1 INTRODUÇÃO
Pesquisar e estudar o percurso de professoras (es) desde a formação na graduação até a atuação profissional, a partir do ingresso na prefeitura municipal de São Paulo, tendo como foco a alfabetização de crianças, foi o elemento disparador para o início desta pesquisa. A proposta é descobrir os elementos dessa formação que aparecem na prática, uma vez que as indagações surgem à medida que o professor se constitui em sua formação inicial e permanente.
“O que fazer para ensinar? Como alfabetizar? O que propor para as crianças construírem conhecimento?” Uma discussão à luz do construtivismo, fundamentada em recentes pesquisas que envolvem a alfabetização, acrescida de nossas experiências e saberes nesta área, possibilitou a transformação destas indagações em dissertação para o mestrado acadêmico em Educação: Currículo, na linha de pesquisa Formação de Professores da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Nesse sentido, contém estudos e questões relacionadas à alfabetização e formação de professores, alicerçadas em nossas próprias experiências no campo da alfabetização e compromissos com a ciência.
Com o perfil elaborado e à luz de uma concepção de ensino da escrita e da leitura que compreende a teoria psicogenética fundamentada em Emilia Ferreiro e outros teóricos da área da educação, foi possível vislumbrarmos os desdobramentos que as experiências desses sujeitos entrevistados trazem para a prática de alfabetização em sala de aula e visualizar alguns aspectos da formação que aparecem na sua prática. Assim, tivemos um entendimento de algumas necessidades que envolvem o processo de ensino/aprendizagem na alfabetização de crianças do ponto de vista da concepção em que nos pautamos, além de trazer o caminho dos profissionais que ingressam por concurso público na rede municipal de São Paulo, e o processo que envolve o efetivo ingresso na rede municipal, a fim de elucidar o caminho percorrido pelo professor nesta rede e suas implicações para a alfabetização.
O trabalho considerou os conhecimentos dos professores sobre os métodos de alfabetização.
Segundo Braslavsky (1971, p. 37):
[...] ao rever os métodos é importante observar que cada um deles responde a uma orientação psicológica dominante de cada época do seu surgimento e desenvolvimento, assim como as interpretações que respectivamente faziam do processo de aprendizagem.
Além de compartilhar os procedimentos metodológicos utilizados na pesquisa, apresentamos um panorama do percurso das (os) professoras (es) ao ingressarem na Prefeitura Municipal de São Paulo e as implicações relacionadas ao ingresso. A análise de dados e a importância destes para a alfabetização permitiram evidenciar as conclusões à luz de um novo olhar para a contemporaneidade e conhecer o perfil dos docentes alfabetizadores.
2 METODOLOGIA DA PESQUISA
A pesquisa iniciou com a leitura de livros e documentos relacionados à fundamentação teórica acerca de métodos de ensino da leitura, concepções de ensino-aprendizagem da leitura e contextos atuais sobre alfabetização. Também abordamos uma linha histórica para contextualizar a questão que envolve o ensino dos métodos de leitura e a história desse movimento no Brasil, trazendo para a contemporaneidade questões relacionadas à alfabetização de crianças, o ensino da leitura e escrita nas escolas. A leitura do aporte teórico possibilitou a elaboração do questionário da pesquisa.
Num segundo momento, elaboramos um questionário, visando responder às questões iniciais do projeto de pesquisa, para professoras (es) que lecionam em salas de alfabetização (oito), e duas (dois) coordenadoras (es) pedagógicas (os) que realizam formação de professor na rede municipal de educação de São Paulo, na DRE-BT, totalizando dez entrevistadas (os).
As (os) professoras (as) responderam um questionário com perguntas abertas e fechadas a fim de traçarmos um perfil para a obtenção de dados acerca da formação docente e dos aspectos relevantes, desafiadores do ponto de vista das (dos) entrevistadas (os). Também foi considerada, no questionário, a formação inicial para a carreira docente, os aspectos que mais contribuíram, as formações que participaram e quais saberes esses docentes consideram mais relevantes na formação que contribuíram para sua ação docente. De posse desses dados, passamos para uma análise quantitativa e qualitativa.
