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Educação e Pesquisa

versão impressa ISSN 1517-9702versão On-line ISSN 1678-4634

Educ. Pesqui. vol.50  São Paulo  2024  Epub 22-Maio-2024

https://doi.org/10.1590/s1678-4634202450262098 

ARTIGOS

Professores e seus estudos: biblioteca, livros e leituras na Escola Normal de São Paulo (século XIX)

Teachers and their studies: library, books, and readings at the São Paulo Normal School (19th century)

Carolina Mostaro Neves da Silva2 

Carolina Mostaro Neves da Silva é mestra e doutora em educação, na área de história de educação. Docente da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.


http://orcid.org/0000-0003-0853-6726

2-Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.


Resumo

Este artigo investiga a relação entre livros, leitura e formação docente na Escola Normal de São Paulo, no final do século XIX. Analisa a constituição de um acervo que deveria compor o repertório de estudantes e professores, e a institucionalização de um espaço para sua guarda e consulta. Para tanto, examina-se um conjunto diverso de fontes, que inclui relatórios, regulamentos, regimentos, legislação, publicações de jornais, catálogos de livros etc. Adota-se a perspectiva transnacional, enfatizando as relações entre São Paulo e França, que marcaram a constituição do acervo em suas primeiras décadas. Dialoga-se com referenciais da história cultural dos saberes pedagógicos e da história do livro e da leitura. Observa-se, desde 1870, o intuito de criar uma biblioteca composta preferencialmente por títulos referentes às matérias do curso normal. A composição de seu acervo acompanhou a diversificação e a ampliação das cadeiras, nos anos de 1880 e 1890, evidenciando a ascensão do caráter científico no campo da pedagogia e a circulação de materiais e ideias pedagógicas. No contexto em que as reformas da instrução pública na França eram admiradas por políticos e educadores brasileiros, a posse de materiais e livros franceses, ou adotados naquele país, era tida como fundamental para a apropriação de experiências e métodos modernos. Entretanto, havia obstáculos à leitura, tais como o horário de funcionamento, a iluminação e o escasso domínio do idioma, sendo constante a afirmação de que a frequência à biblioteca era pequena e que poucas obras eram lidas.

Palavras-chave Formação de professores; Livros; Leitura; Biblioteca

Abstract

This article investigates the relationship between books, reading, and teacher education at the São Paulo Normal School in the late 19th century. It analyses the constitution of an archive that should comprise the repertoire of students and teachers, as well as the institutionalization of a space for its keeping and consultation. To that end, it examines a variety of sources including reports, regulations, bylaws, legislation, newspaper articles, and book catalogues. A transnational perspective guides the analysis, emphasizing the relations between São Paulo and France that presided over the constitution of the archive in its first decades of existence. The article also establishes a dialogue with references from the cultural history of pedagogic knowledges and from the history of the book and reading. Since 1870 one can observe the intention of establishing a library composed mainly by titles associated with the different subjects of the Normal School curriculum. The contents of such archive followed the diversification and expansion of the academic chairs in the 1880s and 1890s, revealing the ascent of the scientific character of the field of pedagogy, and the circulation of pedagogical materials and ideas. In a context in which the French public education reforms were revered by Brazilian politicians and educators alike, the inclusion of books and materials, French or otherwise adopted in that country, was seen as fundamental to the appropriation of modern methods and experiences. However, there were obstacles to their use, such as the working hours, lack of adequate lighting, and the scarce command of the language, giving rise to recurrent statements about the low attendance to the library and the small number of works read.

Keywords  Teacher education; Books; Reading; Library

Introdução

A associação entre docência e estudo não causa estranhamento neste começo de século XXI. Em alguma medida, assim como o fizemos com a relação entre leitura e conhecimento, naturalizamos uma antiga imagem do professor erudito, carregado de livros e com apreço pela leitura. No imaginário social contemporâneo, a professora ou o professor ensina o que sabe, principalmente, o que sabe bem, e estuda para isso. É evidente, no entanto, que essa imagem comporta ressalvas, nuances e dúvidas em relação às qualidades ou às competências de uma boa ou de um bom docente – não raro, por exemplo, profissionais de outros campos se veem aptos a dizer aos professores como devem ou podem fazer seus trabalhos. Valoriza-se a educação, valoriza-se o trabalho docente, mas pairam dúvidas sobre a competência desse profissional e, principalmente, sobre sua formação.

O que uma pessoa que pretende ser uma boa ou um bom docente deveria estudar? O quanto, ou como, os livros e a leitura poderiam contribuir para a formação docente? Como se daria a relação entre a teoria e os exercícios práticos na formação inicial? Essas questões, que podem ser vistas como tipicamente contemporâneas, atravessam a história da escola e da formação docente e nos permitem pensar como, em distintos contextos, conformamos culturas pedagógicas, mais ou menos enlaçadas a livros e competências leitoras, que são localmente específicas, sem estarem, porém, sincrônica ou diacronicamente desconectadas de outras culturas. Neste artigo, questões como essas emergem, do ponto de vista historiográfico, do estudo sobre a institucionalização de uma biblioteca na Escola Normal de São Paulo, no século XIX. Trata-se dos primórdios da formação escolar para a docência na província paulista, que se relacionava a um movimento inicial de difusão da escola primária e de constituição da pedagogia como campo específico de conhecimento (Tanuri, 2000 ; Boto, 2014 ).

Buscando analisar a institucionalização de um espaço destinado à guarda, organização e consulta dos livros que deveriam compor o repertório de estudantes e professores da Escola Normal, além de um espaço para práticas de leitura e formação docente, examino um conjunto diverso de fontes, que inclui relatórios dos diretores da Escola Normal, regulamentos e regimentos internos, legislação, publicações de jornais contemporâneos, catálogos de livros etc. Inspirada em Certeau ( 1982 ), intento construir uma narrativa que destaca os detalhes, e na qual cada documento, isolado de seu contexto original, passa a constituir peça fundamental da operação historiográfica 3 . Como referencial teórico-metodológico, o artigo adota a perspectiva transnacional (Vera, 2013 ; Fontaine; Matasci, 2015 ), enfatizando as relações entre São Paulo e França, que marcaram a constituição do acervo em suas primeiras décadas. Dialoga, também, com referenciais da história cultural dos saberes pedagógicos e da história do livro e da leitura (Choppin, 2009 ; Bittencourt, 2008 ; Silva, V., 2018 ). Assim, observo, em diacronia, o movimento de composição do acervo e suas relações com as cadeiras que compunham o currículo escolar, dando ênfase à pedagogia.

