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Eccos Revista Científica

versión impresa ISSN 1517-1949versión On-line ISSN 1983-9278

Eccos Rev. Cient.  no.62 São Paulo jul./sept 2022  Epub 12-Feb-2024

https://doi.org/10.5585/eccos.n62.21772 

Artigos

A CONSTITUIÇÃO HISTÓRICO-INSTITUCIONAL DA CONSOLIDAÇÃO DOS INSTITUTOS FEDERAIS DE EDUCAÇÃO NO BRASIL

THE INSTITUCIONAL HISTORICAL-CONSTITUTION OF THE CONSOLIDATION OF THE FEDERAL INSTITUTES OF EDUCATION IN BRAZIL

LA CONSTITUICIÓN HISTÓRICO-INSTITUCIONAL DE LA CONSOLIDACIÓN DE LOS INSTITUTOS FEDERALES DE EDUCACACIÓN EN BRASIL

Francislene Rosas da Silva, Doutoranda em Educação1 
http://orcid.org/0000-0002-0751-9548

Arminda Rachel Botelho Mourão, Doutora em Educação2 
http://orcid.org/0000-0002-1940-9477

José Júlio César do Nascimento Araújo, Doutor em Educação3 
http://orcid.org/0000-0003-1045-3284

1Doutoranda em Educação, Universidade Federal do Amazonas - UFAM. Manaus, AM - Brasil.

2Doutora em Educação, Universidade Federal do Acre - UFAM. Manaus, AM - Brasil.

3Doutor em Educação, Instituto Federal do Acre- IFAC. Rio Branco, AC - Brasil.


Resumo

O artigo discute a expansão da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (EPCT), a partir da nova institucionalidade, com a implementação dos Institutos Federais (IFs) no âmbito das políticas públicas e educacionais no Brasil, no governo Lula, destacando os movimentos sociopolíticos envolvidos em sua constituição. A análise metodológica centra-se em um estudo bibliográfico e documental com consulta à legislação e aos documentos normativos do Ministério da Educação (MEC), ancorada no método histórico-dialético. A discussão nos permitiu uma análise dos movimentos históricos, socioeconômicos e políticos que marcaram a consolidação dos Institutos Federais (IFs). Em síntese, a nova institucionalidade caracteriza-se pela transformação das finalidades e do tipo de trabalho desenvolvidos, e pela mudança no público que acessa à nova instituição através da política de expansão. Tal fato trouxe avanços educacionais significativos em termos de desenvolvimento regional e inserção social, embora existam limitações e desafios para a materialização das ações políticas-educacionais que atendam às finalidades de sua criação.

Palavras-Chaves: políticas educacionais; institutos federais; nova institucionalidade.

Abstract

The article discusses the expansion of the Federal Network of Professional, Scientific and Technological Education (EPCT), based on the new institutionality with the implementation of the Federal Institutes (IFs) in the scope of public and educational policies in Brazil, during the Lula government, highlighting the movements sociopolitical factors involved in its constitution. The methodological analysis focuses on a bibliographic and documentary study with consultation of legislation and normative documents of the Ministry of Education (MEC), anchored in the dialectical historical method. The discussion allowed us to analyze the historical, socioeconomic and political movements that marked the consolidation of the Federal Institutes (IFs). In summary, the new institutionality is characterized by the transformation of the purposes, the type of work developed, by the change in the public that accesses the new institution through the expansion policy. This fact has brought significant educational advances in terms of regional development and social inclusion, although there are limitations and challenges for the materialization of political-educational actions that meet the purposes of their creation.

Keywords: educational policies; federal institutes; new institutionality.

Resumen

El artículo discute la expansión de la Red Federal de Educación Profesional, Científica y Tecnológica (EPCT), basada en la nueva institucionalidad con la implementación de los Institutos Federales (IFs) en el ámbito de las políticas públicas y educativas en Brasil, bajo el gobierno de Lula, destacando los movimientos sociopolíticos involucrados en su constitución. El análisis metodológico se centra en el estudio bibliográfico y documental con consulta con legislación y documentos normativos del Ministerio de Educación (MEC), anclado en el método histórico dialéctico. La discusión nos permitió analizar los movimientos históricos, socioeconómicos y políticos que marcaron la consolidación de los institutos federales (FI). En resumen, la nueva institucionalidad se caracteriza por la transformación de los propósitos, el tipo de trabajo desarrollado, por el cambio en el público que accede a la nueva institución a través de la política de expansión. Este hecho ha traído importantes avances educativos en materia de desarrollo regional e inserción social, aunque existen limitaciones y desafíos para la materialización de acciones político-educativas que cumplan con los propósitos de su creación.

Palabras Clave: políticas educativas; institutos federales; nueva institucionalidad.

1 Introdução

A implantação dos Institutos Federais (IFs) preconiza uma nova concepção de institucionalidade na Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (EPCT) brasileira, possibilitando a expansão regionalizada e a interiorização dessa rede de instituições nas diferentes regiões e localidades do território brasileiro.

