1 Introdução
A Inclusão em Educação como uma nova proposta de cultura escolar visa o desenvolvimento de uma escola “para todos” (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura [UNESCOENT], 1990), sendo um dos grandes desafios no cenário educacional. Uma escola para todos é uma escola em movimento, que busca transformar e superar as desigualdades entre seus pares e promover o desenvolvimento de culturas, políticas e práticas de cidadania, exercício de direitos humanos, democracia, respeito, entre outros. É a capacidade de uma unidade escolar em empenhar-se na geração inovadora de uma postura de heterogeneidade, em detrimento da antiga, mas ainda proeminente, cultura de homogeneização de nossas escolas.
Destarte, é necessário um aporte teórico e prático, a partir do qual uma série de relações precisa ser ressignificada, ou seja, é preciso romper com uma prática que prioriza a quantidade em detrimento de um trabalho de qualidade, para que se atinja uma educação democrática, cujas relações sejam igualitárias ou menos desiguais, e os direitos de todos, garantidos com igualdade (Santos, 2003). Uma das possibilidades de levar-se tal tarefa a cabo é por meio do desenvolvimento do Index para a Inclusão (Booth & Ainscow, 2012a) em contextos institucionais escolares. Esse material existe desde o ano de 2000 e tem sido atualizado frequentemente por seu principal autor (Tony Booth), estando, hoje, em sua quarta edição. De uso simples e natureza provocativa, já se encontra traduzido para 40 línguas, em vários países. Utilizado em pesquisas e iniciativas de formação continuada nas escolas, o Index tem se mostrado um profícuo instrumento para promover o repensar e a ressignificação de culturas, políticas e práticas de inclusão em educação, o que pode ser verificado, inclusive, na página do site da Index for Inclusion Network (Rede do Index para a Inclusão)6.
Tendo em vista a notoriedade cada vez maior deste material, assim como o fato de sua utilidade no campo da Educação Especial para o desenvolvimento das escolas em uma perspectiva de inclusão, como comprovarão alguns dos estudos pesquisados na presente investigação, este artigo tem por objetivo realizar uma revisão teórica narrativa sobre a construção teórico-metodológica e o potencial de desenvolvimento do documento Index para a Inclusão.
Mostrar a complexidade de uma construção teórica e metodológica de um fenômeno não é uma tarefa fácil, mas necessária, para que se possa realizar interlocuções com outros estudos, buscando-se quais as singularidades que envolvem tal fenômeno. Igualmente, é importante buscar uma metodologia de construção do fenômeno, neste caso, o Index para a Inclusão, para atestar sua cientificidade, com o intuito de auxiliar na ampliação de novas propostas de estudo e intervenções mais adequadas, visando à educação inclusiva.
2 O desenvolvimento do “Index para a Inclusão”
O “Index para a Inclusão: desenvolvendo a aprendizagem e a participação nas Escolas”, “[...] é um material para apoiar o desenvolvimento inclusivo de escolas. É um documento abrangente que pode ajudar qualquer um a encontrar seus próprios próximos passos no desenvolvimento de seus ambientes inclusivos [...]” (Booth & Ainscow, 2012a, p. 6). O Index foi concebido no ano de 1998, ao longo de um projeto de pesquisa intitulado Developing sustainable Education Inclusion policy and practice: England, South Africa, India and Brazil,7 que, internacionalmente, é conhecido como The 4 Nations Project8, tendo sido financiado pela UNESCO e coordenado pelos professores Tony Booth e Mel Ainscow.
No Brasil, o estudo foi coordenado pela professora Mônica Pereira dos Santos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que o vem desenvolvendo em diferentes instituições educacionais. A autora ressalta que os professores Booth e Ainscow lançaram a primeira versão do Index em 2000, traduzida para o português em 2002 pela referida professora, cujo Laboratório de Pesquisas, Estudos e Apoio à Participação e à Diversidade em Educação (LaPEADE9), na UFRJ, tem sido, desde então, fomentador da utilização do Index no Brasil (Santos, 2009).
Para enriquecer e garantir mais fidedignidade e validade à primeira versão, os professores autores convidaram os demais países do Projeto 4 Nations para a aplicação do material em suas escolas, obtendo como experiência novos delineamentos e viabilizando a segunda versão do Index, publicada em 2002 na Inglaterra e traduzida para o Brasil em 2006.
No momento atual, o “Index para a Inclusão” encontra-se em sua quarta versão, lançada na Inglaterra em 2015 e em fase de tradução para o Brasil. Na terceira edição, alterada significativamente por Tony Booth, o material responde e contempla inúmeras contribuições e reflexões circunstanciadas por outros países (Santos, 2015).
