INTRODUÇÃO
A prática da medicina e as formas de ensiná-la eram muito mais simples do que são hoje em dia. Era muito comum que os valores e comportamentos desejados fossem passados de uma geração de médicos para outra por meio de modelos médicos respeitados. No entanto, por conta do aumento da complexidade social, política, cultural e do sistema de saúde, esse modelo não é mais suficiente. A politização da saúde, o interesse financeiro e o aumento dos litígios levam à deterioração do humanismo e ao distanciamento emocional na prática clínica, o que torna o ensino do profissionalismo um desafio1.
Do ponto de vista histórico, o profissionalismo médico moderno possui origens antigas e evoluiu ao longo de inúmeras fases da história. A medicina é, em parte, a moderna personificação da arte de curar, presente desde o início da civilização. Com a emergência da civilização grega, as raízes da medicina ocidental foram traçadas. Hipócrates (460 a.C - 377d.C.) lançou as bases da medicina atual, distinguindo-a de outras formas antigas de cura por se fundamentar na filosofia natural e não em poderes sobrenaturais, de modo a separar medicina de religião. Médicos hipocráticos defendiam a prática ética − primum non nocere − e o altruísmo, ambos incorporados no juramento de Hipócrates que é recitado ainda nos dias de hoje pelos formandos2.
O profissionalismo é uma competência essencial do médico. Conhecimento, habilidades clínicas e de comunicação e ética são as bases do profissionalismo3. A partir dessas bases, podem-se apontar comportamentos e atributos de profissionalismo: responsabilidade, altruísmo, excelência e humanismo. Pacientes e toda sociedade esperam que o médico seja profissional, independentemente de sua especialidade. O profissionalismo está associado ao aumento da satisfação dos pacientes, da confiança e da aderência ao tratamento, a menores índices de complicação e à redução do risco de litígio4.
O conceito de profissionalismo varia através da história e de contextos culturais, intrinsecamente relacionado à responsabilidade social do médico5. A dificuldade em conceituar decorre da noção de que o profissionalismo se estende ao longo de um continuum do indivíduo (atributos, capacidades e comportamentos) por meio do domínio interpessoal (interações com outras pessoas e com contextos) para o nível macrossocial, em que noções como responsabilidade social e moralidade, além de agendas políticas e imperativos econômicos. Ademais, existem interações entre esses domínios. Por exemplo, o comportamento profissional de um indivíduo pode ser influenciado pelo contexto; similarmente, os indivíduos dentro de uma instituição podem influenciar valores profissionais coletivos5),(6.
Na década de 1990, o American Board of Internal Medicine (ABIM) iniciou o Project Professionalism com o objetivo de examinar como as mudanças no contexto de saúde afetaram negativamente o comportamento profissional dos médicos. A Abim estabeleceu uma lista de atributos que deveriam compor o comportamento ideal do médico (altruísmo, responsabilidade, excelência, dever, honra, integridade e respeito pelos outros), cujo objetivo foi desenvolver uma definição direta dessas qualidades para melhor assistência ao paciente, de modo a permitir que elas pudessem ser apreciadas e documentadas no ambiente de treinamento, como programa de residência e especialidade, além de possibilitar o uso de sistema de avaliação eficaz7),(8.
No ano de 2002, um projeto conjunto do Abim com o American College of Physicians (ACP) e a European Federation of Internal Medicine (EFIM) publicou a “Carta do médico − uma declaração sobre os requisitos de profissionalismo médico para o novo milênio”, que, posteriormente, foi endossada por mais de 120 organizações e traduzida em dez idiomas7),(9. Essa carta definiu três princípios fundamentais do profissionalismo médico: a primazia do bem-estar do paciente, a autonomia do paciente e a justiça social.
A carta definiu também o conjunto de compromissos essenciais ao profissionalismo médico: competência profissional e conhecimento científico, honestidade e confidencialidade para com os pacientes, melhoria do acesso e da qualidade do cuidado, distribuição justa de recursos limitados, manutenção da confiança ao lidar com conflitos de interesse e responsabilidade profissional7),(9.
