1 Introdução
Depois de 1996, com a promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases - LDB - (BRASIL, 1996) e a sequência de medidas que visavam à desregulamentação do ensino superior brasileiro, criando oportunidades de expansão para o setor privado, o resultado foi o grande aumento de Instituições de Ensino Superior (IES), cursos e de matrículas, atingindo o seu grau máximo entre 1999 e 2002 (LOBO, 2012; SILVA JÚNIOR; SILVA, 2013). Mesmo com o crescimento continuado dos anos seguintes, ao final de 2010 as matrículas ainda estavam abaixo do que previa a meta do Plano Nacional de Educação (BRASIL, 2001a): a oferta de educação superior para pelo menos 30% da faixa etária de 18 a 24 anos. A média do país subira apenas de 8,8% para 13,6% no período (SPELLER; ROBL; MENEGHEL, 2012).
Uma das políticas adotadas para possibilitar a expansão foi a criação do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Ampliação das Universidades Federais (REUNI) em 2007, com o objetivo de criar condições para a ampliação do acesso e permanência nos cursos de graduação pelo melhor aproveitamento da estrutura física e dos recursos humanos existentes nas universidades federais (BRASIL, 2007).
Outra política de expansão também voltada para o setor público de educação superior foi a criação, em 2008, da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica (BRASIL, 2008), como desdobramento do plano de expansão anunciado pelo Governo Lula ainda no início do seu primeiro mandato (OTRANTO, 2011). Com a criação da Rede Federal, os Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFETS) foram transformados em Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, instituições de educação superior, básica e profissional, pluricurriculares e multicampi, com a finalidade de ofertar educação profissional e tecnológica em todos os níveis - da educação básica à educação profissional e superior -, com ênfase no desenvolvimento socioeconômico local, regional e nacional. Ao longo da expansão, foram criadas 505 novas unidades que, somadas as 139 existentes, totalizaram 644 instituições (BRASIL, 2016).
Como resultado dessas políticas em favor da educação superior, ao final de 2010, o número de matrículas neste nível educacional totalizou 6.379.299, 10% a mais que as realizadas em 2008 (5.808.017). Em 2015, ano em que foi realizado o último Censo da Educação Superior, as matrículas alcançaram o patamar de 8.027.070, 26% a mais que as realizadas em 20101. O acréscimo nas instituições públicas foi de 31,34% no mesmo período (INEP, 2009, 2015).
Apesar do crescimento, um dado chama a atenção dos especialistas da área: os níveis de conclusão são baixos em relação às médias internacionais. Pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgada em 2014 revelou que, entre 2004 e 2013, a proporção de brasileiros de 25 a 34 anos que concluiu o ensino superior quase dobrou, passando de 8,1% para 15,2%; no entanto, este percentual é o mais baixo entre os países que compõem a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) (CAPUCHINHO, 2014). Além disso, a média brasileira entre jovens de 18 a 24 anos que abandona precocemente os estudos é três vezes maior do que a média dos países da União Europeia (IBGE, 2017).
Os dados divulgados pelo INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) nas Sinopses Estatísticas da Educação Superior ajudam a elucidar tais afirmações. Em 2012, ingressaram no ensino superior 499.370 estudantes; ao final de quatro anos (prazo mínimo médio para a integralização curricular), concluíram os estudos apenas 225.714 (45,2%). Considerando apenas os Institutos Federais e CEFETS2, ingressaram em 2012, 41.179 estudantes; ao final de quatro anos, concluíram apenas 11.677 (28,3%) (INEP, 2014) Tais percentuais informam que as perdas podem ultrapassar 50% dos ingressantes3.
Com o número de matriculados e ingressantes do ano base e o nº de matriculados e concluintes do ano anterior é possível calcular o número de evasões anuais das instituições de ensino superior brasileiras4. Efetuando-se o cálculo nos anos 2010 a 2015, verifica-se que a taxa de evasão anual média das instituições públicas é de 13,2%; podendo atingir, ao final de quatro anos, 52,8% dos seus ingressantes. O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia estudado nessa pesquisa tem apresentado índices que ultrapassam este percentual.
Nesse sentido, o presente artigo visa contribuir para a consecução do seguinte objetivo geral: analisar os fatores que contribuem para a evasão do Curso Superior de Tecnologia (CST) em Gestão Pública em um Instituto Federal do nordeste brasileiro, tendo como objetivos específicos: traçar o perfil socioeconômico dos alunos evadidos do Curso Superior de Tecnologia (CST) em Gestão Pública; mapear o contexto da evasão e identificar as possíveis causas do fenômeno, considerando aspectos internos e externos à instituição.
2 Referencial teórico
2.1 Os cursos superiores de tecnologia
As primeiras experiências de cursos superiores de tecnologia surgiram no âmbito do sistema federal de ensino, do setor público e do setor privado, no final dos anos 1960 e início dos anos 1970. Um marco histórico na trajetória desses cursos foi a criação do Centro Estadual de Educação Tecnológica de São Paulo, criado com o objetivo formal de oferecer cursos de graduação tecnológica (engenharias de operação e cursos de formação de tecnólogos). Posteriormente chamado de Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza, o CETEEPS tornou-se, por mais de trinta anos, o mais importante polo formador de tecnólogos do Estado de São Paulo.
A criação dos cursos superiores de tecnologia remonta à Reforma Universitária de 1968, cuja Lei nº 5.540/1968, em seu art. 18, previa a organização de cursos que não se circunscreviam aos campos profissionais regulares, destinados a suprir as peculiaridades do mercado de trabalho regional por universidades e estabelecimentos isolados. A lei definiu tais cursos como “cursos profissionais de curta duração, destinados a proporcionar habilitações intermediárias de grau superior” (BRASIL, 1968). Em 1969, as Escolas Técnicas Federais foram autorizadas a ministrar estes cursos, com o intuito de proporcionar formação profissional básica de nível superior, de acordo com as necessidades e características dos mercados de trabalho regional e nacional (BRASIL, 1969).
A LDB/1996, mesmo trazendo 92 artigos, dedicou apenas quatro à educação profissional, não fazendo menção, no entanto, aos cursos de tecnólogos. Com a regulamentação dada pelo Decreto nº 2.208, de 17 de abril de 1997, passou então a tratar especificamente do tema: dividiu a educação profissional em três níveis - o básico, destinado à qualificação, requalificação e reprofissionalização de trabalhadores; o técnico, destinado a proporcionar habilitação profissional a alunos matriculados ou egressos do ensino médio; e o tecnológico, referente aos “cursos de nível superior na área tecnológica, destinados a egressos do ensino médio e técnico”. De acordo com o referido decreto, estes “deverão ser estruturados para atender aos diversos setores da economia, abrangendo áreas especializadas, e conferindo diploma de Tecnólogo”.