Os livros e o alvorecer da formação de professores

A antiga relação entre estudo e livros e, mais precisamente, entre instituições de ensino e bibliotecas, alterou-se no decorrer do processo de estatização da escola e de configuração de um ensino primário público que se pretendia difundir amplamente. A disposição de um acervo bibliográfico para o sustento dos estudos, comum a grandes colégios religiosos como os da Companhia de Jesus, não mais se observava nas escolas régias ou avulsas, por meio das quais o Império Português se lançou, no século XVIII, a erigir o ensino estatal (Boto, 2017a ). Nessas escolas, muito frequentemente, ficava a cargo do professor arcar com os custos relativos ao espaço e aos materiais necessários às suas aulas (Cardoso, 2002 ). Por isso, não surpreende que em muitas delas os recursos materiais fossem escassos, indicando o descontínuo e heterogêneo caminho pelo qual a biblioteca se associaria ao espaço escolar nos domínios portugueses.

Para que se compreenda a incorporação de acervos bibliográficos em escolas, – neste caso, em uma instituição para formação de professores, cuja origem está ligada à demanda de profissionais para o ensino de primeiras letras – é preciso examinar o processo de constituição da própria escola como matéria de tratamento público, em suas dimensões práticas, que se referem aos recursos concretos e materiais que precisam ser mobilizados para o seu funcionamento; e teórico-simbólicas, que dizem respeito às concepções que irão sustentar, pedagógica e socialmente, essa instituição. Deve-se observar que internamente à instituição escolar constituíam-se ritmos e rotinas, em uma espécie de liturgia de signos e rituais, que perpassam a interação entre estudantes e professores, a organização do espaço, dos horários, do currículo, dos materiais etc., ou seja, de uma cultura escolar, na qual o livro recebe um lugar de destaque, como suporte e símbolo do ensino (Boto, 2014 ; Faria Filho, 1999 ).

Nos processos de institucionalização da escola estatal e de formação de professores multiplicaram-se discursos sobre os modos mais adequados, eficazes ou de menor custo para atender a um maior número de crianças, assim como acerca dos conteúdos e materiais a serem adotados nas escolas – ainda que questões relativas à organização do tempo e das matérias, à uniformização do contexto de aprendizagem e mesmo ao preparo específico para a docência já estivessem postas no século anterior, como indica, por exemplo, a iniciativa de Jean Baptiste La Salle de substituir o ensino individual pelo simultâneo (Boto, 2017b ; Gallego, 2011 ). Esses discursos encontraram suporte nos impressos, periódicos e livros que, segundo Circe Bittencourt ( 2008 ), desde o final do século XVIII já se configuravam nas sociedades ocidentais “como principal instrumento para a formação do professor, garantindo, ao mesmo tempo, a veiculação de conteúdo e método de acordo com as prescrições do poder estabelecido” (Bittencourt, 2008 , p. 28). Durante o século XIX, a publicação de textos pedagógicos, em meio ao movimento de constituição dos sistemas educativos estatais, conduziu à autonomização das edições especificamente produzidas para o uso escolar (Choppin, 2009 ). O impresso escolar, sob diversas denominações, passou a integrar um crescente mercado editorial de dimensões internacionais, possibilitando o compartilhamento de conhecimentos pedagógicos e experiências educativas em diversos espaços territoriais. Desse modo, a organização e o acesso a acervos bibliográficos que sustentassem iniciativas de escolarização para estudantes e professores passou a ser um aspecto essencial do processo de difusão da escola elementar.

No princípio dos Oitocentos, essa questão se evidencia nas prescrições para a adoção do ensino mútuo ou lancasteriano em vários países e regiões, poucos anos após o seu aparecimento na Inglaterra (Vera, 2013 ). Sinalizando a circulação de modos de ensinar e organizar a escola no contexto ocidental, promotores do ensino mútuo elaboraram guias, tratados, manuais e artigos. Nota-se um movimento de produção de materiais para o uso das escolas de ensino mútuo, além de publicações, como o Journal d’Éducation , da Sociedade pela Instrução Elementar de Paris, destinados a instruir sobre o método (Bastos; Faria Filho, 1999 ). Eugenia Róldan Vera ( 2013 ), identifica intercâmbios bilaterais entre sociedades lancasterianas europeias e americanas, em que “las segundas solicitaban libros, cartillas, tablas y otros materiales didácticos para las escuelas”; e as primeiras enviavam “certificados de membresía, copias de sus reglamentos internos y prescripciones para formar sociedades lancasterianas a su semejanza” (Vera, 2013 , p. 193). Consolidava-se a relação entre a difusão da escola elementar, a preparação de professores e a produção de impressos especificamente destinados a atender a demanda escolar, o que reconhecidamente guardava particularidades regionais (Bittencourt, 2008 ).

No Brasil, as primeiras iniciativas de instrução específica para o magistério são atravessadas por indicações para o ensino pelo sistema lancasteriano, que repercutem antes mesmo da constituição do Estado independente, mas que culminam em sua prescrição, pela Lei Geral da Educação , em 1827, como método de ensino a ser adotado nas escolas de primeiras letras no Império (Bastos; Faria Filho, 1999 ; Tanuri, 2000 ). Como aponta a literatura, porém, o ensino mútuo não experimentou um êxito generalizado, uma vez que a complexidade da realidade escolar das províncias brasileiras, ao longo do século XIX, comportou uma série de arranjos entre o ensino individual e o simultâneo (Gallego, 2011 ; Inácio et al ., 2006 ). Ainda assim, o interesse por um modo que substituísse o ensino individual, possibilitando o atendimento de um maior número de crianças em pouco tempo e sob rigorosa disciplina, produziu entusiasmo suficiente para colocar em questão as condições materiais e intelectuais para a atuação de mestres e mestras conforme um programa específico de atividades de que dependia o seu sucesso.