Em 2013, o Conselho Federal de Medicina afirmou, em “Uma introdução à medicina”, que as opiniões dos médicos sobre profissionalismo são semelhantes em diferentes sistemas de saúde e que o profissionalismo é a base do contrato do médico com a sociedade, em concordância com publicações do ABIM, da EFIM, do ACP e da American Medical Association. Isso exige que os médicos coloquem os interesses dos pacientes acima de quaisquer outros, estabeleçam e mantenham padrões de competência e integridade, e ofereçam à sociedade informações especializadas sobre questões de saúde10.
O profissionalismo é complexo e multidimensional, o que torna difícil estabelecer uma forma simples e generalizada de avaliá-lo. A sua avaliação requer a consideração dos interesses individuais e interpessoais, e das dimensões sociais4),(5. Aumentar a profundidade, a confiabilidade e a validade de instrumentos existentes em diferentes contextos pode ser mais apropriado do que concentrar-se no desenvolvimento de novos instrumentos. Aumentar o número de testes e o número de contextos culturais relevantes elevará a confiabilidade. Da mesma forma, aumentar o número de observadores amplia a confiabilidade5),(6.
A revisão bibliográfica desta pesquisa não identificou nenhum instrumento em português do Brasil que avaliasse especificamente o profissionalismo entre médicos em geral. Foram identificados dois instrumentos que avaliam o profissionalismo em estudantes de Medicina desenvolvidos por autores brasileiros. No entanto, são constructos mais amplos que avaliam as atitudes do estudante de forma geral, e não apenas o profissionalismo, e, como foram desenvolvidos exclusivamente para estudantes de Medicina, não devem ser utilizados em outras populações, como médicos. O instrumento desenvolvido por Colares et al.11 avalia fatores que influenciam a formação do estudante, como doença mental, morte e pesquisa clínica, além do profissionalismo. Já o instrumento de Miranda et al.12 aborda as atitudes relacionadas aos aspectos sociais da profissão médica e as Diretrizes Curriculares Nacionais. É importante que existam outras opções de instrumentos de avaliação específica do profissionalismo que permitam, além da comparação entre diferentes regiões do país, a comparação com outros países. O objetivo deste estudo foi adaptar e validar um instrumento de avaliação de profissionalismo médico do inglês para português do Brasil a fim de avaliar profissionalismo entre médicos.
MÉTODO
Realizou-se revisão da literatura no PubMed com os termos medical education, professionalism e assessment que resultou na identificação de 28 artigos que tratavam sobre instrumentos de avaliação de profissionalismo13),(14. Identificou-se 13 questionários autoaplicados, dos quais sete eram específicos para estudantes de medicina e quatro apresentavam validade estrutural ou consistência interna ruins. Entre os dois restantes, selecionou-se o questionário The Penn State College of Medicine Professionalism Questionnaire (PSCOMPQ)8, pelos seguintes motivos: possuir validação psicométrica, ser curto e de aplicação rápida, ser autoaplicado, possuir versão validada em outros idiomas e a utilização em português ter sido autorizada pelo autor.
O PSCOMPQ foi desenvolvido na Pennsylvania State University College of Medicine, nos Estados Unidos, com o objetivo de avaliar as opiniões relacionadas ao profissionalismo médico pela comunidade acadêmica, incluindo estudantes, professores médicos e médicos. O instrumento proposto foi validado de acordo com critérios de confiabilidade e validade. Trata-se do primeiro questionário validado e confiável sobre o tema na educação médica norte-americana8. Já se realizaram a adaptação transcultural e a validação do instrumento na Colômbia15, e a validação no Paquistão16 e na Malásia17.
Ele contempla os seis atributos do profissionalismo descritos pelo Abim. Possui 36 afirmativas, divididas igualmente entre os seis atributos. Para cada afirmativa, o respondente deve assinalar o seu nível de concordância com ela numa escala de Likert de cinco pontos (nunca = 1, pouco = 2, às vezes = 3, muito = 4 e sempre = 5). O escore de profissionalismo corresponde ao somatório do valor assinalado em cada resposta. Números mais altos indicam maiores níveis de profissionalismo8.