A nova institucionalidade, caracterizada na rede federal pela implantação dos Institutos Federais, a partir do governo de Luís Inácio Lula da Silva, congrega o conjunto de políticas públicas que buscam contribuir com o desenvolvimento político, econômico e social do país, atendendo às demandas do regime neoliberal através do novo desenvolvimentismo e do retorno da teoria do capital humano, focalizando as políticas educacionais para minimizar os conflitos internos estabelecidos pelos circuitos produtivos e financeiros (ARAÚJO; MOURÃO, 2017, p. 2).

Esta nova institucionalidade se dá com a Lei n° 11.892/2008, que institui uma nova configuração à educação profissional brasileira, marcada como um dos pilares de destaque na política governamental, onde os antigos CEFETS (Centros Federais de Educação Tecnológica), as Escolas Técnicas Federais (ETFs), as Escolas Agrotécnicas Federais (EAFs) e as Escolas Técnicas vinculadas às universidades federais foram transformados em Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia.

O presente artigo traz uma abordagem da implantação e criação dos Institutos Federais, apresentando, respectivamente, as seguintes partes: na primeira, a introdução; na segunda, uma síntese dos procedimentos metodológicos; na terceira, discute-se os Institutos Federais como política pública: uma nova institucionalidade, posteriormente, mostra-se o papel social dos Institutos Federais: perspectivas, características e finalidades, e, por fim, conclui-se apontando os desafios e as contradições de uma nova institucionalidade.

2 Procedimentos metodológico

O presente estudo de caráter descritivo teve como orientação a pesquisa bibliográfica não sistemática ou narrativa (ROTER, 2007) e documental (HELDER, 2006) a respeito da temática em publicações em periódico, livros e teses e da consulta aos documentos oficiais e legislações publicadas no site do Ministério da Educação (MEC).

A pesquisa assume os pressupostos do materialismo histórico-dialético, pois entende-se que esta deve apoderar-se da matéria, analisando suas diferentes formas de desenvolvimento, buscando investigar minunciosamente a conexão existente e suas mediações com a realidade em uma perspectiva histórica (MARX, 2017).

A conjuntura metodológica utilizada foi a dialética-marxista como compreensão do objeto e da realidade, onde o método se vincula à realidade de mundo e de vida em sua conjuntura, se caracterizando através da mediação que apreende, revela e expõe a estrutura, o desenvolvimento e a transformação social (FRIGOTTO, 2004, p. 77).

3 Os institutos federais como política pública: uma nova institucionalidade

Historicamente, as instituições que formam hoje a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica são originárias, em grande parte, das dezenove escolas de Aprendizes Artífices instituídas pelo Decreto Presidencial nº 7.566/1909, no governo de Nilo Peçanha, que, mediante inúmeras mudanças e avanços históricos, políticos, econômicos e sociais, culminaram com a criação dos Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia em 2008, a partir da reconfiguração das Escolas Federais já existentes.

Numa perspectiva histórico-dialética, a educação brasileira é resultante do complexo desenvolvimento das forças produtivas e das forças sociais, fruto de forças socialmente antagônicas que contribuem para a reprodução da ideia de classes. Dito isso, a política educacional é pensada contraditoriamente, hierarquizada e representada pela dualidade estrutural: uma educação para elite (propedêutica) e outra para a classe trabalhadora (formação técnica) para a manutenção da dominação do sistema capitalista.

No que se refere à Educação Profissional e Tecnológica no Brasil enquanto política pública, a partir do governo de Lula, ocorre a reconfiguração da rede de educação profissional e tecnológica que visava a consolidação de reformas educacionais requeridas para o avanço econômico como estratégia de ação política e de transformação social.

A conjuntura político-econômica impulsionava a criação de institucionalidade que se permeia na ideia que é preciso criar uma instituição de educação que pudesse corresponder ao momento de crescimento e modernização que o país atravessava. Esta nova institucionalidade apontava para um novo tipo de instituição identificada e pactuada em um modelo desenvolvimentista inovador em termos de proposta política-pedagógica que entende a educação como o compromisso político de transformação social voltado para a emancipação humana.

Nesse contexto, o surgimento da nova institucionalidade, originando a criação dos Institutos Federais, se constituiu a partir de alguns documentos balizadores do processo de reorganização das Instituições Federais de Educação Profissional e Tecnológica em novo projeto institucional. O modelo dos Institutos Federais de Ciência e Tecnologia (IFCT) serviu de alicerce para a consolidação do projeto institucional traçados pelo governo de Lula, destacando-se: o Decreto nº 6.095/2007, a Chamada Pública MEC/SETEC nº 01/2007, a Chamada Pública MEC/SETEC nº 2/2007 e a Lei n° 11.892/2008.

A partir de 2003, no início do primeiro mandato do governo Lula (2003-2006), os movimentos políticos, sociais e sindicais reivindicam uma educação profissional voltada para os interesses da população. O governo apresenta o “ Decreto 5.154/2004 e no projeto Escola das Fábricas uma proposta com políticas desenvolvimentistas para educação como ação interventora do Estado”, de cunho neoliberal, onde predominavam os objetivos voltados ao mercado capitalista (ARAÚJO et al., 2021, p. 284).

