Introdução
“A experimentação pessoal está na base da aquisição do conhecimento”.
(FREINET, 1979, p. 64)
Ao encontro da assertiva de Freinet (1979), convidamos a leitora e o leitor à reflexão, a partir das ideias expressadas nas páginas seguintes, tendo como amparo o estudo de Kusunoki (2018), considerando a proposta dos Cantos de Trabalho1 como possibilidade de aprofundamento das discussões sobre teoria e prática na Educação Infantil, especialmente relacionadas à questão da configuração consciente dos espaços pedagógicos.
Para Kusunoki (2018), os Cantos de trabalho - técnica criada e praticada por Célestin Freinet2 (1896-1966) - possibilita ao professor e à professora da infância condições oportunas para o planejamento e desenvolvimento de situações educativas responsáveis por suscitar as crianças à atividade. Como argumenta Freinet (1979), no excerto acima, a escola pode se configurar como espaço em que o envolvimento, a participação e a experimentação pessoal consistam em fontes de aprendizagens e desenvolvimento de crianças e adultos.
Especialmente dirigida à Educação Infantil, esta exposição se propõe a discutir aspectos do estudo de Kusunoki (2018) sobre os Cantos de Trabalho como viabilidade de organização de uma prática educativa hábil, capaz de orientar as atividades de ensino e propiciar as máximas possibilidades de aprendizagens e desenvolvimento nos sujeitos. Essa questão envolve discussões complexas, tal como os lugares ocupados por crianças e adultos (docentes e demais educadores atuantes nas instituições) nas relações que permeiam o processo educativo.
Com a perspectiva de atender esses objetivos, tecemos reflexões acerca do desenvolvimento humano na perspectiva da Teoria Histórico-Cultural (THC), especialmente relativas às especificidades dos períodos que delineiam a infância. As aproximações dos princípios da referida teoria àqueles orientadores da Pedagogia Freinet constituem fundamento aos argumentos aqui apresentados. Esses últimos, dirigem-se à compreensão das principais características dos tipos de atividades infantis capazes de promover aprendizagens e das condições educativas essenciais para que o desenvolvimento se efetive em suas máximas possiblidades.
Na perspectiva dessa técnica de trabalho pedagógico, trazemos como pauta das reflexões, aspectos do papel docente e suas intervenções no processo educativo potencialmente humanizador na Escola da Educação Infantil (EEI)3.
De maneira sintetizada, expressamos os principais conceitos que endossam a prática com os Cantos de Trabalho e direcionamos nosso olhar especificamente para o contexto da Educação Infantil. Essa técnica, idealizada e desenvolvida na França por Célestin Freinet, por volta dos anos 20 do século passado, contemporaneamente, se mostra muito atual e efetiva ao ideal de formação humana voltado para a inteireza do sujeito.
Nos limites deste texto, tecemos também considerações sobre as potenciais possibilidades das propostas com os Cantos de Trabalho em turmas de crianças da Educação Infantil, destacando, especialmente, os elementos mediadores do desenvolvimento do autocontrole da conduta na infância. Em complemento, no delineamento das ideias, legitimamos a Educação Infantil como campo de atividade profissional e potente na produção de conhecimento científico, problematizando, especialmente, a questão da organização do espaço como fonte do desenvolvimento humano. Para tal, apoiamo-nos nas assertivas dos documentos oficiais da Educação e dialogamos com referenciais teóricos contemporâneos, tais como Horn4 (2004) e Rossetti-Ferreira5 (1997), que há décadas se dedicam a aprofundar os conceitos e implicações pedagógicas sobre a temática na Educação Infantil.
Finalizamos a exposição, retomando pontos centrais das discussões realizadas com o intuito de evidenciar as contribuições dessa técnica de trabalho pedagógico para o desenvolvimento pleno das crianças e dos profissionais dedicados a elas em Escolas de Educação Infantil.
Especificidades do desenvolvimento das crianças da Educação Infantil
“A criança tem, portanto, necessidade de estar num meio rico onde possa entregar-se a estas experiências tactantes [...] este meio permite à criança a formação da sua personalidade”
(FREINET, 1969, p. 34).
As aprendizagens ocorridas na primeira infância são decisivas para o desenvolvimento das funções psíquicas superiores no sujeito (VYGOTSKI6, 1995). Especificamente nos primeiros meses de vida da criança, o adulto, ao realizar as ações de cuidado (banho, troca, alimentação, sono, por exemplo) pode provocar, por meio do seu olhar, toque, gestos e palavras, sensações valiosas aos processos que marcam o desenvolvimento da inteligência e personalidade infantil.
Às sensações motivadas pela intervenção do adulto, o bebê, paulatinamente, atribui sentidos que ampliam e sofisticam seu repertório de impressões de mundo. Esse alargamento, por sua vez, configura-se como uma base sólida na qual se apoiarão processos psíquicos mais complexos, como é o caso da formação das percepções. Com essa compreensão, respaldamo-nos em Mukhina (1995, p. 102), segundo a qual “as impressões se transformam em imagens da percepção”.