Em 2001, por meio do parecer CNE/CES nº 436/2001, os cursos superiores de tecnologia foram reconhecidos como “cursos de graduação com características especiais, distintos dos tradicionais”, “estando seus egressos aptos a prosseguir seus estudos em nível de pós-graduação” (BRASIL, 2001b; GUERRA, 2015, p. 91). O próprio Decreto nº 2.208/1997 apontava para tal reconhecimento quando incluía, entre os objetivos da educação profissional, o de formar profissionais, aptos a exercerem atividades específicas no trabalho, com escolaridade correspondente aos níveis médio, superior e de pós-graduação (BRASIL, 1997). Em 2004, o Decreto nº 5.154/2004 revogou o de nº 2.208/1997, definindo como escopo da educação profissional brasileira: a formação inicial e continuada de trabalhadores; a educação profissional técnica de nível médio; e a educação profissional tecnológica de graduação e de pós-graduação.
Entre as principais deliberações do Plano Nacional de Educação estavam a ampliação da oferta de ensino superior a pelo menos 30% da faixa etária de 18 a 24 anos (em 2001, somente 10% dessa faixa etária frequentavam o ensino superior); institucionalizar um sistema de avaliação interna e externa para os setores público e privado; estabelecer um sistema de recredenciamento periódico das instituições e o reconhecimento periódico dos cursos superiores, apoiado no sistema nacional de avaliação; diversificar o sistema superior de ensino, favorecendo e valorizando estabelecimentos não universitários que atendam clientelas com demandas específicas de formação (tecnológica, profissional liberal e novas profissões); diversificar a oferta de ensino, incentivando a criação de cursos noturnos - sequenciais e modulares -, permitindo maior flexibilidade na formação e ampliação da oferta5; incentivar a generalização da prática da pesquisa como elemento integrante e modernizador dos processos de ensino-aprendizagem em toda a educação superior (GUERRA, 2015; BRASIL, 2001a).
Em 2008, as instituições federais de educação profissional, foram reestruturadas para se configurarem em uma rede nacional de instituições públicas de Educação Profissional e Tecnológica: os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (CAMELO; MEDEIROS; MOURA, 2012).
2.2 Evasão na educação superior
A evasão estudantil é um fenômeno complexo, pois apresenta uma diversidade de definições, que gera prejuízos de ordem econômica, social e acadêmica para todos os envolvidos no processo de ensino: perde o aluno, o professor, a instituição, o sistema de ensino e toda sociedade (CUNHA; MOROSINI, 2013). É também um fenômeno multifacetado cujas causas estão atreladas a fatores sociais, institucionais, econômicos e culturais referentes aos diferentes contextos em que acontece.
Entendida como o abandono do aluno durante o seu processo formativo, os índices de evasão têm sido alvo de severas críticas por parte de estudiosos e especialistas em educação e em economia, mais pungentes na educação básica que na educação superior, e mais nos países desenvolvidos que no Brasil (LOBO, 2012). Entre os principais estudos sobre a evasão, destacam-se os modelos de Fishbein e Ajzen (1975) e Ethington (1991), para os quais a origem demográfica e as influências pessoais (valores, expectativas e aspirações) influenciam a decisão do aluno em permanecer ou evadir-se; e o modelo de Spady (1970), para quem, quando a integração instituição-estudante é incompleta, ou seja, quando o estudante não é capaz de atender às demandas acadêmicas e sociais da instituição de ensino, ele se evade.
No Brasil, um dos principais estudos sobre a evasão foi o realizado pela Comissão Especial de Estudos sobre a Evasão nas Universidades Públicas Brasileiras. O estudo abrangeu 53 Instituições de Ensino Superior Públicas (IESP), tendo como objetivos específicos: aclarar o conceito de evasão; definir e aplicar metodologia adequada a todas as instituições; identificar as taxas de diplomação, retenção e evasão dos cursos; apontar causas internas e externas da evasão; e definir estratégias de ação voltadas à redução dos índices de evasão. Diante do nível de abrangência do estudo e da ampla diversidade de casos, o estudo não concretizou os dois últimos objetivos, admitindo, para sua consecução, a necessidade de estudos complementares. Apresentou, no entanto, um diagnóstico quantitativo que confirmou a generalidade do fenômeno, com maior ou menor incidência em algumas áreas de conhecimento, e identificou, a partir das médias parciais, taxas de evasão, diplomação e retenção de 40,45%, 49,70% e 9,84%, respectivamente, nos cursos de graduação brasileiros.
Não há na literatura especializada uma unanimidade quanto ao conceito de evasão. Para Bueno (1993, p. 13), evasão distingue-se de “exclusão” - quando se admite que houve responsabilidade da escola por não ter mecanismos de aproveitamento e direcionamento para a formação profissionalizante do aluno -, destacando a ausência de uma “postura ativa do aluno ao decidir desligar-se por sua própria responsabilidade”. Outros autores preferem distingui-la de “mobilidade” - fenômeno de migração do aluno para outro curso -, o que não configura abandono dos estudos (RISTOFF, 1995). No âmbito de seu estudo, a Comissão Especial de Estudos sobre a Evasão nas Universidades Públicas Brasileiras (1997, p. 19) definiu a evasão como “a saída definitiva do aluno do seu curso de origem, sem concluí-lo”, considerando como evadido: “todo e qualquer aluno que, não estando mais vinculado ao curso, não o tenha concluído no prazo máximo de integralização curricular” (BRASIL, 1997, p. 23).
Se não há unanimidade quanto ao conceito, faz-se necessário definir a evasão em função do objeto particular ao qual se refere: evasão de curso?, evasão da instituição? ou evasão do sistema? Nesse sentido, a Comissão Especial (1997) decidiu caracterizar a evasão distintamente:
(a) Evasão de curso: quando o estudante desliga-se do curso superior em situações diversas tais como: abandono (deixa de matricular-se), desistência (oficial), transferência ou reopção (mudança de curso), exclusão por norma institucional;
(b) Evasão da instituição: quando o estudante desliga-se da instituição na qual está matriculado;
(c) Evasão do sistema: quanto o estudante abandona de forma definitiva ou temporária o ensino superior (BRASIL, 1997, p. 20).
Para o presente estudo, a evasão foi definida como a saída do curso de graduação, sem concluí-lo, ainda que a este tenha retornado, através de outro processo seletivo; trata-se, portanto, de evasão de curso.
Para Lobo (2012), há três situações em que a evasão de curso pode ocorrer: quando o aluno muda de curso, mas permanece na IES; quando o aluno muda para outro curso de outra IES; ou quando o aluno abandona a educação superior. Observa-se nestas definições, que a evasão de curso pode também implicar em evasão da IES, ou ainda implicar em evasão do sistema.
