de qualidade para a criança. Embora exija um planejamento cuidadoso em sua execução, a atividade lúdica é um recurso bastante dinâmico que proporciona resultados eficazes na educação (Modesto, Silva e Fukui, 2020). A criança aprende quando associa sua maneira de ver com seu modo de pensar e sentir, por isso, a prática por meio das experiências é a melhor metodologia para fazer com que a criança exercite seus pensamentos e sentimentos (Andrade, Andrade e Leal, 2019).
Quando o professor utiliza a ludicidade, possibilita que o aluno modifique sua visão a partir de novas experiências que favorecem na constituição de uma visão de mundo mais reflexiva e potencializada, relacionando o passado com as distintas realidades da vida (ibidem).
As brincadeiras com objetivo pedagógico beneficiam no processo de ensino e aprendizagem, tornando o aluno mais consciente de seu papel na sociedade e proporcionando excelentes resultados no desempenho escolar. As atividades lúdicas, associadas com a motivação e o interesse do aluno e o domínio do professor, possibilitam novas maneiras de ensinar e aprender (Carmo e Cintra, 2018; Modesto, Silva e Fukui, 2020).
MUDANÇAS NAS CRIANÇAS APÓS A REALIZAÇÃO DO PROGRAMA
Essa categoria refere-se às mudanças percebidas nas crianças após a realização do PEE. As mudanças mais perceptíveis foram a identificação de atitudes positivas e negativas, o compartilhamento de brinquedos e as gentilezas com colegas e professores, conforme relatos:
P1 - A gente consegue perceber a diferença nas atitudes das crianças, a gente fala muito em gentileza, em compartilhar, em respeito, então, quanto mais cedo, mais resultados positivos você vai encontrar pela frente.
P2 - É um aprendizado que não é só ali, porque a gente trabalhou um aprendizado para a vida. A gente vê que tem resultado, sabe?
P3- Quando nem tudo acontece da forma que é, eles não conseguem se expressar ou simplesmente lidar com o que está acontecendo, e, quando tem a educação socioemocional, é uma maneira de ensinar eles a aprender a lidar com as frustrações.
P4 - Depois que nós, ali da escola, iniciamos esse projeto, esse trabalho de trabalhar as emoções com as crianças, a evolução que teve, tanto na maneira das crianças expressarem mais os seus sentimentos [...] E eu percebia assim que, aquelas crianças mais tímidas, mais reservadas, com o tempo foram conseguindo colocar mais para fora, conseguiram falar mais, desde o compartilhar brinquedos, o brincar no pátio, sabe? Evoluíram bastante.
Os depoimentos indicam uma melhora nas relações interpessoais e na expressão de seus sentimentos, o que vem ao encontro da literatura mostrando que trabalhar as emoções em sala de aula melhora as competências sociais e emocionais dos alunos dentro e fora da escola e também da capacidade de aprender (Goleman, 2012). Competências como lidar com a raiva e frustração, desenvolver empatia e apresentar melhora no senso de humor e maior disposição para aprender são desenvolvidas em programas de EE na escola (Pérez e Filella, 2019). O aprendizado sobre habilidades de autorregulação das emoções e resolução de problemas auxiliam as crianças no manejo da agressividade e protegem contra problemas de comportamento, bem como no desenvolvimento de transtornos psiquiátricos (Bonfatti et al., 2021).
Uma pesquisa realizada na rede municipal da cidade de Queimadas, na Paraíba, mostrou resultados sobre os impactos do programa de formação em EE. A maioria dos docentes relatou mudança de comportamento em alunos que eram agressivos e tímidos (Possebon e Possebon, 2020). Também um estudo com alunos do jardim de infância da rede pública na cidade de Portalegre apontou que a maior parte das crianças aprendeu a identificar e reconhecer as emoções, apresentando um bom desenvolvimento e equilíbrio emocional. Pode-se dizer, então, que, nesse caso, as crianças têm um desenvolvimento emocional correspondente à sua idade e que tal irá cooperar para o futuro (Catarreira, 2015).
Os alunos que conseguem controlar suas emoções apresentam comportamentos mais adaptativos e melhor desempenho escolar (Usan Supervia e Salavera Bordas, 2018), por exemplo, atitudes como manter a calma durante prova ou atividades e respeitar a opinião do outro, o que facilita uma comunicação e interação positiva com os demais (Medeiros e Moura, 2020). Nesse sentido, um estudo realizado com uma turma do terceiro ano do ensino básico em Portugal que avaliou a eficácia de um programa de regulação emocional realizado por professoras mostrou que os alunos apresentaram maior consciência das suas aptidões e dificuldades, ou seja, maiores autoeficácias escolar e emocional, o que acabou refletindo em um ambiente mais acolhedor e favorável ao trabalho e à aprendizagem (Esteves, 2011).
PROFESSOR: TRABALHANDO SUAS PRÓPRIAS EMOÇÕES
Essa categoria abrangeu o reconhecimento e manejo das próprias emoções por parte das professoras. Todas as professoras reconhecem a importância de trabalharem suas emoções para desenvolver o PEE com as crianças, segundo as narrativas que seguem:
P2 - Quando a gente está bem, a gente consegue ser melhor para todos e, como profe de educação infantil, também é importante a gente estar bem, porque eles copiam muito do que a gente faz e também percebem quando a gente não está bem e, então, é importante. E, como te disse, o ano passado, busquei fazer terapia, porque, quando a gente não está bem, a gente não consegue ser uma boa profe com os pequeninhos, ter a paciência, mas também a firmeza que é necessária, né?
