Introdução
Este texto objetiva debater sobre a entrada do setor privado na educação e como ele redefine o setor público e intervém nas políticas e práticas educacionais. Para tal feito apresentamos a relação público-privada entre o Sistema de Ensino Aprende Brasil (SEAB), do Grupo Positivo, e a Secretaria Municipal de Educação de Gravataí/RS, discutindo sobre os processos de privatização.
Conforme Peroni (2018), a relação entre o público e o privado na educação não se limita apenas à propriedade, mas também precisa ser entendida como um projeto societário, estando vinculado ao mercado com um intenso impacto para a construção de uma sociedade democrática.
A construção de uma sociedade mais justa e democrática passa necessariamente pela educação, entendida e garantida constitucionalmente como um direito público de todos e mantida pelo Estado, mas que vem paulatinamente disputando espaço com o setor privado, por meio das reformas neoliberais que permitem o ingresso de instituições privadas e da lógica mercantil no campo educacional.
A influência do setor privado sobre o sistema público, conforme Peroni (2018), está na passagem do público para o terceiro setor ou mesmo para o privado, seja com repasse da propriedade, seja com a permanência da direção da esfera pública, mas assumindo a lógica do mercado. Para entender esse movimento, apresentaremos em três partes, neste artigo, como isso ocorre. A primeira parte visa compreender como a reforma do estado brasileiro cria condições favoráveis para os processos de privatização em educação. A segunda parte do texto busca entender como ocorre a privatização na e da educação (RIKOWSKI, 2017), e na terceira parte apresentaremos a materialização desse processo por meio da parceria público-privada entre o Grupo Positivo e Gravataí, município da região metropolitana de Porto Alegre, no estado do Rio Grande do Sul.
O público e o privado na educação e a relação com a reforma do Estado
A relação entre o público e o privado na educação materializa-se num contexto de correlação de forças na sociedade, num momento particular do capitalismo, em que não é o Estado quem determina as relações econômicas, mas é por elas determinado.
Para entender esse momento particular do capitalismo, faz-se necessário retroceder algumas décadas na história, e entender o movimento pós segunda guerra, no qual o controle do trabalho, das tecnologias, dos hábitos de consumos e das configurações de poder político-econômico formularam sua base. O crescimento econômico e social, resultante desse movimento, transformou profundamente a sociedade.
Para obter lucros mais seguros, o capital corporativo ajustou sua força de trabalho organizado, assumindo novos papeis e funções relacionadas ao desempenho do mercado e processo produtivo (HARVEY, 1989). O fordismo se expande mundialmente e os Estados Unidos conseguem domínios geopolíticos e alianças militares para relações de poder.
As políticas foram direcionadas para outras áreas de investimento e o estado capitalista passou a assumir diferentes obrigações com uma crescente produção em massa de mercadorias. Com a produção em massa, as políticas sociais se redirecionam e garantem, mesmo que relativamente, um pleno emprego aos trabalhadores. Governos complementavam o salário social através da seguridade social, assistência médica, educação, habitação etc. O Estado regulava direta ou indiretamente os acordos salariais e os direitos trabalhistas na produção.
Para Harvey (1989) configura-se, nesse contexto, o Estado de Bem-Estar Social, sendo importante salientar que este não ocorreu da mesma forma em todos os países e, conforme Lumertz (2008, p. 21) “[...] mesmo naqueles países onde o capitalismo era mais desenvolvido, ele não conseguia atingir a todos os trabalhadores”.
Mas a produtividade e a lucratividade entraram em queda o que ocasionou uma crise fiscal, acelerando a inflação e prejudicando o dólar como moeda-reserva internacional estável. Era o indício de que o poder estadunidense de regulamentação do sistema financeiro internacional estava sendo reduzido.
Conforme Lumertz (2008, p. 22),
A Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) aumenta os preços do petróleo e os árabes embargam as exportações de petróleo para o Ocidente, durante a guerra árabe-israelense em 1973. Buscou-se com isso uma economia de energia através da mudança tecnológica e organizacional, levando ao problema da reciclagem de petrodólares excedentes, desestabilizando os mercados financeiros mundiais.