A tradução e a adaptação transcultural foram realizadas de acordo com as recomendações de Beaton et al.18 e Sousa et al.19. O processo compreendeu seis fases (Figura 1): tradução; síntese; tradução reversa; revisão por comitê de especialistas; pré-teste; confecção da versão final.
O instrumento foi traduzido do inglês para o português por dois tradutores independentes nativos de língua portuguesa e com experiência com traduções do inglês para o português, um médico e um tradutor juramentado. A seguir, compararam-se as duas versões de tradução (T1 e T2), que foram sintetizadas em uma versão consenso (T1/T2), contemplando o esclarecimento de expressões ou termos que continham forma ou sentido semântico e idiomático diferente nas duas versões. Na sequência, realizaram-se duas traduções reversas (RT1 e RT2) do português para o idioma original, por outros dois tradutores independentes que não conheciam a versão original, nativos de língua inglesa e sem conhecimento médico ou da temática. Essa etapa permitiu identificar incoerências ou erros conceituais cometidos durante a tradução, buscando a equivalência conceitual e cultural.
O comitê de revisão foi formado pelos pesquisadores, pelos tradutores e por nove convidados, que representavam a Associação Médica de Minas Gerais, o Sindicato dos Médicos, a Sociedade de Acadêmicos de Medicina de Minas Gerais, médicos e professores de Medicina. Foi feita a análise do questionário original, T1/T2 e RT1 e RT2 para a confecção da versão pré-teste. O objetivo desse grupo foi identificar e resolver discrepâncias considerando os quatro tipos de equivalência: semântica, idiomática, experiencial e conceitual18.
Os profissionais convidados receberam um formulário on-line com o questionário para avaliar as afirmativas e fazer sugestões. O comitê consolidou a versão produzida confeccionando a versão pré-final. Como o autor do questionário original permitiu livre tradução para português, ele não foi consultado.
Após a definição da versão pré-final do questionário pelo comitê de revisão, realizou-se a etapa do pré-teste em amostra de conveniência de 30 pessoas, já que a literatura recomenda a participação de dez a 40 voluntários18),(19. Além de responderem ao questionário em entrevista presencial, os participantes dessa fase reescreveram as afirmativas com suas próprias palavras, para a conferência do entendimento do conteúdo da afirmativa (análise de validade de conteúdo). As respostas escritas foram analisadas uma a uma pelos pesquisadores, e separaram-se para reanálise aquelas cujo significado diferia do entendimento original. Após essa análise qualitativa e novas adequações, obteve-se a versão final do questionário para utilização na segunda etapa do estudo. Uma versão on-line no Google Formulários foi desenvolvida. Coletaram-se as seguintes informações: idade, sexo, ano de formatura, formação profissional, especialidade, pós-graduação, cidade e estado da atividade profissional, se exerce atividade de ensino e qual atividade de ensino. A aplicação do questionário ocorreu exclusivamente por via eletrônica e sua divulgação ocorreu por meio de abordagens individuais com o encaminhamento do respectivo link da pesquisa, além da divulgação em grupos de redes sociais e por contatos telefônicos. Estratégias utilizadas: QR Code, envio de e-mails, Instagram, Facebook, LinkedIn, WhatsApp, Telegram, Workplace e criação de memes motivacionais. Para a divulgação, criaram-se também um e-mail para a pesquisa, um site e uma conta no Instagram.
Verificou-se a consistência interna pelo teste alfa de Cronbach para o questionário como um todo e retirou-se cada um dos itens individualmente. Valores entre 0,70 e 0,80 foram considerados aceitáveis; entre 0,80 e 0,90, bons; e > 0,90, muito bons.
Este estudo encontra-se em concordância com a versão atual da Declaração de Helsinque e a Resolução nº 466/2012 da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa e suas atualizações, e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade José do Rosário Vellano (Unifenas), de Minas Gerais (Parecer nº 3.544.742). Todos os voluntários assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido antes de sua inclusão no estudo.