P4 - Acho muito importante sim, porque a professora, na verdade, tem que estar bem consigo mesma para poder transmitir isso para as crianças.
P5 - A professora tem que estar bem para exercer o seu trabalho, porque ela transmite, na verdade, tudo isso para a criança.
Os programas de EE auxiliam os professores na sua prática diária, contribuindo com a promoção do cuidado relacionado à saúde mental nas escolas (Motta e Romani, 2019). A sala de aula pode ser um ambiente acolhedor ou não, isso dependerá da forma como o professor lida com as suas emoções e as de seus alunos. Os docentes precisam aprender a avaliar suas emoções, pois ignorar a afetividade pode ampliar as crises e os conflitos nas aulas (Mendes, 2016). Nessa interação entre professor e aluno, existe o contágio emocional, isto é, uma influência do estado emocional do professor, por meio de uma repetição involuntária de gestos, tom de voz ou expressão facial (Goleman, 2012). Entende-se que os educadores também necessitariam utilizar desse contágio, com o intuito de tornar melhor as relações interpessoais em sala de aula, pois, quanto mais síncronos estivessem com os estudantes, maior seria o envolvimento e interesse em estudar (Mendes, 2016).
Algumas crianças chegam à escola com carências emocionais e sociais e isso traz ao professor um grande desafio: ao mesmo tempo em que precisa ensinar aos alunos, ele também necessita de um preparo emocional para gerenciar suas próprias emoções - somente assim será capaz de auxiliar no despertar emocional de seus alunos. Por isso, é uma necessidade emergente desenvolver a competência emocional do professor, ponderando frustrações e problemáticas de sua profissão (Silva e Silva, 2009). A empatia, capacidade de compreender o que os outros sentem, está ligada à intepretação de sinais não verbais advindos da expressão emocional alheia e ao conhecimento das próprias emoções. Essa habilidade é importante nas relações sociais, pois é por meio da leitura emocional que os indivíduos compreendem melhor as pessoas com que se relacionam (Goleman, 2012).
Considera-se que, para qualquer indivíduo, mas, em especial para os professores, seja essencial entender os conceitos conexos às emoções, aos sentimentos e à afetividade, pois estes possuem as habilidades imprescindíveis para a consciência e compreensão emocional (Mendes, 2016). A educação é um processo que visa ao desenvolvimento da sociedade e deve atentar às necessidades biológicas e sociais dos seres durante sua vida, mesmo que, no decorrer desse caminho, sofrerá algumas influências do meio. Para os professores, são impostas várias cobranças, pois realizam um serviço social e de caráter pessoal, devendo ele ser possuidor de inúmeras habilidades e conhecimentos. Porém, a relação entre professor e aluno estabelece uma nova dinâmica de intensas relações interpessoais, não se limitando apenas à representação de papéis diferentes (Silva e Silva, 2009).
No contexto de desenvolver um trabalho com as emoções em sala de aula, professores de uma escola da rede pública na Bahia relataram dificuldades em compreender, lidar e gerenciar suas emoções e as de seus alunos. Porém, a maioria dos docentes percebe a importância e a necessidade de desenvolver e saber lidar com suas emoções para que possa auxiliar seus alunos (ibidem). Ainda os docentes de uma escola particular no Maranhão referem que o trabalho com as emoções é indispensável no contexto de aprendizagem, entendendo que, quanto maior for o conhecimento sobre si, maior a capacidade para gerir suas emoções e controlar situações adversas, auxiliando o aluno (Silva, 2018).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados apontaram uma melhora na aprendizagem e no relacionamento interpessoal. No ambiente escolar, a inclusão de um PEE mostrou-se muito importante, pois auxilia os indivíduos a, desde pequenos, por exemplo, identificar e saber como agir em situações adversas ou até mesmo do dia a dia. Indicam também uma melhora nas competências emocionais e sociais na escola, pois os alunos apresentaram mais facilidade de identificar suas emoções, demonstraram atitudes de respeito no convívio entre eles, compartilharam seus brinquedos e gentilezas com colegas e professores e mostraram maior tolerância às frustrações. A EE traz ao professor um grande desafio, pois ele precisa ensinar os alunos ao mesmo tempo em que ele também necessita de um preparo. Por isso, nota-se a necessidade de desenvolver a competência emocional do professor, avaliando as problemáticas de sua profissão.
Para a realização do PEE, uma das técnicas inseridas na educação infantil e que tem se mostrado muito importante é o lúdico. Atividades que utilizam essa técnica auxiliam para um aprendizado diferenciado e de qualidade para a criança. Na educação das emoções, mostra-se essencial, pois auxilia na compreensão das vivências conflituosas que surgem no convívio entre os indivíduos. Através disso, é possível criar novos conhecimentos e fazer com que as crianças pensem para encontrar um comportamento mais assertivo de acordo com suas necessidades, pondo em prática a sua criatividade diante das mais variadas situações. Nesse sentido, espera-se da escola uma relação que aprimore o autoconhecimento por meio da regulação emocional, o que irá refletir no desenvolvimento integral do indivíduo.
Este estudo esteve limitado a professores que atuam na rede particular de ensino. Para pesquisas futuras, sugere-se investigar como as escolas públicas trabalham a EE com crianças. Também torna-se importante investigar quais as mudanças que os pais perceberam nas crianças após a realização do PEE.