Segundo Silva Filho et al. (2007), a evasão pode ainda ser medida em uma área de conhecimento, em um período de oferta de cursos ou em qualquer outro universo, desde que se tenha acesso às informações pertinentes. É possível até medir a evasão em uma turma pela comparação entre o número de ingressantes no período em que ela foi formada e o número de concluintes do grupo estudado. Tais informações foram extraídas do Curso Superior de Tecnologia (CST) em Gestão Pública, porém estão contidas em seção específica.
O estudo feito pela Comissão Especial (1997), como se concentrou em levantar dados quantitativos sobre o desempenho das IESP, não apresentou definições conclusivas quanto aos elementos causadores da evasão; destacou, no entanto, fatores determinantes prováveis, apreendidos, em parte, de estudos anteriores realizados na UNESP, UNICAMP, UFRGS6 e, em parte, da experiência e atuação institucional dos professores que compuseram a Comissão:
Fatores relacionados às características individuais do estudante: relativos a habilidades de estudo; decorrentes da formação escolar anterior; vinculados à escolha precoce da profissão; relacionados a dificuldades pessoais de adaptação à vida universitária; decorrentes da incompatibilidade entre a vida acadêmica e as exigências do mundo do trabalho; decorrentes do desencanto ou da desmotivação do aluno com cursos escolhidos em segunda ou terceira opção; decorrentes da desinformação a respeito da natureza dos cursos; decorrentes da descoberta de novos interesses que levam à realização de novo processo seletivo.
Fatores internos às instituições: questões acadêmicas: currículos desatualizados, rígida cadeia de pré-requisitos, falta de clareza do projeto pedagógico; questões didático-pedagógicas: critérios impróprios de avaliação do discente, falta de formação pedagógica do docente; e pequeno número de programas como Iniciação Científica, Monitoria, para o estudante.
Fatores externos às instituições: relativos ao mercado de trabalho; relacionados ao reconhecimento social da carreira escolhida; vinculados a conjunturas econômicas específicas; relacionados à desvalorização da profissão; vinculados a dificuldades financeiras do estudante.
O estudo realizado por Morosini et al. (2012), que analisou as produções acadêmicas dos anos 2000 a 2011 sobre evasão na Educação Superior nos principais periódicos do país, propôs uma síntese dos principais fatores causadores do fenômeno:
Aspectos financeiros relacionados à vida pessoal ou familiar do estudante;
Aspectos relacionados à escolha do curso, expectativas pregressas ao ingresso, nível de satisfação com o curso e com a universidade;
Aspectos interpessoais - dificuldades de relacionamento com colegas e docentes;
Aspectos relacionados com o desempenho nas disciplinas e tarefas acadêmicas - índices de aprovação, reprovação e repetência;
Aspectos sociais, como o baixo prestígio social do curso, da profissão e da universidade elegida;
Incompatibilidade entre os horários de estudos com as demais atividades, como, por exemplo, o trabalho;
Aspectos familiares como, por exemplo, responsabilidades com filhos e dependentes, apoio familiar quanto aos estudos, etc.;
Baixo nível de motivação e compromisso com o curso (MOROSINI et al., 2012, p. 8).
Lobo (2012) resume, em seu artigo, algumas questões centrais relacionadas à evasão identificadas pelo Instituto Lobo e a Lobo & Associados Consultoria depois de mais de 12 anos de estudos realizados na área e da experiência adquirida com a capacitação de mais de 20 mil gestores de instituições de ensino superior: baixa qualidade da educação básica brasileira; baixa eficiência do ensino médio - criando dificuldades de adaptação e acompanhamento por parte do estudante; escolha precoce da especialidade profissional, em razão das várias especializações presentes no ensino superior brasileiro; dificuldade de mobilidade estudantil entre IES nacionais (pelas regras de transferência/dificuldades no aproveitamento dos créditos); falta de formação didático-pedagógica dos docentes; e, por fim, falta de pressão por parte das instâncias superiores para o combate da evasão.
Segundo Silva Filho et al. (2007), verifica-se, em todo o mundo, que a taxa de evasão no primeiro ano de curso é duas a três vezes maior do que a ocorrida nos anos seguintes. E acrescenta:
As questões de ordem acadêmica, as expectativas do aluno em relação à sua formação e a própria integração do estudante com a instituição constituem, na maioria das vezes, os principais fatores que acabam por desestimular o estudante a priorizar o investimento de tempo ou financeiro para conclusão do curso (SILVA FILHO et al, 2007, p. 643).
Verifica-se, portanto, que o tema da evasão é alvo de preocupação por parte de profissionais e estudiosos da área, e que, no caso específico da educação superior pública, os dados demonstram que este é um cenário digno de atenção e intervenção pelas instâncias educativas.
3 Metodologia
O presente estudo consiste em uma pesquisa descritiva, uma vez que teve como principal característica o aprofundamento da evasão no CST em Gestão Pública de um Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de uma capital nordestina - que não teve seu nome revelado por questões de confidencialidade - observando, analisando e registrando fatos e acontecimentos sem manipulá-los (LANZONI, 2015). Trata-se, também, de uma pesquisa documental, por ter-se utilizado de relatórios do sistema acadêmico utilizado para a gestão dos processos administrativos e acadêmico do Instituto Federal pesquisado, onde foram consultados dados relativos aos alunos evadidos/cancelados do CST em Gestão Pública (quantitativo de alunos, nome completo, número de matrícula, e-mail e telefone para contato). E, por fim, foi um estudo de caso, visto que ficou circunscrita a uma organização e por ter tido caráter de profundidade e detalhamento, qual seja, a análise dos fatores que contribuem para a evasão de um curso superior de tecnologia (VERGARA, 1997; YIN, 2015).
Em relação ao universo e amostra, a população da pesquisa abrangeu todos os alunos que se evadiram/cancelaram o CST em Gestão Pública entre os semestres 2010.1 e 2016.1, totalizando 263 ocorrências; a pesquisa foi, portanto, censitária, já que visava alcançar a totalidade dos componentes do universo (MARCONI; LAKATOS, 2003).
Como fonte primária, optou-se pela aplicação de questionário aos alunos evadidos ou cancelados. O instrumento foi elaborado a partir do modelo de Pereira (2003), com questões que visavam identificar o perfil socioeconômico do evadido, os motivos da escolha da instituição, os motivos de escolha do curso e os motivos da evasão. O instrumento foi inserido na plataforma Google Forms para aplicação via web. Os questionários foram enviados por e-mail e via redes sociais, para aqueles cujos e-mails estavam desatualizados ou não estavam cadastrados no SUAP (Sistema Unificado de Administração Pública). Dentro do prazo de trinta dias estabelecido para a coleta de dados, foram recebidos 97 (noventa e sete) questionários respondidos: o equivalente a 37% do universo.
