1 INTRODUÇÃO
O presente texto delineia algumas reflexões sobre a Língua Brasileira de Sinais2 (Libras) e sua inserção como disciplina obrigatória3 nos cursos de Formação de Professores e de Fonoaudiologia, com base em documentos legais que a regulamentam (Decreto 5.626/2005).
Abordamos essa temática a partir das modalidades de ensino e aprendizagem em plataformas virtuais, considerando como referência para esta reflexão a análise das experiências implementadas com a disciplina de Libras no Curso de Pedagogia e distintas licenciaturas em EaD, desenvolvidas pelo Instituto Virtual. Metodologicamente, sistematizamos a escrita a partir dos grifos de nossa memória-narrativa, em notas etnográficas, sobre essa implementação, apresentando os objetivos referendados, as metas, as concepções, as intenções pedagógicas que estão a materializar tais elaborações.
Segundo o Censo do IBGE de 20204, cerca de 10 milhões de pessoas - apresenta deficiência auditiva ou algum grau de surdez5, requerendo esse contingente populacional ser atendido pelas políticas públicas, sociais e educacionais. Nesse sentido, a comunicação, a expressão, as interações e os processos sociais e educacionais da comunidade surda passam também pela necessária aprendizagem da Libras por toda a comunidade de ouvintes, com vias ao estabelecimento das situações sociocomunicativas. No âmbito da formação profissional em nível superior, é preciso prover tais competências no domínio da Libras, fundamentalmente para atuação futura com os sujeitos com surdez.
2 LÍNGUA DE SINAIS E O RECONHECIMENTO DO IDIOMA VISUOESPACIAL DAS COMUNIDADES SURDAS
Os sinais, essa dança das palavras no espaço, são minha sensibilidade, minha poesia, meu eu íntimo, meu verdadeiro estilo [...] utilizo a língua dos ouvintes, minha segunda língua, para expressar minha certeza absoluta de que a língua de sinais é nossa primeira língua, a nossa, aquela que nos permite sermos seres humanos “comunicadores” (Laborit, 1994, p. 9).
A epígrafe supra demonstra quão importante é para os surdos expressarem-se em Língua de Sinais (LS) e denota que esta se constitui em uma língua legítima, como fenômeno de interação e de constituição de hominização, em sentido vigotskiano. A língua, nessa perspectiva, não é meramente intermediária das relações entre os sujeitos, uma vez que encerra uma relação simbólica, semiótica, entre nosso pensamento e o mundo. Esse fenômeno linguístico é, por excelência, fenômeno humano.
Nessa relação, distintos fatores estão envolvidos, desde aqueles concernentes ao próprio sistema da língua (incluindo as normas pragmáticas; a polissemia; a semântica; a relação entre língua e discurso e interdiscurso etc.), as dimensões biológicas e psíquicas das quais são dotados os sujeitos (filogênese), a qualidade das interações humanas, as trocas simbólicas e intersubjetivas da linguagem, a cultura e a sociedade (sociogênese), em seus referentes discursivos antropológico-culturais.
A LS é considerada a língua natural dos surdos por surgir e se desenvolver espontaneamente no seio de sua comunidade de falantes (Magnani, 2007) os surdos e ouvintes proficientes. De acordo com Quadros e Schmiedt (2006, p. 15-16):
As línguas de sinais são consideradas línguas naturais e, consequentemente, compartilham uma série de características que lhes atribui caráter específico e as distingue dos demais sistemas de comunicação [...] são, portanto, consideradas pela linguística como línguas naturais ou como um sistema linguístico legítimo, e não como um problema do surdo ou como uma patologia da linguagem.
O reconhecimento do status linguísticos LS é proveniente das pesquisas no campo das ciências sociais e, principalmente, dos estudos linguísticos contemporâneos. Apesar de a historiografia trazer poucos registros acerca do desenvolvimento das línguas de sinais, alguns escritos indicam o uso de sinalização6, por distintas razões, para as pessoas se comunicarem, desde os tempos antes de Cristo7.
A aquisição do status linguístico de tais línguas ocorreu a partir dos estudos de William Stokoe, ao longo da década de 1960, quando esse linguista publicou a primeira descrição estrutural da Língua Americana de Sinais (ASL). Assim, o autor, ao fazer analogia com as línguas orais, propôs uma análise em unidades mínimas (queremas/quiremas) 8, além de comprovar sua formação morfossintática (Pimentel-Souza, 2008, 2021).