No tocante aos projetos Escola da Fábrica e o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (PROJOVEM), Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005) destacam que, apesar de reconhecerem a formação profissional de nível médio integrada, internamente é imposta ao currículo uma dicotomia entre concepções educacionais de uma formação para a cidadania e outra para o trabalho.

Os programas Escola de Fábrica e o PROJOVEM, criados no referido governo, são dirigidos para uma massa de desempregados e para alunos da escola pública. O que se observa é uma clara política compensatória sem a garantia da melhoria da renda dos egressos. No caso do Programa Escola de Fábrica, os recursos eram repassados à iniciativa privada, mostrando, destarte, uma concepção de formação voltada às necessidades da empresa (ARAÚJO et al., 2021, p. 285).

Esse período é marcado por disputas entre as secretarias do Ministério da Educação e as forças conservadoras e reformistas. De acordo com Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005), com o Decreto nº 5.154/2004, esperava-se que este garantisse a pluralidade das ações e, ao mesmo tempo, mobilizasse a sociedade civil na defesa do ensino médio unitário e politécnico, integrando a profissionalização aos princípios da ciência, do trabalho e da cultura. Com os Decretos n° 5.154/2004 e n° 5.225/2004, foi permitido que os Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFETs) alcançassem o status de universidades. Porém, tais decretos não resolveram o impasse histórico do ensino médio integrado e não atenderam àquilo que era esperado pelos movimentos intelectuais no tocante à educação profissional.

Em 2004, o governo iniciou o movimento que levaria à expansão das escolas federais de educação profissional, alterando, desse modo, a legislação que vedava a criação de unidades de ensino por meio da aprovação, em 2005, da Lei n° 11.195.

Todavia, as políticas de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mediante a SETEC (Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do MEC), já apontam para a criação de novas instituições de educação profissional que são consolidadas, como as ações do PDE (Plano de Desenvolvimento da Educação) e a implementação do Plano de Expansão da Rede Federal dividida em três fases: fase I de 2003 a 2006, fase II iniciada em 2007 a 2010, e fase III que se estendeu até 2020, visando contribuir para a efetivação do desenvolvimento em regiões remotas do país.

Em 2005, o Ministério da Educação (MEC), por meio da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC) criou o Plano de Expansão da Rede Federal de Educação Profissional, buscando ampliar as instituições de ensino profissional em todas as regiões do território brasileiro. Conforme os dados da Rede Federal MEC/SETEC (2019), tem-se:

O resultado desse plano de expansão e interiorização das instituições federais de EPT é que a rede federal partiu, em 2006, de um total de 144 unidades e chegou em 2018, a 659 unidades em todo o país, das quais 643 já se encontram em funcionamento. Isto representou a construção de mais de 500 novas unidades, quantitativo maior do que o previsto nas três fases de expansão (MEC/SETEC, 2019, p. 1).

Para Silva e Terra (2013), o plano de expansão atenderia três dimensões: social, geográfica e de desenvolvimento. A dimensão social buscava promover o desenvolvimento econômico, atendendo um grupo de 100 cidades com mais de 80 mil habitantes, com baixa renda per capita e com percentual elevado de extrema pobreza. A dimensão geográfica visava a interiorização e a universalização da Educação Profissional e Tecnológica (EPT), atendendo municípios ou microrregiões com mais de 50 mil habitantes. A dimensão do desenvolvimento objetiva que os novos Campi fossem em municípios com arranjos produtivos locais e que contribuíssem para o desenvolvimento social e econômico dessas localidades. As dimensões social, geográfica e de desenvolvimento estabelecidas pelo MEC visavam atender as regiões e as localidades menos favorecidas, contribuindo para minimizar as desigualdades sociais e regionais.

Mourão et al. (2015, p.53) indicam que:

a criação de uma instituição contingenciada pelas dimensões de política social, agências de desenvolvimento local e formação de professores. Assim, Governança e Território são mediações centrais desse projeto de governo para a Educação Profissional e Tecnológica, o qual se configurou como política pública.

O governo de Dilma Rousseff, a partir de 2011, dá continuidade ao projeto de expansão dos institutos, já iniciado no governo de Lula em 2003, dando sequência às Fases I e II e início à Fase III, com ampliação dos investimentos para estas instituições de educação.

A Fase I do plano de expansão tinha por objetivo implantar escolas federais de educação profissional nos estados desprovidos deste tipo de instituição. O governo anunciou a implantação de 64 novas unidades, prevendo a construção de 37 unidades de ensino descentralizadas (UNED), 9 autarquias federais e a federalização de 18 escolas pertencentes a estados e municípios.

A Fase II, iniciada em 2007 até 2010, marca o reordenamento da Rede Federal de Educação Tecnológica, levando em consideração os critérios de:

distribuição territorial e equilibrada das novas unidades de ensino, cobertura das mesorregiões em cada unidade da federação, proximidade aos arranjos locais em desenvolvimento, interiorização da oferta profissional e superior pública, redução dos fluxos migratórios, aproveitamento de infraestrutura existente e identificação de potenciais parcerias” (BRASIL, 2007, p.1).

