OCONTEXTO SOCIOTéCNICO DE AVANçO DAS TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAçãO e comunicação (TDIC) tem contribuído para o apagamento das margens entre o digital e o analógico, assim como entre os cenários físico e on-line (Abranches, 2017; Santaella, 2021). Apesar disso, o recente movimento de desterritorialização, à vista das vivências no período pandêmico, deflagrou a precariedade de infraestrutura e as desigualdades entre classes sociais (Deleuze & Guattari, 1995; Lemos, 2021). A sociedade contemporânea que propõe a inclusão digital é a mesma que tem excluído por diferenças socioeconômicas. Contexto que foi acentuado com a crise da covid-19 devido às diferenças de acesso, conectividade e competências digitais (Comissão Europeia, 2020).
A profusão da internet e das TDIC, organizadas a partir das rupturas dos mercados tradicionais e com a consolidação das redes sociais, autoria de conteúdo, serviços de streaming, big data e small data (Tavares et al., 2021; Fiap, 2021), mostrou-se contraditória e segregadora. Além disso, a rede como lugar democrático e aberto a serviço do capitalismo de dados favoreceu o empobrecimento cognitivo e político (Lemos, 2021).
Esse cenário sociotécnico anacrônico da educação repercute nas condições e saberes de transposições didáticas. O fazer pedagógico em ambientes on-line, mesmo após o período emergencial, revelou-se contraproducente às habilidades e competências digitais em contexto de ensino-aprendizagem digital. Na pandemia, as potencialidades da educação mediada por tecnologias, em muitas realidades escolares, resultaram em aversão para a classe docente (Grupo Internacional de Pesquisa Educação Digital Unisinos [GPe-dU Unisinos], 2022). Das condições de trabalho à formação para o uso das TDIC, evidenciaram-se hiatos nas práticas pedagógicas que ainda persistem após dois anos da pandemia da covid-19 (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura [Unesco], 2022).
Além disso, com a vivência em espaços digitais, reacendemos o diálogo sobre inclusão, equidade, justiça social e educação ampliada em todos os tempos e espaços não duais (Unesco, 2022), o que nos mostra possibilidades de aprendizagem integradas aos ecossistemas educacionais com cuidados éticos, direito à informação, cultura, conectividade e proteção de dados.
À vista disso, pesquisadores ligados à educação híbrida e à teoria da interdependência discutem ecossistemas de aprendizagem capazes de convergir experiências, recursos e ambientes - possíveis desenhos metodológicos apoiados em mudanças de cultura no uso das TDIC por meio de tecnologias interativas e no desenvolvimento da autonomia (Unesco, 2020). Nesse contexto, a sugerida hibridização da aprendizagem on-line com os espaços de socialização presenciais físicos pode contribuir com a educação na era digital (Pérez Gómez, 2015), compondo possíveis ambientes que alteram a lógica e o modelo vigente de sala de aula, ressignificados pela presença social, cognitiva e docente (Brown, 2021).
A aprendizagem em rede potencializada pelas TDIC possibilita a existência de um ecossistema de aprendizagem on-line (EAO), melhorando a aprendizagem on-line, ou, em inglês, e-learning (Bayode, 2020), ambiente que também é apresentado como ecossistema de aprendizagem digital, ou Digital Learning Ecosystem (DLE), em que o ponto de congruência está na composição dos processos interativos e na gestão da aprendizagem (Meepung et al., 2021; Moreira et al., 2022). Além disso, o EAO se estrutura a partir das ecologias interativas entre territórios, dados, recursos, pessoas e culturas (Schlemmer et al., 2020).
Nesse cenário, a revisão sistemática da literatura (RSL) teve por objetivo identificar estudos sobre ecossistemas de aprendizagem on-line, delineando as possíveis definições e estruturas metodológicas. Dessa maneira, surgiu a necessidade de compreender como os ambientes híbridos de ensino e aprendizagem, convergentes às dinâmicas sociais e em rede da cultura digital, podem ser potencializados.