No Brasil, o “Index para a Inclusão” vem sendo, portanto, trabalhado, por mais de uma década, em associação a grupos internacionais de pesquisa, investindo em produções científicas relativas ao referido material, comprovando sua eficácia em diferentes realidades brasileiras. Por tratar-se de uma proposta cuja flexibilidade estrutural permite sua adaptação a uma diversidade de contextos, o Index gera uma construção cultural, política e de práticas institucionais transformadoras em direção à inclusão educacional.
Com tal característica, a utilização do Index permite um processo de revisão detalhado da escola e de sua relação com a comunidade e seu entorno, abrangendo os professores, os funcionários, os gestores, os pais/responsáveis e as crianças, aspirações para o desenvolvimento institucional orientado pela inclusão com o que já é conhecido pela escola e impelindo a um procedimento investigativo mais apurado. Baseia-se nos princípios de “[...] barreiras à aprendizagem e à participação, recursos de apoio à aprendizagem e à participação e apoio à diversidade [...]” (Booth & Ainscow, 2012a, p. 13). O Index propõe a compreensão dos processos institucionais a partir de três dimensões: culturais, políticas e práticas. Cada dimensão divide-se em duas seções ou eixos, formando uma estrutura de planejamento. Os tópicos de planejamento em cada seção ajudam a assegurar que as ações ofereçam suporte umas às outras, conforme o Quadro 1.
Dimensão A | Criando culturas inclusivas | A1 - Edificando a Comunidade |
A2 - Estabelecendo valores inclusivos | ||
Dimensão B | Produzindo políticas inclusivas | B1 - Construindo a escola para todos |
B2 - Organizando o apoio à diversidade | ||
Dimensão C | Desenvolvendo práticas inclusivas | C1 - Construindo currículos para todos |
C2 - Orquestrando a aprendizagem |
Fonte: Booth e Ainscow (2012a, p. 13).
Por conseguinte, as implicações desse processo legal consistem no reconhecimento da igualdade de valor (Booth, 1981) e de direitos entre seres humanos e na consequente tomada de atitudes e de decisões por parte da escola, visando o desenvolvimento de culturas, de políticas e de práticas inclusivas. Nesse sentido, compactuamos com a definição de “cultura inclusiva” como sendo
criação de comunidades seguras, acolhedoras, colaborativas, estimulantes, em que todos são valorizados. Os valores inclusivos compartilhados são desenvolvidos e transmitidos a todos os professores, às crianças e suas famílias, gestores, comunidades circunvizinhas e todos os outros que trabalham na escola e com ela. Os valores inclusivos de cultura orientam decisões sobre políticas e a prática a cada momento, de modo que o desenvolvimento é coerente e contínuo. A incorporação de mudança dentro das culturas da escola assegura que ela esteja integrada nas identidades de adultos e crianças e seja transmitida aos que estão chegando à escola (Booth & Ainscow, 2012a, p. 46).10
Já as “políticas inclusivas” procuram garantir que:
a inclusão permeie todos os planos da escola e envolva a todos. As políticas encorajam a participação das crianças e professores desde quando estes chegam à escola. Elas encorajam a escola a atingir todas as crianças na localidade e minimiza as pressões exclusionárias. As políticas de suporte envolvem todas as atividades que aumentam a capacidade da ambientação de responder à diversidade dos envolvidos nela, de forma a valorizar a todos igualmente. Todas as formas de suporte estão ligadas numa única estrutura que pretende garantir a participação de todos e o desenvolvimento da escola como um todo (Booth & Ainscow, 2012a, p. 46).
Quanto às “práticas inclusivas”, estas se referem ao desenvolvimento do que é, como se ensina e aprende, de maneira a refletir sobre os valores e as políticas inclusivas. Nesse sentido, as práticas inclusivas ligam
a aprendizagem à experiência, local e globalmente, bem como a Direitos e incorpora assuntos de sustentabilidade. A aprendizagem é orquestrada de modo que o ensino e as atividades de aprendizagem se tornam responsivos à diversidade de jovens na escola. As crianças são encorajadas a ser ativas, reflexivas, aprendizes críticas e são vistas como um recurso para a aprendizagem umas das outras. Os adultos trabalham juntos de modo que todos assumem responsabilidade pela aprendizagem de todas as crianças (Booth & Ainscow, 2012a, p. 46).