Entre os programas criados nos moldes da reorganização da Educação Profissional, destacam-se: o Programa Brasil Profissionalizado, o PROEJA (Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Jovens e Adultos) e o Programa de Expansão da Rede. Como destaca Ramos (2014), a implantação do PROEJA como modalidade de educação busca a integração da educação básica com a educação profissional e avança como uma política de inclusão educacional, visando a elevação de escolaridade da população de jovens e adultos em uma formação de qualidade, onde os sujeitos sejam capazes de produzirem sua existência pelo trabalho (RAMOS, 2014, p. 79).

Ramos (2014) aponta que o Programa de Expansão da Rede objetivava a ampliação da rede federal de educação tecnológica e suas funções para o ensino superior integrando com a pesquisa e o desenvolvimento cientifico-tecnológico, constituindo-se pela criação dos CEFETS e Escolas Técnicas, que foram transformadas posteriormente, em 2008, nos Institutos Federais. Para a supracitada autora:

O Programa Brasil Profissionalizado tem os sistemas estaduais como foco, visando apoiá-los na implantação da educação profissional integrada ao ensino médio de acordo com o Decreto n° 6.302 de 12 de dezembro de 2007. O programa tem como objetivo a modernização e a expansão das redes públicas de ensino integrado, tendo como foco o ensino médio integrado na rede federal com a exigência que os Institutos Federais ofertem pelo menos 50% de suas vagas aos cursos integrados (RAMOS, 2014, p. 79).

Na Fase III da expansão, os 27 estados foram divididos em cinco classes, de acordo com a totalidade da Rede Federal e Estadual em cada um deles. E os critérios foram basicamente: índice populacional, Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), distribuição das unidades da rede nos estados, índices de desenvolvimento da educação básica, número de mesorregiões e municípios de cada estado, distribuição geográfica e índices de população jovem (BRASIL/MEC, 2009).

Destaca-se ainda, na Fase III que se iniciou em 2011, a criação do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC) por meio da Lei n° 12.513/2011 como parte integrante da Política de Educação Profissional Técnica de nível médio com a finalidade de “expandir, interiorizar e democratizar a oferta de cursos de educação profissional técnica de nível médio presencial e a distância e de cursos e programas de formação inicial e continuada ou qualificação profissional” (BRASIL/MEC/PRONATEC, 2021). Salienta-se, nesse contexto, a criação de Bolsas e de Financiamento Estudantil (FIES Técnico), voltadas para beneficiar a iniciativa privada com a oferta de cursos de formação aligeirada.

No entanto, em 29 de dezembro de 2008, foi instituída a Lei n° 11.892, que, no âmbito do Ministério da Educação, criou os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, que apresentam um novo modelo de institucionalidade na Educação Profissional, estruturado a partir dos CEFETs, das Escolas Técnicas, Agrotécnicas Federais e Escolas vinculadas às Universidades Federais, tendo como objetivos estimular e apoiar os processos educativos que levem à geração de trabalho e renda e à emancipação do cidadão na perspectiva do desenvolvimento socioeconômico local e regional, respondendo à necessidade da institucionalização definitiva da educação profissional e tecnológica como política pública. No sentido de comprometê-la com a dimensão social, de modo a fundar a igualdade na diversidade e, também, articulá-la a outras políticas de trabalho e renda, de desenvolvimento setorial, ambiental, social e mesmo educacional, para provocar impactos nesse universo (MEC, 2010, p. 7).

O modelo singular dos institutos se difere de outras instituições de educação, pois tem suas bases na oferta de educação profissional e tecnológica em uma organização pedagógica verticalizada da educação básica a superior, atendendo aos cursos técnicos (50% das vagas), em sua maioria, na forma integrada com o ensino médio, licenciaturas (20% das vagas) e cursos de graduações de tecnologia e bacharelados tecnológicos (30% das vagas), podendo ainda disponibilizar especializações, mestrados profissionais e doutorados voltados principalmente para a pesquisa aplicada e para inovação tecnológica. (BRASIL, 2008).

A educação profissional representada nessa nova institucionalidade propõe uma nova estrutura organizacional para a rede federal de educação profissional e tecnológica, buscando colocar os Institutos Federais em contato direto com as demandas locais, sejam elas de ordem econômica, sejam de ordem social. “A afirmação dessa rede nos espaços territoriais permitirá que o conhecimento nela desenvolvido se volte às reais necessidades que emergem desses contextos, contribuindo, particularmente, para a construção de um projeto de desenvolvimento nacional cada vez mais preocupado com a melhora de vida da população brasileira” (SOUZA; CASTIONI 2012, p. 11).

A concepção educacional presente nos IFs orienta os processos de formação com base nas premissas da integração, da articulação entre ciência, tecnologia, cultura e conhecimentos específicos e do desenvolvimento da capacidade de investigação científica como dimensões essenciais à manutenção da autonomia e dos saberes necessários ao permanente exercício da laboralidade, que se traduzem nas ações de ensino, pesquisa e extensão.