No ato de se comunicar com o bebê, o adulto - sendo àquele que porta elementos da cultura a qual está inserido - para além de simplesmente falar e gesticular oferece a ele um lugar na relação: de sujeito com possibilidades de atuação ativa. Atitudes de comunicação com a criança, desde que ela é pequenininha, são essenciais para o seu processo de formação humana. Assim, essas relações estabelecidas entre adultos e bebês constituem essencialmente “[...] as bases do seu desenvolvimento psíquico” (MUKHINA, 1995, p. 84).
Essa atividade, sem o uso da fala articulada (por parte do bebê), mas permeada por emoções, por meio da qual o bebê se relaciona com o mundo, mediada por pessoas e elementos constituintes da cultura, é denominada, segundo a Teoria Histórico-Cultural, como comunicação emocional (MUKHINA, 1995). Trata-se, pois, da atividade que possibilita à criança pequenininha condições para o autoconhecimento e apropriação do mundo externo, em especial relativo à existência do outro, no caso as pessoas de seu entorno.
Nos primeiros meses de vida, tudo o que chega até o bebê resulta da ação e situações oferecidas pelo adulto. O desenvolvimento de seu aparato biológico encontra-se em situação inicial e progressiva, porque ainda não vivenciou experiências capazes de provocá-lo a andar ou expressar seus desejos e necessidades por meio da linguagem verbal, por exemplo. Esse momento na vida do bebê é caracterizado por uma expressiva contradição: por um lado uma capacidade - que é especificamente humana - ilimitada de assimilar novas experiências e adquirir novas formas de comportamento e, por outro, uma grande dependência social (MUKHINA, 1995).
Nesse processo, em que já se configuram os processos ligados à inteligência e personalidade humana, as relações sociais organizadas na escola, ancoradas na afetividade e respeito, podem suscitar emoções e sensações positivas passíveis de ampliação e sofisticação das formas de a criança sentir, pensar e agir no mundo. Essas relações criam necessidades antes inexistentes e formam bases propulsoras para o desenvolvimento das funções psíquicas em níveis superiores. Sobre isso, afirmativamente, Martins (2012, p. 107) destaca
As emoções medeiam o desenvolvimento de todos os processos psíquicos e o seu próprio desenvolvimento subjuga-se às condições para a sua vivência. Apenas na relação ativa com o mundo e, essencialmente mediada pelo adulto, o bebê emerge de suas vivências emocionais indiferenciadas, próprias à condição de recém-nascido, dotando-as de propriedades humanas.
Em Vygotski (1995), encontramos a assertiva de que, especialmente no período que marca o início da vida, o bebê vive uma relação de pura dependência (biológica e psíquica) com adultos. É, nesses termos, um ser essencialmente social, por depender única e exclusivamente das ações do outro e por ter a necessidade objetiva de atenção e solicitude dos adultos de seu entorno, logo que sozinho não teria condições efetivas de sobrevivência.
Em acréscimo, sublinhamos que a partir dos princípios da lei genética geral do desenvolvimento7, Vigotskii (1988) considera que a maneira como tratamos o sujeito desde seus primeiros momentos no mundo é substancial para a formação dos processos que constituirão sua identidade. De maneira ativa a criança, precisamente na relação com o outro, vivencia e internaliza modos de ser, estar e agir socialmente.
Sobre a concepção de criança como sujeito nas relações, evocamos as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil (DCNEIs), documento que normatiza e estabelece condutas para a elaboração e materialização de propostas pedagógicas para a Educação Infantil no país, a fim de corroborar nossa compreensão de criança. O documento traz a seguinte definição:
Sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura (BRASIL, 2009, p. 12).
A premissa apresentada no documento, expressa-nos um conceito emancipado de criança. O escopo tem sido consolidar, na prática, distinta conceituação. Assim, por meio da formação docente (inicial e continuada), dos estudos e pesquisas, a Educação Infantil vem se constituindo como área de conhecimento e construindo sua identidade como período crucial para o desenvolvimento humano (ROSSETTI-FERREIRA, 1997).
Para aprofundarmos as discussões acerca do papel dos adultos na formação do psiquismo infantil, pautamo-nos nas ideias de Lísina (1987). Para a estudiosa,
[...] as crianças pequenas podem assimilar esta experiência somente por meio da interação com os adultos que o rodeiam, portadores vivos desta experiência; por isso a comunicação com os adultos é a condição mais importante do desenvolvimento psíquico da criança. (LÍSINA, 1987, p. 274, grifo nosso).
Frequentemente, na relação com os adultos e, observando sua atuação com uma infinidade de objetos o bebê, progressivamente, passa a se interessar por esses elementos materiais da cultura. Quando o outro lhe apresenta um objeto, cria-se uma necessidade que o move inteiramente em sua direção. Diante da situação, o adulto nomeia o objeto e solicita que o faça também. A partir dessas ações, o bebê cria para si as referências relativas a esse mundo e atribui sentido às experiências das quais participa. Por meio da palavra que chega pelo outro, descobre significados, cria repertório de emoções, amplia impressões, confere sentidos às relações, conhece o mundo em sua complexidade, aprende e desenvolve-se.