Um enfoque relevante na concepção de inclusão do Index diz respeito às implicações de princípios e valores, os quais devem estar enraizados nas pessoas, para que estes possam ser acordados, não como uma moda a ser seguida, ou uma regra a ser cumprida, mas, sim, na compreensão da importância de promover, por meio de suas ações e do entendimento das ações dos outros, o desenvolvimento da inclusão superando a exclusão.
Dos valores que sustentam uma prática inclusiva propostos no Index destacam-se igualdade, direitos, participação, respeito à diversidade, comunidade, sustentabilidade, não violência, confiança, honestidade, coragem, alegria, compaixão, amor, esperança/otimismo e beleza. Dentre estes, cinco são destacados como centrais: participação, igualdade, comunidade, respeito pela diversidade e sustentabilidade (Booth & Ainscow, 2012a). O Index na versão de 2012 define estes cinco valores conforme pode ser visualizado no Quadro 2.
Participação | “A participação aumenta quando o engajamento reforça um senso de identidade; quando somos aceitos e valorizados por nós mesmos” (p. 23). |
Igualdade | “Igualdade não significa que todos sejam iguais nem tratados da mesma forma, mas que todos sejam tratados como sendo de igual valor” (p. 22). |
Comunidade | “As comunidades inclusivas estão sempre abertas aos novos membros que contribuem para sua transformação, e são enriquecidas por eles” (p. 23). |
Respeito pela diversidade | “O respeito inclusivo envolve valorizar os outros e tratá-los bem [...]. A ‘diversidade’ inclui diferenças e similaridades percebidas e não percebidas entre as pessoas: a diversidade diz respeito à diferença dentro da humanidade comum” (p. 23). |
Sustentabilidade | “A sustentabilidade ambiental é central para a inclusão de uma vez, quando a degradação ambiental, o desmatamento, o aquecimento global ameaçam a qualidade da vida de todos” (p. 24). |
Fonte: Booth e Ainscow (2012a).
Os valores constituem uma direção em que todos os envolvidos no processo escolar devem entender a relação destes com suas ações, em um processo constante para desenvolver a convivência e a educação uns com os outros. Os autores ressaltam que, para assegurar, de fato, a inclusão nas escolas, de forma que haja a aprendizagem e a participação de todos os alunos, é importante que as práticas inclusivas reflitam a cultura e as políticas de inclusão adotadas pela instituição escolar, devendo assegurar que os conhecimentos prévios dos alunos sejam valorizados nas atividades de sala de aula, proporcionando a participação de todos. “O ensino e o apoio são integrados na orquestração da aprendizagem e na superação de barreiras à aprendizagem e à participação” (Booth & Ainscow, 2006, p. 45).
Não obstante, existem barreiras que impedem a consolidação da inclusão escolar. Algumas, bastante significativas, têm sido exaustivamente apontadas na literatura científica, que revelam como causa principal o despreparo dos professores, o número excessivo de alunos nas salas de aula, a precária ou a inexistente acessibilidade física das escolas, a rigidez curricular e as práticas avaliativas mal sucedidas (Glat & Nogueira, 2002; Rodrigues, 2006, Martínez, 2010).
Capellini (2004), em estudo realizado com 423 professores, verificou que os três principais fatores que dificultavam o processo de inclusão escolar estavam relacionados à escola (número excessivo de alunos e falta de equipe técnica), ao próprio professor e à família. Ressalta-se, ainda, que, apesar das dificuldades supracitadas, algumas pesquisas colaborativas em torno da equipe escolar demonstram avanços na prática educativa no que se refere ao atendimento da diversidade, considerando as singularidades dos alunos (Capellini, 2004; Mendes, Marques, & Lourenço, 2012).
Nesse sentido, observa-se que vários estudos internacionais (Booth, 2011; Cansino, 2010; Moliner, Sales, Ferrández, & Traver, 2011; Salceda Mesa & Ibanez Garcia, 2015) e brasileiros (Lago, 2014; Fernandes, 2014; Santos, Santiago, & Melo, 2015; Araujo, 2013; Silva, 2012) já utilizam o “Index para Inclusão” em programas de formação continuada. Os resultados desses estudos apontam que o documento pode ser uma maneira de potencializar as reflexões no cotidiano escolar sobre as culturas, as práticas e as políticas inclusivas.
Assim, é importante investigar e conhecer o aporte teórico do documento “Index para a Inclusão”, sendo este um importante instrumento de investigação por meio de um processo de reflexão e ação nas escolas, orientando-as em direção ao desenvolvimento de suas culturas, políticas e práticas de inclusão (Santos, Nascimento, Motta, & Carneiro, 2014). É o que veremos mais adiante.