Em São Paulo, preocupações com a formação do magistério primário levaram à criação, na década de 1840, de uma Escola Normal, que conferia habilitação vitalícia ao cargo de professor primário. Apresentava-se para os candidatos ao magistério uma alternativa aos exames avulsos, que muitas vezes transcorriam de forma obscura, sob o manto do protecionismo político e das relações sociais de parentesco ou compadrio (Monarcha, 1999 ). Estabelecia-se um curso com duração de dois anos, em que se ensinaria lógica, gramática geral e língua nacional, teoria e prática de aritmética, noções gerais de geometria prática e suas aplicações usuais, caligrafia, princípios e doutrina da religião do Estado e “os diversos métodos e processo de ensino, sua aplicação e vantagens comparativas” (SÃO PAULO, 1846 , s/p.). A nomeação do professor, assim como o provimento de “todos os instrumentos, livros, modelos, e mais objetos que forem precisos para os exercícios”, ficaria a cargo do governo (SÃO PAULO, 1846 , s/p.).

A escola funcionou por duas décadas, tendo como único professor Manoel José Chaves, bacharel em Direito, que havia ocupado vários cargos públicos antes de ser nomeado para a Escola Normal (Dias, 2013 ). A instituição contou com parcos recursos materiais. Em 1861, Chaves ( 1861 ) apontou que as necessidades da escola eram “por sem dúvida bastantes”, não possuindo “livros importantes, que não podem ter os alunos, nem os instrumentos e modelos precisos para os convenientes trabalhos, até os móveis da aula são poucos e estão em muito mau estado” (Chaves, 1861 , p. 1).

Para o ensino de “todos os métodos para a direção da instrução e educação da mocidade”, o professor afirmou usar “os tratados metodológicos mais célebres”, principalmente o método de Descartes, que considerava a “obra recomendável para explicar esta matéria em geral”, para depois tratar “dos métodos especiais de ensino, do singular, mútuo e simultâneo” (Chaves, 1852 , p. 5). Chaves tinha acesso a livros e mencionou, em seus relatórios, títulos que usava para aulas. Possivelmente, possuía seu próprio acervo bibliográfico – o que não era incomum entre os bacharéis – ou buscava livros na biblioteca da Academia de Direito, onde havia se formado. Na Escola Normal, segundo ele, faltavam os “livros indispensáveis para o ensino, como são os dicionários, clássicos da língua e outros, que os alunos não podem possuir, e que bem seria haverem na aula para consulta” (Chaves, 1859 , p. 248). Mais de uma década após a inauguração da instituição, o professor indicava que os livros não faziam parte da rotina escolar dos estudantes, não obstante o fato de ele mesmo se servir de compêndios “para explicação das matérias ensinadas em aula”. As evidências da época contam mais sobre a falta dos livros do que sobre sua presença ou utilização cotidiana na Escola Normal de São Paulo. Embora a importância de uma instituição destinada à formação do magistério fosse reconhecida, inclusive entre as autoridades públicas, a escola foi suprimida em 1867, após vários anos de críticas quanto à organização e ao ensino ministrado.

Os livros estão chegando

Passados sete anos, juntamente com a aprovação da obrigatoriedade do ensino primário, foi aprovada a criação de uma nova Escola Normal na capital da província. Estabeleceu-se um curso de dois anos, com as matérias distribuídas em duas cadeiras, cada uma sob a responsabilidade de um docente. Inicialmente, os ingressantes seriam maiores de 16 anos, do sexo masculino, e deveriam saber ler, escrever e contar 4 . Observa-se, em comparação com a primeira experiência de Ensino Normal na cidade de São Paulo, a ampliação das matérias curriculares, com a prescrição dos ensinos de História, Geografia, Cosmografia e Francês, além de “Metódica e Pedagogia, com exercícios práticos nas escolas da Capital” (REGULAMENTO, 1874 ). Já era corrente a ideia de que a formação de professores não deveria prescindir do exercício prático – questão que aparecia entre as críticas à experiência anterior.

O Regulamento da escola, publicado em 1874, selava a conexão entre o ensino para a formação de professores e a organização de um repertório de leitura, que constituiria uma biblioteca “destinada especialmente ao uso de professores e alunos, formada de livros dos melhores e mais recentes escritores das diversas matérias do ensino ”. O acervo, segundo o documento, seria enriquecido anualmente, “a fim de ficar a par do progresso da instrução na parte dos estudos normais primários”. Os professores deveriam indicar a compra de obras recentes sobre as matérias a seu cargo, “das quais deva a biblioteca da Escola fazer pronta aquisição” (REGULAMENTO, 1874 ). Previa-se, ainda, uma classificação dos títulos “por ordem de matérias e cadeiras, inventariados em livro próprio”, com designação de autor, edição, lugar, volumes e formato. Nota-se que os princípios civilizatórios projetados na instituição escolar e compartilhados pelas bibliotecas, que dão centralidade à cultura letrada e erudita, ajustavam-se ao propósito de proporcionar leituras adequadas e específicas para a formação docente. Não se tratava, portanto, de propor a criação de uma biblioteca ampla e universal, voltada à erudição, com títulos das mais diversas épocas e temáticas, mas que reunisse obras sobre as matérias do ensino normal, privilegiando, sobretudo, a formação para o magistério.