A partir dessas assertivas, que desvendam o aspecto desenvolvente (DAVÍDOV, 1988) da relação mediada da criança com os objetos da cultura, chamamos à atenção para as premissas apontadas nas DCNEIs que, ao discursarem sobre a função sociopolítica e pedagógica das instituições explicitam a necessidade de “[...] convivência entre crianças e entre adultos e crianças quanto à ampliação de saberes e conhecimentos de diferentes naturezas” (BRASIL, 2009, p.17, grifos nossos).
A “ampliação de saberes e conhecimento” apontada pela DCNEI coaduna com as asserções teóricas de Vygotski (1995) e colaboradores (LEONTIEV, 1978; LÍSINA, 1987; MUKHINA, 1995), sobre a relação entre cultura e desenvolvimento, engendrada, por exemplo, na atividade objetal manipulatória desenvolvida pelo bebê.
Alargamos as possibilidades de reflexão, citando outro documento relevante ao cenário da infância, a saber, “Critérios para um atendimento em Creches que Respeitem os Direitos Fundamentais das crianças (CAMPOS; ROSEMBERG, 2009). Esta produção desperta à consciência docente a necessidade e direito das crianças em desfrutarem de “[...] um ambiente, aconchegante, seguro e estimulante” (p.13), ou ainda, do direito à brincadeira em salas "arrumadas [projetadas] de forma a facilitar brincadeiras espontâneas e interativas” (p.14). Tais assertivas, indicadas no referido documento, dialogam estreitamente com a questão da sofisticação dos “arranjos espaciais” (ROSSETTI-FERREIRA, 1997) na Escola de Educação Infantil e corroboram a natureza dos Cantos de Trabalho.
Consonantes às ideias explicitadas até aqui, as apropriações oriundas das vivências do primeiro ano de vida criam no bebê a necessidade de se interessar pelos objetos da cultura e pessoas de sua convivência. Na relação com o adulto - que tem o papel de parceiro mais experiente8 aprende o nome do objeto, experimenta possibilidades de manuseio e testemunha situações nas quais são utilizados segundo a sua função social. Vygotski (1995) intitula essa relação da criança com o mundo como atividade objetal manipulatória, conforme apontada anteriormente.
As mudanças de atividades principais9 ocorridas ao longo da infância não acontecem, assim, de forma abrupta. De forma gradativa se alternam e passam de coadjuvante à protagonista de acordo com as condições objetivas de educação que o sujeito experimenta ao longo de sua vida. Assim, a comunicação emocional não desaparece do desenvolvimento infantil, mas assume a função de selar a relação da criança com os objetos da cultura na busca pela apropriação de suas qualidades físicas e finalidades sociais.
Pasqualini (2014) considera, então, que a atividade objetal manipulatória se caracteriza como o processo responsável pelas apropriações das qualidades físicas, possibilidades e uso social dos objetos. É o momento em que o bebê inicia uma jornada desafiadora de conhecer a riqueza da cultura humana por meio de sua própria atividade, mediado pelas ações conscientes do adulto. Em suas atitudes e ações exploratórias, a criança enriquece suas percepções e impressões de mundo e forma bases consistentes para orientar e ampliar os processos relacionados ao desenvolvimento de sua inteligência e personalidade. Em complemento, Martins (2012, p. 110) amplia as argumentações ao destacar que “esse momento representa grande oportunidade para que ensine à criança maneiras corretas de se atuar com o objeto”.
Ao manipular os objetos, a criança conhece suas propriedades físicas externas e, a partir dos processos de mediação promovidos pelo adulto, se apropria dos elementos materiais da cultura, sofisticando assim, suas percepções, ações e testemunhando o seu uso permanente. Mukhina (1995, p. 106) amplia essas ideias ao argumentar que,
Inicialmente, a criança faz uso indiscriminado do objeto - independentemente de sua função social - e, por meio de um processo de apropriações cada vez mais sofisticadas, passa a fazer uso com base em sua função social por meio da imitação das ações que observa atentamente do mundo adulto.
Desse modo, quando internalizada a função social dos objetos, a criança eleva o seu nível de ação com eles e passa a utilizá-los de forma livre buscando em seus recursos mnemônicos referências que se assemelham a sua função primeira (VYGOTSKI, 1995; MUKHINA, 1995).
Aprender, pois, usar os objetos segundo as convenções sociais lhe permite agir de maneira cada vez mais complexa e começa a sinalizar o surgimento de uma nova atividade que passará a guiar todo o desenvolvimento nos momentos seguintes da infância, manifestado por uma atividade humana mais complexa: o jogo de papéis sociais10.
As premissas do jogo surgem por meio da relação do sujeito com a materialidade da cultura. Nesse processo todas as experiências antes vivenciadas pelo sujeito desde o seu nascimento, são as bases orientadoras do jogo. Nesse sentido, quanto mais referências a criança tiver do mundo dos objetos e suas funções, mais condição objetiva terá de estabelecer relações nos jogos de papéis sociais com outras crianças e adultos do seu entorno (ELKONIN, 1998; MARCOLINO, 2013).
