1 INTRODUÇÃO
O campo de atuação profissional para os licenciados em Educação Física (EF) não se restringe às atividades de sala de aula. De acordo comLarocca e Junges (2004), o exercício de outras atividades ou funções por parte dos professores, que extrapolam a dimensão pedagógica na regência de classe, configura-se como um fator importante na constituição da identidade docente.
Em consonância com essa perspectiva, a Resolução do Conselho Nacional de Educação (CES) Nº 6/2018, que trata das Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Educação Física (DCNEF), estabelece que: “A etapa específica para formação em Licenciatura deverá garantir nos currículos interdisciplinares [...] formação na área de políticas públicas e gestão da educação [...]” (BRASIL, 2018, p. 4).
Entre os papéis que o professor de EF pode desempenhar no âmbito da educação, neste artigo, destacamos a direção/gestão escolar, termos que assumiremos como sinônimos. Gerir uma unidade de ensino envolve elementos que influenciam o trabalho desenvolvido na/pela comunidade escolar e têm como eixos centrais as gestões de pessoas, pedagógica e administrativa, de forma democrática e participativa (LÜCK, 2009). Esses eixos, segundo a autora, exigem conhecimentos relacionados ao planejamento e à organização do trabalho escolar, à compreensão de fundamentos e aos princípios da educação e da gestão educacional, ao monitoramento de processos administrativos e financeiros, bem como à avaliação institucional e ao acompanhamento dos resultados educacionais.
Acerca dessa relação da atuação profissional de docentes com formação em EF com as atividades de gestão escolar, Noronha e Teixeira (2015) identificaram que
[...] diversos professores de Educação Física começaram a concorrer nos processos eleitorais, sendo eleitos e desempenhando o papel de diretores ou vice-diretores. Tal situação pode ser compreendida considerando-se não só as características pessoais de cada um deles, mas também competências e habilidades comuns aos professores e profissionais da área, como a liderança, o empreendedorismo, a capacidade de escuta, de desenvolver redes de relacionamentos que chegam às famílias e às comunidades atendidas pelas escolas, mediada pela vivência da corporalidade, de afetos e sentimentos (NORONHA; TEIXEIRA, 2015, p. 90).
Em 2017, constatamos na Rede Municipal de Ensino de Vitória/ES que, em um total de 4.481 docentes, 339 (7,6%) eram professores de EF e que, de suas 101 unidades de ensino, onze delas elegeram docentes de EF para na função de diretor escolar, o que representava 10,9% do total.
O número crescente de professores de EF na gestão escolar, mais especificamente em Vitória/ES, instigou-nos a pensar sobre aspectos legais e pedagógicos que cercam a formação desses docentes e a produção de conhecimento na área. Nossas reflexões caminharam no sentido de indagar: O que os documentos que orientam os cursos de formação inicial em Educação Física indicam sobre a gestão escolar? Como o campo acadêmico-científico da Educação Física tem abordado as questões relativas à participação de profissionais dessa área na gestão escolar? Quais são os saberes mobilizados nos currículos dos cursos de formação inicial em EF da Região Metropolitana da Grande Vitória/ES (GV)1 que subsidiem a atuação profissional para a gestão escolar?
Para respondermos a essas perguntas, este artigo objetiva analisar as orientações legais para a formação de professores, a produção acadêmico-científica da Educação Física sobre a gestão escolar e os currículos prescritos dos cursos de formação inicial em EF na GV.
2 MÉTODO
Para alcançar o objetivo proposto, combinamos a pesquisa documental com a pesquisa bibliográfica (LAKATOS; MARCONI, 2003). Os documentos utilizados neste estudo foram: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Nº 9.394/1996) e as Resoluções do Conselho Nacional de Educação (CNE) Nº 7/2004, Nº 2/2015, Nº 6/2018 e Nº 2/2019, os perfis dos egressos e as matrizes de disciplinas dos cursos de formação de professores de EF da GV. A pesquisa bibliográfica focalizou a produção acadêmico-científica da EF brasileira no tocante à gestão escolar, veiculada em artigos, dissertações e teses.
As fontes documentais permitiram-nos realizar um levantamento histórico das orientações curriculares de formação docente, tanto das licenciaturas em geral, quanto específica em EF, que foram selecionadas por mencionarem a gestão escolar em seus conteúdos. Os perfis de egressos e as matrizes de disciplinas foram incorporados ao debate, intencionando compreender a materialização das orientações legais na formação oferecidas pelas Instituições de Ensino Superior (IES).
Delimitamos a investigação às IES da região metropolitana de Vitória/ES, que oferecem o curso de licenciatura em EF na modalidade presencial, sendo elas: Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Católica Vitória Centro Universitário (Salesiano), Fabra, Faculdade Estácio de Sá, Faculdade Pitágoras, Universidade Vila Velha (UVV), Faculdade Multivix e Faculdade Doctum. Essa escolha deve-se ao seu impacto predominante na formação dos professores de EF que são diretores na Rede Municipal de Vitória/ES.