3 Metodologia
Caracterizado como um estudo bibliográfico narrativo, a coleta foi realizada em bases de dados eletrônicas nacionais (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior [CAPES] e LaPEADE) e internacionais, a saber: Web of Science, Scopus, Parthenon e Dialnet. Para todas, usamos as palavras-chave: Index para a Inclusão, Booth, e fizemos o recorte temporário entre os anos de 2011 e 2016. Das bases internacionais, observamos 12 artigos, que foram organizados em quadros para melhor visualização dos dados. Das bases nacionais, observamos um total de 36 artigos, 31 dos quais originados no LaPEADE. Estes foram classificados por áreas temáticas.
Quanto aos cinco nacionais e os 12 internacionais, optamos por uma descrição individualizada de cada um. Assim o fizemos para entendermos as diferentes compreensões e visões de uso do Index. Nosso foco maior não se deu nos artigos produzidos pelos pesquisadores do LaPEADE, pelo fato de que todos seguem o mesmo olhar teórico-prático sobre o Index, e por já serem mais tradicionalmente conhecidos no Brasil. Dessa forma, eles foram colocados para conhecimento dos leitores, mas optamos por enfocar, neste artigo, os menos conhecidos, que foram cinco, perfazendo um total de 17 artigos descritos individualmente.
4 Pesquisas internacionais desenvolvidas tendo como base o documento “Index para a Inclusão”
O “Index para Inclusão” é um material muito utilizado como suporte teórico metodológico em vários estudos, tanto nacional como internacionais. Dentre os internacionais, encontramos 12 estudos que abordam a utilização do “Index para a Inclusão”, sendo três de 2011, um de 2012, dois de 2013, três de 2014 e três de 2015, apresentados a seguir.
Moliner et al. (2011) investigaram os indicadores relacionados à Educação Inclusiva com professores do ensino regular e especializado na Espanha, utilizando, para tal, um questionário do Index para a Inclusão, traduzido da língua inglesa para o espanhol (Booth & Ainscow, 2012b), sendo este adaptado e dividido em três escalas, constituídas de 63 itens no total, com alternativas de respostas do tipo Likert sobre culturas inclusivas, organização no contexto de ensino-aprendizagem e práticas inclusivas. Os resultados apontaram que não houve diferenças significativas nos itens relacionados a culturas e à organização, somente encontraram diferenças significativas em 12 dos 36 itens, específicos da escala práticas inclusivas, demonstrando que os professores são mais conscientes e dispostos a utilizar estratégias pedagógicas de natureza mais inclusiva.
A partir de uma solicitação do Ministério da Educação, cujo objetivo era o de reforçar a capacidade institucional para lidar com a diversidade, visando ao processo de inclusão em Caldas, na Colômbia, Rendón (2011) realizou uma pesquisa com base no “Index para a Inclusão”, visando uma autoavaliação das instituições, com a finalidade de apoiar as instituições de ensino no processo de transformação de escolas mais inclusivas, nas dimensões das práticas, das políticas e das culturas de inclusão. Como resultados, emergiram reflexões qualitativas dos grupos parceiros, vislumbrando um panorama histórico dos processos de integração e proposta de Educação Inclusiva. Mudanças ocorreram na cultura escolar no que se refere às percepções sobre a vida diária na escola, na atuação dos professores e nos processos pedagógicos, bem como o resgate do trabalho colaborativo.
Procurando fornecer uma visão geral de como as comunidades escolares podem trabalhar com uma abordagem mais inclusiva na educação, Carrington, Bourke e Dharan (2012) utilizaram como recurso o “Index para a Inclusão” em um projeto desenvolvido na Austrália e na Nova Zelândia, visando apoiar a equipe de educação nos processos de avaliação, bem como o aumento da participação e da aprendizagem de todos os alunos. Concluíram o estudo salientando alguns pontos de discussão para desafiar e inspirar a equipe escolar a trabalhar no sentido de uma sociedade mais justa por meio de mudanças no contexto escolar. Tais pontos estão relacionados ao desenvolvimento de professores em serviço, provocando uma reflexão e discussão sobre inclusão, bem como a sua ampla utilização em contextos escolares com professores, estudantes, diretores e pais.