Os jogos e as formas produtivas de ação (MUKHINA, 1995) surgem como novas formas de atividade na infância. A atividade com objetos possibilitará à criança o desenvolvimento de funções do seu psiquismo em níveis superiores, responsáveis por criar as bases para todo o desenvolvimento das ações lúdicas infantis. Assim, essa nova forma de a criança se relacionar com o mundo tem sua matéria-prima nas próprias relações estabelecidas pelo sujeito socialmente. Particularmente, o conteúdo desse jogo infantil se caracteriza quando,
[...] a criança reproduz as atividades sociais dos adultos e relações sociais que se estabelecem entre eles. Nesse processo, ao desempenhar papéis adultos, ela se apropria no sentido social das atividades produtivas humanas, internalizando determinado padrões sociais que formarão bases de sua própria conduta (PASQUALINI, 2014, p. 200).
O conteúdo do jogo é composto por elementos presentes nas relações sociais expressadas na atividade humana adulta. Por isso, para a criança ter condições de desenvolver o jogo de papéis sociais, é fundamental que ela participe e testemunhe relações e atividades humanas (MARCOLINO, 2013). A partir das vivências reais, a criança adquire repertório para agir conscientemente durante o brincar. Isso significa que as condições objetivas organizadas para o jogo, podem afetar a qualidade do brincar e, como consequência, as contribuições dessa atividade para a formação dos processos psíquicos das crianças.
Em acréscimo, Marcolino (2013, p. 22) explicita que,
Dessa forma, tomando a brincadeira como atividade guia da criança, é correto supor que o enriquecimento da atividade por meio da mediação pedagógica seja essencial para promover as condições para o alcance de novas formas de desenvolvimento da personalidade infantil (MARCOLINO, 2013, p. 22).
O trabalho pedagógico embasado no conhecimento teórico acerca das especificidades da Educação Infantil pode contribuir para que as crianças aprendam e desenvolvam capacidades que não são dadas geneticamente, mas apropriadas mediante a experiência vivenciada com outras pessoas. Assim, em nosso entendimento, o trabalho docente nas EEI envolve o planejamento, realização e avaliação de situações pedagógicas voltadas à organização do espaço e intervenções diretas do professor nas ações com crianças, possibilitando-lhes liberdade de ação e de expressão, o que pode constituir elementos fundamentais para o desenvolvimento do autocontrole da conduta na infância.
Com essa compreensão, para a criança ter condições efetivas de desenvolver de maneira harmônica os processos relacionados à sua inteligência e personalidade, as práticas desenvolvidas no interior da EEI precisam estar fundadas no conhecimento teórico-científico, essencial à qualificação da ação docente e êxito nos processos. Os argumentos tecidos nesta seção do texto amparam a compreensão de elementos que medeiam o desenvolvimento do autocontrole da conduta por expressarem os princípios que estruturam a atividade infantil.
Na próxima parte desta exposição, são apresentadas especificidades da prática docente na EEI à luz da proposta de Cantos de trabalho.
Atuação do professor da Educação Infantil na perspectiva dos Cantos de Trabalho
“Devemos [...] [encorajar a criança] sempre a fazer cada vez melhor, organizando em torno [...] [dela] o trabalho e a vida, contando com suas possibilidades”
(FREINET, 1973, p. 59)
Concordamos com as ideias de Freinet (1973), as quais são potentes para discussões sobre a função social e pedagógica da escola dirigida a contribuir com o processo de humanização das novas gerações. Trata-se de organizar a vida na EEI para sofisticar a atividade de crianças e adultos.
Nossa compreensão acerca do termo humanização é respaldada na ideia de Duarte (2012) que, alicerçado nos pressupostos da Teoria Histórico-Cultural, define o termo como resultado de um conjunto de ações formativas capazes de fomentar e ampliar condições de formação e aperfeiçoamento de capacidades essencialmente humanas, com o propósito de produzir em cada pessoa a humanidade que vem sendo construída historicamente pelo coletivo dos homens (DUARTE, 2012).
O princípio segundo o qual o sujeito se apropria do mundo da cultura (objetos, instrumentos, costumes, regras, língua, por exemplo) por meio das relações estabelecidas com o outro, nos possibilita refletir sobre as ações docentes pautadas em escolhas metodológicas e intencionalmente direcionadas a criar situações propícias à humanização das crianças.
Desse modo, o profissional atuante em turmas da Educação Infantil se constitui como interventor consciente e promotor de situações educativas voltadas à formação humana na escola. É, pois, sujeito ativo nos processos educativos, atuando como parceiro mais experiente (VIGOSTKI, 1995) das crianças e é, por excelência, quem apresenta a elas o mundo em sua forma física e social mais elaborada. Neste sentido, configura-se como portador da cultura, das elaborações e objetivações humanas historicamente engendradas na atividade do trabalho.