Realizamos buscas em periódicos científicos2 da área que possuem melhor classificação no WebQualis da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)3 (2013-2016) e nos repositórios disponíveis online de cada Programa de Pós-Graduação4 que possuem áreas de concentração e/ou linhas de pesquisas com as vertentes sociocultural e pedagógica, até julho de 2018. Em uma primeira fase da pesquisa, utilizamos os descritores: Gestão; Gestão Escolar; Gestão Educacional; Diretor escolar; Direção. Ao observarmos um número muito baixo de artigos, procedemos a uma investigação aprofundada, entrando em cada uma das edições das revistas selecionadas e em todos os arquivos disponibilizados pelos Programas investigados.
Nessa etapa do trabalho, somando-se as publicações em revistas e as dissertações e teses defendidas, foram visitadas 9.920 produções. Na seleção dos textos, realizamos a leitura dos títulos de todos os trabalhos. Quando observadas relações com o objeto deste estudo, procedemos à leitura dos resumos, e, quando ainda restavam dúvidas, procedíamos a leitura do trabalho na íntegra. Do total, encontramos dois artigos e quatro dissertações que mantiveram relação com a temática focalizada neste estudo.
3 ANÁLISE DOCUMENTAL DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE EF
Para subsidiar a discussão que orienta a formação de professores no Brasil para atuação na Educação Básica, dialogamos com os seguintes documentos: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB - Lei No 9.394/1996); as Resoluções do CNE N° 7/2004 e Nº 6/2018, que instituíram/instituem as DCNEF, e as Resoluções Nº 2/2015 e Nº 2/2019, que regulamentam a formação geral para todas as licenciaturas atualmente. Todos esses documentos estão sintetizados no Quadro 1, apresentado a seguir.
Lei Nº 9.394 (BRASIL, 1996) | Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: [...] Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públi cas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público. (BRASIL, 1996, n.p., grifo nosso). |
Resolução Nº 7 (BRASIL, 2004) | Art. 6º § 1° [...] - Participar, assessorar, coordenar, liderar e gerenciar equipes multiprofissionais de discussão, de definição e de operacionalização de políticas públicas e institucionais nos campos da saúde, do lazer, do esporte, da educação, da segurança, do urbanismo, do ambiente, da cultura, do trabalho, dentre outros (BRASIL, 2004, p. 2, grifos nossos). |
Resolução Nº 2 (BRASIL, 2015) | Art. 13 [...] a formação para o exercício integrado e indissociável da docência na educação básica, incluindo o ensino e a gestão educacional. § 2º Os cursos de formação deverão garantir nos currículos conteúdo específicos da respectiva área de conhecimento ou interdisciplinares, seus fundamentos e metodologias, bem como conteúdos relacionados aos fundamentos da educação, formação na área de políticas públicas e gestão da educação [...]. (do urbanismo, do ambiente, da cultura, do trabalho, dentre outros (BRASIL, 2015, p. 11, grifos nossos). |
Resolução Nº 6 (BRASIL, 2018) | Art. 9° […] VI - Mobilização efetiva de princípios que norteiam a formação inicial e continuada nacionais comuns, tais como: [...] e) gestão democrática; e [...] Art. 14. A etapa específica para formação em Licenciatura deverá garantir nos currículos interdisciplinares, seus fundamentos e metodologias, bem como conteúdos relacionados aos fundamentos da educação e à formação na área de políticas públicas e gestão da educação para o desenvolvimento das pessoas, das organizações e da sociedade. Art. 16. [...] b) pesquisa e estudo da legislação educacional, processos de organização e gestão educacional, trabalho docente, políticas de financiamento educacional [...] (BRASIL, 2018, p. 4-5, grifos nossos). |
Resolução Nº 2 (BRASIL, 2019) | Art. 12. No Grupo I, a carga horária de 800 horas deve ter início no 1º ano, a partir da integração das três dimensões das competências profissionais docentes - conhecimento, prática e engajamento profissionais - como organizadoras do currículo e dos conteúdos segundo as competências e habilidades previstas na BNCC - Educação Básica para as etapas da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e do Ensino Médio (BRASIL, 2019, p. 5, grifo nosso). Parágrafo único. No Grupo I, devem ser tratadas ainda as seguintes temáticas: IV - gestão escolar com especial ênfase nas questões relativas ao projeto pedagógico da escola, ao regimento escolar, aos planos de trabalho anual, aos colegiados, aos auxiliares da escola e às famílias dos estudantes (BRASIL, 2019, p. 5-6, grifo nosso). |
Fonte: Os autores, pesquisa documental.
A gestão democrática aludida pela LDB, em seus Artigos 14 e 15, evidencia um modelo de gestão centrado na autonomia das unidades escolares, indicando que elas devem se organizar para se autogerirem, ainda que reguladas pelos sistemas de ensino locais. Contudo, é importante destacar que, via de regra, a ocupação da função de diretor escolar, no Brasil, ocorre por meio de quatro mecanismos distintos: eleição, concurso público, indicação política ou processo seletivo interno (MEDEIROS, 2003). Embora não seja uma regra objetiva da LDB, tampouco uma prática predominante nos municípios e nos estados, há sistemas públicos de ensino que optam pela eleição dos diretores das unidades escolares com base nesse princípio.