Para isso, fundamentamos a busca no método Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (Prisma) (Page et al., 2021), indicando os estudos elegíveis com descritores e operadores de lógica booleana (Faria, 2016). A partir dessa exploração, incluímos 14 estudos das 206 produções científicas, considerando os critérios de inclusão, exclusão e qualidade. A sistematização se baseou em artigos científicos revisados por pares em língua portuguesa, inglesa e espanhola, publicados entre 2012 e 2022, de acesso aberto, além de teses e dissertações.
Assim, a RSL é apresentada nas seções “Contexto e design da revisão sistemática da literatura” e “Ecossistema de aprendizagem on-line: Construções teórico-metodológicas”, sendo a primeira uma descrição do design da pesquisa, do fluxo de identificação, da seleção e dos critérios de inclusão, exclusão e qualidade, e a segunda, um estudo das possíveis definições e estruturas metodológicas de EAO.
Contexto e design da revisão sistemática da literatura
O processo de busca, seleção e inclusão considerou a possibilidade de identificar na literatura científica a construção teórico-metodológica da categoria ecossistema de aprendizagem on-line. Para esse propósito, definimos três questões de pesquisa (Tabela 1):
Perguntas | Descrição |
---|---|
P1 | O que a literatura compreende sobre EAO? |
P2 | Como se deram as construções teórico-metodológicas de EAO? |
P3 | Há um desenho metodológico para o desenvolvimento do EAO? |
Fonte: Elaboração dos autores com dados da pesquisa.
Com base nas questões, prosseguimos com a estratégia de busca considerando os seguintes critérios (Tabela 2):
Critérios | Descrição |
---|---|
População | Professores e estudantes das redes pública e privada |
Intervenção | Educação básica e ensino superior |
Contexto | Conceitual e procedimental |
Resultado | Discussão sobre o desenvolvimento do EAO |
Fonte: Elaboração dos autores com dados da pesquisa.
A estratégia abrangente se justifica por ser uma categoria recente, desenvolvida como alternativa, no contexto pós-covid-19, à educação para o ensino básico e superior. Essa proposição surge enquanto possível design pedagógico (Behar, 2019) com TDIC, em um contexto não dicotômico entre recursos e subjetividades.
Além disso, convencionamos às questões e à estratégia os elementos estruturantes da RSL em sua etapa prévia, como os operadores de lógica booleana, descritores e bases de dados (Tabela 3).
Operadores de lógica e descritores | (ecossistema de aprendizagem on-line) OR (ecossistema de aprendizagem digital) OR (e-learning ecologies) OR (e-learning ecosystem) OR (digital learning ecosystem) OR (ecossistema de aprendizagem inovador) OR (ecossistema de aprendizagem inovativa) |
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Bases de dados | Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) |
Education Resources Information Center (Eric) | |
Scientific Electronic Library Online (SciELO) |
Fonte: Elaboração dos autores com dados da pesquisa.
Por conseguinte, desenvolvemos o design da pesquisa, o fluxo de identificação, a seleção e a inclusão com base em critérios de inclusão (CI) e exclusão (CE), conforme a Figura 1.
De acordo com a Figura 1, após a etapa de identificação, seguimos com a seleção enquanto protoinclusão a partir dos CI e CE. Nesse percurso, os estudos relativos à análise totalizaram 206, dos quais 192 foram removidos segundo os CE, resultando em 9 artigos, teses e dissertações desenvolvidos externamente à área de educação e 183 que tangenciaram o objetivo da revisão. Por conseguinte, na transição para a etapa de inclusão após leitura dos resumos (abstracts), incluímos 14 estudos elegíveis, congruentes com o escopo da RSL.
Na etapa de análise, utilizamos as qualificadoras “definição conceitual e background teórico” e “proposta metodológica” como critérios de qualidade (CQ), o que resultou em 2 teses da BDTD, 7 artigos da Eric e 5 artigos da SciELO elegíveis.
A seguir, relacionamos o quadro-síntese descrevendo as autorias, os títulos dos estudos e as considerações (Tabela 4).