Nesse movimento de considerar a criança como um sujeito capaz de aprender e se desenvolver, o docente transforma qualitativamente o seu papel e o lugar que ocupa nas relações sociais na escola, atuando de modo ativo e consciente da função que realiza nesse espaço. Na ótica dos Cantos de Trabalho, seu papel não se encerrará nos atos de planejar e propor as situações, mas de acompanhar seus desdobramentos e avaliá-los à luz do conhecimento teórico-científico, objetivando criar novas necessidades nas crianças, as quais podem potencializar e revolucionar suas formas de pensar e agir, transformadas em comportamentos mais elaborados.
Para explicitar o valor das ações docentes nesse processo, apoiamos em Horn (2004, p. 15, grifos nossos) ao pontuar que “o olhar de um educador atento é sensível a todos os elementos que estão postos em uma sala de aula”. A autora ainda chama à atenção para “como crianças e adultos ocupam esse espaço e como interagem com ele” (HORN, 2004, p.15, grifos nossos). Assentadas nessas afirmações, complementamos que o refinamento do olhar docente para as implicações da organização do espaço no desenvolvimento das capacidades humanas nas crianças, mobilizam ações intencionais dirigidas à agência da criança, especialmente por meio das situações desafiadoras que exercitam “sua capacidade de compreensão e produção de conhecimento” (HORN, 2004, p. 18).
Diante dessas exposições, para suscitar novas necessidades nos sujeitos, não é suficiente apenas disponibilizar os objetos em espaços configurados na proposta com os Cantos de Trabalho. Os materiais apresentados de maneira isolada, destituídos da presença dos sujeitos portadores de elementos mediadores para a atividade, são inertes. Como argumentado, para o êxito do ensino e das aprendizagens infantis - especialmente no que tange à prática com os Cantos de Trabalho-, são essenciais ações pedagógicas mediadoras de professores e professoras e do envolvimento ativo das crianças no contexto da EEI.
Acerca do papel docente na proposição de espaços organizados para a atividade infantil, reiteramos as assertivas de Horn (2004) que, ao referenciar os estudos de Vygotski, sinaliza,
Entendemos que o papel do professor é interferir na zona de desenvolvimento proximal dos alunos, provocando avanços que não ocorreriam de forma espontânea. Essa intervenção, sobretudo na escola infantil, dependerá de como o professor, o parceiro mais experiente, organiza, por exemplo, jogos e materiais relacionados aos mais diferentes campos do conhecimento (linguagens, matemática, ciências, artes), que, em tal estágio do desenvolvimento das crianças, serão os mais adequados e do modo como organiza cantos e recantos da sala de aula (HORN, 2004, p. 20).
Apoiadas nas asserções da autora, apontamos para a natureza intelectual da atividade docente que, ao compreender o espaço como condição para a sofisticação dos processos relacionados às aprendizagens infantis, configura-os de modo a possibilitar interações entre as crianças representadas pelas parcerias nas brincadeiras, na resolução de conflitos (escolhas, decisões e negociações), na atividade cooperativa, livre e autônoma. Compreendemos que Freinet (1973), no processo de elaboração de suas técnicas de trabalho - forjadas essencialmente na experiência com as crianças -, vislumbrou a máxima da prática educativa: plenitude dos processos de desenvolvimento humano.
Desse modo, em relações ativas com o mundo e mediadas por parceiros mais experientes, a inteligência e a personalidade da criança se transformam qualitativamente (LEONTIEV, 1978; PASQUALINI, 2014). Aparadas nas asserções dos autores, corroboramos o argumento de que, na escola da infância, as aprendizagens das crianças são impalpáveis, pois se trata de habilidades, capacidades e aptidões (memória, atenção voluntária, linguagem, pensamento, emoções, dentre outras) em pleno desenvolvimento, as quais dependem exclusivamente das relações mediadas pelo outro e pelos elementos da cultura. Eis a complexidade e desafio da atividade docente na Educação Infantil.
As estratégias metodológicas adotadas pelo professor e professora se tornam, com essa compreensão, determinantes para o êxito ou não das aprendizagens infantis (AKURI; LIMA, 2017; KUSUNOKI, 2018). Assim, atuar na perspectiva dos Cantos de Trabalho em Freinet pode favorecer a origem de processos capazes de sofisticar os relacionamentos das crianças com o mundo em sua complexidade social, física e cultural.
Para ampliar essas considerações, Mello (2012) argumenta sobre o papel especial do professor e professora da Educação Infantil. Segundo a autora:
[...] um intelectual que intencionalmente apresenta às novas gerações a cultura social produzida e historicamente acumulada. Sob a forma de experiências, vivências e situações, o Professor intencionalmente produz o processo de humanização, ou seja, o processo de constituição do ser humano nas novas gerações (MELLO, 2012, p. 367).
A atuação de professores da Educação Infantil exige, dessa ótica, a organização, desenvolvimento e avaliação de práticas pedagógicas voltadas para a formação plena da humanidade nas crianças, tendo como base a compreensão de que aspectos cognitivos, perceptivos, emocionais e sociais são sistêmicos e complexos. Daí afirmarmos o valor da compreensão das especificidades do processo de desenvolvimento psicológico infantil como fomento das realizações nas instituições dedicadas à educação e ao cuidado das crianças desde bebês.