A Resolução CNE N° 7/2004, em seu Artigo 6°, trata das competências que deverão constituir o projeto pedagógico de formação do graduando em EF e aponta quais são as competências e as habilidades que devem ser adquiridas e desenvolvidas na formação desses profissionais. Em seu inciso 1º, consideramos que “[...] coordenar, liderar e gerenciar equipes multiprofissionais de discussão, de definição e de operacionalização de políticas públicas e institucionais [...]” (BRASIL, 2004, p. 2) subentende-se que essas podem ser características que, quando materializadas no currículo de formação inicial da área, deverão colaborar na atuação profissional dos egressos que virão a atuar como diretores de escola. Assim sendo, em tese, os cursos de licenciatura deveriam promover discussões sobre a gestão educacional e escolar de diferentes maneiras, inclusive como componente curricular em suas matrizes.
A Resolução Nº 2/2015, que trata das licenciaturas em geral, sinaliza que os currículos de formação docente deverão ser capazes de ir além dos assuntos específicos de cada área, incluindo também “conteúdos relacionados aos fundamentos da educação” e aponta dentre eles, a gestão escolar. Por esse ângulo, compreendemos que a referida Resolução aponta para a formação de um professor, seja ele de qual disciplina for, capaz de atuar e intervir além da sala de aula, podendo colaborar no processo de gestão educacional e de políticas públicas. Para Puziol:
Uma formação que envolva o aprendizado sobre a gestão e organização dos estabelecimentos escolares de modo mais aprofundado, pode propiciar que profissionais de outras licenciaturas atuem com maior qualidade e responsabilidade no estabelecimento escolar em sua totalidade e não somente em sala de aula, que já é grande comprometimento (2018, p. 158).
Compreendemos que a Gestão deve estar situada com destaque no âmbito dos currículos da EF, exatamente para que seus egressos estejam em condições de ocupar a função de diretor escolar em pé de igualdade com os demais licenciados, bem como para que os princípios expressos nessas Resoluções se efetivem.
As novas DCNEF, publicadas em dezembro de 2018, além de preconizarem uma nova estrutura de currículo, acrescentam contribuições na temática da gestão escolar. Observamos que o Art. 9 aponta a gestão escolar como parte da “Mobilização efetiva de princípios” (BRASIL, 2018, p. 3) da formação. Conforme apresentado no Quadro 1, ressaltamos que aparece de forma bem específica que a temática da gestão é conteúdo dos currículos e como campo de “pesquisa e estudo” na formação inicial em EF.
Em dezembro de 2019, o CNE publicou uma nova Resolução que balizou a formação docente no país, denominada de “Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica” (BNC-Formação) (BRASIL, 2019, p. 1). Essa normativa reforça a necessidade de a gestão estar contemplada nos currículos das licenciaturas, estabelecendo que é uma das competências profissionais a serem desenvolvidas nos cursos que formam docentes para atuarem na Educação Infantil, no Ensino Fundamental e no Ensino Médio. A gestão passa, a partir dessa Resolução, a compor parte das 800 horas destinadas aos “[...] conhecimentos científicos, educacionais e pedagógicos e fundamentam a educação e suas articulações com os sistemas, escolas e práticas educacionais” (BRASIL, 2019, p. 5).
A temática da gestão escolar é recorrente nas orientações do Ministério da Educação (MEC) brasileiro. Aparenta, ainda, estar ganhando cada vez mais espaço ao longo do tempo. Ela deixa de ser tratada como “competências e habilidades” da formação docente em EF (BRASIL, 2004, p. 3), para se estabelecer como conteúdo de ensino e espaço de “pesquisa e estudo” da EF, a partir das orientações atuais (BRASIL, 2018, p. 5). Ressalvamos que as DCNEF não determinam que IES devam contemplar esses conhecimentos em forma de disciplina; no entanto, considerando o exposto, evidenciamos que ela ganha força e tenciona as IES a pensarem sobre como garantirem essa temática em seus currículos.
Todas essas legislações são reconhecidas por Noronha e Teixeira (2015) como sendo exigências à qualificação dos professores de EF para darem conta, por completo, das suas atribuições profissionais docente. Portanto, o debate acadêmico-científico da área bem como os currículos de licenciatura devem atentar-se a essas demandas legais/pedagógicas. Em consonância com Puziol (2018, p. 168-169), acreditamos que a possibilidade de abordar, de forma mais detida e específica, as dimensões da gestão educacional e escolar em todos os cursos de licenciatura, “[...] pode se configurar numa importante ação docente formativa que favoreça o entendimento da realização das políticas educacionais no contexto da prática, dando maior materialidade à legislação educacional”.
Dada a recente publicação, uma análise mais profunda sobre o impacto das novas DCNEF na temática da Gestão escolar só será possível à medida que as IES reformularem seus itinerários formativos, dentro do prazo de dois anos previsto para o seu cumprimento em definitivo.
4 PRODUÇÃO ACADÊMICA NA ÁREA DA EDUCAÇÃO FÍSICA SOBRE GESTÃO ESCOLAR
Na busca por produções acadêmicas que pudessem ampliar nossa compreensão sobre o objeto, bem como estabelecer as fronteiras do que já havia sido produzido pela comunidade científica da área, lançamo-nos a procura por publicações. Romanowski e Ens (2006) defendem o mapeamento do conhecimento já produzido, nas diferentes áreas, para que essa iniciativa contribua com a realização de um balanço que desvende e examine o conhecimento já elaborado e apontem os enfoques, os temas mais pesquisados e as lacunas existentes.