A economia capitalista passa a vivenciar uma crise e passa por um processo de reestruturação do capital que teve como finalidade a recuperação de seu ciclo de produção. As estratégias lançadas pelo capital para se reerguer foram o Neoliberalismo, a Terceira Via, a Globalização e a Reestruturação Produtiva.
Para fins deste artigo focaremos no Neoliberalismo, pois entendemos que ele é parte fundamental para compreendermos a relação entre o público e o privado na educação hoje.
Neoliberalismo, reforma do Estado e educação
Para o Neoliberalismo o Estado passa por uma crise porque ao atender as políticas sociais ocorreu um aumento de gastos públicos ocasionando a crise fiscal. A solução para a crise, portanto, seria a fragilização da democracia por meio da privatização e da desregulamentação, o que provocaria o desmantelamento do Estado, ou seja, o Estado mínimo. Peroni (2006, p. 14) alerta que esse Estado mínimo é proposto somente para as políticas sociais, pois acaba sendo “[...] máximo para o capital, pois, de um lado, ele é chamado a regular as atividades do capital corporativo no interesse da nação [...]” e por outro, é preciso criar um “[...] bom clima de negócios para atrair o capital financeiro transnacional e global e conter (por meios distintos dos controles de câmbio) a fuga de capital para pastagens mais verdes e lucrativas” (PERONI, 2006, p. 14). As políticas sociais passam por um processo de privatização que acabam alterando o papel do Estado para com as políticas sociais, já que racionaliza recursos e esvazia o poder de instituições públicas num projeto claro de sociedade sob a égide capitalista.
A crise de 2008 do neoliberalismo, para Puello-Socarrás (2008), estaria trazendo uma atualização local e global do próprio neoliberalismo e não seu fim. É importante ressaltar que a crise de 2008 deu novas particularidades ao neoliberalismo com as reformas de segunda geração do Consenso de Washington redefinindo o papel do Estado de um Estado mínimo para um Estado essencialmente empresarial e trouxe relações com o neoconservadorismo que acabam por redefinir as fronteiras entre o público e o privado que se materializam em políticas sociais, sobretudo as educacionais para promover,
[...] un dominio que desvincula ‘lo público’ de ‘lo estatal’ en una especie de ‘espacio público-privado’, o como se lo ha denominado un ‘espacio público no-estatal’ que resulta abierta y fundamentalmente mercantil (como el mismo status ontológico del Mercado: un dominio que no es exclusivamente privado sino estrictamente público-privado, es decir, un locus público donde las mercancías tienen la posibilidad de intercambiarse entre ellas para posteriormente privatizarse). (PUELLO-SOCARRÁS, 2008, p. 108)
O Estado repassa ao setor privado a execução de políticas sociais com características gerenciais, que é o caso do Sistema de Ensino Aprende Brasil, do Grupo Positivo, que é adquirido pelo governo municipal por meio da compra de um Sistema Educacional. Para o autor trata-se de um governo empresarial, no qual presta serviços sociais por intermédio do mercado.
O neoliberalismo avançou mundialmente defendendo a privatização de direitos sociais e limitando a intervenção do Estado na economia assentindo por vezes um avanço local, mas com retrocessos internacionais. Nesse sentido, com o crescimento do debate em torno dos direitos houve também o debate acerca da necessidade de uma reforma do Estado que revisse a atuação do governo na política social e em questões importantes que acabam se opondo ao movimento pela redemocratização da sociedade (PIRES, 2018).
Durante a década de 1990 as políticas neoliberais no Brasil tiveram forte influência nas políticas sociais iniciadas no governo Fernando Collor de Mello e seguidas por Fernando Henrique Cardoso. A saída para a crise fiscal estaria em reformar o Estado por meio do Plano de Reforma do Aparelho do Estado, de 1995. A proposta foi aderir a uma administração gerencial, incluindo, nesse âmbito, a educação.
Na década de 2000, até o ano de 2016, com governos brasileiros mais alinhados aos campos progressistas e com o golpe parlamentar da Presidenta Dilma Roussef as políticas de austeridade fiscal neoliberais intensificaram-se e estão em seu auge no governo de Jair Messias Bolsonaro representando um campo político da nova direita econômica.