Como fonte secundária, foi consultado o sistema de gestão administrativa e acadêmica do Instituto para o conhecimento da situação dos alunos em estudo e das informações pertinentes para elaboração e envio do questionário. Os dados foram tratados por meio de análise descritiva, técnica de estatística descritiva, com emprego de medidas de frequência, assim como uso de tabelas para exposição dos dados e informações, conforme poderá ser observado nas próximas seções. Antes, contudo, será feita uma caracterização do curso em estudo.
4 Análise dos resultados
4.1 Perfil socioeconômico dos alunos evadidos
No tocante ao perfil socioeconômico, verificou-se que 51% dos evadidos/cancelados são homens; 54%, entre os respondentes. Destes, 29% tinham entre 17 e 26 anos de idade, 39% tinham entre 27 e 36 anos de idade e 32% tinham acima de 36 anos. Considerando o grupo mais numeroso, observa-se entre os respondentes uma média de idade de 31 anos e meio, idade aproximada da média observada entre os ingressantes: 33 anos de idade.
Considerando a idade, no período de ingresso, verificou-se que os evadidos/cancelados tinham, em média, 29 anos de idade (mínima de 17 e máxima de 58 anos), perfil considerado semelhante ao dos ingressantes: de, em média, 30 anos de idade (mínima de 17 e máxima de 63 anos).
Quanto ao ano de conclusão do ensino médio, verificou-se uma população bem diversificada, formada tanto por estudantes que ingressaram no curso superior decorridos 33 anos7, em média, desde a conclusão; quanto por estudantes que ingressaram um ano após a conclusão, em média. O maior número de respostas, no entanto, concentrou-se nos anos de 1996 e 2012 (82%), com maior número de respostas para os anos 2005 (10%) e 2009 (9%), indicando, neste grupo, um intervalo de oito e quatro anos, respectivamente, entre o ingresso no CST em Gestão Pública e a conclusão do ensino médio.
Perguntou-se, aos pesquisados, se já possuíam formação de nível superior quando ingressaram no CST em Gestão Pública. As respostas revelaram que 49% dos respondentes possuíam formação de nível superior quando ingressaram no curso; 51% estavam iniciando a primeira graduação. Tal cenário levanta um questionamento: o fato de o aluno ser graduado pode ser visto como um elemento facilitador da evasão?
Perguntados sobre o curso de formação, os estudantes graduados pontuaram vinte e quatro (24) cursos das mais diversas áreas de conhecimento, entre elas: Educação (Licenciatura em Química, Licenciatura em História, Letras), Saúde (Enfermagem, Farmácia, Odontologia, Psicologia), Engenharia (Engenharia da Computação, Construção de Edifícios - do próprio Instituto Federal pesquisado; destacando-se, no entanto, cursos da área de Ciências Sociais: Ciências Contábeis (6), Direito (6) e Administração (5). Em todos os casos, acredita-se que a busca pelo CST em Gestão Pública tenha sido motivada pelo desejo de aperfeiçoamento profissional, aprovação em concurso público ou para capacitação profissional de servidores.
Ainda quanto ao perfil socioeconômico, perguntou-se aos pesquisados se exerciam atividade remunerada no período em que realizavam o CST em Gestão Pública. As respostas revelaram que 74% dos respondentes trabalhavam enquanto realizavam o curso; 26%, não. Relacionando a observação com a evasão, verifica-se que a incompatibilidade entre a vida acadêmica e as exigências do mundo do trabalho foi uma das causas apontadas pela Comissão de Estudos sobre a Evasão (1997) e por Morosini et al. (2012) para a evasão.
Perguntou-se, ainda, aos respondentes, sobre o tipo de instituição em que trabalhavam. As respostas revelaram que, dos 74% supramencionados, 64% atuavam em instituições públicas, 32% atuavam em instituições privadas e 4% eram profissionais liberais. Como se vê, grande parte dos respondentes que trabalhavam eram servidores públicos (64%). Esta informação expõe outro aspecto positivo do CST em Gestão Pública, que é o atendimento a uma de suas principais finalidades: a capacitação de profissionais que atuam em instituições públicas ou que nelas pretendem atuar (CAMELO; MEDEIROS; MOURA, 2012). Esta informação comprova a hipótese há pouco formulada sobre as motivações de escolha do curso.
Foi perguntado, também, aos respondentes, qual sua renda mensal e a carga horária semanal de trabalho. As respostas revelaram que 54% recebiam de um a três salários mínimos; 25% recebiam de quatro a seis salários mínimos; 8% recebiam menos de um salário mínimo; 13% recebiam acima de seis salários mínimos. Observa-se, portanto, que a maior parcela dos respondentes tinha renda de até três salários (62%). Tais informações sugerem que a realização do CST em Gestão Pública trazia consigo expectativas de ascensão profissional.
Perguntados ainda sobre a carga horária semanal de trabalho, 33% dos respondentes trabalhavam 40 horas semanais, 17% trabalhavam 44 horas e 14% trabalhavam mais de 44 horas semanais. Estes grupos juntos somam 64% dos trabalhadores, elemento indicativo de que a carga horária semanal de trabalho pode ter sido relevante para a evasão. Essa situação também pode ser relacionada com a vida pessoal do aluno que, ao dedicar grande parte de seu tempo ao trabalho e, também, aos estudos, acaba por comprometer o tempo dedicado ao convívio familiar e, nesse sentido, os aspectos familiares como, por exemplo, responsabilidades com filhos, é um dos fatores, apontado por Morosini et al. (2012), que contribui para a evasão escolar.
Por fim, perguntou-se aos respondentes sobre a modalidade utilizada para ingressar no CST em Gestão Pública. Verifica-se que 59% dos pesquisados utilizaram a ampla concorrência (concorrendo às vagas destinadas a estudantes que cursaram o ensino fundamental II e o ensino médio em escolas particulares) e 41%, utilizaram a ação afirmativa (concorrendo às vagas destinadas a estudantes que cursaram o ensino fundamental II e o ensino médio em escolas públicas).
No sistema acadêmico foi possível levantar a modalidade de ingresso dos 263 evadidos/cancelados do CST em Gestão Pública. As informações revelaram que 55% dos evadidos ingressaram por ampla concorrência, enquanto que 36% ingressaram por ação afirmativa. O percentual complementar (19%) se utilizou de outras formas de ingresso (convênio, conversão, reingresso e transferência).
4.2 Motivos da escolha: Instituto Federal e CST em gestão pública
As questões que buscaram identificar os motivos de escolha do Instituto Federal foram elaboradas com base no trabalho de Pereira (2003), do qual foram selecionadas seis razões, a serem julgadas pelos respondentes a partir dos valores: “Nenhuma Importância” (NI), “Pouca Importância” (PI), “Importância Moderada” (IM), “Muita Importância” (MI) e “Extrema Importância” (EI). São elas: 1) dificuldade de acesso nas universidades públicas (federais/estaduais); 2) oferecer curso pretendido; 3) qualidade reconhecida da instituição; 4) localização (distância); 5) estrutura de apoio e instalações físicas (auditórios, bibliotecas, cantinas, laboratórios, etc.); e, 6) possibilidade de estudar à noite.