Portanto, não somente como modo de interação, mas também como uma língua legítima, a “Língua Brasileira de Sinais”, a partir da “Lei de Libras”, passou a ser considerada como a “[...] forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constitui um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil (Brasil, 2002).
No contexto brasileiro, aliada aos estudos (Pimentel-Souza, 2008, 2021) acadêmicos e aos diplomas normativos contemporâneos, e em grande parte pela força das reivindicações da comunidade surda, a Libras foi reconhecida em nível federal a partir de 24 de abril de 2002 (Lei 10.436) e regulamentada em 22 de dezembro de 2005 (Decreto 5.626). Esse Decreto traz implicações importantes ao reconhecimento social e a garantia de direitos aos sujeitos surdos.
Assim, entre as contribuições que decorrem dos documentos legais destacamos a obrigatoriedade da inclusão da disciplina Libras no currículo dos cursos de formação de professores e Fonoaudiologia, em níveis médio e superior, nas instituições públicas e/ou particulares de ensino. Considerando o art. 9.º do Decreto 5.626/2005 (Brasil, 2005b), as instituições de ensino deveriam incluir a disciplina, nos seguintes prazos estabelecidos, em etapas/percentuais: I - até três anos, em vinte por cento dos cursos da instituição; II - até cinco anos, em sessenta por cento dos cursos da instituição; III - até sete anos, em oitenta por cento dos cursos da instituição; e IV - dez anos, em cem por cento dos cursos da instituição.
Para atender ao que estabelece o referido Decreto, o governo federal ofereceu, em 2006, na modalidade semipresencial, o curso de licenciatura em Letras-Libras em nove polos brasileiros9, tendo como polo central a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Posteriormente, em 2008, ampliou para mais polos10 em uma oferta de duas habilitações, licenciatura e bacharelado. O objetivo principal era o de formar profissionais para atuarem na educação de surdos, seja no ensino de Libras ou como tradutores intérpretes de língua de sinais-português (TILSP). Além dessa medida, visando a difusão da Libras, o Ministério da Educação e a UFSC passaram a realizar o exame Prolibras11.
As experiências pioneiras da UFSC, portanto, contribuíram para a formação de 1.079 profissionais em todo o Brasil12, professores e intérpretes, os quais trabalham na Educação Básica e Ensino Superior, além de colaborarem com pesquisas e trabalhos na área da educação de surdos e estudos linguísticos da Libras. Os egressos do Letras-Libras, com profissionais bilíngues (Libras-Português), de posse da certificação do Prolibras ou com Especialização lato sensu em Ensino de Libras, vêm atuando também nas demandas de ensino de Libras dos cursos semipresenciais e EaD, em atendimento à legislação.
3 A DISCIPLINA DE LIBRAS NOS CURSOS DE LICENCIATURAS EM EAD DO INSTITUTO VIRTUAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
A Universidade Federal do Ceará oferece a disciplina Libras inserida em seus cursos presenciais (a partir de 2009) e em EaD (a partir de 2011.2), no âmbito do Instituto Virtual, em parceria com a Universidade Aberta do Brasil, e dispõe de sete cursos de licenciaturas (Letras-Inglês, Letras-Português, Letras-Espanhol, Química, Física, Matemática e Pedagogia) e um de bacharelado (Administração com Foco em Gestão Pública), os quais beneficiam mais de cinco mil estudantes em várias regiões do estado do Ceará18. Em todos esses cursos, a disciplina Libras é ofertada. Trata-se dessa experiência que, oportunamente, colocamos em análise.
Na contemporaneidade, entre os tantos percalços próprios dos ambientes educativos, a globalização adiciona mais um desafio ao professor: o de conhecer, ao menos minimamente, a seara das novas tecnologias de informação e comunicação (TIC), suas ferramentas e princípios fundantes. Quando se trata de educação a distância, as mudanças atitudinais e a adoção de novos paradigmas ao educador/educandos passam a ser uma necessidade, em particular, nesse contexto, também no domínio de outra língua.