Autoria | Título do estudo | Considerações |
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AlShamsi et al. (2020) | Instructional and business continuity amid and beyond Covid-19 outbreak: A case study from the higher colleges of technology | A experiência das instituições acadêmicas na pandemia da covid-19 revelou a relevância da transformação digital como pilar para as próximas estratégias de tecnologia educacional. |
Brown (2021) | What are the main trends in online learning? A helicopter view of possible futures | O necessário olhar multifocal sobre o termo ecossistema da educação digital e o cuidado em relação às contradições da aprendizagem on-line. |
Gomez et al. (2013) | A digital ecosystems model of assessment feedback on student learning | Ecossistema de aprendizagem digital baseado na web 2.0, que pode ser utilizado para melhorar o feedback sobre o aprendizado do estudante utilizando recursos multimídia e redes sociais. |
Goudart (2012) | Cartografias da aprendizagem em rede: Rastros das dinâmicas comunicacionais do Visualizar 11, Medialab Prado | A reciprocidade interativa e a interdependência entre os processos de pensamento e construção de conhecimento ajudam a compreender o indivíduo no mundo em que vive e suas relações. |
Heyde e Siebrits (2019) | The ecosystem of e-learning model for higher education | EAO são ambientes associados e mediados por recursos/componentes e relacionamentos. Além disso, o estudante deve ser o foco na adoção de tecnologias e no processo de aprendizado, incluindo o nível social. |
Li et al. (2022) | Disrupting the disruption: A digital learning HeXie ecology model | A ecologia de aprendizagem digital enfatiza a aprendizagem autodirigida e flexível. |
Meepung et al. (2021) | Interactive tool in digital learning ecosystem for adaptive online learning performance | O ecossistema de aprendizagem digital desenvolvido a partir da aprendizagem adaptativa on-line e de recursos interativos pode elevar o desempenho dos estudantes. |
Moreira et al. (2022) | Cenários híbridos de aprendizagem e a configuração de comunidades virtuais no ensino superior | Um ecossistema de educação digital enriquecido com tecnologias audiovisuais em cenários híbridos pode ter efeitos positivos na criação e no desenvolvimento de comunidades virtuais de aprendizagem. |
Santamaría-Buitrago et al. (2019) | Ecosystem for the deployment and management of virtual laboratories based on the standard IMS LTI | O ecossistema para a implantação e gestão de laboratórios virtuais pode melhorar a experiência de acessibilidade de experimentos e formas interativas de observar, ilustrar, demonstrar e investigar. |
Schlemmer et al. (2020) | Educação OnLIFE: A dimensão ecológica das arquiteturas digitais de aprendizagem | Apresenta uma realidade hiperconectada, em que o real e virtual se (con)fundem, instigando instituições, professores e estudantes a repensar o sistema educativo enquanto ecossistema. |
Terres (2021) | Cartografia de projetos de aprendizagem: Uma proposta de abordagem projetual convivial do design estratégico | Está nas relações colaborativas e convivências a ressignificação política, social e cultural, em ruptura com os modelos monolíticos do contexto escolar. |
Vivanco (2015) | Educación y tecnologías de la información y la comunicación: ¿Es posible valorar la diversidad en el marco de la tendencia homogeneizadora? | As TDIC precisam suportar o ecossistema comunicativo como parte da dimensão pedagógica e de inclusão social. |
Yakovleva (2022) | Digital learning environment values of pre-service teachers as a basis for successful professional self-realization: A case study | O DLE mostrou valorização do conteúdo digital, mas os professores não estão preparados para sua criação, desenvolvendo tolerância na comunicação, mas não apresentando habilidades suficientes para demonstrar empatia, e ainda precisam de treinamento para lidar com a gestão da aprendizagem. |
Zhao et al. (2021) | Do our children learn enough in Sky Class? A case study: Online learning in Chinese primary schools in the Covid era March to May 2020 | Em ecologias de e-learning, o aprendizado não é alcançado quando há menos coordenação dos professores, ausência de interação, feedback atrasado e tempos de aprendizado e comunicação curtos. |
Fonte: Elaboração dos autores com dados da pesquisa.