Para a análise das respostas, convencionou-se como irrelevantes as razões que obtivessem maior pontuação nos valores “Nenhuma Importância” e “Pouca Importância” (NI/PI), e relevantes as razões que obtivessem maior pontuação nos valores “Importância Moderada”, “Muita Importância” e “Extrema Importância” (IM/MI/EI). As respostas estão representadas na Tabela 1.
NI | PI | IM | MI | EI | NI/PI | IM/MI/EI | |
1 - Dificuldade de acesso às universidades públicas federais/estaduais | 29% | 14% | 23% | 20% | 14% | 43% | 57% |
2 - Oferecer curso pretendido | 9% | 10% | 27% | 16% | 38% | 19% | 81% |
3 - Qualidade reconhecida da instituição | 4% | 2% | 8% | 23% | 63% | 6% | 94% |
4 - Localização (distância) | 5% | 10% | 23% | 24% | 38% | 15% | 85% |
5 - Estrutura de apoio e instalações físicas (auditórios, bibliotecas, cantinas, laboratórios, etc.) | 2% | 10% | 16% | 37% | 35% | 12% | 88% |
6 - Possibilidade de estudar à noite | 10% | 9% | 15% | 25% | 41% | 19% | 81% |
Fonte: Elaborada pelos autores (2017).
As respostas dadas a questão “1” revelaram que a “Dificuldade de acesso às universidades públicas (federais/estaduais)” foi relevante para 57% dos pesquisados e irrelevante para 43% dos respondentes. Em que pese o fato de esta razão ter sido a que menos influenciou na escolha da instituição, é possível que tenha exercido alguma influência sobre a evasão, tendo em vista que o status referente às universidades pode atrair alunos que iniciam o curso superior no Instituto Federal pesquisado, os quais, quando têm oportunidade, mudam de IESP. Este assunto será discutido mais adiante.
Quanto à questão “2”, o fato de a instituição “oferecer o curso pretendido” foi visto como relevante para 81% dos pesquisados e irrelevante para 19% dos respondentes. Com tais julgamentos, vê-se que os participantes da pesquisa foram atraídos pelo Instituto Federal pelo fato de este possuir um diferencial diante de outras instituições públicas da capital: a oferta do CST em Gestão Pública.
As respostas dadas à questão “3” revelaram que a “Qualidade reconhecida da instituição” foi relevante para 94% dos pesquisados e irrelevante para outros 6%. Tais dados confirmam a qualidade dos serviços educacionais prestados pelo Instituto Federal, embora, ao longo de sua existência, os IFs tenham se caracterizado por ser uma instituição voltada para o ensino técnico-profissional.
As respostas dadas à questão “4” revelaram que a “Localização (distância)” foi relevante para 85% dos pesquisados e irrelevante para outros 15%, resultado que confirma boa localização do Campus, situado em uma área por onde passam duas avenidas principais da cidade.
Quanto à questão “5”, as respostas revelaram que a “Estrutura de apoio e instalações físicas” foram relevantes para 88% dos pesquisados e irrelevantes para 12% dos respondentes. Estes resultados confirmam a afirmação anterior, uma vez que tais elementos também agregam qualidade à instituição.
As respostas dadas à questão “6” revelaram que a “Possibilidade de estudar à noite” foi relevante para 81% dos pesquisados e irrelevante para 19% dos respondentes. Tais dados, provavelmente, estão relacionados com o elevado percentual de indivíduos que trabalhavam e estudavam ao mesmo tempo (74%).
Em consulta ao sistema acadêmico, foi possível levantar o turno de entrada dos 263 evadidos e cancelados. Os dados revelam que é maior o número de alunos evadidos do turno noturno (58%) que o número de alunos do turno vespertino (42%). Tais resultados, aparentemente, remetem à dificuldade em conciliar trabalho e estudo.
A fim de mapear o contexto da evasão, ora buscando entender os motivos da escolha do CST em Gestão Pública, foram enumeradas seis razões, a serem julgadas pelo respondente a partir da mesma escala e parâmetro de análise utilizados na tabela anterior; quais sejam: 7) ter conhecimento anterior acerca do curso; 8) identificou-se com as disciplinas contempladas pela grade curricular do curso; 9) vocação para atuar na área; 10) para complementar formação anterior na área de Administração/Gestão; 11) para complementar conhecimentos que auxiliem na aprovação em concurso público. As respostas estão representadas na Tabela 2.
NI | PI | IM | MI | EI | ∑ NI/PI | ∑ IM/MI/EI | |
---|---|---|---|---|---|---|---|
7 - Ter conhecimento anterior acerca do curso. | 20% | 11% | 26% | 27% | 16% | 31% | 69% |
8 - Identificou-se com as disciplinas contempladas pela grade curricular do curso. | 11% | 7% | 25% | 31% | 26% | 18% | 82% |
9 - Vocação para atuar na área. | 9% | 13% | 28% | 22% | 28% | 22% | 78% |
10 - Para complementar formação anterior na área de Administração/Gestão. | 53% | 7% | 12% | 11% | 17% | 60% | 40% |
11 - Para complementar conhecimentos que auxiliem na aprovação em concurso público. | 15% | 14% | 21% | 23% | 27% | 29% | 71% |
Fonte: Elaborada pelos autores (2017).
As respostas dadas à questão “7” revelaram que “ter conhecimento anterior acerca do curso” foi relevante para 69% dos pesquisados e irrelevante para 31% dos respondentes. Esse resultado sugere que o investimento em divulgação e comunicação sobre os cursos oferecidos pela instituição (características, perfil do egresso, público-alvo, etc.) pode ter implicação na evasão, uma vez que essas informações poderiam evitar que alunos ingressassem no curso sem ter afinidade com o mesmo.
Quanto à questão “8”, as respostas revelaram que “identificar-se” com as disciplinas contempladas pela matriz curricular do curso, foi a principal razão para a escolha do curso, sendo relevante para 82% dos pesquisados e irrelevante para 18% dos respondentes. Verificou-se, com os dados supracitados, que grande parte dos pesquisados, não somente conhecia as linhas gerais do curso, como tinha afinidade com a grade curricular; o que revela que houve alguma fundamentação para a escolha e que, essa fundamentação está relacionada com a razão anterior.
As respostas dadas à questão “9” revelaram que a “vocação para atuar na área” foi relevante para 78% dos pesquisados e irrelevante para 22% dos respondentes. Estes dados revelam um dos aspectos que fundamentou a decisão supramencionada. É válido, ainda, lembrar que a maior parte dos respondentes já trabalhava em instituições públicas, o que pode ter influenciado na escolha dessa razão.