Processos de privatização em educação
Este item propõe-se a compreender o impacto do mercado na educação pública, influenciado pela nova direita no setor educacional, buscando entender as formas de privatização que inserem a lógica mercantil na educação e sua relação entre o público e o privado. As políticas de austeridade e a severa recessão econômica acabaram reduzindo o investimento em políticas sociais e concentraram a riqueza nas mãos da elite, exacerbando a desigualdade social. Uma nova direita brasileira surge em meio a tal recessão regulada por “[...] propostas de políticas públicas pautadas em reformas e privatizações da estrutura estatal, até privatização das próprias formas de gestão do Estado e suas funções sociais” (CASIMIRO, 2018, p. 465).
A nova direita, segundo Casimiro (2018), opera de forma articulada e institucionalizada, conduzindo à doutrina e ao domínio da burguesia hegemônica, sendo um agravante para a construção democrática, principalmente na educação, porque vai impregnando-a com a lógica empresarial, reduzindo cada vez mais os direitos sociais dando poder a uma classe que quer transformar o dinheiro público em lucro. Nesse sentido, as políticas sociais públicas são mercantilizadas no sentido de atender aos anseios dessa nova direita, investindo contra a democratização da sociedade.
No Brasil, o processo de redemocratização da sociedade vivido pós ditadura militar, na década de 1980, coincidiu com o auge do neoliberalismo. Com a reforma estatal da década de 1990, já citada no item anterior, os processos de democratização eram vistos como um empecilho ao livre andamento do mercado, tendo como solução o repasse, para a iniciativa privada, do controle de políticas públicas e sociais. Os recursos utilizados, portanto, foram os processos de privatização dos serviços públicos, redefinindo o papel do Estado na garantia do direito à educação. Os processos de privatização atuam tanto na direção quanto na execução de políticas sociais (PERONI, 2018), tendo como lógica o Estado empresarial, como já citamos anteriormente.
A privatização pode ocorrer na e da educação, é parte do próprio desenvolvimento capitalista e transforma a receita do Estado em lucro privado, ou seja, a educação é um investimento em capital por meio da privatização. A privatização ocorre de duas maneiras básicas: a primeira delas é a privatização clássica, ou seja, transferência da propriedade dos ativos públicos para o setor privado, e a segunda como tomada de controle sobre a educação por parte das empresas (RIKOWSKI, 2017).
As empresas que controlam a educação o fazem por meio do contrato, no qual o gestor privado se beneficia da diferença entre os pagamentos feitos pelos governos e o que realmente custa para administrar. Trata-se da conversão da receita do Estado em lucro privado por meio da administração ou compra de instituições e serviços educacionais (RIKOWSKI, 2017). Para o autor é a capitalização da educação gerando mercadoria e mercantilização, estabelecendo o mercado educacional que é crucial para esse processo.
A mercantilização está atrelada à mercadificação, onde tudo vira mercadoria, por exemplo, uma política de publicidade e persuasão por meio de grandes grupos, como lobistas, meios de comunicação e think tanks; a comercialização na educação (propaganda em livros didáticos, produtos de tecnologias da informação e até mesmo anúncios filantrópicos dentro das escolas ou na televisão); produção de produtos (mercadorias) como videoaulas, softwares e produtos para gerentes educacionais; por último, o mercado de tecnologia da informação: avaliação, monitoramento e vigilância - circuito de TV (RIKOWSKI, 2017).
Faz parte da capitalização, a monetização de atividade, produtos, processos e procedimentos que recebem preços ligados “[...] à medição de serviços educacionais, que por sua vez podem ser divididos em padronização, garantia e controle de qualidade, relação custo-benefício e muitos outros conceitos subsidiários” (RIKOWSKI, 2017, p. 406).
Para Peroni (2018), o processo de privatização educacional ocorre de diferentes formas. Ele pode se dar por meio da alteração da propriedade, em que o público é repassado ao terceiro setor ou para o setor privado; pode ser por meio das parcerias público-privadas com ou sem fins lucrativos; ou ainda pode ocorrer da forma em que a propriedade estatal passa a ter a lógica de mercado, reorganizando principalmente os processos de gestão e redefinindo o conteúdo da política educacional. Portanto, o conteúdo da educação passa a ser definido pelo setor privado, que adere à lógica mercantil na administração pública por meio da gestão gerencial.