Para ampliação das ideias precedentes, a discussão a seguir busca mobilizar reflexões potencialmente capazes de orientar cientificamente a professora e o professor em ações de planejamento e efetivação de propostas de Cantos de trabalho, que sejam promotoras de aprendizagens e desenvolvimento em crianças da Educação Infantil.
Cantos de trabalho na Educação Infantil: especificidades da técnica criada por Freinet
“Farão o trabalho de que mais gostam, que escolheram. Sentirão, pois, o prazer em assumirem a responsabilidade em tal tarefa”
(FREINET, 1973, p. 59-60)
Anteriormente, dedicamo-nos a expressar o entendimento de que a EEI é lugar privilegiado para a criança - independentemente de sua condição social, idade, gênero, religião ou descendência - se apropriar das objetivações humanas ocorridas ao longo da História. Afirmamos a escola da infância como espaço, tempo e lugar de situações nas quais crianças possam vivenciar relações harmônicas com o outro por meio de propostas planejadas e oportunizadas pela ação docente.
Com essa compreensão, em sua essência, a técnica de trabalho elaborada por Célestin Freinet (1976) focada nos Cantos de Trabalho pode possibilitar modos conscientes para o professor e a professora organizarem situações potencialmente formativas na escola.
De acordo com os resultados do estudo de Kusunoki (2018), a condução do trabalho pedagógico com as crianças por meio dos Cantos de Trabalho instaura uma dinâmica rica em relacionamentos interpessoais e propicia o envolvimento por inteiro dos sujeitos em atividades motivadoras da formação de psiquismos mais autônomos em consonância com os trabalhos de Freinet (1973).
Ademais, para Kusunoki (2018), especialmente na Educação Infantil, o trabalho com os Cantos de Trabalho agrega possibilidades de transformações qualitativas do psiquismo infantil, oferecendo às crianças e docentes condições efetivas, por meio da interação, de apropriação e objetivação dos conhecimentos aceca do mundo. Essa riqueza de possibilidades oportunizadas mediante a prática com os Cantos de Trabalho é necessária à formação de capacidades humanas e seu desenvolvimento em níveis mais complexos.
Os Cantos de Trabalho caracterizam-se, assim, como uma organização intencional do espaço físico, este concebido como matriz de oportunidades para as relações entre os sujeitos e o pleno exercício da atividade e autonomia infantis, criando condições para a autogestão do tempo e escolhas realizadas pelas crianças (SAMPAIO, 2002; KUSUNOKI, 2018).
Consoante aos fundamentos já apresentados, a natureza dessa forma de organizar e efetivar o trabalho com as crianças é fonte para o desenvolvimento de capacidades psíquicas responsáveis por elevar e qualificar os modos de o sujeito ser e se relacionar com o mundo em sua dimensão física, social e cultural. Possibilita, portanto, condições oportunas para a formação dos processos relacionados à constituição de inteligências e personalidades mais harmônicas.
Em essência, Kusunoki (2018) explica que os Cantos de Trabalho constituem na oferta simultânea de diversas proposições formativas (leitura, jogo de papéis sociais, construção, recorte e colagem, modelagem, por exemplo), organizadas em espaços específicos (internos ou externos), tendo em sua composição, abundância de recursos materiais motivadores da ação das crianças. Para fomentar estado de atividade, os Cantos de Trabalho são planejados e configurados na EEI por meio da ação docente, em parceria com as crianças que, na condição de sujeitos, também opinam, transportam, elegem, restauram, configuram, modificam e organizam os espaços.
Em razão das particularidades e modos de expressão humana na infância, da brincadeira como atividade que melhor orienta as aprendizagens e interações da criança (VYGOTSKI, 1995), os Cantos de Trabalho, especialmente nesse período da vida, são estruturados em temáticas/situações (casinha, hospital, ateliê de costura, oficina, projeto da turma e etc.) guarnecidos de diversidade expressiva de elementos materiais prenhes de significações sociais. Em Freinet (1976), apreendemos que a organização dos espaços, materiais e situações nos Cantos de Trabalho são fonte para a formação do sujeito.
A partir dos resultados da pesquisa, Kusunoki (2018) sinaliza que os Cantos expressam condições objetivas para motivar a atividade de crianças e adultos que, por meio de suas próprias ações, se apropriam e complexificam processos psíquicos. Deste ponto de vista, é possível depreender que a intenção primeira da proposta é contribuir para a mobilização de processos responsáveis por ativar as funções psíquicas do sujeito desenvolvendo-as e elevando-as a níveis mais aprimorados (KUSUNOKI, 2018). A ativação dos processos mentais - provocada por esta forma de conceber e encaminhar o trabalho pedagógico na Educação Infantil - amplia de maneira substancial o repertório cultural e qualifica a relação da criança com o entorno.
Diante dessas considerações, na EEI, a organização do espaço - considerada como elemento mediador da atividade infantil-, constitui modo efetivo para criar novas necessidades humanizadoras na infância. Em essência, a proposta com os Cantos de Trabalho prima pelo direito de as crianças exercitarem sua autonomia por meio da efetivação de suas próprias escolhas, da liberdade de movimento e manipulação dos materiais disponíveis, da iniciativa de estabelecer relações com outros sujeitos e com a cultura, do prazer em empreender ações lúdicas com seus pares e do entusiasmo de conhecer o mundo por meio de (re) elaborações dos fenômenos físicos e sociais.