Quanto à questão “10” - “para complementar formação anterior na área de Administração/Gestão”, tal razão foi relevante para 40% dos pesquisados e irrelevante para 60% dos respondentes. Estes resultados são coerentes com os encontrados ainda no bloco socioeconômico, quando se verificou que, apenas, 14% dos graduados eram formados em Administração ou Gestão: cinco (5) em Administração; um (1) em Gestão de RH; e um (1) em Gestão da Saúde. Com isso, entre as razões mencionadas para a escolha do curso, essa foi a primeira que se apresentou como irrelevante.
Quanto à razão “11”, as respostas revelaram que o desejo de “complementar conhecimentos que auxiliem na aprovação em concurso público” foi relevante para 71% dos pesquisados e irrelevante para 29%. Assim, sabendo dos motivos para a escolha do curso, parte-se para a discussão sobre as causas da evasão, a ser realizada na próxima seção.
4.3 Evasão nos cursos superiores de tecnologia
O Instituto Lobo, uma organização sem fins lucrativos criada em 2005 para realizar consultoria e pesquisas na área da educação, ciência e tecnologia, ao realizar um trabalho de coleta e organização dos dados sobre a evasão brasileira estabeleceu uma forma de cálculo para medir a perda de aluno de um ano para outro (evasão anual) a partir dos dados estatísticos divulgados anualmente pelo Inep (Sinopses Estatísticas da Educação Superior):
E(n) = 1 - [M(n) - I(n)] / [M(n-1) - C(n-1)] (1),
Onde: E = evasão; M = número de matriculados; C = número de concluintes; I = número de ingressantes; n = ano em estudo; e, n-1 = ano anterior.
Com a fórmula supracitada, a evasão anual é calculada através da comparação entre o número de alunos que estavam matriculados num determinado ano (subtraídos os concluintes) com a quantidade de alunos matriculados no ano seguinte (subtraídos os ingressantes). Com os dados divulgados pelo INEP (2016), em relação aos cursos superiores presenciais dos Institutos Federais e CEFETS, verifica-se que a evasão anual, entre os anos de 2010 e 2015, foi da ordem de 26%, em média.
Além da evasão anual, foi possível também medir a evasão total, que consiste na percentagem de alunos que, tendo entrado em um determinado curso, IES ou sistema, não se diplomou ao final do prazo máximo de integralização (complemento do que se chama índice de titulação). Para o referido cálculo, no entanto, foi necessário ter acesso a informações específicas, não detalhadas pelo INEP e só disponíveis nos sistemas acadêmicos de cada instituição.
Considerando, no entanto, o prazo mínimo de integralização (três anos), pode-se calcular o índice de titulação, e com ele, se chegar aos índices de evasão e retenção praticados. Assim, com base no número de ingressantes em 2012 (38.512) e concluintes em 2014 (10.872), verifica-se que o índice de titulação dos Institutos Federais/CEFETS foi da ordem de 28%. No período 2013-2015 esse percentual foi de 29%, considerando o número de 40.356 ingressantes e 11.677 concluintes, conforme dados disponibilizados pelo INEP (2016).
Dados levantados por Oliveira Júnior (2015) mostraram que Auditoria Operacional do TCU realizada em 2013 revelava que as taxas de evasão média dos cursos superiores da Rede Federal de ensino eram da ordem de 64,6% nas Licenciaturas, 62,5% nos Bacharelados e 57,2% nos Cursos Superiores de Tecnologia.
Quanto ao CST em Gestão Pública do Instituto Federal estudado nesta pesquisa, entre o primeiro ano de funcionamento, em 2010, até o presente semestre (2017.1), quatorze turmas foram formadas, tendo três delas encerrado seu ciclo: 2010.1, 2011.1 e 2011.28. Os dados referentes à situação dos alunos estão representados na Tabela 3.
Turma | Cancelado | Evadido | Transferido Interno | Concludente | Formado | TOTAL |
---|---|---|---|---|---|---|
2010.1 | 7 (16%) | 9 (20%) | - | 4 (9%) | 24 (55%) | 44 (100%) |
2011.1 | 10 (25%) | 14 (34%) | 5 (12%) | - | 12 (29%) | 41 (100%) |
2011.2 | 7 (17%) | 13 (31%) | 11 (26%) | 8 (19%) | 3 (7%) | 42 (100%) |
TOTAIS | 24 | 36 | 16 | 12 | 39 | 127 |
Fonte: Elaborada pelos autores (2017).
Relacionando o número de evadidos e cancelados com o número de ingressantes por turma, verifica-se que os índices de evasão atingem o valor médio de 47,1%.
Quantos às turmas que estão em andamento (2012.1, 2012.2, 2013.1, 2013.2, 2014.1, 2014.2, 2015.1, 2015.2, 2016.1, 2016.2 e 2017.1), os dados referentes à situação atual dos alunos9 revelam um índice de evasão que excede em 12,5% o número de matriculados. Os dados estão representados na Tabela 4.
TURMA | Mat. | Canc. | Evad. | Transf.Ext. | Form. | Tranc. | Tranc. Volunt. | M.V.I. | Canc. Comp. | TOTAL |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
2012.1 | 9 | 12 | 19 | - | 10 | - | - | - | - | 50 |
2012.2 | 3 | 15 | 18 | - | 6 | 1 | - | - | - | 43 |
2013.1 | 7 | 10 | 23 | 1 | 1 | 3 | 2 | 1 | - | 48 |
2013.2 | 7 | 13 | 17 | - | 6 | - | 3 | 1 | 1 | 48 |
2014.1 | 11 | 9 | 21 | - | - | 2 | - | 1 | 3 | 47 |
2014.2 | 27 | 8 | 13 | - | - | - | 2 | - | - | 50 |
2015.1 | 20 | 4 | 15 | - | - | - | 3 | - | - | 42 |
2015.2 | 24 | 6 | 12 | - | - | - | 1 | - | - | 43 |
2016.1 | 29 | 9 | 8 | - | - | - | 2 | - | - | 48 |
2016.2 | 38 | 8 | 1 | - | - | - | 1 | 1 | - | 49 |
2017.1 | 41 | 2 | - | - | - | - | - | - | 2 | 45 |
TOTAIS | 216 | 96 | 147 | 1 | 23 | 6 | 14 | 4 | 6 | 513 |
Fonte: Elaborada pelos autores (2017).
Considerando apenas as turmas cujo prazo mínimo de integralização foi cumprido - 2012.1, 2012.2, 2013.1, 2013.2 e 2014.1 -, observa-se que o índice de evasão ficou em torno de 67%, e o índice de titulação, em torno de 10%. Outro dado importante, captado pelas análises no sistema acadêmico do Instituto Federal, traz informações sobre o período do curso em que os alunos evadiram. Com o objetivo de investigar o momento em que ocorreram as evasões/cancelamentos, levantou-se, junto ao INEP (2016), o número de ocorrências por semestre letivo. Verificou-se que as ocorrências foram mais numerosas no primeiro e segundo semestres - 29,8% e 37,0%, respectivamente. A partir do terceiro semestre, o percentual começa a cair, tendendo a zero à medida que se aproximam os períodos finais do curso. Verifica-se assim, que a observação feita por Silva Filho et al. (2007, p. 641) também se aplica ao CST em Gestão Pública: “verifica-se em todo o mundo que a taxa de evasão no primeiro ano de curso é duas a três vezes maior do que a dos anos seguintes”.