A oferta da educação permanece pública e a privatização ocorre no “[...] conteúdo da proposta [...]”, com a lógica mercantil no pedagógico e na organização da escola pública (PERONI, 2015, p. 27). Esses processos de privatização em educação redimensionam a escala de democratização da educação pública e reorganiza a educação enquanto bem público guiado pela lógica de mercado. Para melhor compreensão desses processos de privatização em educação, apresentaremos o Grupo Positivo, que tem parceria com o município de Gravataí/RS.
O Grupo Positivo e o Sistema de Ensino Aprende Brasil2
O Grupo Positivo (GP) é uma holding3 brasileira que fica situada em Curitiba/PR, atua em todo o Brasil e em mais de 40 países. Foi fundada em 1972 e seus primeiros empreendimentos foram uma gráfica e um cursinho pré-vestibular. Atualmente opera no ensino privado, vende soluções educacionais para a rede pública e atua na área de tecnologia e gráfico-editorial. Além da empresa, foi fundado em 2012, o Instituto Positivo, que atua como gestor do investimento social privado do GP direcionando seus projetos para área da educação e desde 2015 atuando fortemente nos Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs).
Neste artigo apresentaremos o Sistema de Ensino Aprende Brasil (SEAB), fruto da parceria entre o município de Gravataí e o Grupo Positivo, que consiste na venda de um “[...] conjunto de soluções específicas [...]” (SISTEMA..., [201-], documento eletrônico) para a rede de ensino, contendo livros didáticos, assessoria pedagógica, sistema de avaliação e gestão online, visando atender alunos do primeiro ao quinto ano do ensino fundamental.
A cidade de Gravataí está localizada na região metropolitana de Porto Alegre, à 22 quilômetros da capital do Rio Grande do Sul. Sua população é de 273.742 habitantes (IBGE, 2016), é o quinto maior PIB do estado. A economia gira em torno do polo industrial, com destaque para a fábrica automotiva da General Motors (GM).
A rede municipal de ensino de Gravataí é uma das maiores redes do estado, possuindo 02 escolas especiais, 11 escolas de educação infantil, 60 escolas de ensino fundamental e 01 escola de ensino médio.
No ano de 2014 o município passou a adquirir o Sistema de Ensino Aprende Brasil (SEAB), da Editora Positivo, que consiste em um sistema privado de ensino que tem por objetivo elevar a qualidade do ensino público potencializando as aprendizagens dos anos iniciais do ensino fundamental.
O SEAB é um “[...] um sistema de ensino completo, que oferece um conjunto específico de soluções para a rede de ensino pública [...]”, que vai desde o “[...] Livro Didático Integrado, Assessoria Pedagógica, Aprende Brasil On e os Sistemas hábile e simeB” (SISTEMA..., [201-], documento eletrônico).
O livro didático integrado e o livro digital são compostos por 4 volumes anuais. O município também recebe os livros do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Os materiais didáticos são distribuídos aos professores e alunos. O sistema apostilado acaba definindo o conteúdo da educação pública no município.
Conforme dados do GP, a assessoria pedagógica à capacitação dos docentes e também da equipe técnica da rede de ensino é uma complementação feita de forma presencial e à distância. Essa assessoria pedagógica conta com uma equipe de apoio disponível aos municípios para auxiliar no trabalho tanto dos professores, quanto dos gestores.
Faz parte também o Aprende Brasil On que é uma plataforma digital de aprendizagem com diferentes recursos que fazem o gerenciamento da aprendizagem. A plataforma virtual de aprendizagem conta com materiais para alunos, professores, gestores e famílias.
Disponibilizam também “[...] duas ferramentas para a gestão e mensuração do avanço da educação de sua rede de escolas: o simeB e o hábile” (SISTEMA..., [201-], documento eletrônico). Esses sistemas de gestão e de avaliação disponibilizam diagnósticos sobre o desempenho da rede, bem como das escolas e dos alunos.
O hábile é um sistema de avaliação educacional externo de aprendizagem em larga escala nas áreas de Língua Portuguesa, Matemática e Ciências. Já o Sistema de Monitoramento Educacional do Brasil (simeB) é uma ferramenta de gestão educacional no qual são feitos diagnósticos, planejamentos e monitoramentos de metas que foram estabelecidas pela rede de ensino.