Pérez (2013) analisou a importância dos valores de inclusão e multiculturalismo nos futuros profissionais da educação, seguindo as diretrizes do “Index para a Inclusão” com uma amostra composta por estudantes do Ensino Médio, de Graduação e de Pós-Graduação da Universidade Tenerife das Ilhas Canárias. Os resultados revelaram a urgência em promover uma educação intercultural, a fim de provocar mudanças nas crenças, nas atitudes e nos comportamentos diante da diversidade cultural, rompendo com as barreiras que não permitem aos profissionais desenvolverem habilidades e estratégias colaborativas em relação à Educação Inclusiva.
Pacheco, López e Pacheco (2013) realizaram na província de Córdoba (Espanha) um estudo para analisar a inclusão educativa de 41 escolas. Para tal, usaram a versão espanhola do “Index para a Inclusão” (Booth & Ainscow, 2012b), assim como diferentes indicadores complementares de eficácia, organização e funcionamento. Ao analisarem os dados das dimensões do “Index para a Inclusão”, os autores destacaram que as médias percentuais de todas as dimensões e subdimensões pontuaram alto (7,9%), indicando uma elevada tendência de inclusão nos centros educativos avaliados.
Alborno e Gaad (2014) fornecem-nos, em seu estudo, uma imagem rica e contextualizada da implementação do “Index para a Inclusão”, em que os resultados são apresentados nas dimensões de culturas, de políticas e de práticas. Os temas emergentes incluem as barreiras à participação e à aprendizagem, tais como: a falta de treinamento eficaz, serviços de apoio inadequados, incluindo estrutura das salas de aula. Inclui, ainda, os aspectos positivos, tais como as características do sistema de boas-vindas da escola, o apoio entre a equipe escolar e o envolvimento da comunidade. Esse estudo fornece, ainda, ideias sobre os possíveis desafios para a implementação do Index nas escolas nos Emirados Árabes (Dubai).
Figueroa e Muñoz (2014) analisaram o processo de avaliação educacional realizada por um estabelecimento de ensino em Santiago do Chile, a partir do “Index para a Inclusão”. As principais conclusões estão relacionadas ao enriquecimento do processo de autoavaliação e da utilização do documento, que proporciona, de acordo com os participantes, uma visão reflexiva e transformadora, guiando a procura de recursos e de barreiras para inclusão. Nesse sentido, a participação é crucial nesse processo, tornando-se uma ponte para alcançar o empoderamento local e, assim, orientar o caminho da instituição no sentido de uma cultura escolar mais aberta e inclusiva.
Sarrionandia e Mateu (2014), em um estudo na Espanha, oferecem algumas reflexões sobre dois conceitos importantes para a criação de um projeto social com equidade: Educação Inclusiva e desenvolvimento sustentável, uma vez que sem a garantia de sustentabilidade, a Educação Inclusiva, como qualquer outro princípio ou valor, não tem sentido. Ressaltaram que um conjunto de valores que favoreça a construção da Educação Inclusiva na forma de práticas, culturas e educação política ocorre quando um desses valores é a sustentabilidade.
Salceda Mesa e Ibanez García (2015) fizeram uma adaptação do documento “Index para a Inclusão” com o intuito de utilizá-lo no contexto universitário, visando avaliar culturas, políticas e práticas de instituições de ensino, bem como implementar ações inclusivas em cada uma dessas áreas, passando de inovação para a transformação educacional. As autoras apontaram que não há muitos estudos nessa área na Espanha e que, em geral, as universidades locais têm uma organização inflexível que dificulta o desenvolvimento de práticas alternativas.
McMaster (2015) utilizou a estrutura do “Index para a Inclusão” em uma escola da Nova Zelândia, ressaltando que o Index configura uma ferramenta flexível e adequada para alcançar o desenvolvimento sustentável de toda a escola e aprendizagem profissional. Concluiu que um sistema de educação que permite as expressões individuais de cultura e liderança escolar favorece fatores que influenciam no desenvolvimento da inclusão, como a necessidade de renegociação de significados, devendo a inclusão ser desenvolvida dentro de uma cultura escolar por meio da reflexão sobre os valores centrais e do alinhamento desses valores com as práticas pedagógicas.
Diante do exposto, observa-se que a maioria dos estudos internacionais que utilizaram o “Index para a Inclusão” nas investigações é da Espanha. Tais estudos indicam uma tendência elevada no processo inclusivo nos centros educativos, demonstrando ainda que os professores se apresentam mais dispostos a utilizar estratégias pedagógicas mais inclusivas. No entanto, os estudos também apontam que, de maneira geral, as universidades locais apresentam uma organização inflexível, o que dificulta o desenvolvimento de práticas mais inclusivas.