Para Chizzotti (2017), estabelecer um grupo de pesquisa enquanto sujeitos desta, pressupõe que estes,
[...] elaboram conhecimentos e produzem práticas adequadas para intervir nos problemas que identificam. Pressupõem-se, pois, que elas tenham um conhecimento prático, de senso comum e representações relativamente elaboradas que formam uma concepção de vida e orientam as suas ações individuais (CHIZZOTTI, 2017, p. 103).
Nesse sentido, o grupo de pesquisa em questão já se constitui como produtor de conhecimento, tanto no que diz respeito à vivência, experiência, quanto pela bagagem profissional das (os) professoras (es), uma vez que a docência exige constante aperfeiçoamento e atualização na carreira.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A pesquisa nos trouxe um aporte teórico para a atualidade, pois aborda a questão das ações das (os) professoras (es) alfabetizadoras (es) de maneira a retomar aspectos didáticos que são encontrados até hoje nas práticas docentes. Nesse sentido, permite que façamos uma análise crítica da importância do conhecimento que envolve o processo de ensino-aprendizagem da alfabetização de crianças e também de compreender a relevância das descobertas de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky (1979) para a alfabetização, pois segundo Weisz (inFERREIRO; TEBEROSKY, 1999, p. viii.), as autoras demonstraram que
[...] a questão crucial da alfabetização inicial é de natureza conceitual. Isto é, a mão que escreve e o olho que lê estão sob o comando de um cérebro que pensa sobre a escrita que existe em seu meio social e com a qual toma contato através de sua própria participação em atos que envolvem o ler e escrever, em práticas sociais mediadas pela escrita.
Este foi um aspecto muito importante para a elaboração do perfil das (os) professoras (es) alfabetizadoras (es) em questão desde o seu início de carreira.
3.1 O perfil das (dos) profissionais docentes pesquisadas (os)
A maior parte das (dos) docentes pesquisadas (os) estão na faixa dos 41 aos 45 anos, correspondendo a 30% das (dos) entrevistadas (os). Entretanto, há uma parcela de 40% entre 46 e 50 anos e entre 51 e 55 anos. Entre essas (esses) docentes, não encontramos indivíduos abaixo dos 30 anos em salas de alfabetização.
No gráfico, a seguir, é possível identificar uma relação percentual de faixa etária das (dos) docentes pesquisadas (os).
Das (os) docentes pesquisadas (os) que fizeram magistério no ensino médio, 80% direcionaram suas carreiras para as licenciaturas ao cursar a graduação. Enquanto, 20% concluíram o ensino médio regular para depois ingressarem no curso de Pedagogia. Pode-se observar, nesse grupo, uma tendência daquelas (es) que cursaram o magistério em seguir na área.
Ainda analisando a formação dessas (es) docentes, muitas (os) continuaram a formação ao longo da carreira e realizaram especializações lato sensu e stricto sensu (mestrado), além das formações permanentes em serviço.
O próximo gráfico 2 mostra a relação de formação das (os) docentes pesquisadas (os) a partir do ensino médio até a graduação.
O gráfico 3 mostra a idade das (os) docentes e a quantidade de pós-graduações que estas (es) fizeram. Podemos perceber que 70% das (os) professoras (es) fizeram uma especialização lato senso. Destas (es), 10% realizaram três especializações lato sensu, 10% uma especialização stricto sensu (mestrado) e 30% das (os) professoras (es) não realizaram nenhuma pós-graduação. No grupo pesquisado, não há nenhuma docente com título de doutorado.
Observando a formação permanente das (os) docentes, podemos concluir que essas (es) profissionais continuam investindo ao longo de sua carreira profissional e que são pessoas com experiência profissional e de vida. Nesse grupo, não há profissionais com menos de 34 anos. A partir disso e com o apoio do próximo gráfico, é possível observar outras informações relevantes e ter uma noção de tempo de sua vida que os profissionais trabalham com alfabetização.
O gráfico 4 mostra a relação entre tempo de magistério em sala de alfabetização e idade cronológica, sobrepondo o tempo de experiência com alfabetização (em laranja) e a idade (em azul), revelando que, em relação à idade cronológica e o tempo de magistério com alfabetização, esse grupo é experiente em sua profissão.
Cabe destacar, entretanto, que observamos apenas o tempo no qual a (o) docente permaneceu em salas de alfabetização, excluindo o tempo em outras classes que não as de alfabetização.