RESULTADOS
Tradução e adaptação transcultural
A fase de tradução do instrumento ocorreu sem dificuldade. Na síntese (T1/T2), os pesquisadores consideraram que houve equivalência em 88,9% (32/36) dos itens. Observaram-se discrepâncias semântica nas afirmativas 2, 14, 29 e idiomática no item 33. Na tradução reversa, observou-se discrepância de equivalência semântica no item 29. Essa discrepância foi discutida e elucidada com os tradutores antes da confecção de versão pré-teste e solucionada (Tabela 1).
Fases I e II | |||||
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Item | Tradutor 1 (não médico) | Tradutor 2 (médico) | Síntese (T1/T2) | Discordância | |
2 | Não usa a relação médico-paciente para obter vantagens financeiras ou sexuais, nem para explorar a privacidade. | Mantém relação médico paciente sem exploração financeira, pessoal, de privacidade ou de vantagens sexuais. | Não usa a relação médico paciente para ganhos financeiros pessoais ou vantagens sexuais e nem explorar a privacidade. | Semântica | |
14 | Procura progredir profissionalmente sem prejudicar a carreira de outro colega. | Não procura avançar sua carreira às expensas da carreira do outro. | Não procura avançar em sua carreira às custas da carreira do outro. | Semântica | |
29 | Adota padrões uniformes e equitativos para o atendimento do paciente. | Adota padrões uniformes e igualitários no cuidado do paciente. | Adota padrões uniformes e equitativos no cuidado ao paciente. | Semântica | |
33 | Atua profissionalmente de forma respeitosa aos outros. | Veste-se de maneira respeitosa aos outros. | Veste-se de maneira profissional e respeitosa para com os outros. | Idiomática | |
Fase II | |||||
Item | Original | Síntese (T1/T2) | RT1 | RT2 | Discordância |
29 | Adopts uniform and equitable standards for patient care. | Adota padrões uniformes e equitativos no cuidado ao paciente. | Uses consistent and reasonable standards in patient care. | Adopts uniform and equitable standards in patient care. | Semântica |
T1/T2 - síntese da tradução 1 e 2; RT - retrotradução.
Fonte: Elaborada pelos autores.
Após as retrotraduções, elaborou-se nova versão do questionário que foi avaliado pelo comitê de especialistas, composto por nove participantes, sendo três professores de Medicina, um médico gestor, um médico assistencial e um estudante de Medicina. Na fase IV, os pesquisadores consideraram que seria necessário utilizar as afirmativas na primeira pessoa do singular, e não na terceira pessoa do singular, uma vez que o objetivo do projeto era avaliar a atitude do entrevistado em relação ao profissionalismo e não a sua opinião sobre ele. A versão pré-teste foi consolidada pelo comitê. Com bases nessas sugestões, acrescentou-se uma nova afirmativa sobre pontualidade (item 37), considerando que se trata de uma questão cultural relevante no Brasil e que não era abordada na versão norte-americana do instrumento. Realizaram-se pequenos ajustes no texto dos itens 18 e 33 para alcançar 100% de equivalência semântica. Na fase V, de pré-teste, a versão pré-final do questionário foi aplicada em 30 médicos. Na análise qualitativa, houve discrepâncias mínimas entre pergunta e transcrição, e poucos foram os ajustes necessários para elaboração do questionário final, como correção ortográfica, gramatical e erros de digitação. Frases negativas foram substituídas por verbos de sentido negativo. A Tabela 2 apresenta a versão final do questionário. Os itens são divididos em seus domínios: responsabilidade (1, 12, 13, 24, 25 e 36), altruísmo (2, 7, 14, 19, 30 e 31), dever (3, 11, 15, 20, 29 e 35), excelência (4, 8, 18, 23, 26 e 34), honra e integridade (5, 9, 16, 21, 27 e 32) e respeito (6, 10, 17, 22, 28, 33 e 37).
