A obra intitulada Patrimônio Educativo: arquitetura escolar e currículo foi publicada sobre os auspícios do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP). A obra organizada por Alba Fernanda Oliveira Brito e Fernanda Ferreira Boschini, servidoras e pesquisadoras do IFSP, abre espaços para estudos sobre a história e a memória da instituição em seus diferentes momentos, além de receber contribuições de estudos relacionados a outras instituições e contextos educacionais. A publicação tem como núcleo central o patrimônio educativo das instituições de Educação Profissional e Tecnológica ao longo do século XX.
É interessante observar que as escolas centenárias que são objeto da análise da maior parte dos textos compilados passaram a ter estudos específicos e projetos institucionais voltados à organização de acervos documentais e centros de memória muito recentemente. Além da temática abordada, o livro registra, celebra e analisa a trajetória na institucionalização de acervos e centros de memória. Relata o esforço interinstitucuonal a partir, por exemplo, de uma parceria entre o Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza (CEETEPS) e o IFSP em 2018 no sentido de trocar experiências de pesquisa e organizar eventos e publicações no âmbito da história e da memória da Educação Profissional e Tecnológica.
Como pano de fundo desse esforço há que se mencionar o protagonismo do Núcleo de Pesquisa em História e Memória da Educação Profissional e Tecnológica, o NUPHMEPT e do Centro de Memória do IFSP que deram o aporte institucional para as ações de ensino, pesquisa e extensão na realização do I Seminário Patrimônio Educativo: Arquitetura Escolar e Currículo ocorrido em abril de 2019 no IFSP, campus São Paulo. O NUPHMEPT que tem entre seus objetivos investigar e produzir conhecimento sobre a memória do ensino técnico no Brasil conta com cinco linhas de pesquisa, a saber: História da educação profissional; Narrativas docentes e história oral; Arquitetura escolar e espaços educativos; Cultura material escolar e História das disciplinas escolares. É possível afirmar que a obra Patrimônio Educativo: arquitetura escolar e currículo reflete os caminhos de pesquisa desse núcleo no amadurecimento dessas linhas, também difundido as pesquisas apresentadas na organização do seu primeito seminário.
Não é ocioso destacar que esse livro faz parte de um esforço de divulgação dessas conquistas disponibilizando a todos os interessados o desenrolar do conhecimento da história e da memória da Educação Profissional e Tecnológica como uma estratégia relevante de formação e reflexão sobre esse âmbito do patrimônio educativo.
O que se pode esperar deste livro já aparece explicitado na capa. A imagem da capa foi selecionada no próprio acervo documental do Centro de Memória da instituição surgido em 2019. Trata-se de uma foto da fachada do prédio nos idos da década de 1970 em que se lê o nome da Escola Técnica Federal de São Paulo. Ainda em construção, a foto revela, por meio da arquitetura, a concepção de uma escola-fábrica que, embora nascida no início do século XX como parte do grande projeto nacional das Escolas de Aprendizes e Artífices, é no processo da industrialização próprio dos anos 1960 e 1970 que se fortalece numa perspectiva desenvolvimentista para a formação de trabalhadores. De todo modo, o prédio da antiga Escola Técnica Federal de São Paulo surge como um monumento em constante construção tal qual se dá com a busca de consolidação de um ideal republicano ainda em aberto num país que em pleno século XXI enfrenta grandes desafios em seu processo de democratização.
O livro Patrimônio Educativo: arquitetura escolar e currículo se debruça sobre a institucionalidade das escolas de formação técnica e tecnológica resgatando seus antecedentes históricos e trazendo para seu escopo estudos congêneres que têm a arquitetura escolar e o currículo como temas transversais e articulados a processos de densenvolvimento urbano e industrial e de formação para o mundo do trabalho.