O gráfico 5 também traz essa relação de maneira diferente, permitindo visualizar a idade de cada profissional e compreender a relação com a idade cronológica, como, por exemplo, a Cida que tem 41 anos e sete anos de magistério; ou a Cléia, com 53 anos de idade e 21 anos de magistério.
Com a análise das respostas das (dos) professoras (es), foi possível obter informações sobre o que estas (es) profissionais compreendem do início de sua carreira que consideram como saberes essenciais para a sua ação ou desempenho em classes de alfabetização; Sejam as formações permanentes das quais participaram e que consideraram mais relevantes para a prática docente, sejam os saberes/conhecimentos que consideram subsídios necessários para a prática alfabetizadora, como: o conhecimento sobre a construção da leitura e escrita, os fundamentos da psicogênese da língua escrita, o papel da experiência, entre outros.
As (Os) docentes consideraram alguns fatores relevantes em sua formação inicial e nas formações permanentes, tanto em serviço, quanto fora deste, particular. Todas (os) as (os) docentes consideram de grande relevância as formações em seus empregos. Essas (es) profissionais trabalham, no mínimo, 40h semanais (70%) e, no máximo, 70h semanais (30%), sendo que todas (os) efetuaram formação permanente em seus respectivos empregos. 100% das (os) docentes pesquisadas (os) confirmaram que a formação inicial teve relevância em suas atuações e desempenho, e destas (es), 60% destacaram o magistério como fundamental e muito relevante para sua formação.
Sobre o que foi fundamental para atuação e desempenho das (os) docentes pesquisadas (os), podemos concluir que 90% citaram a prática de ensino como aspecto fundamental, 10% se referiram a trabalhos em grupos e 10% consideraram os conhecimentos acerca da psicogênese da língua escrita.
As formações continuadas mais relevantes para a prática alfabetizadora foram: 50% da prefeitura, 20% das particulares, 20% do Programa de Formação de Professores (Profa) e 20% do Letra e Vida, sendo esta uma formação do mesmo Programa, mas em esferas diferentes, uma municipal (Letra e Vida) e outra federal (Profa); 10% se referiram ao Pró-letramento (esfera federal); 30%, ao Plano Nacional de Alfabetização na Idade Certa Pnaic; 10%, ao Currículo da Cidade de São Paulo e 10%, à formação integral dada pelo magistério como acesso à prática na escola de ensino fundamental I. Ou seja, as (os) professoras (es) entrevistadas (os) realizaram diferentes formações, também, em serviço e aderiram a programas propostos pelo governo, tanto na esfera federal quanto na municipal, ao longo de sua carreira e consideraram fundamental os conhecimentos que tiveram (cerca de 80% das/ os entrevistadas/ os).
Para essas (es) docentes, também, foi relevante para a sua formação os cursos que trouxeram um conhecimento específico, 10% se referiram à produção de texto, métodos de alfabetização, consciência fonológica, hipótese de escrita e leitura. Esses saberes se relacionam com os conhecimentos teóricos necessários à prática alfabetizadora que, por sua vez, fundamentam-se em conhecimentos de concepções pedagógicas de ensino/aprendizagem. Dentre eles: 10% elencaram os conhecimentos sobre matemática, jogos matemáticos, prática pedagógica e estágio em sala de aula; 10% se referiram à necessidade de conhecer a concepção de infância, 20% elencaram os conhecimentos étnico-raciais, 10% se referiram à educação de adultos, leitura compartilhada e conhecimentos sobre música, sendo esses conhecimentos considerados essenciais para a prática alfabetizadora.
Considerando os saberes que as (os) docentes elencaram como fundamentais para a (o) professora alfabetizadora, ou seja, aqueles que subsidiam a prática docente: 60% responderam que os conhecimentos sobre alfabetização e letramento foram essenciais. Dos conhecimentos/saberes elencados pelas (os) entrevistadas (os), foram citados: 30% sobre compartilhar o conhecimento; 40% sobre ter domínio do conteúdo; 90% sobre a psicogênese da língua escrita; 20% sobre sistema de escrita alfabética; 20% sobre as modalidades organizativas; 20% sobre rotina e formação continuada; e 10% citaram BNCC, currículo da cidade e magistério. Ainda houve 20% de citações sobre parceria com a família, e 10% sobre: autorreflexão, pesquisa; 50% sobre teóricos da educação, relacionando relação dialógica (Paulo Freire), zona de desenvolvimento proximal (Vygotsky), fases de desenvolvimento das crianças (Piaget), e o ser afetivo (Wallon) e psicogênese da língua escrita (Emilia Ferreiro).