Essa coletânea de estudos internacionais deixa claro que buscar estratégias que favoreçam um mapeamento das práticas e culturas inclusivas é o caminho para a promoção de mudanças em relação às crenças, às atitudes e aos comportamentos diante do processo inclusivo, permitindo aos profissionais da educação a inovação e a transformação dos processos educativos.
5 Pesquisas nacionais desenvolvidas tendo como base o documento “Index para a Inclusão”
No Brasil, os estudos com o documento “Index para a Inclusão” iniciaram-se com os pesquisadores do LaPEADE. Entre os anos de 2011 e 2015, foram desenvolvidas cinco dissertações de Mestrado e quatro teses de Doutorado, assim como 32 artigos que versavam sobre o tema da inclusão escolar utilizando o documento “Index para a Inclusão”. Neste estudo, em função do espaço reduzido de que dispomos, optamos por mostrar os artigos, e não as teses e as dissertações.
A partir da consulta e da leitura dos artigos disponíveis no site do Laboratório, foi feita uma seleção daqueles que tiveram como base teórica ou metodológica o “Index para a Inclusão” como instrumento, os quais foram categorizados por temáticas de acordo com os conteúdos apresentados em cada um dos estudos. Assim, as temáticas elencadas foram: 1) Formação Continuada, com 13 estudos; 2) Ensino Fundamental, com seis estudos; 3) Ensino Médio, com dois estudos; 4) Ensino Superior, com um estudo; 5) Estudo Teórico, com seis estudos; 6) Prática Docente, com um estudo; e 7) Estudos Gerais, com três estudos, conforme pode ser visualizado no Quadro 3 a seguir.
TEMÁTICA | TÍTULO | AUTORES | |
---|---|---|---|
Formação Continuada (13) | 1 | Planejamento de estratégias para o processo de Inclusão: desafios em questão | Santiago & Santos (2015) Artigo publicado em periódico |
2 | Formação de professores para o atendimento educacional especializado: políticas e práticas instituintes de inclusão | Santos, Santiago, & Melo (2015) Artigo publicado em periódico | |
3 | As contribuições da mediação professor e aluno e a importância do lúdico no ensino da matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental | Venturini, & Guimarães (2014) Artigo publicado em periódico | |
4 | Ciclo de formação de professores sobre Inclusão em Educação: em direção a uma perspectiva omnilética | Santiago (2013) Publicação em anais. | |
5 | A reflexividade dos formadores de professores diante das políticas de inclusão de universidades públicas | Santos, Araujo, Senna, Fonseca, & Santos (2013) Publicação em anais | |
6 | O processo de Inclusão no Ensino Médio: o protagonismo dos alunos em foco | Lago & Santiago (2013) Publicação em anais | |
7 | Concepções de docentes e licenciandos de Educação Física acerca de inclusão em educação: perspectiva omnilética em discussão | Santos & Fonseca (2013) Artigo publicado em periódico | |
8 | Formação de professores e organização do Ensino nas Salas de Recursos Multifuncionais e classes comuns | Kelman, Venturini, Santos, Morais, & Rodrigues (2013) Publicação em anais. | |
9 | Inclusão no Sistema Educacional: desafios para a gestão escolar | Santiago, Costa, Galvão, & Santos (2013) Publicação em anais | |
10 | O papel da Escola de Contas e Gestão do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro na promoção de culturas inclusivas na gestão municipal Paula Alexandra Canas de Paiva Nazareth | Nazareth & Melo (2012) Publicação em anais | |
11 | Políticas de inclusão e demandas de formação continuada na percepção de educadores de quatro municípios do Rio de Janeiro | Santos (2012a) Publicação em anais | |
12 | Inclusão em Educação: desafios da formação docente | Lago & Santos (2011) Publicação em anais | |
13 | Do desejável e do real: culturas de inclusão ou de exclusão na formação de futuros professores de educação física | Fonseca & Santos (2011a) Artigo publicado em periódico | |
Ensino Fundamental (6) | 1 | A abordagem de pesquisa etnográfica nos estudos sobre educação | Melo (2015) Capítulo de livro |
2 | “Não, isso não é coisa pra homem” - masculinidades e os processos de inclusão/exclusão em uma Escola da Baixada Fluminense | Brito, Freitas, & Santos (2014) Artigo publicado em periódico | |
3 | Masculinidades na Educação Física escolar: um estudo sobre os processos de inclusão/exclusão | Brito & Santos (2013) Artigo publicado em periódico | |
4 | O currículo como dispositivo de promoção da Inclusão: relato de um estudo de caso | Carneiro, Santos, & Santos (2012) Texto disponível no website do LaPEADE | |