Além do acervo bibliográfico, o documento determinava a organização de um espaço com mesas e assentos que funcionasse por três horas diárias, sob a responsabilidade do porteiro, e de onde nenhum livro pudesse sair sem autorização do encarregado da direção da escola, ou seja, o próprio Inspetor Geral da Instrução Pública (REGULAMENTO, 1874 ). Delineava-se a ideia de que uma instituição de ensino que se prezasse, como deveria ser aquela destinada a formar o magistério primário, não poderia prescindir de acervo bibliográfico e de um espaço destinado à sua consulta (Silva, C., 2022 ). Nesse contexto, os impressos e suas instituições se espalhavam pela província de São Paulo, sobretudo na capital, e gabinetes literários e bibliotecas contribuíam para que se superassem obstáculos decorrentes da dificuldade de acesso aos livros por meio da compra (Deaecto, 2011 ). Na solenidade de instalação da Escola Normal, o presidente de São Paulo, João Teodoro Xavier de Matos, lembrou das “cidades de Lorena, Areias, Cunha, Itu, e muitas outras”, onde “surgem associações, ricas de vida, levantando e mantendo escolas noturnas e bibliotecas populares, para uso gratuito do povo” (DIÁRIO DE S. PAULO, 18 fev. 1875a , p. 3).

A questão do acesso aos livros tornava-se premente na Escola Normal, onde se formariam os responsáveis pelo ensino escolar da leitura e da escrita. Conforme projetava o regulamento da instituição, o curso se franqueava a pessoas de poucas posses, razão pela qual estabelecia a isenção de pagamento da taxa escolar anual aos reconhecidamente pobres. Nessa época, já se reconhecia a “exiguidade dos ordenados” do magistério primário, como mencionou o próprio Xavier de Matos, considerando esse aspecto uma das causas do atraso na “difusão das luzes na província” (CORREIO PAULISTANO, 16 maio 1875 ). Cabe lembrar a observação do professor Manoel Chaves ( 1861 ), quatorze anos antes, acerca da impossibilidade de seus alunos adquirirem livros indispensáveis aos estudos na Escola Normal. Assim, estabelecendo o funcionamento de uma biblioteca para atender à finalidade de formar o professorado primário paulista, na ocasião de refundação da Escola Normal, essa ordem de dificuldade poderia ser superada. O Regulamento determinava, ainda, que fosse concedido como “prêmio” a alunos que se distinguissem por sua “reconhecida inteligência” um livro “elegantemente encadernado”, cujo conteúdo se referisse a uma das matérias do curso (REGULAMENTO, 1874 ).

Em fevereiro de 1875, a Escola Normal começou suas atividades provisoriamente instalada em uma sala da Faculdade de Direito – esperava-se, então, que lhe fosse construído um prédio próprio. Os primeiros livros chegaram no início do ano letivo, tendo sido adquiridos por Paulo do Valle, professor interino da primeira cadeira 5 . Valle listou 27 títulos, que atendiam às matérias abarcadas pela cadeira sob sua responsabilidade 6 . A maior parte correspondia ao ensino da Língua Nacional e Francesa, sendo gramáticas, dicionários e seletas. Na lista havia, ainda, um título de aritmética, de Louis Pierre Marie Bourdon, e seis títulos destinados ao ensino de Metódica e Pedagogia: um de Jean-Baptiste Daligault (1811-1894), indicado na lista como compêndio , outro de Michel-Charbonneau (1817-1870), um de José Maria Graça Affreixo (1842-1919), além de três títulos de Louis-Aimé Martin (1786-1847) 7 . Além desses, foram adquiridos na Casa Garraux, no mesmo ano, um livro de Charles Lenormant, possivelmente Essais sur la instruction publique , publicado em 1873, e uma obra indicada com o título Pedagogia, cuja autoria mencionada é de “Cordeiro” 8 . A presença desses livros, que ensinam a ensinar, “produzindo uma espécie de gramática do magistério e articulando os elementos para se conceber e agir nesse ofício” indica os caminhos pelos quais se configurava a cultura pedagógica da Escola Normal (Silva, V., 2018 , p. 67).

Destaca-se a apropriação do livro de Daligault, Curso prático de pedagogia , como referência principal nas aulas de Pedagogia da Escola Normal, entre 1875 e 1877, conforme indicam as provas de final de ano dos estudantes normalistas (Trevisan, 2011 ; Perez, 2012 ; Perez; Silva, 2014 ). O manual francês, originalmente publicado em 1851, havia recebido duas traduções para o português, em 1865 e 1874, e teve ampla circulação no Brasil (Bastos, 2011 ; Trevisan, 2011 ; Araujo, 1874 ). As transcrições, paráfrases e menções à obra de Daligault, identificadas em exames de normalistas, revelariam o quanto suas palavras “eram valorizadas para legitimar o exercício do magistério” (Perez; Silva, 2014 , p. 101). Schelbaeur ( 2003 ) observa que as provas trazem conteúdos e definições semelhantes, levantando a hipótese de que o contato dos estudantes com o conteúdo das obras pode não ter sido direto, mas mediado pelas apropriações que dele haviam feito os professores da disciplina.

Em fevereiro de 1875, Paulo do Valle recebeu do Tesouro Provincial a quantia de 428$000 para a aquisição de livros para a Escola Normal (DIÁRIO DE S. PAULO, 27 fev. 1874 , p. 1; Valle, 1875 , p. 2). Uma nota da Casa Garraux, de junho do mesmo ano, indica a aquisição de nove títulos, em 39 volumes, pelo valor de 125$600. Essa nota foi encaminhada por um ofício, em que o professor dizia se “desobrigar” com o tesouro em relação ao dinheiro que recebera em fevereiro, indicando que cerca de 312$000 já haviam sido despendidos em livros para a Escola. Em 1875, um exemplar da Gramática , de Julio Aulete, custava cerca de 1$000; em 1876, o livro Elementos de pedagogia , de Graça Affreixo, era anunciado por 2$500, pela livraria Garraux. Assim, ainda que não se possa precisar o número exato de obras e volumes adquiridos, ou mesmo quantas compras ocorreram, os ofícios e recibos indicam que, no mesmo ano em que a escola teve 33 alunos matriculados, Paulo do Valle adquiriu dezenas de livros. Além disso, havia a possibilidade de a Escola Normal receber doações, como ocorreu com os 40 exemplares da Gramática de língua francesa (1860), de Abílio César Borges, doados pelos membros da Sociedade Literária Nova Arcádia, em 1875 (DIÁRIO DE S. PAULO, 11 abr. 1875b , p. 2).