Podemos inferir, pelos modos com que as (os) docentes descrevem os saberes/conhecimentos, que 90% de suas citações têm relação com os estudos acerca dos conhecimentos sobre a psicogênese da língua escrita, o que nos mostra a relevância e importância que esses estudos têm para a prática alfabetizadora. Os conhecimentos elencados mostram a relevância em compartilhar e dominar o conhecimento, além de estabelecer uma rotina e pesquisar.
No que diz respeito aos métodos de alfabetização, o fato de 10% citarem, especificamente, os métodos não reduz a importância desse conhecimento, mesmo porque é possível inferir que a questão dos métodos se traduz nas teorias que as (os) professoras (es) elencaram. Tais informações, de como se constrói o conhecimento, requerem da (o) professora a transposição didática, cujo itinerário da aprendizagem passa por transformações a partir dos diferentes saberes, a prática da ação, o saber da teoria.
A transposição didática pode ser entendida como a passagem do conhecimento científico ao conhecimento ensinado. Esse caminho, contudo, não deve ser compreendido como transposição do saber no sentido limitado do termo: apenas uma mudança de espaço. Sugere-se que o professor descontextualize o conteúdo, [...] (SANTANA; NOFFS, 2016, p. 68).
Os aspectos relacionados à formação que as (os) docentes trouxeram com sua experiência de vida e profissional, também, estão relacionados com as dificuldades encontradas no percurso, uma vez que são construtoras (es) de conhecimento e o fazem à medida que as adversidades encontradas elucidam os aspectos que necessitam melhorar. Nesse sentido, também elencamos as dificuldades encontradas pelas (os) docentes e as sugestões que estas (es) consideram necessárias para melhoria do desempenho na alfabetização. A figura 1, a seguir, mostra o que foi encontrado nessa discussão.
Dentre as dificuldades elencadas pelas (os) docentes, 30% das citações se referem à inexperiência com o planejamento das turmas em relação à diferença dos níveis de conhecimentos, ou seja, saber o que a turma já sabe é uma importante ação para o planejamento da (o) professora (r); 10% relataram a dificuldade em estabelecer uma parceria com gestão escolar e seu envolvimento no trabalho pedagógico, melhor correlação da formação com a prática (30% de citações) e o entendimento da parceria entre gestão escolar e trabalho pedagógico (10% das citações).
A compreensão de que o processo de alfabetização é responsabilidade de todos os envolvidos na comunidade escolar (U.E) também teve destaque (30% das citações). As (Os) docentes também consideraram como um fator de dificuldade o desconhecimento acerca do ensino da leitura e escrita segundo aspectos da psicogênese, uma vez que citaram a dificuldade de fazer sondagem de escrita, o ensino da escrita e da leitura em situações do cotidiano escolar e a dificuldade em propor um trabalho pedagógico nesse sentido, visando atingir o maior número de crianças.
Portanto, consideraram em suas sugestões para a alfabetização: conhecer a psicogênese da língua escrita (40% de citações diretas), promover um ambiente alfabetizador na U.E. (30% de citações), realizar intervenções intencionais visando avanço da escrita e leitura (10% de citações), promover a leitura em voz alta (10% das citações) e fazer uso das modalidades organizativas, visando uma aprendizagem mais significativa (10%).
Todos esses aspectos citados se relacionam com a psicogênese da língua escrita e a teoria que as pesquisadoras Ferreiro e Teberosky3 realizaram (1979).