Dos estudos em questão, 85,71% são artigos científicos e apenas 14,28% são teses de doutorado. Dessa totalidade, as vivências estão centradas no ensino superior, sendo a maioria representada pela literatura estrangeira, compondo cerca de 78,57% dos achados sobre EAO.
Por fim, foram criados os codificadores sobre EAO, relacionados para aproximar os textos das categorias conceituais em comum. Concomitantemente estabelecemos uma rede categorial para representar as conexões entre os códigos e o objeto da RSL (Figura 2).
Nessa rede (Figura 2), o EAO está relacionado à proposta de sociedade reticular e com as redes de informação e comunicação em sua evolução, como OnLIFE (Abranches, 2017; Santaella, 2021; Schlemmer et al., 2020). Os cenários híbridos de aprendizagem, as TDIC e os impactos da globalização se referem às influências sociais, culturais e ideológicas. Além disso, o ponto de inflexão está no letramento digital na educação.
Foi possível mapear questões significativas em relação à necessidade de transformação digital como pilar para o desenvolvimento da perspectiva metodológica. A sociedade em rede, desde a web 2.0, informa, comunica e produz por meio de recursos hipermidiáticos, característica que implica processos de pensamento, atenção e construção de conhecimento. Esse contexto remete a contradições entre os métodos tecnicistas com foco na atuação de quem expõe e reproduz, em vez de reconhecer os atores e autores em perspectiva autônoma de aprendizagem autodirigida.
A partir desse contexto, extraímos as contribuições teórico-metodológicas sobre EAO, com base nas relações conceituais e na possibilidade metodológica em rede.
Ecossistema de aprendizagem on-line: Construções teórico-metodológicas
As perspectivas teórico-metodológicas sobre EAO são recentes e estão em processo de consolidação, seja para contextos híbridos, on-line ou a distância (Moreira et al., 2022). Ainda assim, segundo Moreira et al. (2022), podemos compreendê-las metaforicamente a partir de dois tipos de fatores: bióticos e abióticos. No primeiro, as relações e integrações são concebidas na constituição orgânica e subjetiva entre professores, tutores, estudantes e o conteúdo enquanto comunidades de aprendizagem em rede. Já no que se refere aos fatores abióticos, os autores estabelecem analogias com elementos objetivos, tais como as TDIC, acesso e conexão com a rede, dinâmicas e interfaces de hardwares e softwares.
Com esse encadeamento, as interações e interatividades se efetivam com o apagamento das margens entre o analógico e o digital e entre o on-line e o presencial, combinando presenças, tempos, tecnologias e ambientes de aprendizagem. Tal contexto é representado pelas partilhas, cooperação, colaboração e interações entre humanos e não humanos (Schlemmer et al., 2020), cenário que exigirá pedagogias relacionais, metodologias, práticas e estratégias inventivas que valorizem as presenças cognitiva, social e docente no processo de ensino e aprendizagem (Brown, 2021).
Na constituição de EAO em relação à perspectiva das presenças, segundo Brown (2021), é preciso compreender que a existência de TDIC não acentua a interatividade e a interação, mas o entrelaçamento entre recursos, cognição, afetividades e a presença docente nos processos educativos. A postura do professor é fundamental enquanto prática planejada e intencional para o desenvolvimento e aprendizagem da comunidade escolar (Bock, 2018). Ou seja, faz-se necessária a integração pragmática do planejamento com a prática pedagógica, desde a concepção até a facilitação do conteúdo, em um percurso formativo centrado na aprendizagem dos estudantes. Assim, independente da técnica, a justaposição de práticas ativas, as aproximações do conteúdo ao âmbito real do estudante e a dialogicidade entre os sujeitos podem diminuir as distâncias teórico-metodológicas em razão da categoria “presença no EAO”.