Se os indícios confirmam a composição de um acervo bibliográfico, possivelmente contendo obras para o uso cotidiano dos alunos, não é possível afirmar o mesmo quanto à organização de um espaço de leitura e consulta que remeta à imagem atual de uma biblioteca. Em 1877, um novo regulamento reiterava a promessa de uma biblioteca-espaço, com a prescrição de que o acervo, além das obras “dos melhores escritores sobre as diversas matérias do ensino normal”, seria constituído “dos livros de ciência, história, viagens, literatura, artes e ofícios, que puderem ser adquiridos com consignações que forem concedidas pelo poder legislativo ou por donativos particulares”. Esse espaço estaria aberto “não só aos alunos e alunas da escola normal, como a qualquer outra pessoa que deseje visitá-la ou consultar obras” (REGULAMENTO, 1887 ). Aparecia, no documento, a função de “bibliotecário”, acumulada pelo porteiro.

O desejo de criar um espaço para a guarda e consulta de livros foi reafirmado, mas havia obstáculos para sua efetivação, sobretudo, de ordem prática e financeira: a Escola Normal contava com exímios recursos para manutenção e esteve, durante os três anos de funcionamento, instalada de modo improvisado, com a seção masculina inicialmente abrigada na Faculdade de Direito, em seguida, no prédio do Tesouro Municipal, e a seção feminina, no Seminário de Nossa Senhora da Glória. Conforme o relatório de João Batista Pereira, que ocupava a presidência da província quando a escola foi fechada, em 1878, até mesmo sua mobília era emprestada (Monarcha, 1999 ).

Temos uma biblioteca!

Em 1880, a Escola Normal de São Paulo foi reaberta e seu regulamento reafirmava o compromisso com a criação de uma biblioteca que pudesse atender, além de professores e estudantes da instituição, o público em geral. Os temas sobre os quais os livros deveriam versar eram os mesmos indicados no Regulamento anterior ( 1887 ). No entanto, na nova proposição, a biblioteca abriria por no mínimo cinco horas diárias, durante o funcionamento das aulas, mantendo-se sob a responsabilidade do porteiro.

Os livros começaram a ocupar o cotidiano escolar no momento inicial de retomada das aulas, em agosto de 1880, uma vez que era obrigatório a cada um dos cinco professores do curso a indicação de um compêndio para a sua respectiva cadeira 9 . Naquele ano, foram indicados a Gramática portuguesa , de Freire da Silva, juntamente com uma seleta de autores clássicos, para a cadeira de gramática e língua portuguesa; as obras Aritmética , de Antonio Trajano, e Geometria , de Ottoni, para a segunda cadeira 10 ; para a terceira, História universal de Victor Duruy, Lições de história pátria , de Américo Brasiliense, Geographia de Pedro de Abreu e Geographia do Brazil de Thomas Pompeo; Pedagogia de Antônio Marciano Silva Pontes, para a quarta cadeira; e, para as aulas anexas, adotava-se a Cartilha maternal de João de Deus.

A notícia da adoção dos compêndios pela Escola Normal repercutiu e, no dia seguinte à reunião da Congregação que aprovou os títulos, o Jornal da Tarde (4 ago. 1880 , p. 1) os publicou em seu noticiário, mencionando que se tratava de uma adoção provisória e dependente da aprovação do governo. No relatório de 1880, Vicente Mamede de Freitas, professor e diretor interino da escola, apontou a dificuldade da Congregação em escolher as “obras apropriadas” para um curso “especial”, como o da Escola Normal, afirmando que havia “carência de bons compêndios” no Brasil. Conforme Mamede de Freitas ( 1880 ), “a dificuldade é tamanha que o professor de Física e Química fornece apostilas de sua própria lavra a seus alunos, atenta a impossibilidade de encontrar um compêndio dentro dos limites da programação da escola” (Freitas, 1880 , p. 9-10).

A experiência de produzir o próprio material não era estranha aos professores dos cursos normais; o próprio compêndio de Silva Pontes, adotado pela cadeira de Pedagogia, havia sido elaborado a partir da experiência do autor na Escola Normal de Niterói 11 . Observa-se que a indicação dos livros envolvia, além de razões pedagógicas e institucionais, questões políticas e comerciais, já que os títulos deveriam ser aprovados por agentes do governo e, por óbvio, estarem disponíveis para a compra em São Paulo 12 .

Em agosto de 1880, a Livraria Popular, de propriedade de Abílio Marques, direcionou anúncios na imprensa ao público da Escola Normal, com os compêndios indicados pela Congregação e mais alguns que pudessem interessar aos estudantes, como Lições de história do Brasil , de Joaquim Manoel de Macedo, e Curso teórico e prático de pedagogia de Michel-Charbonneau – que já aparecia em anúncios dessa livraria desde o final da década de 1870. Títulos relacionados aos temas educacionais eram recorrentes em anúncios de livrarias, como a Casa Garraux, que ofereciam livros importados aos leitores paulistas, o que contribuía, em certa medida, para que se pudesse contornar a referida carência local de bons compêndios.

Não obstante a adoção desses livros para as aulas, como previa o Regulamento da Escola Normal, as primeiras mobilizações para a composição de um acervo bibliográfico levaram mais de dois anos para acontecer. Foi no final de 1882, quando Paulo Bourroul (1855-1942), professor da cadeira de Física, Química e Francês e diretor interino da Escola Normal viajou à França, que a promessa de uma biblioteca começou a se concretizar. Naquela altura, em suas aulas, Bourroul sofria com a falta de aparelhos que possibilitassem ensaios práticos, o que alimentava acusações de que o governo não provinha a escola com os materiais necessários a seu adequado funcionamento. Em A Província de S. Paulo ( 1882 , p. 1), Rangel Pestana afirmava: “as aulas de Química e Física funcionam há mais de dois anos e não existe na casa um só aparelho, nem mesmo desses que se encontram por aí em qualquer botica de aldeia!”. O próprio Presidente da Província, Francisco Brandão ( 1882 , p. 1), reconheceu que a escola ressentia, não só de aparelhos indispensáveis para as aulas de física e química, mas “da falta de uma biblioteca apropriada, não possuindo mesmo livro algum de pedagogia”. Assim, em meio às pressões da imprensa e às demandas da escola, Brandão oficialmente encarregou Bourroul de adquirir, na Europa, os itens necessários às aulas de sua cadeira e “as melhores e mais modernas obras de pedagogia” (A PROVÍNCIA DE SÃO PAULO, 1882 , p. 1). Além disso, foi solicitado ao professor que se dedicasse ao estudo para a organização de um museu pedagógico – questão intrinsecamente conectada à construção dos sistemas escolares nacionais, tanto na Europa como na América do Norte (Fontaine; Matasci, 2015 ).