4.4 Motivos da evasão do curso de tecnologia em gestão pública
O bloco do questionário referente a esta subseção foi elaborado com o intuito de identificar as causas da evasão do curso em estudo, considerando aspectos internos e externos à instituição. Para tanto, as questões foram elaboradas com base em dez variáveis, numeradas de 12 a 21, a serem julgadas pelos respondentes de acordo como os mesmos valores e convenção utilizados nas questões presentes nas tabelas 1 e 2. São elas: 12) escolha equivocada da carreira; 13) ter sido admitido para um curso que não foi sua primeira opção; 14) ter sido aprovado para outro curso de graduação, na mesma, ou em outra instituição; 15) dificuldades com as atividades acadêmicas propostas; 16) dificuldades com a metodologia didático-pedagógica utilizada pelos professores; 17) dificuldades com os métodos de avaliação aplicados; 18) expectativas não atendidas em relação ao curso/instituição; 19) dificuldades em conciliar trabalho e estudo; 20) dificuldades em conciliar o CST Gestão Pública com outros cursos; e, 21) problemas de ordem pessoal/familiar. As razões estão representadas na Tabela 5.
NI | PI | IM | MI | EI | ∑ NI/PI | ∑ IM/MI/EI | |
---|---|---|---|---|---|---|---|
12. Escolha equivocada da carreira. | 57,7% | 13,4% | 11,3% | 8,3% | 9,3% | 71% | 29% |
13. Ter sido admitido para um curso que não foi sua 1ª opção. | 67,0% | 8,2% | 9,3% | 8,2% | 7,2% | 75% | 25% |
14. Ter sido aprovado para outro curso de graduação na mesma ou em outra instituição. | 50,5% | 4,1% | 5,2% | 11,3% | 28,9% | 55% | 45% |
15. Dificuldades com as atividades acadêmicas propostas. | 54,6% | 18,6% | 14,4% | 8,2% | 4,1% | 73% | 27% |
16. Dificuldades com a metodologia didático-pedagógica utilizada pelos professores. | 60,8% | 13,4% | 14,4% | 6,2% | 5,1% | 74% | 26% |
17. Dificuldades com os métodos de avaliação aplicados. | 61,8% | 16,5% | 11,3% | 5,1% | 5,1% | 78% | 22% |
18. Expectativas não atendidas em relação ao curso/instituição. | 53,6% | 13,4% | 13,4% | 12,4% | 7,2% | 67% | 33% |
19. Dificuldades em conciliar trabalho e estudo. | 31,9% | 7,2% | 13,4% | 14,4% | 33,0% | 39% | 61% |
20. Dificuldades em conciliar o curso de Gestão Pública com outros cursos. | 58,8% | 8,2% | 11,3% | 8,2% | 13,4% | 67% | 33% |
21. Problemas de ordem pessoal/familiar. | 52,6% | 10,3% | 5,1% | 10,3% | 21,6% | 63% | 37% |
Fonte: Elaborada pelos autores (2017).
As respostas dadas à questão “17” revelaram que as “dificuldades com os métodos de avaliação aplicados” foram relevantes para, apenas, 22% dos pesquisados, e irrelevantes para outros 78% dos respondentes. Neste item, 62% dos pesquisados selecionaram o valor “Nenhuma Influência” (NI). De todas as razões mencionadas, esta foi a que menos influenciou a decisão pela evasão do CST em Gestão Pública.
Quanto à questão “18”, as respostas revelaram que as “expectativas não atendidas em relação ao curso/instituição” foram relevantes para 33% dos pesquisados, e irrelevantes para 67% dos respondentes.
As quatro razões anteriores sugerem relativa adequação dos procedimentos metodológicos utilizados pelo corpo docente, e da estrutura oferecida pelo curso, e respaldam dois dos motivos listados anteriormente para a escolha do Instituto Federal enquanto IESP, quais sejam: “Qualidade reconhecida da instituição” e “Estrutura de apoio e instalações físicas”.
Quanto à questão “19”, as respostas revelaram que a “dificuldade em conciliar trabalho e estudo” foi relevante para 61% dos pesquisados e irrelevante para 39% dos respondentes. Dentre as razões mencionadas, esta foi a razão que apresentou maior nível de influência e, igualmente, corrobora com os resultados obtidos por Lobo (2012) e Cunha e Morosini (2013).
As respostas à questão “20” revelaram que a “dificuldade em conciliar o CST em Gestão Pública com outros cursos” foi relevante para 33% dos pesquisados, e irrelevante para 67% dos respondentes. Nesta razão, 59% dos respondentes selecionaram o valor “Nenhuma Influência” (NI). Destaca-se, nesse sentido, o que prevê a Lei n° 12.089, de 11 de novembro de 2009, art. 2°, que proíbe uma mesma pessoa de ocupar, na condição de estudante, simultaneamente, no curso de graduação, duas vagas, no mesmo curso ou em cursos diferentes em uma ou mais de uma instituição pública de ensino superior (BRASIL, 2009).
Por fim, quanto à questão “21” - “problemas de ordem pessoal/familiar” -, esta razão foi relevante para 37% dos pesquisados e irrelevante para 63% dos respondentes, não respaldando as proposições de Morosini et al. (2012) no que diz respeito aos principais motivos da evasão.
Questionou-se, ainda, se existia alguma outra razão não contemplada para a evasão do CST em Gestão Pública. Neste item, foram mencionadas 24 razões, das quais destacaram-se: greves (4%); baixa perspectiva em relação ao mercado de trabalho (4%); e, o fato do curso ser totalmente presencial (3%). Sobre estes aspectos, merece destaque o fato de que, no período de 2010 a 2017, o Instituto Federal pesquisado vivenciou períodos de greve, de maneira que, entre 2011 e 2017, o calendário letivo não ficou compatível com o calendário civil. Essa situação gerou, aparentemente, dificuldades para os alunos no ambiente profissional e pessoal.
As últimas seções do questionário tinham o intuito de conhecer um pouco do percurso do respondente quanto à participação em programas institucionais, como programas de assistência estudantil e de bolsas escolares. A questão “Participou de algum programa de assistência estudantil como Auxílio Transporte e Alimentação Escolar durante o período em que realizou o CST em Gestão Pública?” apontou que somente 3% dos alunos evadidos haviam participado destes programas. Do total, 82% afirmaram não ter participado e 12% afirmaram não ter tido conhecimento sobre tais programas. Quanto à participação no programa de bolsas escolares, os percentuais se repetiram: as respostas revelaram que, apenas, 3% dos respondentes participaram de Bolsa de Iniciação Profissional, Bolsa de Iniciação Científica ou Bolsa de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação durante o período em que realizaram o Curso.