Na formação de professores, por exemplo, essa necessidade torna-se prioridade, principalmente se considerarmos o compromisso de superar o analfabetismo funcional no público em que se encontram os educandos surdos, daí mais uma relevância da disciplina Libras para a formação de professores, notadamente. Desse modo, é condição sine qua non hoje posta aos educadores que sejam proficientes em Libras e tenham a devida formação docente para ensinarem tal idioma, seja como primeira (L1) ou segunda língua (L2), de forma a reunir conhecimentos para lidar com estudantes surdos, mesmo com a presença do intérprete, como no caso das escolas comuns do ensino.
No contexto do Instituto Virtual, a disciplina Libras foi ofertada nos polos distribuídos em dez municípios do interior do estado Ceará, inicialmente para o curso de Licenciatura em Letras-Português (semestre de 2011.2). A priori, os desafios pertinentes a tal modalidade ocorreram em função do tempo e do objeto de conhecimento específico, a Libras, pois o tempo para produção dos textos para as aulas, atividades de portfólios, temáticas e discussões a serem lançadas em fóruns e chats foi um dos primeiros desafios, em meio aos recursos do ambiente virtual e à especificidade de se colocar on-line uma língua visuoespacial, a se realizar em período de aproximadamente um mês.
O conteúdo programático dessa disciplina foi pensado de modo a favorecer aos estudantes informações sobre a escolarização das pessoas surdas, bem como acerca da cultura e identidade surdas, além das especificidades relacionadas ao profissional TILSP, e a aprendizagem da Libras. Para o desenvolvimento das aulas, tivemos a participação de dois bolsistas surdos, estudantes do curso de Licenciatura em Letras-Libras (UFSC/polo da IES UFC, que colaboraram também com encenações de diálogos gravados em vídeos a serem incluídos na finalização de cada aula do ambiente virtual.
A disciplina se desenvolveu por meio das interações teóricas oportunizadas pelas ferramentas disponíveis no AVA da plataforma Solar, articulando outros recursos/TICs, como vídeos com o conteúdo e demais explicações pertinentes e atividades teórico-práticas (solicitadas aos estudantes e também experimentadas nos encontros presenciais).
A seguir, apresentamos, a título de ilustração, a execução da produção do material disponibilizado no Solar, cujas aulas abordavam a aplicabilidade funcional da Libras e suas características gramaticais. A sinalização, desse modo, é demonstrada por meio dos diálogos entre os estudantes-atores dos vídeos, em diferentes contextos, e aprofundada pelos tutores nas interações e estudos promovidos no ambiente virtual.
Nas imagens acima, diálogos das aulas 1 e 4, em que apresentam sinais de situações cotidianas.
Fonte: http://www.solar.virtual.ufc.br.
Além desses dois discentes, contamos também com outra estudante, à época, em 2011, do curso de Bacharelado em Letras-Libras, já com vasta experiência profissional em tradução e interpretação de Libras-Português, tendo contribuído com a tradução dos diálogos em Libras que aparecem nos vídeos, quando é ativada a legenda oculta.
Também disponibilizamos em vídeo a interpretação da Apresentação da Disciplina14, em que uma estudante se posiciona sinalizando ao lado da coordenadora/professora conteudista da disciplina que explana em português oral (cena disponibilizada a seguir, na Imagem 3). Há também na abertura do módulo-aula a explanação em Libras15 sobre os objetivos, procedimentos e as atividades desse componente curricular, em linhas gerais (Imagem 4).
A utilização de tal estratégia e recurso faz-se por compreensões político-ideológicas e também em função de ilustrar aos discentes o papel do intérprete de Libras, bem como com a intenção de valorizar o aspecto visual da Libras. Por isso, a inclusão de pequenos vídeos com traduções em Libras no corpo da disciplina, além da solicitação para produção de pequenos vídeos em Libras aos discentes e tutores, feitos com uso de webcam, estimulando as interações sociolinguísticas entre os sujeitos na LS.
Como o AVA não comporta possibilidades de interações visuais, nem suporta materiais em vídeos em maior quantidade, restringimo-nos, inicialmente, àqueles da Apresentação, dos diálogos, e aos ilustrativos quanto a alguns aspectos gramaticais da Libras.
Na Imagem 5, apresentamos mais um desses momentos didáticos, no caso, explicações em videoaulas sobre verbos, também sediado no ambiente virtual:
A bolsista do curso apresentando exemplos de Verbos da Libras.
Fonte: http://www.solar.virtual.ufc.br.