Foram mais de 120 títulos importados da França, cujos temas atendiam a todas as cadeiras da Escola Normal, com exceção da Cadeira de Gramática e Língua Nacional. Mais da metade das obras, como observa Marina Pestana ( 2011 ), destinava-se aos assuntos diretamente abordados na 4ª cadeira, mais especificamente à Pedagogia e Metodologia, embora pudessem ser úteis aos professores das demais matérias do curso normal. Havia livros sobre lições de coisas, instrução moral e cívica, educação física, história da educação, pedagogia teórica e prática, metodologias de ensino e higiene.

Essas obras chegaram à escola em abril de 1883, quando a instituição enfrentava problemas de infraestrutura e carência de itens básicos, tais como mesas e bancos que acomodassem o crescente número de matriculados. Ainda assim, um espaço foi dedicado aos livros, como indica um ofício em que Paulo Bourroul solicitava recursos para as obras de encanamento de gás, necessárias ao funcionamento da biblioteca (Bourroul, 1883 , p. 1). No começo do ano seguinte, o noticiário de A Província de S. Paulo anunciava a abertura da biblioteca:

O atual diretor da Escola Normal, sr. Dr. Benevides, procura levar a efeito algumas medidas que, pela força das coisas, não têm sido realizadas. Entre outras, providenciou a abertura da Biblioteca da Escola, formada principalmente, por ora, dos livros de Pedagogia comprados pelo Dr. Bourroul. A biblioteca, cujo regimento já se acha organizado, está aberta todos os dias úteis, dias na semana para os alunos, e dias para as alunas. Estas durante a sua estada na sala de leitura são, segundo resolveu a congregação, acompanhadas pela adjunta da professora da aula anexa.

(A PROVÍNCIA DE S. PAULO, 19 mar. 1884 , p. 2).

O atendimento em dias alternados para alunas e alunos, além de reverberar as dúvidas e ressalvas em relação à coeducação estabelecida pelo regulamento da instituição, reduzia as possibilidades de frequência à biblioteca. Em 1885, Benevides escreveu: “a frequência de alunos consultantes tem sido pequena em proporção ao número de matriculados, o que se deve atribuir ao fato de conservar-se a biblioteca aberta [...] somente durante o tempo em que funcionam as aulas”. Naquele ano, em que havia 227 estudantes matriculados, foram somados 140 consultantes nos meses de outubro e novembro, período que antecedia os exames (Benevides, 1885 , p. 2-3). Em 1886, com a matrícula de 336 estudantes, a biblioteca obteve um total de 608 consultas (Benevides, 1886 , p. 3, p. 6).

Nesse contexto, em que a França e suas reformas da instrução pública eram observadas e admiradas por políticos e educadores brasileiros, a posse de materiais e livros de autores franceses, ou de títulos adotados naquele país, era tida como fundamental para que experiências educacionais e métodos de ensino considerados modernos fossem apropriados na capital paulista. Em 1884, do total de 323 títulos listados no Catálogo provisório da biblioteca da Escola Normal, havia 203 em língua francesa, dentre os quais traduções de obras originalmente escritas em inglês e alemão, como De l´éducation , de Herbert Spencer, L’éducation de l’homme e Manuel pratique des jardins d’enfants , de Froebel (Benevides, 1884a ). Neste catálogo, 99 títulos foram atribuídos à cadeira de Pedagogia, Metodologia e doutrina cristã, dos quais apenas dez estavam em português 13 . Assim, pensadores anglo-saxônicos que marcaram as concepções educacionais nos séculos XIX e XX, chegaram à Escola Normal de São Paulo por meio de traduções francesas ou, ainda, pela mediação de autores franceses, como é o caso da obra Études sur la vie et les travaux pédagogiques de J.-H. Pestalozzi , de Pierre-Philibert Pompée (1809-1874) 14 .

A presença dos livros não significava, entretanto, que todos os obstáculos à leitura haviam sido transpostos naquele espaço escolar. Para além do gás, cuja instalação foi autorizada ainda em 1883, e do reduzido horário de funcionamento, nos primeiros anos da década de 1880 a biblioteca precisou ser fechada por falta de um funcionário que dela se encarregasse. Benevides ( 1884b , p. 1), considerando “não ser possível ao porteiro pela natureza de seus serviços estar efetivamente na biblioteca durante todo o tempo determinado pelo Regulamento”, precisou insistir para que outro funcionário fosse contratado, o que aconteceu no final de 1884. Cerca de três anos depois, a Escola Normal recebeu um novo Regulamento ( 1887 ) em que constava a função de bibliotecário, a ser exercida por um dos professores da instituição.

Esses avanços com relação à institucionalização da biblioteca não resolviam, porém, a questão do acesso ao idioma estrangeiro. Sabe-se que a língua francesa era conhecida das elites escolarizadas no Brasil oitocentista, principalmente dos egressos do ensino superior ou dos liceus equiparados ao Colégio Pedro II. No entanto, o público que majoritariamente frequentava a escola não era oriundo do grupo social e economicamente privilegiado que frequentava os ensinos secundário e superior. Muitos estudantes eram professores públicos primários, autorizados a se matricularem na escola desde que comprovassem apenas um ano de exercício docente (REGULAMENTO, 1880 ). Para algumas pessoas, o curso normal era a possibilidade de se escolarizar e alcançar uma ocupação estável. Não se esperava que o público estudantil ingressasse na instituição sendo capaz de compreender e interpretar textos em francês.