Como afirma Nogueira (2016, p. 79), “as premissas neoinstitucionalistas da política de criação dos IFs contribuem para a percepção de um Estado neutro e conciliador em relação à principal contradição Capital X Trabalho. Mediante o exposto, a nova economia política para a educação profissional, cuja maior expressão é a criação e expansão dos Institutos Federais, confere centralidade à Educação Profissional e Tecnológica com o propósito de continuar contribuindo para a reprodução da força de trabalho nos moldes do desenvolvimento capitalista em sua especificidade contemporânea”.

Os Institutos Federais são criados trazendo inovações nas dimensões estruturais, políticas e pedagógicas, como o plano estratégico de implantação e a formulação de políticas públicas educacionais. O novo modelo dos Institutos Federais se difere das escolas técnicas e das universidades, caracterizando-se por uma matriz marxista de dissociabilidade, baseada na construção de uma educação teórico-prática, política e tecnológica que proporcione a formação dos fundamentos sócio históricos, científicostecnológicos e culturais.

4 Os institutos federais: perspectivas, características e finalidades

A formação humana para o trabalho é vista como uma questão complexa que não se encerra apenas no sistema educacional. Educação e trabalho não podem ser vistos de forma dicotômica, mas, sim, articulados entre si na formação do ser social, como um processo dialético e contínuo que se prolonga por toda vida.

O modelo dos Institutos Federais surge como uma autarquia de regime especial de base educacional humanístico-técnico-científica. É uma instituição que articula a educação superior, básica e profissional, pluricurricular e multicampi, especializada na oferta de educação profissional e tecnológica em diferentes níveis e modalidades de ensino (BRASIL, 2008).

Os Institutos Federais, de acordo com sua Lei de criação n° 11.892/08, em seu Artigo 6º, apresenta como finalidades e características dos IFs,

[...] orientar sua oferta formativa em benefício da consolidação e fortalecimento dos arranjos produtivos, sociais e culturais locais, identificados com base no mapeamento das potencialidades de desenvolvimento socioeconômico e cultural no âmbito de atuação do Instituto Federal”. Em seu artigo 7º, define como objetivos “realizar pesquisas aplicadas, estimulando o desenvolvimento de soluções técnicas e tecnológicas, estendendo seus benefícios à comunidade”, além de “estimular e apoiar processos educativos que levem à geração de trabalho e renda e à emancipação do cidadão na perspectiva do desenvolvimento socioeconômico local e regional (BRASIL, 2008).

Com essa nova institucionalidade dos Institutos Federais, a educação nessas intuições de ensino está voltada para a base educacional humanística-técnico-cientifica, encontrando na territorialidade e no modelo pedagógico elementos singulares para sua definição identitária, numa construção que entrelaça cultura, trabalho, ciência e tecnologia em favor da transformação social (PACHECO 2010, p. 16).

Nesse sentido, os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia apresentam, como princípios basilares, a formação que integra a ciência, a cultura e a tecnologia, alinhadas aos conhecimentos específicos que caracterizam as ações de ensino, pesquisa e extensão, numa concepção que vai além de uma formação voltada para o mercado de trabalho, mas que contempla a formação integral, humanística e omnilateral, tendo o trabalho como princípio educativo.

Marx (1983) já destacava tal concepção de educação integral, quando defendia uma formação geral humanística, física e profissional-tecnológica, vinculada ao mundo do trabalho, já sinalizava uma formação para a politécnica.

A proposta dos Institutos Federais surgiu para a ampliação do ensino, buscando promover o ensino básico, técnico e tecnológico, os programas de formação e qualificação de trabalhadores, bem como os cursos de licenciaturas e cursos de pós-graduação lato e stricto sensu, visando a qualificação profissional e o fortalecimento dos arranjos produtivos locais e regionais minimizando, dessa forma, as desigualdades sociais.

De acordo com Souza; Castioni (2012), a missão dos Institutos Federais é a promoção da justiça social, da equidade, do desenvolvimento sustentável, com vistas à inclusão social à busca de soluções técnicas e de novas tecnologias, esperando que respondam às demandas crescentes por formação profissional, por difusão de conhecimentos científicos e por suporte aos arranjos produtivos locais, oportunizando uma educação voltada para o compromisso político de transformação social e emancipação humana.

Para Lima (2017), a educação profissional como campo específico da educação coloca-se como elemento constitutivo da formação humana, tendo o trabalho como princípio educativo e fundamento onto-criativo. Desse modo, a educação profissional apresenta no seu conteúdo e nas suas formas, relações com a ciência e a tecnologia do trabalho. O trabalho é ou deveria ser o princípio e o fim desse processo educativo.