Dando continuidade à exposição do desenho didático-metodológico e conceitual do curso, expomos o objetivo de promover o contato direto dos graduandos dos cursos do Instituto Virtual com os nativos da Libras. Os tutores da primeira iniciativa - dez turmas do curso de Letras-Português (2011.2) - eram todos(as) surdos(as), acompanhados(as) de TILSPs. Esses tutores-surdos eram estudantes de Letras-Libras e possuíam certificação do Prolibras, que habilita para o ensino, tradução e interpretação. Nos semestres seguintes e na continuidade dessa oferta, parte dos tutores-surdos assumiu atuações profissionais em outras instituições e, assim, não dispuseram mais de tempo para essa colaboração, o que exigiu que ampliássemos o quadro de tutores também para ouvintes, considerando os requisitos de já acumularem experiência como intérpretes e possuírem graduação em uma licenciatura afim, além de certificação do Prolibras, conforme previsto na legislação17, com prioridade dada aos graduados do curso Letras-Libras.
Chamamos a atenção para a riqueza e, ao mesmo tempo, o desafio contidos nessa experiência: nas interações dos fóruns, chats e atividades avaliativas, por exemplo, portfólios, todos estavam lidando diretamente com o português escrito (L2 para o tutor-surdo e L1 para os graduandos); os encontros presenciais também se apresentavam como um momento extremamente rico em trocas, pois eram realizados pelo tutor-surdo (que tinha a Libras como L1) e pelo intérprete (Libras como L2), em interações face a face com os graduandos em aprendizagem da Libras e de suas questões pedagógicas. Consideramos também significativa, no desenho didático do curso para a aprendizagem de graduandos em formação, a imersão na língua possibilitada por meio da convivência e interação com sujeitos surdos. Nesse caso específico, intencionamos promover o encontro dos atores e das línguas veiculadas - a Libras e o português escrito, além da superação das “limitações da linguagem virtual e do espaço do AVA”, no caso do Instituto Virtual, o Solar e suas limitações já inerentes18.
Por outro lado, destinamos exímia atenção à superação dos desafios salientados por Belloni (2011) quanto à tradução das mensagens pedagógicas. Para tanto, estimulamos as interações dos discentes com tutores no Solar e o uso de diversos aplicativos das redes sociais em português escrito, bem como a ativa participação dos graduandos (ouvintes), especificamente em Libras, nos encontros presenciais. Aqui também reside a defesa da existência/manutenção de encontros presenciais, sob a forma de aulas de laboratório em Libras. Esse momento didático nos permite realizar as avaliações de compreensão de Libras - aquelas que em línguas orais são as avaliações “auditivas”, sempre por meio de projeção no telão das autogravações dos graduandos, em vídeos, seguindo o modelo dos exames do Prolibras, bem como das avaliações de expressão (teste “oral”), conforme podemos conferir nas Imagens 6 e 7:
Também utilizamos os glossários de outro projeto que desenvolvemos, o Rede Surdos-CE - Sinalário Escolar e Acadêmico19. Buscamos, portanto, otimizar as inter-ações dos discentes entre si e com os tutores, entre tais pares e os textos on-line, e de todos com a língua-alvo - a Libras. Salientamos que o principal veículo dos conteúdos no Solar e em outros cursos em AVA é o texto escrito, e sobre esse aspecto Cabral (2008, p. 162) cita Fayol (1992) ao salientar que, do ponto de vista linguístico:
A compreensão de um texto, da qual depende o bom desenvolvimento do curso, é mais fácil ou mais difícil em função da relação que se estabelece entre os conhecimentos linguísticos do leitor e os conhecimentos linguísticos que são exigidos para abordar cada passagem do texto; inclui-se nesses conhecimentos certo domínio do léxico da área específica de conhecimento na qual se insere o curso.
É preciso reconhecer, ainda, que as experiências vivenciadas (de 2010 a 2013), em particular, apontaram para a necessidade de formar os tutores, visto que eram eles quem atuavam diretamente na mediação pedagógica da disciplina. Assim, apresentavam-se como demandas a suprir questões de planejamento e a tematização das especificidades quanto ao ensino da Libras e as interações na EaD, além de outras situações ligadas ao cotidiano dos diferentes polos (tanto pedagógicas quanto da gestão da disciplina e/ou relativas as lacunas da plataforma e dificuldades da EaD).