A discussão sobre a produção científica relacionada ao tema abordado neste artigo inicia com a constatação de outros autores dedicados a essa tarefa, que apontam uma baixa produção acadêmica na área no tocante à relação do professor de EF com a gestão de escolas (CÁRDENAS; FEUERSCHÜTTE, 2014; ALATZOGLOU; ATHANAILIDIS; SAMPANIS, 2013; MENDES; BACCIN; DALL’IGNA, 2012; ILHA; KRUG, 2008). Eles observam ainda haver muito a ser explorado nas pesquisas sobre o assunto. Conforme sentenciam Cárdenas e Feuerschütte (2014): “A formação em Educação Física relacionada à gestão, ao que aparenta, foi objeto de escassas investigações cientificas”.
Souza (2006) apresenta um levantamento de teses e de dissertações produzidas entre 1981 e 2001, combinando os bancos de dados da Associação Nacional de Pesquisas em Educação (ANPEd) e da Capes, de todas as áreas do conhecimento. Foram encontrados 183 trabalhos sobre gestão escolar, ficando evidente que nenhum desses foi defendido em Programas de EF. Essa constatação reforça nossos argumentos de um quadro de escassez de publicações que abordam essa temática na área.
Alatzoglou, Athanailidis e Sampanis (2013), em um estudo quantitativo realizado na Grécia sobre a capacidade administrativa do professor de EF atuando como diretor escolar, destacam que: “A maior limitação é que os resultados não podem ser comparados com outros estudos similares” (ALATZOGLOU; ATHANAILIDIS; SAMPANIS, 2013, p. 3, tradução nossa), levando-nos a perceber que tanto a atuação de professores de EF frente à gestão de escolas seria uma temática relevante, quanto a baixa produção acadêmica se repete também no referido país.
As produções encontradas em nossos levantamentos debruçaram-se em descrever a atuação dos docentes de Educação Física frente à gestão educacional (MOLINA NETO, 1998; QUINTANA, 2010; MENDES; BACCIN; DALL’IGNA, 2012; KRÖNING, 2016; LOPES, 2016; PETERLE, 2017), seja ela diretamente na escola ou em algum órgão gestor.
Conforme descrito no método, realizamos buscas em oito periódicos científicos do campo da EF com melhor classificação no WebQualis da Capes (2013-2016). Apresentamos, no Quadro 2 a seguir, os dados levantados nesse processo.
Periódico | Periodicidade | Artigos observados | Educação Física e Gestão escolar |
---|---|---|---|
Licere | 1999 - 2007 | 678 | - |
Motrivivência | 1988 - 2017 | 853 | - |
Motriz | 1995 - 2015 | 552 | - |
Movimento | 1994 - 2017 | 1019 | MOLINA NETO (1998) MENDES; BACCIN; DALL’IGNA (2012) |
Pensar a Prática | 1998 - 2017 | 792 | - |
RBCE | 1979 - 2017 | 1464 | - |
RBEFE | 20045 - 2017 | 656 | - |
Revista de EF da UEM | 1989 - 2017 | 917 | - |
Total | 6931 | 2 |
Fonte: Os autores, pesquisa bibliográfica.
No conjunto de publicações levantadas, identificamos apenas dois artigos que discutem gestão escolar, ambos publicados na revista Movimento. No primeiro trabalho, Molina Neto (1998) ouviu 20 professores de Educação Física de escolas públicas de Porto Alegre, buscando identificar suas práticas e seus conhecimentos. O segundo trata da relação de professores com formação em EF e um órgão gestor de educação da cidade de Acalifa, no Rio Grande do Sul. De autoria de Mendes, Baccin e Dall’Igna (2012), tem como título Da escola para a gestão da rede de ensino: como o professor se torna um supervisor? e a utilização de uma metodologia qualitativa, composta por entrevistas e análise documental para atingir os objetivos.
Observamos que o artigo de Molina Neto (1998) centra esforços em uma visão ampla da atuação do professor de EF, trata de assuntos diversos, tais como: a falta de reconhecimento profissional; especificidade do trabalho na escola pública e do trabalho com o corpo; aborda também questões como a liberdade relativa que gozam dentro da organização da disciplina e o isolamento desses profissionais na escola.
Molina Neto (1998) discutiu a participação política dos docentes da área dentro das escolas, percebendo na fala dos profissionais ouvidos temas políticos e sindicais. O autor aponta também que, devido à especificidade da EF, os professores desenvolvem uma “relação muito próxima” com os alunos, o que os daria um “espaço privilegiado” dentro da organização política das escolas. O pesquisador apresenta dados que refletem a participação dos docentes em cargos de Direção/Vice-direção, comparando as redes municipal de Porto Alegre/RS e a estadual do Rio Grande do Sul. Nesse caso, o autor observou que respectivamente 22,5% e 6,2% dos diretores são docentes da área. Molina Neto (1998) atribui essa diferença de percentuais ao fato de os alunos participarem votando nas eleições municipais, fato que não ocorre no âmbito estadual.