Além disso, com a dinâmica e evolução da internet social (Gomez et al., 2013), assumir caminhos opostos às pedagogias tradicionais pode significar superação do individualismo, da centralidade em determinado indivíduo para um olhar coletivo, social. Nesse aspecto, de acordo com Goudart (2012), mais que acoplamento de humanos e não humanos, a ecologia da partilha, colaboração e participação fundamentam os ecossistemas educacionais. Tais ecologias interativas, para Heyde e Siebrits (2019) e Schlemmer et al. (2020), não estão reduzidas a ambientes virtuais de aprendizagem (AVA), mas à atenção e ao desenvolvimento da autonomia e promoção das relações sociais e trocas entre os sujeitos, recursos, interfaces, natureza e subjetividades. Um cenário reticular que, em primeira instância, foca nas condições e construção de desenhos abertos à criação/invenção (Schlemmer & Moreira, 2020).
Ambientes de ensino e aprendizagem enriquecidos por TDIC, colaborativos e centrados no amadurecimento cognitivo e social dos estudantes (Zhao et al., 2021). Para AlShamsi et al. (2020) e Meepung et al. (2021), isso envolve elementos indissociáveis: processo interativo, recursos interativos, gestão e composição da aprendizagem. O primeiro elemento está relacionado à acessibilidade e afetividade na constituição das relações entre os sujeitos. O segundo elemento implica recursos que devem proporcionar interatividade, como quizzes, trilhas gamificadas, produção de vídeos e áudios, entre outros recursos, sobretudo nos espaços assíncronos. No contexto da gestão e composição da aprendizagem, as ações do professor se traduzem no desenvolvimento de atividades integradas e individualizadas e na responsabilidade dos estudantes no desenvolvimento da autonomia.
Em um EAO em que o conhecimento é consequência da coletividade em colaboração, segundo Santamaría-Buitrago et al. (2019), o entendimento dos elementos integrando atores, redes e produção de conhecimento é fundamental para a formação de professores, uma vez que a sala de aula é território de pesquisa, experimentação, diálogos, colaborações e percursos individualizados.
A possibilidade de termos um framework, conforme Yakovleva (2022), não dirime a autonomia do professor na elaboração dos processos educativos. Pensar nas etapas constitutivas, de maneira prévia, gera segurança à docência e valoriza a relação ensino-aprendizagem com os estudantes, reconhecendo suas individualidades.
As TDIC, nesse contexto, segundo Vivanco (2015), são recursos mediadores de saberes coconstruídos, relacionados às formas de estar no mundo, das novas relações e subjetividades. As hipermídias se tornam pertinentes na tradução das intenções que antecedem a escolha do recurso, servindo a inteligência colaborativa, criação ativa de conhecimento, ubiquidade e metacognição (Cope & Kalantzis, 2017).
Nesse contexto, como afirma Terres (2021), o EAO se desprende da concepção monolítica de escola para estimular o potencial criativo e a capacidade colaborativa dos estudantes em ambientes híbridos. Entretanto, como destacam Li et al. (2022), para que isso aconteça, é preciso garantir acesso e conectividade, ambientes equipados e investimento em formação continuada de professores para a integração dos elementos e fatores do EAO. Mais que compreender essa totalidade, é necessário ser capaz digitalmente e alimentar uma cultura de estudos autônoma.
Possibilidade metodológica de EAO em rede
A RSL mostrou que a possibilidade de um desenho metodológico está associado aos valores do DLE enquanto conteúdo interdisciplinar, individualização da aprendizagem, relações positivas com empatia, motivação, confiança e segurança e a valorização das identidades sociais (Yakovleva, 2022) - categorias que, embora sejam reconhecidas no cotidiano escolar, desafiam a lógica de organização e prática pedagógica em sala de aula no contexto dos ecossistemas de aprendizagem.
A metáfora EAO, de acordo com Brown (2021), Meepung et al. (2021), Moreira et al. (2022) e Cope e Kalantzis (2017), pode ser compreendida como interação entre espaços, dinâmicas sociais, cognição e diálogos colaborativos. Nesse cenário, não existem fronteiras, mas redes e fluxos contínuos de informação e conhecimento produzidos e compartilhados socialmente. Na educação, segundo Brown (2021) e Gomez et al. (2013), essa complexidade se estabelece com presenças.