Nessa tarefa de refletir e pesquisar sobre os percursos da Educação Profissional e Tecnológica como política de inserção sociolaboral, desenvolvimento e modernização, o livro foi prefaciado pela Profa. Dra. Rosa Fátima de Souza Chaloba que destaca a relevância da abordagem teórica do livro. A relação entre arquitetura escolar e currículo na história e memória da Educação Profissional e Tecnológica é marcada por autores fundamentais lembrados no prefácio e também largamente citados ao longo da obra. São visitados neste prefácio autores centrais nos estudos sobre currículo, cultura escolar e patrimônio educativo. Destacam-se as obras de Benito Escolano e Antônio Vinão Frago amplamente citados nos capítulos do livro, assim como podem ser encontrados aprofundamentos em torno de autores como Luiz Antonio Cunha e Carmen Sylvia Vidigal Moraes no que tange às políticas e instituições de Educação Profissional e Tecnológica.
Nem sempre a dimensão cultural tem sido levada em conta nos estudos sobre as políticas e as instituições de Educação Profissional e Tecnológica. A obra, portanto, ao problematizar e enfatizar a dimensão cultural não apenas como conteúdo mas intrínseca à própria concepção de espaço educativo coloca em patamares elevados o campo das relações entre educação, cultura e trabalho como objeto de estudo. De maneira pontual, o livro traz estudos interessantes sobre futuros pautados na Educação Profissional e Tecnológica em que experiências estéticas foram valorizadas considerando as propostas pedagógicas de Aprígio Gonzaga no começo do século XX e a importância de intervenções artísticas a partir das obras de Cildo Meireles no IFSP em 2018.
O livro é dividido em três partes em que estão reunidos professores e pesquisadores de diferentes instituições como o IFSP, a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e o Ceeteps. A primeira parte dedicada à Educação Profissional e Tecnológica no Brasil traz estudos dos próprios pesquisadores do IFSP. A segunda parte recebeu o título “Arquitetura escolar e suas relações com o aprendizado”. Nessa parte aparecem autores vinculados à Universidade Brasil, à UFGD, ao IFSP e à Unifesp. A terceira e última parte é dedicada especificamente ao currículo da Educação Profissional e Tecnológica contando com o trabalho sobretudo de pesquisadores vinculados ao Ceeteps e ao IFSP.
Fartamente documentados os capítulos do livro revelam que muito se avançou nas primeiras décadas do século XXI quanto à organização de coleções histórico- digitais e de sites institucionais capazes de disponibilizar imagens e documentos diversos, e de divulgar a formação de arquivos pessoais que se configuram como importante sistematização do patrimônio educativo ligado não apenas aos processos de ensino aprendizagem mas às relações entre as instituições, a sociedade e o desenvolvimento econômico e sociocultural.
Que relação ocorre entre o lugar em que se ensina e o que se ensina? Quais são os aspectos visíveis e invisibilizados da arquitetura escolar em diálogo com o currículo voltado para a formação de técnicos? Que diálogos podem se dar entre arquitetura e educação de modo a propor inovação na produção e ocupação de um escola emancipadora? Essas e outras questões perpassam os estudos publicados nesse livro.
Os estudos empíricos, de natureza documental presentes na obra, revelam que a cultura escolar resulta num processo permanente de criação, configuração e reconfiguração de espaços e narrativas em que se percebem separações, especializações, confinamentos, interdições e silenciamentos.
Imersos na história e na memória da Educação Profissional e Tecnológica ou mesmo tratando de experiências educacionais mais amplas na formação de crianças e jovens, os estudos publicados nessa obra comumente se associam à compreensão do desenvolmento urbano e das diferentes concepções de educação no contexto das transformações relacionadas à industrialização e a modernização conservadora em curso a partir do século do início do século 20 em nosso país. A cidade aparece como parte desse processo e não apenas como um contexto geograficamente definido ou cenário. A cidade em seus caminhos de desenvolvimento e de urbanização também é educadora criando monumentalidades e demolições, memórias e esquecimentos, institucionalidades e subjetividades, sendo a cultura escolar um tempo-espaço de resistência, de construção de narrativas e dissonâncias.