O estudo de Mendes, Baccin e Dall’Igna (2012) retrata a mediação entre os supervisores de uma Secretaria Municipal de Educação e os professores de EF que atuam no referido município. Esse trabalho ressalta as nuances encontradas no tocante aos projetos de governos das sucessivas administrações municipais. Os autores também fazem questão de mencionar o pouco interesse que a comunidade vem demonstrando sobre essa temática, ao afirmarem que: “A relevância do estudo desse tema prende-se ao reduzido número de pesquisas que discutem a gestão das redes de ensino e à escassez dessas investigações na Educação Física” (MENDES; BACCIN; DALL’IGNA, 2012, p. 97), convergindo com o nosso levantamento atual, exposto no Quadro 2.
Apesar disso, é interessante observarmos que, durante a pesquisa bibliográfica, percebemos publicações que focalizam a participação de professores de Educação Física em cargos de gestão em espaços não escolares. Essa observação coaduna com o que é apresentado por Cárdenas e Feuerschütte (2014), ao destacarem o crescente número de publicações que abordam a temática da gestão esportiva por profissionais de Educação Física no Brasil. Noronha e Teixeira (2015) concluem que a gama de estudos dedicados a essa temática decorre do entendimento de que se trata de uma responsabilidade do profissional de Educação Física a gestão esportiva.
Inserindo-se os descritores: professor de Educação Física e gestão escolar, nas bases de dados do Google Acadêmico e SciELO, notamos publicações em periódicos de outras áreas do conhecimento; contudo, parecem seguir a mesma pista da baixa produção de trabalhos dentro da temática. Como parte das conclusões de seu artigo sobre a participação do professor de EF na gestão escolar, Ilha e Krug (2008) apontam a necessidade de mais produção na área e complementam “[...] que os estudos nessa linha Educação Física - Gestão Escolar/Educacional são poucos”.
Ao buscar teses e dissertações defendidas em Programas de Pós-Graduação em Educação Física (PPGEFs), por meio da Plataforma Sucupira/Capes6, localizamos 36 Programas com 58 cursos oferecidos, entre Doutorado, Mestrado Acadêmico e Mestrado Profissional. Após filtrados pelas áreas de concentração e linhas de pesquisas com foco nas subáreas sociocultural e pedagógica, restaram 20 cursos.
Após examinarmos cada repositório disponibilizado pelos PPGEFs, identificamos 2.993 teses e dissertações, das quais apenas quatro dissertações contemplaram a temática EF/Gestão Escolar, conforme explicitado no Quadro 3.
Instituição | Trabalhos observados | Trabalhos relacionados ao objeto | Autor e ano de defesa | ||
---|---|---|---|---|---|
Dissertações | Teses | Dissertações | Teses | ||
UPE | 74 | 0 | - | - | |
USP* | 87 | 50 | - | - | |
UNICAMP* | 106 | 0 | - | - | |
UEM/UEL | 107 | 0 | - | - | |
UNESP* | 384 | 0 | - | - | |
UFMT | 25 | 0 | - | - | |
UFMG** | 18 | 0 | - | - | |
UFPel | 203 | 1 | 2 | - | QUINTANA (2010) KRÖNING (2016) |
UFPE | 6 | 0 | - | - | |
UFSC | 416 | 89 | - | - | |
UFSM | 52 | 0 | - | - | |
UFSCAR** | 23 | 0 | |||
UFES | 199 | 1 | 1 | - | PETERLE (2017) |
UFRJ*** | - | - | - | - | |
UFRN | 91 | 0 | - | - | |
UFRGS | 552 | 135 | 1 | - | LOPES (2016) |
UNIVASF | 17 | 0 | - | - | |
UNIMEP | 186 | 0 | - | - | |
UNIVERSO*** | - | - | - | - | |
USJT | 167 | - | - | - | |
Soma parcial | 2713 | 276 | 4 | - | |
Total | 2989 | 4 | |||
* Levantamento pela aplicação de filtros na biblioteca online da instituição ** Mestrado profissional em Educação Física *** Arquivos não disponíveis para pesquisa |
Fonte: Os autores, pesquisa bibliográfica.
A partir da leitura de cada uma das dissertações encontradas, extraímos elementos gerais desses trabalhos em busca de ampliar nossa compreensão do objeto. Quintana (2010) identificou como os professores de EF se constituíram gestores das escolas da Rede Estadual de Ensino da cidade de Pelotas/RS, entre os anos de 2007 e 2009. A metodologia utilizada foi uma pesquisa qualitativa, que entrevistou nove gestores, sob um roteiro semiestruturado que visou compreender motivos pessoais e profissionais para buscarem ocupar essa função. O autor concluiu que a formação inicial em EF não fora suficiente para o exercício da função. Observou, ainda, que fatores pessoais determinaram a escolha da profissão; contudo, a interlocução com os colegas de trabalho é o que mais os influenciaram na opção por atuarem na gestão. O pesquisador ressalvou que, apesar das diretoras conhecerem as práticas de gestão democrática, nem todas as aplicam e que as famílias provenientes de camadas menos favorecidas economicamente se mostram mais participativas e preocupadas com a gestão da escola, bem como com a educação oferecida a seus filhos.