Desse modo, os espaços, quando configurados com materiais diversos e em quantidade suficiente, cuidam das crianças e as educam propiciando condições para que, apoiadas na liberdade, realizem seus tateios experimentais (FREINET, 1976) e se apropriem da cultura mediadas por relações afetivas.
A ação positiva e consciente do profissional promove, assim, intervenções que motivam vivências instigantes por meio do brincar, nas quais as crianças pensam, estabelecem relações entre eventos, objetos e pessoas, apropriando-se de significados e atribuindo sentidos pessoais ao mundo. Desde o momento em que planeja e organiza os Cantos até o desenvolvimento das situações educativas possíveis em cada um desses espaços, o professor e a professora, expressam aspectos de seu trabalho pedagógico orientados para a efetivação de aprendizagens e desenvolvimento coerentes para a constituição da inteligência e personalidade infantil.
As práticas docentes pautadas na proposição dos Cantos de Trabalho podem, com isso, criar a necessidade de comunicação e são motivadoras do desejo de se apropriar do mundo em sua forma física e no plano das relações. Nesses lugares e tempos, como professores e professoras, podemos contribuir efetivamente para revoluções no pensamento, autocontrole (psíquico, físico e emocional), imaginação e criação, a partir dos processos de mediação viabilizados pela nossa escuta visível (RINALDI, 2012).
No próximo tópico, explicitamos possibilidades para o envolvimento da criança em situações educativas voltadas ao desenvolvimento do autocontrole da conduta. As reflexões são fundamentadas em princípios da Pedagogia Freinet, especialmente em elementos que expressam a dinâmica produtiva à atividade infantil durante as proposições com os Cantos de Trabalho.
Cantos de trabalho como elemento mediador do desenvolvimento do autocontrole da conduta na infância
“Através de nossas oficinas de trabalho de base [Cantos de Trabalho], oferecemos às crianças possibilidades de trabalho e não de domesticação”.
(FREINET, 1973, p. 82).
As afirmativas destacadas nas páginas anteriores permitem depreender que a prática docente, fundada nos princípios filosóficos que a proposta com os Cantos de Trabalho, possibilita às crianças experiências capazes de provocar-lhes sensações, emoções e sentimentos positivos potencializadores do desenvolvimento psíquico.
O foco das discussões desta exposição se concentra na qualidade das relações estabelecidas no interior da proposta de trabalho educativo desenvolvida por Freinet, em especial sobre os impactos no desenvolvimento do autocontrole da conduta. Nossos esforços intensificam a argumentação de que, nesta configuração de trabalho docente na Educação Infantil, inúmeras capacidades humanas são sofisticadas, especialmente o autocontrole da conduta.
Para efetivação de suas máximas possibilidades, o trabalho pedagógico nutre-se em conhecimentos teóricos acerca das especificidades e complexidade da formação humana desde a infância (MELLO, 2012). Conhecer as regularidades do desenvolvimento sob a perspectiva da Teoria Histórico-Cultural implica, necessariamente, a compreensão de que a capacidade psíquica de autocontrole da conduta não é uma característica herdada biologicamente, mas resultado de processos de atividade vivenciados pelo sujeito em suas relações com as pessoas e com a cultura (VYGOTSKI, 1995).
Essas afirmações acentuam que, por ser uma função psíquica aprendida socialmente, o autocontrole da conduta surge e se desenvolve no sujeito de maneira progressiva. Trata-se da capacidade que o ser humano adquire de controlar o próprio comportamento de modo cada vez mais sofisticado à medida que experimenta situações da vida e participa de relações sociais. Desse modo, um bebê ainda não viveu relações suficientes e efetivas que o motive a controlar suas atitudes diante dos eventos e pessoas do mundo. Adiante e mais complexa a essa situação, a criança de cinco anos, por exemplo, encontra-se num momento específico de desenvolvimento psíquico que a permite pensar e agir de maneira mais controlada e condizente com a situação experimentada porque já testemunhou e participou inúmeras vezes desses processos formativos.
Na perspectiva Freinetiana, os espaços exigem planejamento e organização a fim de proporcionar às crianças situações educativas dirigidas às escolhas conscientes em um entorno fértil em recursos materiais e relacionamentos promotores da autonomia na infância. Na atitude de escolha sobre a atividade que deseja participar, na tomada decisões, nas condutas diante dos conflitos, na gestão do próprio tempo, seleção de materiais, dentre outras ações possibilitadas especificamente pela natureza da atividade nos Cantos de Trabalho, a criança mobiliza inúmeras e diferentes funções psíquicas (atenção voluntária, memória, linguagem, raciocínio) que, de maneira sistêmica, impulsionam o desenvolvimento do autocontrole da conduta (FREINET, 1979; SAMPAIO, 2002; FERREIRA, 2003; RIBEIRO, 2009; KUSUNOKI, 2018). Essas particularidades da dinâmica dos Cantos de Trabalho vivificam as relações da criança com o mundo, possibilitando que esta se constitua sujeito ativo nas situações, cada vez mais consciente de suas ações no mundo.