Gramsci (1982) esclarece que, na civilização moderna, as atividades práticas se tornaram tão complexas e que as ciências se mesclaram de tal modo à vida que toda atividade prática tende a criar uma escola para os próprios dirigentes e especialistas e, consequentemente, um grupo de intelectuais especialistas de nível mais elevado,

Assim, ao lado do tipo de escola que poderíamos chamar de “humanista”, destinado a desenvolver em cada indivíduo humano a cultura geral ainda indiferenciada, o poder fundamental de pensar e de saber se orientar na vida, foi-se criando, paulatinamente, todo um sistema de escolas particulares de diferente nível, para inteiros ramos profissionais, ou para profissionais, ou para profissões já especializadas e indicadas mediante uma precisa individualização. Pode-se dizer, aliás, que a crise escolar que hoje se agudiza liga-se precisamente ao fato de que este processo de diferenciação e particularização ocorre de um modo caótico, sem princípios claros e precisos, sem um plano bem estudado e conscientemente fixado: a crise do programa e da organização escolar, isto é, da orientação geral de uma política de formação dos modernos quadros intelectuais, é em grande parte um aspecto e uma complexificação da crise orgânica mais ampla e geral (GRAMSCI, 1982 p. 117, 118).

É necessário refletir sobre o papel das instituições de ensino, onde estas busquem atender aos interesses da classe trabalhadora que esteja voltada para a formação humana cidadã integral, omnilateral, ou seja, abrangendo vários aspectos (politécnica), com a indissociabilidade entre a educação intelectual e educação tecnológica.

Os Institutos Federais, em sua concepção, “amalgamam trabalho-ciência-tecnologia-cultura na busca de soluções para os problemas de seu tempo, aspectos que necessariamente devem estar em movimento e articulados ao dinamismo histórico da sociedade em seu processo de desenvolvimento” (MEC, 2010, p. 34).

Desse modo, os Institutos Federais precisam estar ancorados em dois princípios: o científico, que se consolida na construção da ciência, e o educativo, que diz respeito à atitude de questionamento diante da realidade. O desafio colocado para os Institutos Federais no campo da pesquisa é, pois, ir além da descoberta científica. Em seu compromisso com a humanidade, a pesquisa deve estar presente em todo o trajeto da formação do trabalhador e representar a conjugação do saber e de mudar e se construir, na indissociabilidade da pesquisa, ensino e extensão. E mais: os novos conhecimentos produzidos pelas pesquisas deverão estar colocados a favor dos processos locais e regionais, numa perspectiva de seu reconhecimento e valorização no plano nacional e global (MEC, 2010, p. 34).

Portanto, a consolidação e a materialização da escola unitária defendida por Gramsci são uma possibilidade futura, pois implica decisões políticas e de grande ampliação do orçamento destinado à educação:

A escola unitária requer que o Estado possa assumir as despesas que hoje estão a cargo da família, no que toca à manutenção dos escolares. Mas esta transformação da atividade escolar requer uma ampliação imprevista da organização prática da escola, isto é, dos prédios, do material científico, do corpo docente etc. O corpo docente, particularmente, deveria ser aumentado, pois a eficiência da escola é muito maior e intensa quando a relação entre professor e aluno é menor, o que coloca outros problemas de solução difícil e demorada. Também a questão dos prédios não é simples, pois este tipo de escola deveria ser uma escola-colégio, com dormitórios, refeitórios, bibliotecas especializadas, salas aptas ao trabalho (GRAMSCI, 1982, p. 121-122).

Nesse sentido, vimos que a atuação dos docentes no âmbito das instituições é crucial para a formação de intelectuais, de sua ampliação cultural, política, humanística e social, tendo em vista que é na escola que se obtêm os conhecimentos sistematizados que corroboram para as transformações sociais e o direcionamento revolucionário de posicionamentos críticos e de discussão contra o sistema elitista vigente.

Moura et al. (2015), ao pensar na organicidade do trabalho e da educação na instituição, destacam a integração entre trabalho, ciência e cultura para compor o princípio educativo da escola unitária como alternativa à escola tradicional, buscando a formação humanística em defesa da emancipação humana.

Dessa forma, o papel dos institutos é promover a formação de intelectuais críticos, de pesquisadores que possam reivindicar melhorias para o direito das minorias através da luta e resistência e dos movimentos político-sociais contra todo processo de dominação, exclusão e manutenção das desigualdades sociais.

5 Institutos federais: desafios e contradições de uma nova institucionalidade

A nova institucionalidade dos Institutos Federais tornou-se responsável por agregar ciência, trabalho e tecnologia na construção de cidadãos emancipados e conscientes de seu papel na sociedade, fazendo dessa instituição um foco para a política pública de transformação social através da educação, impulsionando-a para um novo patamar em relação a sua função social, principalmente no que diz respeito ao mundo do trabalho.

Esta nova estruturação formal dos Institutos Federais, reproduziu identidades que conviveram com os registros do passado. O artigo 6º da Lei nº 11.892/2008 delega aos Institutos atuarem em diferentes níveis e modalidades de ensino, atendendo a um diversificado itinerário formativo que se estende desde a educação básica, a educação de jovens e adultos, a graduação tecnológica, os bacharelados, as licenciaturas, a pós-graduação lato e stricto sensu, recomendando a integração com os arranjos produtivos locais numa enormidade de frentes delegadas à nova estrutura.