O trabalho de Lopes (2016) buscou compreender como docentes de EF que atuam como diretores ou vice-diretores assumem, significam e experienciam a gestão escolar na Rede Municipal de Ensino de Porto Alegre/RS. Foram utilizadas narrativas de três docentes que ocupavam essas funções no período de agosto a dezembro de 2015. As narrativas produzidas pelos “professores-diretores” assinalam os percursos e as singularidades de cada um dos sujeitos, fazendo menções sobre a sua formação e sobre o contexto social, histórico e político de cada um. Em suas considerações finais, a autora afirma que a mudança na conjuntura política de organização da educação na Rede Municipal de Porto Alegre influencia na participação dos professores de EF em cargos relativos à gestão escolar. O estudo aponta também que fatores como a boa relação mantida por esses professores com alunos e famílias são preponderantes na chegada ao cargo de diretor.
As narrativas que compõem o trabalho de Lopes (2016) destacam, ainda, que os sujeitos dessa pesquisa afirmam não se lembrar de disciplinas que os preparassem para essa atuação, mas consideram que outros elementos como a participação em diretórios acadêmicos e espaços políticos durante sua formação inicial contribuíram para essas aspirações. A referida autora produz uma crítica considerando necessária uma formação mais ampla nos cursos de EF, pois, para ela, ficou explícito que os envolvidos aprendem apenas pela prática cotidiana sobre gestão escolar.
Os trabalhos de Kröning (2016) - Formação Continuada em Educação Física Escolar: ações, percepções e desafios da gestão educacional - e de Peterle (2017) - Formação, gestão e inclusão: a experiência da Educação Física no município de Viana - apesar de anunciarem a relação entre EF e Gestão, apresentam-se no âmbito da gestão educacional ampla. O primeiro evidencia contribuições na área da formação continuada em EF escolar no município de Pelotas/RS. O segundo estudo trata da formação continuada específica no campo da inclusão desenvolvida na cidade de Viana/ES. Ambas as pesquisas contribuem para uma visão mais ampliada de gestão educacional, mas não tratam da presença direta do professor de EF nessa função.
As dissertações analisadas, sutilmente, responsabilizam a formação docente em EF pela dificuldade em exercer a gestão escolar. Embora não mencione com clareza a ausência de disciplinas específicas para tal, bem como quando os sujeitos participantes foram formados em EF (se antes ou após as Diretrizes que identificamos recomendarem a gestão como eixo da formação em licenciatura), os autores problematizam as deficiências no processo de “preparação” para o exercício profissional pleno, em todos os espaços possíveis para quem cursa EF. Acabam por expor ainda que, nos casos analisados, a formação não é um fator de encorajamento para a assunção da gestão. Fatores outros, como um suposto perfil enxergado pelos demais colegas da escola, atuação política pregressa; envolvimento em formações continuadas das próprias redes, têm se constituído como motivantes para o desafio da gestão escolar.
Esse nosso entendimento, encontramos respaldo na pesquisa de Silva e Molina Neto (2012), que estudaram a participação de docentes de EF em diversos espaços de liderança/gestão (direção de escolas, sindicatos, parlamento, movimentos sociais) no Rio Grande do Sul, provocados pela prevalência de sujeitos com essa formação a frente desses espaços. Os pesquisadores concluem que “[...] há uma multiplicidade de determinações da prática social, das relações familiares e da formação inicial que se sintetizam e contribuem para a formação política de professores de Educação Física” (SILVA; MOLINA NETO, 2012, p. 870). Os autores compreendem que a “formação política”, proveniente de um “currículo oculto”, é peça determinante para mobilizar os profissionais da EF para essas tarefas.
5 A GESTÃO ESCOLAR NOS PERFIS DE EGRESSO E NAS DISCIPLINAS DOS CURSOS DE FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA NA GRANDE VITÓRIA
Os cursos de formação inicial têm impacto decisivo sobre a atuação docente. Portanto, pesquisar os elementos constitutivos das propostas curriculares de cursos de Ensino Superior podem contribuir para compreendermos as aproximações e os distanciamentos com as exigências legais e as demandas do campo profissional. O perfil do egresso de um curso traduz a consolidação dos objetivos traçados pela instituição em relação ao seu currículo de formação acadêmica; em outras palavras, uma síntese textual do conjunto de conhecimentos e habilidades que o discente deve adquirir ao se formar na perspectiva anunciada pela faculdade. Por meio dos títulos das disciplinas, buscamos as unidades curriculares que mantivessem relação com nosso objeto de estudo, procurando compreender a materialização desses perfis no rol de disciplinas oferecidas, ou, ainda, identificação da presença desse tema no currículo mesmo quando não anunciado.
Observando as perspectivas trazidas pelos documentos orientadores e pela legislação, percebemos que cada IES precisa tomá-los como base, porém possuem certo grau de autonomia para definir seus currículos. Dentre as oito IES pesquisadas, a gestão escolar é encontrada no perfil de egresso da Católica de Vitória, em duas disciplinas oferecidas pela Faculdade Pitágoras e uma disciplina ofertada pela Fabra.