Nesse sentido, ao longo da infância, a criança amplia seu repertório de mundo e consciência de si e do outro, o que influi substancialmente no processo de desenvolvimento do autocontrole da conduta. Essa prerrogativa expande o entendimento acerca do valor e potência dos Cantos de Trabalho - propostas para estar em atividade em pequenos grupos e espaços circunscritos - no desenvolvimento infantil. Organizar a jornada da criança na escola, de modo esta experimente a atividade nos Cantos de Trabalho, possibilita que ela se relacione ativamente com seus companheiros de infância e adultos e, por meio desses relacionamentos, se apropriem de modos de conduta cada vez mais conscientes expressados por “comportamentos menos impulsivos e mais atentos” (EIDT; FERRACIOLI, 2010, p. 119).
No conjunto, os resultados da pesquisa de Kusunoki (2018) evidenciaram que o envolvimento da criança na atividade Cantos de Trabalho é retratado em suas ações físicas (postura corporal, gestos e deslocamentos, por exemplo) e psíquicas (diálogos, conflitos, decisões, percepções e interesses), o que pode contribuir substancialmente para o desenvolvimento de formas mais sofisticadas de comportamentos.
Imersa na atividade que realiza, a criança aprimora suas formas de projetar ações e antever os resultados (MUKHINA, 1995; KUSUNOKI, 2018). Essa operação mental demanda que a criança mobilize, em níveis superiores, sua atenção voluntária, pensamento, linguagem, memória e raciocínio lógico. Ao serem ativadas e mobilizadas, as funções psíquicas supracitadas se ascendem sistemicamente e propiciam à criança possibilidades de desenvolvimento e manifestação de condutas mais controladas (VYGOSTKI, 1995; AUTORA, 2018). Nesta ótica, ao efetivar suas ações nos Cantos de Trabalho, a criança experimenta possibilidades de mobilizar funções psíquicas em condições mais elaboradas, elemento esse responsável por influenciar seus modos de comportamento frente às relações interpessoais e eventos do mundo da cultura.
Em harmonia com essas ideias, retomamos Freinet (1973, p. 61, grifo nosso) para quem “[a criança] adquire nesta actividade [nos Cantos de Trabalho], por muito nova que seja, a noção da ordem, do domínio de si, da confiança, do amor pelo trabalho executado, do equilíbrio e da paz”. Com essa assertiva do pedagogo francês, destacamos o valor que os Cantos de Trabalho - como proposta de trabalho intensa e satisfatória -, têm para o êxito das ações formativas na EEI, especialmente no que tange a formação das capacidades responsáveis por humanizar o sujeito.
Considerações finais
Ao longo deste texto, buscamos discutir questões relacionadas aos Cantos de Trabalho como uma proposta educativa propícia para impulsionar aprendizagens capazes de incidir diretamente no desenvolvimento do autocontrole da conduta nas crianças da Educação Infantil. Esse argumento foi validado por meio das reflexões apresentadas acerca das especificidades do desenvolvimento das crianças, bem como relativas a possibilidades de trabalho pedagógico e do papel do professor atuante nessa perspectiva teórico-metodológica.
No conjunto das discussões, destacamos o entorno numa composição intencionalmente dirigida à disponibilização e acesso aos diversos materiais a fim de oferecer às crianças situações educativas nas quais possam estabelecer relações com pessoas, eventos e objetos do mundo.
Em acréscimo, evidenciamos a necessidade docente de conhecer as especificidades do desenvolvimento infantil - aqui expressadas sob a ótica Histórico-Cultural - com o intuito de criar condições objetivas para realizar vivências humanizadoras das crianças desde a primeira infância.
Concebemos os Cantos de Trabalho como uma técnica pedagógica que envolve elementos mediadores responsáveis pela formação e desenvolvimento de inteligências e personalidades em níveis cada vez mais sofisticados. Expressamos, ao longo das argumentações, que esses Cantos de Trabalho podem favorecer a formação de vínculos afetivos entre os sujeitos e objetos da cultura, bem como criar elos mediadores capazes de formar atitudes essenciais para a formação da criança como protagonista em seu processo de aprendizagem.
Pelo exposto, a efetivação da proposta com as crianças, possibilita a apropriação e objetivação de conhecimentos de maneira autônoma e contribui para o desenvolvimento da capacidade de autocontrole da conduta em crianças da Educação Infantil. Sob esse olhar, o papel precípuo do docente envolve pensar em formas cada vez mais aprimoradas de apresentar às crianças a cultura engendrada pela humanidade ao longo de sua trajetória histórica (LEONTIEV, 1978).
Com isso, finalizamos nossas argumentações destacando que o papel da escola é apresentar o patrimônio cultural, à luz da ciência, com a beleza, leveza e qualidade de que as crianças precisam e têm direito para se efetivarem como sujeitos cada vez mais humanizados.