Outros pontos elencados sobre as dificuldades no início da carreira estão relacionados à clareza do currículo, ao grande número de crianças nas salas de aula e a questões relacionadas com as vulnerabilidades sociais (10% de citações de cada um desses aspectos). Ou seja, o início de carreira dos docentes foi cercado de dificuldades que não se relacionam diretamente à formação que lhes foi oferecida na graduação ou magistério, mas são configurações da vida cotidiana e reflexo da desigualdade social que atinge o universo escolar e do qual, na maioria das vezes, só é ensinado diante da prática escolar, nas vivências, em momentos de troca com os pares e/ou formações permanentes em serviço. Esses aspectos são igualmente entendidos pelos docentes em suas sugestões, pois consideram importante a formação permanente em serviço - políticas públicas - (20% de citações); educação integral (20%) e acolhimento das crianças de 6 anos e suas famílias (30%).
O início da carreira também apresenta para a (o) docente dificuldades relacionadas à distância da residência e o difícil acesso à unidade escolar (10%); o que se relaciona com a necessidade de políticas públicas e valorização dos profissionais da educação (20%).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Alfabetizar, sim, mas sabendo que a criança, sujeito da aprendizagem, é um ser pensante; que a ação educativa pode apelar para a sua inteligência, exatamente para não inibir a reflexão nascente” (FERREIRO, 2013, p. 33).
A formação de professores alfabetizadores é um tema fundamental para estudo no que diz respeito ao que eles podem proporcionar às crianças. Ensinar a ler e a escrever é abrir um caminho para a autonomia das crianças, é acreditar que todos podem se desenvolver e valorizar a relação entre a (o) professora (r) e a (o) estudante. É ter um olhar atento e uma escuta afetiva para essa (e) estudante.
Diante de tamanho desafio, são importantes e necessários os estudos e as pesquisas voltadas à atuação docente. Desse modo, evidenciamos por meio de nossa pesquisa que as (os) professoras (es) alfabetizadoras (es), que possuem uma base em conhecimentos adquiridos em sua formação no magistério (formação em nível de ensino médio), além de terem uma grande experiência em salas de alfabetização também consideram como fundamentais as experiências com o estágio para entender a realidade, caracterizando-se como início da profissionalidade docente. Conforme explicitam Noffs, Lizardo e Silva (2019, p. 121-131):
Defendemos a ideia de que os estudantes devem ter consciência de que o estágio é uma oportunidade de se constituírem bons profissionais e de vivenciarem situações cotidianas, mantendo uma relação estreita com os docentes e demais colaboradores. Dessa forma, a prática de estágio lhe permite compreender que teoria e prática são indissociáveis, haja vista que ambas contribuem para o sucesso da aprendizagem. O contexto escolar torna-se espaço de formação e transformação, lócus onde discente e docente, juntos, produzem saberes. (grifo nosso)
A reflexão que podemos ter acerca de tal consideração é de que é preciso pensar em formas contemporâneas de trazer os conhecimentos do magistério (formação em nível de ensino médio) e valorizar esse segmento de ensino. Promover uma iniciativa de formação para o início da profissionalidade docente, já que, nesse sentido, percebemos as vozes das (os) docentes. Essa relação também aparece no que diz respeito à valorização das trocas de experiências, da parceria, da solidariedade no cotidiano, enquanto um estímulo à confiança e ao autoconceito da (o) professora (r), à medida que ela (e) colabora com o outro.
Para nós, é necessário rever esse aspecto da formação inicial, agregando valor às graduações de pedagogia e licenciaturas e fomentando um início de carreira em conjunto com essas formações.
As análises realizadas nos mostraram a importância dada às formações permanentes pelas (os) professoras (es) alfabetizadoras (es), uma vez que todas (os) elas (es) realizaram formações em seus locais de trabalhos e 70% ainda fizeram especializações lato sensu e stricto sensu, deixando evidente a preocupação inerente com a profissão, a constante busca pela melhoria do trabalho pedagógico e a atualização profissional. Cabe destacar que tais capacitações são realizadas, apesar das longas jornadas de trabalho semanais.
As formações permanentes ofereceram um valor significativo para essas (es) profissionais, principalmente os programas dos governos, Letra e Vida, Profa, Pnaic e os oferecidos pela Secretaria Municipal de São Paulo. São programas que, cada um em sua esfera - municipal, estadual ou federal -, oportunizaram o desenvolvimento de conhecimentos elencados pelas (os) professoras (es) como essenciais e complementares em relação aos saberes necessários à alfabetização, demonstrando a importância das políticas públicas voltadas à alfabetização. Essas formações permanentes devem valorizar não só a questão conceitual, mas simultaneamente o ambiente onde o afeto, a solidariedade, a ludicidade e a imaginação ocorram de forma articulada.