No perfil de egresso da Católica de Vitória - única IES que faz menção textual da gestão -, notamos que a função de “gestor” faz parte do campo de atuação previsto para seus discentes. O documento afirma ainda que é preciso “[...] dominar as metodologias de ensino e estratégias de aula, incluindo as novas tecnologias educacionais, considerando os âmbitos do ensino e da gestão”. Isso leva-nos a crer que a temática da gestão escolar é contemplada no curso oferecido. Embora esteja presente no perfil de egresso, a Católica de Vitória não oferece uma disciplina especifica sobre gestão escolar. Contudo, detectamos, na bibliografia da disciplina intitulada “Estrutura e funcionamento do ensino”, o livro Educação escolar: políticas, estrutura e organização, de Libâneo, Oliveira e Toschi (2006), o qual trata, entre outros assuntos, da inter-relação entre a prática docente do professor, a organização das estruturas de ensino e a gestão das escolas.
Identificamos que a Fabra e a Pitagorás ofertam disciplinas que dialogam diretamente com a temática, intituladas em ambas as instituições “Gestão Educacional”. A primeira IES, inclusive, exige a realização de um estágio nessa área. Cabe ressaltarmos que não nos foi fornecido acesso à ementa dessas disciplinas, fato que nos permitiria desenvolver uma análise mais detida.
Em linhas gerais, percebemos que os textos dos perfis de egressos são muito abrangentes, possivelmente pelo interesse das IES em ofertar a formação mais ampla possível, podendo, assim, atender a diversas demandas do mercado de trabalho. É provável que a intenção dessas instituições seja a captação de um maior número de estudantes para seus cursos, tendo em vista que são faculdades privadas.
Aparentemente, o fato de um número crescente de professores de EF assumirem postos na gestão de escolas em Vitória não tem repercutido de modo significativo no currículo dessas IES. Esse fato não se restringe à capital capixaba. Pela nossa trajetória como professores, ex-gestores e pesquisadores na/da EF no Espírito Santo, temos conhecimento de que existem um grande número de docentes com essa formação atuando na direção de escolas em outras redes e como Secretários de Educação em algumas cidades7 do interior do Estado.
Defendemos que os cursos de EF devem oferecer uma formação ampla, em permanente diálogo com as orientações legais vigentes. Com base em Sacristán (2000), compreendemos que o currículo precisa dialogar com as demandas sociais, pois ele se configura como criação social; deve estar, portanto, intimamente ligado ao contexto no qual está inserido. Ainda, segundo o referido autor, nenhum currículo é neutro, pois as pessoas que o compõem estão permeadas por seus próprios interesses e construções históricas, refletindo seus anseios e suas necessidades.
Sobre a repercussão das DCNEF (Resolução CNE Nº 7/2004), por um lado, nos currículos de licenciatura em Educação Física no contexto capixaba, Marques e Figueiredo (2014) destacam que as orientações contidas nessas diretrizes não repercutem de maneira automática ou rígida neles. Para as autoras, os currículos
[...] apresentaram diferentes e ambíguas formas de interpretação das diretrizes curriculares para os cursos de educação física e confirmam o campo de manobra, omissões, interpretações e materialização de dimensões epistemológicas e políticas, para além daquelas sugeridas nas orientações legais (MARQUES; FIGUEIREDO, 2014, p. 40).
Morschbacher e Veronez (2015, p. 112-113), por outro lado, ao estudarem os currículos reformulados após a vigência das DCNEF de 2004 de algumas IES, avaliam que “[...] no processo de seleção do conhecimento, disciplinas são incluídas ou suprimidas (negadas) com base no parâmetro dos espaços de trabalho”.
A discussão sobre gestão escolar parece ser incipiente nos currículos das IES da GV. Ao que tudo indica, embora o campo profissional local tenha sinalizado essa demanda, as IES ainda não potencializaram essa temática na formação de seus discentes. Essa lacuna na formação inicial parece estar repercutindo na necessidade de apostar na formação continuada. A Secretaria Municipal de Educação de Vitória/ES (Seme) vem promovendo formação específica para os professores de sua rede que se propõem a gerir escolas no município. Verificamos na Portaria Seme 019/20178, a obrigatoriedade da participação em um curso instituído como pré-requisito às candidaturas no pleito de 2017 (VITÓRIA, 2017a). A modalidade escolhida fora a semipresencial e totalizou 40 horas de formação. O objetivo geral descrito no projeto era: “Qualificar os profissionais do magistério da rede municipal de Vitória, proporcionando estudos, discussões e reflexões nos processos pertinentes à gestão da escola pública” (VITÓRIA, 2017b, p. 4).
Observamos um movimento que ocorre dentro da administração da educação pública do município em prol de instrumentalizar seus futuros gestores de escolas para as ações que lhes serão imputadas no desempenho da função. Observamos ainda que a formação é destinada a todos os candidatos - professores formados em diversas áreas do conhecimento. Essa ausência de discussões mais sistematizadas e aprofundadas na formação inicial, aparentemente em todas as licenciaturas, pode estar associada à constituição desse “curso preparatório”, para aqueles que desejam concorrer nas eleições.