No tocante ao ambiente virtual, a familiaridade prévia dos tutores com os recursos em EaD foi um elemento positivo, pois todos eram também estudantes de um curso semipresencial - o Letras-Libras da UFSC/Polo-IES UFC Entretanto, a necessidade de um curso específico de “Formação de Tutores” para a especificidade e natureza dessa atividade despontou fortemente, uma vez que os cursos de Formação de Tutores já ofertados pelo Instituto Virtual não atendiam as especificidades dos tutores-surdos, dos nativos na Libras, nem dos TILSPs, com vias ao desenvolvimento satisfatório de uma disciplina desse tipo.
Nesse aspecto, tínhamos um grande desafio: formar tutores para atuarem em uma disciplina dessa natureza e, especificamente, nessa modalidade; uma dupla tarefa. Assim, criamos, como projeto de extensão, um curso intitulado “Formação de Tutores Bilíngues e Tutores TILSPs em EaD”. A Formação contou com os textos básicos dos cursos clássicos de formação de tutores, já promovidos pelo Instituto UFC Virtual, acrescidos de textos específicos sobre a tutoria na área de Libras, disponibilizados no ambiente Solar. Esse curso figurou como atividade integrada, complementar e exigência obrigatória à atuação de tutor em referida disciplina.
Vale ressaltar que os fundamentos teórico-conceituais do trabalho realizado têm sede, principalmente, nos postulados de Bakhtin (1997) e Vygotsky (1993), quando entendemos que as formas do signo dependem tanto da organização social dos indivíduos envolvidos em um processo de interação quanto das condições em que tal interação acontece. Isso porque os signos resultam das trocas estabelecidas entre indivíduos socialmente organizados, e destes com o meio e com os objetos de conhecimento e da apropriação no decorrer de um processo de interação.
Desse modo, na especificidade da EaD, os sujeitos envolvidos vão estabelecendo trocas tanto na aprendizagem do objeto em si do componente curricular quanto do domínio progressivo das tecnologias em uso nas especificidades da EaD, com implicações extensivas à promoção do letramento digital desses aprendentes.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O eixo central que direcionou a tessitura deste texto foi o universo, particular, do processo de aprendizagem que envolve (i) as múltiplas linguagens possibilitadas no ensino em EaD; (ii) duas culturas distintas - a dos estudantes ouvintes e a da comunidade surda; (iii) duas línguas - a Libras, língua objeto do componente curricular, e o português escrito - modalidade linguística priorizada no AVA.
Na reflexão procedida, reconhecemos que a EaD encerra a possibilidade de formação das pessoas de diferentes e longínquos lugares, em territórios de difícil acesso ou que apresenta escassez de profissionais da área, aproximando culturas e propiciando o conhecimento e o uso das TICs. Outrossim, também explicitamos os desafios.
No trabalho com a disciplina Libras no Instituto Virtual de ensino superior, em questão, foi necessário descobrir e utilizar outros meios além daqueles à disposição comumente em ambiente virtual, objetivando não somente contribuir com um processo de ensino e de aprendizagem da Libras, mas também aproximar o “mundo ouvinte” da realidade dos sujeitos surdos, pertencentes a uma cultura visuoespacial diferente da sociedade de maioria ouvinte.
A perspectiva de trabalho desenvolveu-se no sentido de promover aos graduandos das licenciaturas vivências que pudessem formá-los para atuação futura, em sala de aula com educandos surdos, seja em escola específica (bilíngue e/ou especial) ou de inclusão.
Referida disciplina é obrigatória por força de lei, todavia a legislação não estabelece parâmetros ou diretrizes que a orientem na realização pedagógica dentro das IES, ficando as instituições e seus professores “livres” para a definição da abordagem metodológica e conteúdos dos Programas da disciplina, inclusive da carga horária.
A falta de uma diretriz faz com que as instituições “cumpram” a legislação, embora ofertando conteúdos e carga horária variados, de 32 h/a a 96h/a, ou, ainda, articulados a outras áreas consideradas afins como Língua Portuguesa ou outra língua estrangeira, ou ainda com disciplinas da Educação Especial, entre outras, o que consideramos um equívoco que não atende a necessária demanda formativa para a profissionalidade.
De fato, delineiam-se exigências para discussões mais amplas sobre saberes e metodologias, além da urgência de mais trocas e debates entre pesquisadores, professores e estudantes em formação, considerando também o reconhecimento dos estudos surdos e as expectativas dos sujeitos de direitos.