5 | O direito de aprender e participar do discente com dislexia | Venturini (2012) Capítulo de livro | |
6 | Barreiras de aprendizagem no Ensino Fundamental: o papel dos Laboratórios de Aprendizagem | Santiago & Santos (2012) Publicação em anais | |
Ensino Médio (2) | 1 | Promovendo a Inclusão em Educação através da participação: trajetória de uma pesquisa-ação no ensino médio | Santos, Lago, & Hallak (2011) Publicação em anais |
2 | A participação como processo de Inclusão no Ensino Médio: trajetória de uma pesquisa-ação | Santos et al. (2011) Texto disponível no website do LaPEADE | |
Ensino Superior (1) | 1 | Concepções sobre Inclusão e Exclusão: licenciandos de educação física em foco | Fonseca, Santos, & Venturini (2011) Publicação em anais |
Estudos Teóricos (6) | 1 | Homofobia mata: do desconhecimento à cumplicidade | Marques & Oliveira (2015) Texto disponível website do LaPEADE |
2 | Construindo culturas, políticas e práticas de Inclusão em uma Escola Pública | Pinto, Filgueiras, & Santiago (2015) Texto disponível no website do LaPEADE | |
3 | O Index para a Inclusão como instrumento de pesquisa: uma análise crítica | Santos, Nascimento, Motta, & Carneiro (2014) Artigo publicado em periódico | |
4 | Políticas públicas de Inclusão de pessoas com deficiência: uma análise omnilética | Santos (2012b) Artigo apresentado em Encontro | |
5 | O mal-estar dos profissionais da Educação - culturas, políticas e práticas em um novo contexto | Maçãs (2012) Texto disponível no website do LaPEADE | |
6 | Culturas, políticas e práticas de Inclusão na formação de professores em Educação Física: analisando as ementas | Fonseca & Santos (2011b) Artigo publicado em periódico | |
Prática Docente (1) | 1 | A complexidade da Inclusão no Atendimento Educacional Especializado | Rocha (2015) Publicação em anais |
Estudos Gerais (2) | 1 | L’impact des Politiques Néolibérales sur L’éducation: tensions entre prise en compte des diversités et standardisation | Akkari & Santiago (2012) Artigo publicado em periódico internacional |
2 | Direitos Humanos e Estatuto da Criança e do Adolescente: estudo de caso em uma ONG no Rio de Janeiro/BR | Santos et al. (2012) Texto disponível no website do LaPEADE | |
3 | Do local ao global: encurtando as distâncias entre pesquisadores-reflexões sobre uma experiência de pesquisa em rede | Maçãs & Senna (2011) Texto disponível no website do LaPEADE |
Fonte: Elaboração própria com base nos resultados da busca no LaPEADE.
Como podemos observar no Quadro 3, a maioria dos estudos foi publicado em anais de eventos científicos (12), seguidos por publicações em periódicos (10), no website do LaPEADE totalizam 7 estudos e três capítulos de livros. A maioria dos estudos está relacionada à formação continuada, demonstrando a necessidade de investir-se na formação em serviço, qualificando a equipe escolar para uma educação que seja democrática e inclusiva.
Além dos estudos desse grupo de pesquisadores, foram encontrados, na base CAPES, mais cinco estudos nacionais, não produzidos no LaPEADE, sendo dois de 2011, dois de 2014 e um de 2015.
Oliva (2011), visando compreender o cotidiano escolar de um aluno com deficiência visual (DV) que frequenta a classe regular, assim como preconceitos e atitudes em relação a ele dentro da escola, realizou a coleta de dados a partir de sete instrumentos elaborados tendo como base informações do “Index para a Inclusão”, sendo questionários dirigidos aos professores/equipe escolar e alunos, além de roteiros de observação e escala de proximidade entre os alunos. Os dados apontaram que a interação com colegas é satisfatória, embora mais efetiva no recreio do que em sala de aula. A ausência de adaptações curriculares para a acessibilidade resultou na exclusão do conteúdo, em que sua aprendizagem foi parcialmente negligenciada, ocorrendo a marginalização em sala, colocando-se barreiras à incorporação da cultura. O autor ressalta que a escola tem como foco o desempenho dos alunos normovisuais e uma busca competitiva e pragmática por resultados.
Crochik et al. (2011) buscaram verificar a validade de conteúdo e a fidedignidade do formulário para caracterização de escolas inclusivas, instrumento criado com base no “Index para a Inclusão”, aplicado em seis escolas públicas e privadas da cidade de São Paulo. Ao final, foi observada a amplitude das diferenças dos resultados obtidos pelas escolas, revelando seu poder discriminativo.