Como destaca Pacheco (2020), a nova institucionalidade deve atender aos fundamentos estruturantes da ação dos Institutos Federais, baseados na verticalidade, na transversalidade e na territorialidade. A verticalidade compreende oferta simultânea de cursos e formações em diferentes níveis e modalidades da educação profissional e tecnológica. A transversalidade diz respeito ao diálogo entre ensino, pesquisa e extensão e entre as disciplinas, cursos, instituição e sociedade. E a territorialidade envolve o compromisso e o desenvolvimento soberano sustentável e inclusivo de seu território de atuação.

Embora os Institutos Federais estejam pautados em uma política governamental que representa uma revolução na educação profissional, ocasionando avanços educacionais significativos, a saber, a interiorização, o acesso à educação para as classes menos favorecidas, a dinamização do processo educativo que possibilita aos discentes o acesso à educação básica até os cursos de pós-graduação na mesma instituição, a contribuição para a qualificação de profissionais docentes (licenciados e tecnólogos) nos cursos de licenciatura, tecnologia e pós-graduação e dos profissionais técnicos nos cursos (subsequente, integrado e concomitante) para inserção no mundo do trabalho, buscando atender às necessidades e aos arranjos produtivos locais.

Os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia atravessam inúmeros desafios e contradições na consolidação de suas ações políticas e educacionais. Nesse sentido, destacamos alguns elementos desafiadores e contraditórios, evidenciados a partir da nova institucionalidade dos IFs presentes nos estudos de autores como Oliveira; Silva (2012), Souza; Castioni (2012), Pacheco (2020), Araújo; Mourão (2021).

Oliveira; Silva (2012, p 200) destacam como desafio nos IFs a necessidade de ampliação dos espaços de formação. As autoras afirmam a carência de incentivos da pesquisa sobre a própria prática como espaço de autoformação, a ampliação das discussões acerca da formação docente nos programas de pós-graduação, a ampliação da formação continuada institucional e a instituição de uma política de formação continuada para a docência de Ensino Superior e na Educação Profissional no interior das universidades e dos Institutos Federais.

Souza; Castioni (2012, p. 53, 54) trazem uma reflexão a respeito da criação da identidade e da estrutura organizacional dos Institutos Federais que, mesmo possuindo um modelo legal, enfrentarão forças culturais e políticas em sua jornada. Destacam ainda como grande desafio o desenvolvimento com a sustentabilidade na formação de capital social, praticando a inovação. Para os autores, é preciso refundar as disciplinas e buscar na transdisciplinaridade a intersetorialidade, destacando que os desafios da nossa educação é colocar o território como expressão das nossas ações, pensando na educação como libertadora e emancipadora, como defende Paulo Freire.

Pacheco (2020) apresenta como principal problemática dos Institutos Federais a formação de uma nova cultura institucional, pois os institutos se diferem da universidade, destacando os seguintes elementos como desafiadores no âmbito dos IFs:

1.Consolidar um novo conceito institucional, pois os institutos não são nem escolas técnicas, nem universidades, mas uma instituição nova e inovadora que oferta cursos em diferentes níveis e modalidades. 2. A consolidação de sua institucionalidade, seu ineditismo é um processo institucional em construção. 3. Limitações a respeito da compreensão entre educação integral, ensino médio integrado, formação humana integral (omnilateral) e politécnia por parte de seus servidores. 4. Dificuldade no desenvolvimento de ações relacionadas ao desenvolvimento indissociáveis entre ensino, pesquisa e extensão nos diferentes níveis, buscando desenvolver projetos coletivos. 5. Aprofundamento de debates sobre os cursos de licenciaturas e tecnologias buscando unir a teoria e a prática. 6.Integração com a sociedade e as demais redes políticas de ensino. 7.Atuação em rede, a criação de uma rede nacional pública, que esteja articulada e se fortaleça no coletivo. 8. Certificação dos saberes não formais. 9. Democratizar o acesso e cuidar da permanência. 10. Formação permanente de técnicos e docentes não apenas didático-pedagógica, mas sobretudo o significado dos Institutos. (PACHECO 2020, p.19 - 20).

Outro fator de destaque com a nova institucionalidade dos IFs refere-se à verticalização, onde o mesmo docente atuará em diferentes níveis e modalidades, buscando a integração da educação básica à educação profissional e superior, desenvolvendo o tripé: ensino, pesquisa e extensão, como preconiza a Lei n° 11.892/2008:

As funções do professor de EBTT estão definidas na lei de criação dos IFs, no artigo 6º, ao estabelecer que os IFs devem ofertar educação profissional e tecnológica, em todos os seus níveis e modalidades. Com ênfase no desenvolvimento socioeconômico local, regional e nacional; desenvolver a educação profissional e tecnológica; promover a integração e a verticalização da educação básica à educação profissional e educação superior; otimizar a infraestrutura física, os quadros de pessoal e os recursos de gestão (BRASIL, 2008).

Esta característica de atuação, verticalizada em uma instituição híbrida (ARAÚJO e MOURÃO, 2015), tem forte impacto sobre o trabalho docente e sobre a organização pedagógica, sendo parte da reordenação cognitiva da força de trabalho que esfacela a formação do trabalhador.