Segundo Marcelo García (1999, p. 29),
A formação de professores, tanto inicial como permanente, deve ter em conta a reflexão epistemológica da prática, de modo que aprender a ensinar seja realizado através de um processo em que o conhecimento prático e o conhecimento teórico possam integrar-se num currículo orientado para a ação.
Em nossa análise, foi possível inferir que as (os) docentes consideram importantes e fundamentais os conhecimentos acerca da psicogênese da língua escrita e os estudos de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky. Além disso, valorizam a importância de conhecer as formas com as quais as crianças elaboram hipóteses sobre a escrita, o conhecimento sobre o sistema de escrita alfabética, o desenvolvimento de ações e práticas que busquem inserir a criança em contato com a escrita em seus usos e funções sociais, a criação de um ambiente alfabetizador em sala e na própria unidade escolar, o trabalho com leitura de textos pela (o) professora (r), os conhecimentos e os usos das modalidades organizativas, o conhecimento do currículo, por meio do desenvolvimento do trabalho em grupo de maneira significativa.
A precisão teórica com que falam, nos permite inferir uma vasta clareza da teoria e uma preocupação genuína com a prática alfabetizadora. Nesse sentido, podemos dizer que, para essas (es) profissionais da educação, a didática dos conhecimentos (científicos) que possuem pode ser transformada em conhecimentos educativos, uma vez que a “[...] a transposição didática inclui questões relativas ao que ensinar, como ensinar e por que ensinar determinado conteúdo e não outro, [...] como ajudar o aluno a aprender” (SANTANA; NOFFS, 2016, p. 69).
A alfabetização de crianças é considerada como um processo que necessita de estímulo e intervenção para que aconteça e não pode ser descontextualizada da realidade, pois é preciso que seja significativa, que faça parte do contexto escolar e das práticas sociais.
Desse modo, para nós, essas (es) docentes conhecem bem as teorias que as (os) subsidiam, refletem sobre esses conhecimentos e buscam, em suas formações permanentes, o “alimento” necessário à prática educativa em salas de alfabetização.
As (os) professoras (es) convivem com essas práticas no coletivo que são, na maioria das vezes, exitosas, porém nossa pesquisa identificou a necessidade de se estudar situações que permitam reelaborar conhecimentos para a prática pedagógica de alfabetização. Os dados evidenciaram que esses docentes da rede municipal de São Paulo passam por formações ao longo de sua carreira. Entretanto, ao ingressarem, devido ao sistema vigente, assumem salas que estão disponíveis, nem sempre conseguindo atuar de forma a exercer sua bagagem teórica e prática, já que o modo vigente não atende aos interesses de cada profissional.
Assim, a (o) professora (r) só consegue permanecer no ciclo de alfabetização, escolhendo as salas de 1º e 2º anos após terem fixado sua lotação numa unidade escolar e acaba permanecendo nesta por muitos anos, até que tenha pontuação necessária para escolher primeiro em uma ordem classificatória. Para nós, esse aspecto limita a alfabetização em sua profissionalidade e especialidade, impossibilitando que todas as salas de alfabetização tenham as (os) profissionais mais bem preparados para esse fim específico.
Nesta pesquisa, percebemos que, para a alfabetização acontecer sem lacunas, é necessário que a (o) docente conheça seu objeto de ensino, as especificidades desse objeto, as estratégias e metodologias para o ensino e que esteja sempre se atualizando com as novas teorias e estudos, respeitando o perfil do aluno inserido na instituição a partir do contexto vivido.
Inferimos, também, que as lacunas existentes na formação podem estar relacionadas ao ingresso na docência nessa rede, uma vez que não existe uma equipe de docentes que permaneça sempre no ciclo de alfabetização, numa mesma unidade, dada a maneira como ocorrem as atribuições de sala nesse sistema de ensino. Embora as formações caminhem no sentido de atender às necessidades do coletivo, identificamos lacunas que subsidiam um olhar inclusivo e singular, um olhar para os alunos desse processo. Esse é o desafio para a formação das (os) professoras (es) alfabetizadoras (es).