As perguntas finais do questionário foram propostas, especialmente, com o objetivo de conhecer o percurso acadêmico do pesquisado após a evasão. Para tanto, foram colhidas informações sobre o retorno à instituição, o curso procurado e o grau de escolaridade. Quanto ao retorno ao Instituto Federal, 13% dos alunos evadidos do Curso em estudo informaram ter retornado ao Instituto. Desses, dois (2) retornaram ao CST em Gestão Pública, participando de processos seletivos subsequentes. Em que pese o baixo percentual de retorno (13%), esses dados indicam que o abandono do curso não estaria relacionado às características relacionadas à instituição e ao curso, mas sim a fatores externos à instituição.
Realizadas estas discussões, na sequência, serão apresentadas as últimas considerações do presente estudo, no que diz respeito a evasão no CST em Gestão Pública ofertado pelo Campus Central do Instituto Federal pesquisado.
5 Considerações finais
Este trabalho teve como tema a evasão no ensino superior e, mais especificamente, estudou o caso do CST em Gestão Pública, ofertado pelo Campus Central de um Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do nordeste brasileiro, trazendo como diretriz geral a análise das causas que contribuíram para a ocorrência da evasão. Para a realização do estudo, definiram-se os seguintes objetivos específicos: a) traçar o perfil socioeconômico do evadido, b) mapear o contexto da evasão e, por fim, c) identificar as causas da evasão, considerando aspectos internos e externos à instituição.
Para cumprir o primeiro objetivo, foram colhidas informações no sistema acadêmico da instituição pesquisada, e junto aos 97 pesquisados abordados por meio de questionário socioeconômico. Para algumas variáveis socioeconômicas, no entanto, foram priorizadas as informações colhidas no sistema acadêmico, por serem mais completas, como foi o caso das relativas à população total de evadidos/cancelados (sexo, idade e modalidade de ingresso).
Constatou-se, no sistema acadêmico, que, entre os evadidos/cancelados, há um equilíbrio entre o número de indivíduos do gênero masculino e do gênero feminino. Essas pessoas têm uma idade média de 29 anos; sendo que, pouco mais da metade, ingressaram no curso por meio da ampla concorrência, isto é, não se utilizando de políticas de cotas.
Quanto aos 97 pesquisados, a maior parte concluiu o ensino médio entre 1996 e 2012, boa parte informou já ter concluído um curso de graduação quando iniciaram o curso estudado - com destaque para os cursos de Ciências Contábeis, Direito e Administração (área afim). A maioria ainda exercia atividade remunerada, enquanto realizavam o CST em Gestão Pública e, destes, pouco mais da metade recebiam de 1 a 3 salários mínimos. Além disso, exerciam carga horária de trabalho de 40 horas semanais.
Quanto aos motivos para escolha do Instituto Federal enquanto IES, destacaram-se, em ordem decrescente de importância as razões: qualidade da instituição, estrutura de apoio e instalações físicas, localização, oferta do curso pretendido, possibilidade de estudar à noite e dificuldade de acesso às universidades públicas (federais/estaduais). Como se vê, as razões que exprimem características institucionais foram as mais pontuadas.
No que diz respeito aos motivos de escolha do CST em Gestão Pública, constatou-se que razões ligadas à afinidade com o curso foram as mais pontuadas, merecendo destaque o desejo de complementar conhecimentos para ser aprovado em concurso público. Neste item, foi considerada menos importante a razão que indica o intuito de complementar formação anterior na área de Administração/Gestão.
Acerca das razões para evadir-se do curso, observa-se que, de todas mencionadas, somente uma foi considerada relevante pela maioria dos pesquisados: dificuldades em conciliar trabalho e estudo. Tal contexto corrobora, aqui, o fato, descrito no perfil socioeconômico, de que a maior parte dos evadidos possuía mais de 27 anos de idade, isto é, encontrava-se economicamente ativa e inserida no mercado de trabalho. Além disso, como a maior parcela dos sujeitos abordados pela pesquisa possuía uma renda, relativamente, baixa, a busca por um segundo emprego, ou por um trabalho mais bem remunerado pode ter interferido, de alguma forma, na incompatibilidade de horários trabalho-curso. A questão “ter sido aprovado em outro curso de graduação”, apesar de ter sido relevante, não foi considerada como a mais influente para a maior parcela dos respondentes. Destacam-se, ainda, os períodos de greve, como razões para o abandono do curso, mencionadas de maneira espontânea pelos pesquisados, sem o estímulo de alternativas propostas pelo questionário. As demais razões mencionadas obtiveram índices baixos de influência, dentre elas as que se referem à adequação da estrutura acadêmica do curso em questão.
De forma alternativa, acredita-se que a distância temporal entre a data de conclusão do ensino médio e o ingresso no CST em Gestão Pública (mais de quatro anos) não apresentou grande influência na evasão dos alunos, tendo em vista que, aproximadamente metade dos respondentes informou possuir uma formação superior, isto é, o tempo decorrido entre o término do ensino médio e a entrada no Curso em estudo foi preenchido pelo andamento de uma graduação, não retirando do aluno um possível ritmo de estudos.
Além do exposto, merece destaque o fato de que todas as razões que buscaram analisar a autoconfiança do aluno na escolha do CST em Gestão Pública indicaram que esta foi uma decisão aparentemente fundamentada, não sendo, portanto, causadora da evasão. Este fato também foi comprovado quando buscou-se identificar os motivos de escolha do CST em Gestão Pública: os resultados apontaram a “afinidade com as disciplinas contempladas pela matriz curricular” e a “vocação para atuar na área” como razões mais relevantes, corroborando dado do perfil dos respondentes que apontava grande parte deles atuando em instituições públicas.
Também foi constatado que o fato de apenas uma mínima parte dos alunos evadidos terem se utilizado da política de assistência social do Instituto Federal sugere, de maneira geral, que os alunos atendidos por essa política não se evadem da instituição. Assim, uma ampliação do número de alunos atendidos por essa política poderia impactar na redução dos atuais índices de evasão.
Os resultados desta pesquisa sugerem, por fim, que há a necessidade de um trabalho especial com os alunos ingressantes, que vise identificar suas expectativas com a realização do curso, a fim de que, de posse desses dados, sejam desenvolvidas ações que objetivem minimizar a evasão e estimular a permanência do aluno. Como sugestão para trabalhos futuros, recomenda-se estudos acerca das ações de acompanhamento pedagógico e assistência social ao aluno, e ainda dos impactos dessas ações na redução da evasão.