Em síntese, a ecologia de saberes, presenças e partilhas combinadas com o digital a favor das subjetividades e criatividades pode impulsionar a transformação digital dos ambientes e processos educativos em um EAO.
Importa frisar que a literatura elegível está em processo de consolidação a partir de pesquisas empíricas, restringindo-se as conjecturas de e-learning e projeções para contextos híbridos, objeto de pesquisas da educação digital e das coexistências e imbricamentos entre humanos e não humanos na educação (Moreira & Schlemmer, 2020).
Considerações finais
A tentativa de estabelecimento de um paradigma de aprendizagem on-line após a crise da covid-19 é uma possível releitura da perspectiva de aprendizagem em rede e colaborativa, emergente à época da web 2.0. As características do EAO se confundem com processos educativos consolidados na educação a distância, como as categorias interação e interatividade.
Também é possível reconhecer uma construção que não está reduzida aos recursos. O olhar multifocal para as diferenças e individualidades, assim como o cuidado com as contradições da aprendizagem em perspectiva on-line e digital, demonstra a constituição de ecossistemas centrados no princípio de educação enquanto bem comum e direito inalienável da sociedade.
Seja presencial, a distância, on-line, digital ou OnLIFE, a razão por avançar perspectivas instrucionais e abordagens liberais tradicionais se assenta em percursos flexíveis e abertos com responsabilidade e competências digitais. Nesse sentido, conforme relatórios internacionais, como o Plano de Ação para a Educação Digital 2021-2027 (Comissão Europeia, 2020) e Reimaginar nossos futuros juntos (Unesco, 2022), faz-se necessário garantir conectividade, equipamentos adequados, investimentos em formação e coordenação das práticas pedagógicas, adaptando-as às demandas deste tempo histórico. Portanto, formas de dirimir as fraturas digitais acentuadas após vivenciarmos a virtualização da sala de aula sem o cuidado de reconceitualizar os processos de ensino-aprendizagem e as discrepâncias no acesso aos recursos e conectividade.
As contribuições da literatura se voltam às subjetividades na constituição de experiências de aprendizagem combinadas com processos e recursos interativos. A convergência de hipermídias, ambientes e humanos transpõe o EAO de e-learning para contextos híbridos descentralizados, colaborativos e sensíveis à coletividade, o que implica abordagens didático-pedagógicas relacionais voltadas à reciprocidade interativa e à compreensão dos indivíduos e suas relações com o mundo.
Nesse cenário, o foco na aprendizagem e o desenvolvimento da autonomia enquanto perspectiva autodirigida são essenciais à realidade hiperconectada. Contudo, o enriquecimento dos espaços digitais com tecnologias interativas, curadoria e acesso a conteúdos digitais pode gerar versões aprimoradas das aulas em PowerPoint, na proporção em que a educação persista em modelos instrucionais e práticas convencionais massivas.
Em contexto de realidade hiperconectada, estimular o potencial criativo e a capacidade colaborativa dos sujeitos em rede significa envolvimento e flexibilização dos percursos formativos, constituídos de maneira coletiva e individualizada. Entretanto, essa ecologia, ancorada na perspectiva híbrida e na teoria da interdependência, esbarra na capacidade de uso das TDIC em contexto escolar e no reconhecimento de diferentes papeis e responsabilidades em perspectiva on-line, híbrida ou a distância.
Dessa maneira, respondendo às três questões de pesquisa, desenvolver um EAO impacta as relações estabelecidas entre professor-estudante, organização de sala de aula e a compreensão dos processos educativos mediados por TDIC, repercutindo na dinâmica, currículo, gestão e avaliação em contexto educacional.
Por conseguinte, há limitações neste estudo propositivo, como o número reduzido de estudos e experiências com EAO e o fato de os estudos existentes serem conjecturas teóricas. Nesse sentido, será preciso reunir contribuições em torno de possíveis desenhos metodológicos a fim de depreender desafios, potencialidades e limitações nas narrativas de estudantes e professores.