A parceria existe desde 2014 e o financiamento municipal foi utilizado para a aquisição do Sistema de Ensino Aprende Brasil. A seguir mostraremos todo o investimento público feito até o ano de 2021.
ANO | VALOR (R$) |
---|---|
2014 | 3.872.887,20 |
2015 | 4.263.950,00 |
2016 | 4.492.638,00 |
2017 | 4.629.996,00 |
2018 | 4.901.376,00 |
2019 | 5.877.300,00 |
2020 | 6.246.300,00 |
2021 | 5.900.294,40 |
TOTAL | 40.184.741,60 |
Fonte: elaborada pela autora a partir dos Contratos de Compra e Venda (GRAVATAÍ, 2013; 2015; 2016; 2017; 2018; 2019; 2020; 2021).
Para a compra do sistema de ensino foram gastos R$ 40.184.741,60 (quarenta milhões, cento e oitenta e quatro mil, setecentos e quarenta e um reais e sessenta centavos). Os recursos usados para adquirir os produtos são destinados ao setor privado, gerando lucro para eles via receita pública. Quando esse recurso é enviando para a iniciativa privada, que presta serviços educacionais com regras definidas, entendemos que a lógica do mercado está sendo introduzida no setor público, reorganizado o processo de gestão e redefinindo a execução, a direção e o conteúdo da política educacional (ROSSI; LUMERTZ; PIRES, 2018).
Importante ressaltar que a propriedade permanece pública. A escola continua sendo pública, mas o gestor define a compra de pacotes educacionais, num processo de privatização com apoio do poder público. É o que Peroni (2018) aponta como privatização como política pública.
Considerações finais
O auge do neoliberalismo e a reforma estatal feita do Estado brasileiro aguçaram a austeridade fiscal. A crise de 2008 trouxe novos contornos aos estados trabalhando na lógica de um novo neoliberalismo que se alimenta de crises para sua sobrevivência (LAVAL; DARDOT, 2017).
As políticas sociais são atingidas fortemente e os processos de privatização se consolidam. Na educação eles aparecem com diferentes contornos: ora surge como uma parceria entre público e o privado, com a rede de ensino ou diretamente com as escolas, em que a iniciativa privada assume a responsabilidade pela gestão e/ou pelo pedagógico da escola. Ora aparece vendendo serviços educacionais e tecnologias para as escolas públicas, fornecendo proposta de conteúdo e execução para o setor público. Em ambos os casos o processo de democratização da educação pública é deixado de lado, já que o setor privado acaba definindo regras, geralmente vinculadas ao mercado.
Com o argumento de melhorar os índices e a qualidade da educação pública, gestores acabam escolhendo um projeto de educação privatizada. Essa privatização pode ocorrer via direção ou via execução e o conteúdo da educação passa a ser ditado pelo mercado, num projeto claro de sociedade num contexto de luta de classes.
A lógica privatista implica retrocesso para a democracia na educação pública e o papel da escola é de fundamental importância na construção de uma sociedade democrática. É o caso do Sistema de Ensino Aprende Brasil do Grupo Positivo no município de Gravataí/RS. O currículo escolar passa a ser definido por meio do sistema apostilado de ensino em que o município o paga para adquirir.
O mercado educacional é introduzido na rede municipal de Gravataí não só privatizando-a como também transformando-a em mercadoria e distanciando-se cada vez mais de um direito público essencial do cidadão com base democrática, crítica e coletiva. A educação da rede municipal de Gravataí, que já tinha um histórico de construção democrática, é ressignificada como bem público, retrocedendo os pequenos passos avançados rumo à democratização da educação. A receita pública municipal também é transformada em lucro para o GP, uma vez que o município destina verbas para a aquisição do Sistema de Ensino Aprende Brasil.
A iniciativa privada define a formação de professores e de gestores escolares, ignorando o processo participativo, criativo e democrático da educação. Nesse caso, não ocorre mudança de propriedade em si, mas pressupõe-se que há um projeto societário de desdemocratização, corrompendo a escola pública impondo a lógica de marcado baseada no individualismo e na competitividade.