Senna e Motta (2014), apresentaram dados de uma das etapas da pesquisa: O Ciclo de Atualização em Inclusão em Educação para Professores das Salas de Recursos Multifuncionais (SRMs), com o objetivo de apresentar essa experiência de formação e de discutir as culturas, políticas e práticas de avaliação presentes nas falas dos professores de SRMs, a partir do “Index para a Inclusão”. No que tange à dimensão das culturas de inclusão, foi percebido um olhar mais atencioso às diferenças e às potencialidades dos alunos do Atendimento Educacional Especializado, com a intenção de considerar os alunos de toda a escola e não somente os do professor de SRMs. Com relação à dimensão das políticas, identificaram um movimento de planejamento e busca de estratégias de avaliação que percebessem o processo, os avanços e os retrocessos do aluno, tendo em vista os objetivos previamente estabelecidos. No que se refere à dimensão das práticas, os professores apontaram algumas dificuldades: eles acreditam em uma forma de avaliar, adotam um planejamento de avaliação, mas não conseguem colocar em prática essa avaliação.
Gomes (2014) teve como objetivo compreender como tem se realizado a inclusão dos alunos com deficiência intelectual e transtornos globais do desenvolvimento nas escolas regulares do município de São Bernardo do Campo, e como essa inclusão tem implicado e comprometido o professor na construção de novas práticas docentes na perspectiva de atendimento a todos os alunos na sala de aula comum. A pesquisa ocorreu com professores da Educação infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental e os seus respectivos professores da Educação Especial em cinco escolas da rede pública, tendo como referencial teórico o “Index para a Inclusão”. Os resultados indicaram que esses professores têm buscado informações sobre as dificuldades dos alunos incluídos de forma mais autônoma, assim como têm buscado a parceria com o professor da Educação Especial, que tem contribuído com a reflexão e transformação da prática do professor da sala de aula comum em benefício de todos os alunos. Entretanto, essas ações são marcadas por iniciativas individualizadas e não de toda a escola, distanciando-se da construção de uma cultura institucionalmente reconhecida de inclusão, indicando a necessidade de formação continuada dos professores.
O estudo de Santos (2015) objetivou discutir as contribuições do “Index para a Inclusão”, com o intuito de fundamentar uma formação continuada ou inicial com base em questionamentos e reflexões acerca dos processos de exclusão escolar. Para tanto, apresentou as características do Index, bem como dados de pesquisas recentes coordenadas por sua equipe em diferentes contextos. Sequencialmente, discutiu os impactos e, por último, argumentou que o Index se constitui em material extremamente rico não apenas para as escolas, mas adaptável a qualquer instituição que deseja rever suas culturas, políticas e práticas de exclusão, visando combatê-las em direção à inclusão.
É importante salientarmos que os estudos brasileiros divergem em seus resultados em relação aos internacionais. Os estudos nacionais estão mais focados na prática pedagógica do professor, indicando a necessidade de formação continuada dos professores para trabalhar com a diversidade de alunos em uma cultura mais inclusiva.
6 Considerações finais
Este estudo teve como objetivo realizar uma revisão teórica narrativa sobre a construção teórico-metodológica e a aplicabilidade do documento “Index para a inclusão”. É notória a importância desse documento como um instrumento de investigação por meio de um processo de reflexão e ação nas escolas, orientando-as em direção ao desenvolvimento de práticas de inclusão mais efetivas.
Contudo, para além da divulgação do uso do instrumento, este estudo mostra como o “Index para a Inclusão” tem sido adaptado e desenvolvido em contextos educacionais brasileiros e internacionais, possibilitando as escolas mais autonomia no que se refere às culturas, às políticas e às práticas inclusivas.
Quanto a sua aplicabilidade, poderão surgir algumas limitações, como a dificuldade de entendimento por parte da equipe escolar quanto aos seus objetivos ou mesmo em relação aos pesquisadores que, por desconhecimento, poderão utilizá-lo sem as devidas adaptações de acordo com o contexto social e cultural ao qual se insere o estudo. No entanto, acreditamos que os resultados deste estudo possam contribuir não somente para o desenvolvimento prático-pedagógico no contexto escolar, mas também com pesquisadores no que se refere ao desenvolvimento de estudos e intervenções sobre práticas de inclusão e no aprimoramento de políticas públicas na educação, especialmente, na Educação Especial na perspectiva da inclusão.