Ainda que todas as licenciaturas adotassem a dimensão da gestão escolar com mais solidez em seus currículos, isso não excluiria a necessidade de formação permanente para aqueles que se lançam nesse desafio. Para Lück (2009, p. 25), “[...] não se pode deixar de considerar como fundamental para a formação de gestores, um processo de formação continuada, em serviço, além de programas especiais e concentrados sobre temas específicos”.
A formação continuada constitui-se em uma alternativa viável para atualização e qualificação profissional permanente; ao mesmo tempo, ela acaba servindo, recorrentemente, como um instrumento de superação das lacunas diagnosticadas na formação inicial. No caso da relação EF-Gestão escolar em Vitória/ES, parece que prevalece a segunda opção.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A gestão escolar tem se apresentado como possibilidade no campo de atuação profissional do professor formado em Educação Física, especialmente em contextos onde são realizadas eleições diretas para escolha dos diretores escolares. Essa participação é endossada pela legislação que imputa ao professor papel na organização administrativa da escola, desde a elaboração dos projetos à intermediação da relação com as famílias, indicando ser o docente responsável por funções correlatas à gestão em uma visão macro da organização escolar (BRASIL, 1996).
Observamos que as orientações legais para formação de professores de EF vêm gradualmente ampliando o espaço dedicado à gestão escolar. Destacando os apontamentos contidos nas DCNEF, a temática deixa de figurar apenas como “competências e habilidades” (BRASIL, 2004, p. 3), para em sua publicação mais recente aparecer claramente como campo de “estudo e pesquisa” (BRASIL, 2018, p. 5). Compreendemos que esse fato deveria/deve impactar nos currículos de formação de docentes da área.
No campo da produção acadêmica, constatamos um número muito reduzido de publicações na temática que relaciona o professor de EF frente à gestão escolar. O mesmo se repete nas investigações acerca dos currículos ofertados em instituições da Grande Vitória/ES. Os trabalhos encontrados corroboram não somente com nossas observações de que a presença do profissional de EF atuando como diretor de escola se repete em outras regiões do país (até mesmo no exterior), mas também com o fato de esses estudos não considerarem a formação inicial na área como capaz de suprir as necessidades no que tange à gestão escolar.
De acordo com os documentos que orientam os cursos de licenciatura no Brasil, a gestão escolar deve fazer parte dos currículos de formação dos professores que irão atuar na Educação Básica. Entretanto, essa discussão foi percebida de maneira superficial nos perfis dos egressos/matrizes curriculares dos cursos analisados. Com isso, percebemos indícios de que a temática Gestão Escolar tem sido negligenciada pela maioria das IES pesquisadas, onde, mesmo quando mencionada no perfil dos egressos, ocupa um papel periférico na composição do currículo, ficando oculta dentro das matrizes curriculares.
Todavia, fazemos duas ressalvas. Na primeira, observamos que a baixa presença de disciplinas ou de informações no perfil do egresso sobre a gestão escolar não é garantia de que essa discussão seja inexistente nos cursos pesquisados, podendo se configurar como um tema inserido em diferentes componentes da formação, tendo em vista que, em nenhuma das resoluções analisadas mencionam a obrigatoriedade da composição de uma disciplina curricular específica abordando essa temática. Na segunda, verificamos que, mesmo com as atualizações das DCNEF, existe um tempo necessário para que possam ser absorvidas nas reestruturações curriculares das IES que formam os docentes da área; em tempo, consideramos que ainda são muito recentes essas orientações para que possam causar grande impacto na formação.
Analisamos que a baixa produção acadêmica no campo da EF, no que tange à gestão escolar, deve-se a fatores como: os currículos de formação inicial pouco discutem o tema, e parte dos estudos produzidos se localizam em periódicos e programas de Pós-Graduação de outras áreas do conhecimento.
Ainda que em Vitória/ES verifique-se um processo de ocupação considerável de docentes com formação em EF nos cargos de diretores escolares na rede pública, bem como a LDB, as DCN para os cursos de licenciatura e as DCNEF ressaltem a gestão escolar como um dos campos de atuação profissional, isso não vem se materializando de forma expressiva em perfis de egressos e de disciplinas nos cursos de formação inicial nas IES da região metropolitana da GV e na produção acadêmico-científica geral e capixaba.
Identificamos, no âmbito municipal, um movimento formativo que visa instrumentalizar os futuros gestores das unidades de ensino; além disso, observamos que esse curso engloba professores formados em todas as licenciaturas, o que pode indicar duas situações possíveis identificadas pela Seme: a) tentativa de suprir uma lacuna deixada pelos cursos de formação inicial (licenciaturas) de modo geral dentro do campo da gestão; b) fornecer uma instrumentalização básica e específica para atuarem como gestores nessa municipalidade.
Considerando o exposto, indicamos haver uma divergência entre o campo de atuação/orientações e formação em EF/produção acadêmica da área. Em investigações futuras, pretendemos analisar os fatores que têm levado os professores de Educação Física a ocuparem a função de Diretor escolar e suas representações sobre essa posição.