Araújo; Mourão (2021) nos apresentam alguns elementos precarizantes do trabalho no âmbito dos Institutos Federais, como o fetiche da nova carreira de educação básica técnica e tecnológica nos IFs, a atuação verticalizada, a intensificação do trabalho, a hibridização institucional, os processos de precarização social do trabalhador, as precariedades pedagógicas e a falta de estrutura e pessoal nos Institutos Federais. Tais fatores ocasionam impactos nos processos de organização do trabalho institucional, causando a precarização do trabalho docente, condicionando-o a mecanização e a automação de suas práticas, alienando o ato de ensinar, os obrigando a cumprir exigências mercadológica do sistema capitalista.

Nesse sentido, o governo cria as instituições híbridas, desfocando o debate sobre a reforma do ensino técnico, a formação de professores e as graduações tecnológicas.

Portanto, o que se observa é a precarização do processo de qualificação do trabalhador, pois o modelo de formação dos Institutos Federais está centrado no modelo de competências, que reforça a desqualificação, progressiva e relativa, alterando os parâmetros dos níveis cargos, valor de salários, benefícios, estrutura de incentivos e participação nos resultados (MOURÃO, 2006, p. 97-98).

Com a nova reestruturação da Rede Federal de Educação Profissional no Brasil, a partir da criação dos Institutos Federais, em 2008, adota-se um novo formato de trabalho que, associado à hibridização institucional (oferta de vários níveis de ensino em única instituição), ocasiona a fragmentação e a intensificação do trabalho docente no ensino verticalizado, envolvendo-se na polivalência, na versatilidade e na flexibilidade, exigindo do trabalhador múltiplas competências para a execução de suas atribuições. Tais fatores ocasionam impactos na atuação docente, causando intensificação em sua jornada e, consequentemente, a precarização do seu trabalho.

6 Considerações finais

Com base nas discussões apresentadas e mediante a análise dos estudos dos pesquisadores aqui elencados, conclui-se que o modelo institucional dos Institutos Federais se constitui um formato diferenciado, provocando grandes avanços na política educacional de educação profissional no país, com a criação e a ampliação de novo campus, e a interiorização da educação nos lugares mais longínquos do país, abrangendo todas as regiões do território brasileiro, focalizando os arranjos produtivos locais e regionais, buscando ofertar uma educação pública de qualidade.

Portanto, se evidenciam inúmeras críticas à institucionalidade dos IFs, sendo necessários maiores investimentos por parte do governo para a materialização desta proposta, buscando a melhoria nas condições de infraestrutura, na formação e na qualificação do corpo docente, que atua num contexto fragmentado e precarizado, oferecendo o ensino em diferentes níveis e modalidades e a capacitação dos técnicos e das equipes de gestão institucional, possibilitando também a formação continuada dos professores bacharéis e em início de carreira, onde tais barreiras evidenciadas precisam ser superadas através de alternativas que viabilizem políticas de formação dos profissionais que atuem nas referidas instituições.

Faz-se necessário refletir sobre a importância das políticas de formação dos profissionais que atuam nos Institutos Federais, de forma que se construam e estabeleçam identidades e o sentimento de pertencimento, buscando a superação da subordinação e da reprodução do ideário de uma educação voltada apenas para atender aos interesses imediatos do capital.

Conforme destacam Araújo et al. (2021), constata-se ainda que não há uma renovação significativa na educação profissional, pois a política de formação profissional e tecnológica foi implantada de cima para baixo, por meio de decretos e chamadas públicas, sem o enfrentamento da real necessidade de criar alternativas mais diversificadas de formação profissional em nível médio.

De acordo com as questões desafiadoras e contraditórias vivenciadas nos Institutos Federais, Nogueira et al. (2016) destacam que a materialização da proposta dos IFs, contudo, exige um investimento constante na formação dos quadros docentes, na carreira profissional, nas condições de permanência dos alunos, no incentivo a pesquisa, na tessitura mais acurada entre oferta e as demandas do território, na ampliação da oferta e na articulação mais profunda que garanta um real ensino médio integrado.

Desse modo, entendemos que o processo de configuração e expansão da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica e a criação dos IFs, mesmo com suas limitações e enfrentando críticas, trouxeram consideráveis e viáveis benefícios à sociedade, embora apresentem fatores limitantes para a concessão de suas finalidades, decorrentes do novo arranjo produtivo institucional, das políticas estaduais e de inúmeras fragilidades sobre essas instituições, sendo necessário, assim, maior engajamento, acompanhamento e monitoramento por parte das ações governamentais para consecução de melhores resultados qualitativos, buscando a valorização dessas instituições de educação básica técnica e tecnológica, promovendo ações de desenvolvimento profissional.

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Recebido: 05 de Março de 2022; Aceito: 06 de Setembro de 2022

Editor Chefe: Prof. Dr. José Eustáquio Romão

Editor Científico: Prof. Dr. Mauricio Pedro da Silva

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