No entanto, a cadeira de Gramática e Língua Francesa estava prevista no primeiro ano do curso, conforme os Regulamentos de 1880 e de 1887 , e esse estudo seguiria até o final. O domínio suficiente da língua francesa por parte dos normalistas foi, porém, questionado por uma comissão que, em 1884, analisou o projeto de regulamento encaminhado pela Congregação da Escola Normal 15 . Segundo a comissão:

Faz-se preciso o estudo de uma língua estranha, como meio de aquisição de conhecimentos. É palmar, portanto, que, ao ser alguém admitido à matrícula, possa já usar dela, sabendo quando menos, traduzi-la, para se não dar o fato, aliás frequente entre alunos normalistas, de não poderem interpretar livros em francês, adotados para o estudo da Pedagogia, História, Física, Química, etc., vendo-se forçados a recorrer a quem os ensine verter os tópicos correspondentes às lições. [...]. Somos, pois, de opinião que se suprima a sexta cadeira, para incluir-se Língua Francesa e sua Gramática, que constituem a matéria dela, no curso preparatório das Escolas Anexas.

(Silva, A. et al ., 1884 , p. 2-3).

A biblioteca se institucionalizava, com bibliotecário, regimento e a promessa de catalogar o acervo e “organizar uma estatística do número dos consultantes e das obras consultadas e fazê-la publicar mensalmente” (REGULAMENTO, 1887 , p. 2). As compras continuaram sendo realizadas e o acervo crescia continuamente, embora aquém das expectativas de Benevides, que, em 1886, lamentava ter sido preciso usar a verba que era destinada à compra de livros para suprir “outras necessidades escolares”. Nesse ano, o acervo contava com 505 títulos e 1.015 volumes (Oliveira, J., 1886 ). Como não há registros das obras consultadas, não se pode reconhecer e acompanhar a diversidade de leituras feitas por estudantes e professores da Escola Normal – já que apenas a esses a biblioteca foi franqueada, e não ao “público geral”, como prescrevia o Regulamento de 1880.

Com as reformas da década de 1890, o bibliotecário, não mais um professor que acumulava essa função, passou a ser nomeado pelo do Governo do Estado e cuidou de classificar as obras em três sessões: científica, literária e diversa (SÃO PAULO, 1892 ). Assim como o acervo, o movimento da biblioteca aumentou. Em 1893, a Escola Normal registrou 121 matriculados, e sua biblioteca teve 826 consultantes e 170 obras consultadas, registrando uma maior presença de mulheres do que de homens. Foram consultadas obras que percorriam o variado espectro do currículo da Escola Normal: Corografia do Brasil; Ginástica; Química; Astronomia; História; Psicologia; Pedagogia; Botânica, Zoologia e História Natural, sendo que o maior número correspondia às matérias de História do Brasil e Astronomia.

Entre as científicas, mais de dois terços estavam em francês. No mês de maio do referido ano, a biblioteca recebeu 222 estudantes que consultaram 40 obras, 29 em português e 11 em francês. No mês de julho, foram consultadas 23 obras, 12 em português e 11 em francês (O ESTADO S. PAULO, 13 jun. 1893 ; CORREIO PAULISTANO, 5 ago. 1893 ). Esses números, apesar de pontuais, indicam que, embora o acervo fosse composto majoritariamente por títulos em língua francesa, na biblioteca da Escola Normal lia-se mais em português.

Considerações finais

A Escola Normal de São Paulo chegou ao final do século XIX com uma biblioteca diversa. Havia obras para todas as matérias do curso normal – cujo currículo se ampliou entre as décadas de 1870 e 1890 –, além de títulos de literatura, artes e viagens. A composição de seu acervo, crescentemente especializado, ou seja, formado por obras escritas ou usadas para a formação docente, para o conhecimento do funcionamento das escolas, dos sistemas escolares, de métodos e conteúdos de ensino, reflete o movimento de institucionalização e consolidação do curso normal, que se tornou referência para muitos de seus congêneres no estado e no país.

Os títulos incluídos no final do século XIX expressam a ascensão do caráter científico no próprio campo da pedagogia, ofertando aos frequentadores da biblioteca informações sobre as modernas concepções pedagógicas em circulação no mundo ocidental. Indicam, também, que havia grande probabilidade de apropriação seletiva e criativa desse material.

Os livros estavam na biblioteca, muitos deles importados em maior parte da França, o que evidencia a circulação dos saberes pedagógicos e nos faz conjecturar sobre os fatores que explicam essa primazia: a tradicional preferência da elite letrada brasileira pela literatura francesa; a expectativa dos gestores da Escola Normal de São Paulo em espelhar suas congêneres daquele país; a oferta mais numerosa e frequente de livros produzidos na França e vendidos pelas casas livreiras, em São Paulo (Deaecto, 2011 ); ou ainda, o fato de esse país ter passado por uma reforma da instrução pública que motivou o estudo, a produção e a reunião de materiais sobre experiências educativas de diferentes nações (Silva, C., 2022 ; Fontaine; Matasci, 2015 ).

A história da constituição da biblioteca não indica, entretanto, ter havido o objetivo expresso de emular uma biblioteca francesa, ou de assumir que as escolas francesas fossem o modelo único para a formação do magistério paulista. É importante lembrar que o impulso inicial para a constituição da biblioteca da Escola Normal, em 1880, foi a viagem do diretor Paulo Bourroul à França, para tratar de questões pessoais. Foi essa uma oportunidade, que chama a atenção para que se considere, no processo de constituição do acervo, a intervenção do acaso e das conveniências. Ainda que os caminhos que levaram os livros à escola tenham sido diversos e guardem em si alguma aleatoriedade, é notória a presença de livros em língua francesa, na biblioteca, naquele final de século.

Objetos circulantes, que podem ganhar novos sentidos em diferentes territórios, físicos ou epistemológicos, os livros estavam disponíveis para serem lidos, reproduzidos, apropriados. Entretanto, ao longo das três décadas investigadas, várias evidências revelam que estudantes e professores precisaram encarar obstáculos, tanto de ordem prática como de ordem cultural, para os acessarem. Da ausência de um funcionário que pudesse manter a biblioteca aberta à falta de iluminação, da precariedade do espaço ao imperfeito domínio do idioma estrangeiro, foram várias as dificuldades enfrentadas para a leitura das obras pertencentes ao acervo da Escola Normal. Quais obras eram lidas e como os estudantes se apropriavam de seus conteúdos para a formação docente são questões que permanecem em aberto. Investigar tais questões demanda o recurso a outras fontes, como cadernos, notas de aulas e exames.

É possível que, na Escola Normal, a consulta tenha se restringido a um pequeno número de títulos do acervo, variando no tempo de acordo com as recomendações de leitura das cadeiras; e que as obras estrangeiras fossem mais acessadas pelos docentes, hipoteticamente mais familiarizados com outros idiomas, a fim de traduzir e explicar trechos selecionados a seus estudantes em uma linguagem mais acessível. Nesse caso, poderia ser diminuída ou relativizada a importância dos livros para a formação de professores na Escola Normal de São Paulo, no século XIX? Talvez. De todo modo, é plausível considerar que a presença e a circulação de livros, preservados e oferecidos à toda comunidade escolar por meio de um equipamento especializado, a biblioteca, veio permitir a constituição de leituras híbridas, por vezes amalgamadas de distintos elementos pedagógicos e culturais, nacionais e estrangeiros, religiosos e políticos.

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3As características específicas de cada documento, como o seu contexto de produção, a intencionalidade e a autoria, foram considerados na análise documental, para o levantamento de informações e indícios sobre a biblioteca, seus agentes e a circulação dos livros na Escola Normal.

4 Em 1876, a idade mínima dos ingressantes passou a ser de 18 anos, e foi criada uma seção feminina (SÃO PAULO, 1876 ).

5 Paulo Antônio do Valle (1824-1886) formou-se bacharel na Academia de Direito de São Paulo, em 1848. Atuou como redator na imprensa periódica, professor, historiador e teatrólogo (Dias, 2013 ).

6 A primeira cadeira da Escola Normal era composta pelo ensino da Língua Nacional e Língua Francesa, Aritmética e Sistema Métrico, Caligrafia, Doutrina Cristã, Metódica e Pedagogia. Já a segunda cadeira reunia as matérias de Noções de História Sagrada e Universal, inclusive a do Brasil; Geografia, especialmente do Brasil; e elementos de Cosmografia. Em 1876, a Escola passou a ter quatro cadeiras e uma seção feminina (Monarcha, 1999 ; Dias, 2013 ).

7 Nessa lista manuscrita, há indicação do livro “Estado da instrução pública na Europa e na América”, de Ducpétiaux, cujo título correto é, provavelmente, De l’état de l’instruction primaire et populaire en Belgique, comparé avec celui de l’instruction en Allemagne, en Prusse, en Suisse, en France, en Hollande et aux Etats-Unis ; e há outro título que parece ser “Estado da Instrução no Brasil”, cuja autoria não pode ser identificada.

8 A Casa Garraux, fundada pelo francês Anatole Louis Garraux (1833-1904), foi uma das mais importantes casas comerciais a vender livros europeus em São Paulo, na segunda metade do século XIX (Deaecto, 2011 ).

9 Na época, o curso normal era composto por cinco cadeiras – 1ª. Gramática e Língua Nacional; 2ª. Aritmética e Geometria; 3ª. Geografia Geral, História do Brasil e da Província, História Sagrada e Universal; 4ª. Pedagogia e Metodologia, Doutrina Cristã; e 5ª. Francês, Química e Física (REGULAMENTO, 1880 ).

10 Em 1879, foram publicados os livros Arithmetica progressiva e Arithmetica elementar ilustrada , de Antônio Trajano (Oliveira, M., 2013 ). No relatório da Escola Normal consta apenas o título “Arithmetica”.

11Em São Paulo, Camilo Passalacqua, regente da Cadeira de Pedagogia a partir de 1884, também optou por adotar um compêndio de sua autoria.

12 Houve, a propósito, grande polêmica em torno dos professores Silva Jardim, Cypriano de Carvalho e Godofredo Furtado, reconhecidamente positivistas, entre os anos de 1885 e 1886. Os dois primeiros se recusaram a indicar compêndios para as suas cadeiras. Já Furtado, teria indicado “Condorcet e Lacroix, unicamente porque Comte os recomendava” (Benevides, 1886 , p. 1).

13 Os livros em português eram: Pedagogia , de Maria da Graça Affreixo; Reorganização do ensino (brochura) de Almeida Oliveira; Resumo de história da pedagogia , de Cirne Junior; Guia do professor primário , de Robinson; A educação das crianças , de Siqueira Ferraz; e o Compêndio de pedagogia , de Silva Pontes. Além desses, pertenciam à 4ª. cadeira os livros Catecismo da Diocese de S. Paulo (quatro exemplares) e a Bíblia Sagrada, além da Constituição do Império . Os demais títulos estavam em francês.

14 Conforme Fontaine e Matasci ( 2015 ), Pierre-Philibert Pompée foi um educador francês que esteve na Suíça, estudando o método Pestalozzi, e que se tornou um importante mediador desse autor na França.

15Essa comissão foi composta por Paulo Antônio do Valle, que atuou como professor na Escola Normal de São Paulo na década de 1870; Manoel José da Lapa Trancoso, professor substituto na Escola Normal em 1882; e por Augusto Freire Silva, professor de Gramática e Língua Nacional no curso preparatório da Faculdade de Direito.

Recebido: 15 de Março de 2022; Aceito: 10 de Abril de 2023; Revisado: 09 de Fevereiro de 2023

2- Contato: carolmostaro@usp.br

Editor:

Profa. Dra. Danusa Munford

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