Para cada uma das afirmativas a seguir, indique a frequência de ocorrência de acordo com as colunas da direita | Nunca | Pouco | Às vezes | Muito | Sempre |
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Afirmativas | |||||
1. Baseio minhas condutas em evidências científicas. | |||||
2. Recuso-me a usar a relação médico paciente para obter vantagens pessoais, sexuais e/ou financeiras de meus pacientes ou seus acompanhantes. | |||||
3. Estou disponível para auxiliar meus colegas em seu trabalho e forneço comentários significativos e construtivos. | |||||
4. Busco o autoaperfeiçoamento. | |||||
5. Apresento informações de forma consistente, precisa e honesta. | |||||
6. Evito fazer comentários ofensivos, indelicados e críticas injustas. | |||||
7. Promovo o bem-estar e desenvolvimento do colega iniciante. | |||||
8. Recuso-me a violar meus valores pessoais e o código de ética médico. | |||||
9. Valorizo e respeito a natureza diversa do paciente ou do sujeito de pesquisa e respeito essas diferenças no meu trabalho com eles. | |||||
10. Apoio alunos, residentes e/ou colegas participando de reuniões científicas, seminários e apresentações de pesquisas. | |||||
11. Trabalho em equipe de forma colaborativa e respeitosa para melhorar o atendimento ao paciente e/ou a pesquisa. | |||||
12. Participo de intervenções corretivas direcionadas a pessoas que não cumprem os padrões de conduta profissional. | |||||
13. Tenho disponibilidade em auxiliar colegas no seu desenvolvimento pessoal e profissional. | |||||
14. Recuso-me a explorar o trabalho dos outros para avançar na carreira ou obter benefícios. | |||||
15. Participo de atividades voluntárias na comunidade em que vivo | |||||
16. Cumpro meus compromissos e obrigações com responsabilidade. | |||||
17. Respeito os direitos, a individualidade e a diversidade de pensamentos de colegas e estudantes. | |||||
18. Busco contribuir significativamente para o ensino e formação de estudantes de Medicina e/ou residentes nos locais onde trabalho (cursos de Medicina ou serviços assistenciais). | |||||
19. Demonstro compaixão com o paciente e seus acompanhantes. | |||||
20. Demonstro capacidade de adaptação para responder a mudanças de necessidades e prioridades. | |||||
21. Promovo a justiça no sistema de saúde combatendo a discriminação. | |||||
22. Respeito a autonomia do paciente e procuro tomar decisões compartilhadas. | |||||
23. Coordeno o cuidado ao paciente perante os demais profissionais de saúde. | |||||
24. Reconheço minhas próprias limitações. | |||||
25. Assumo responsabilidade pessoal por decisões relacionadas ao cuidado ao paciente. | |||||
26. Participo de atividades com objetivo de alcançar excelência no cuidado ao paciente. | |||||
27. Relato erros médicos ou de pesquisa. | |||||
28. Atuo de modo a demonstrar compromisso com a confidencialidade, privacidade, intimidade e pudor de pacientes e/ou sujeitos de pesquisa. | |||||
29. Adoto padrões de conduta uniformes e justos no cuidado ao paciente. | |||||
30. Demonstro empatia com o paciente e seus acompanhantes. | |||||
31. Defendo o interesse do paciente e/ou do sujeito de pesquisa acima de meus próprios interesses. | |||||
32. Comunico conflitos de interesse no exercício de minhas atividades e deveres profissionais. | |||||
33. Uso trajes adequados ao ambiente de trabalho com objetivo de ser respeitoso com os outros. | |||||
34. Reajo à crítica construtiva buscando melhorar minha habilidade na área criticada. | |||||
35. Preocupo-me com o custo-efetividade no cuidado ao paciente. | |||||
36. Apresento informações verdadeiras e atuo de maneira honesta. | |||||
37. Sou pontual em meus compromissos profissionais. |
Fonte: Elaborado pelos autores.
O alfa de Cronbach do questionário total foi 0,886, e os valores referentes à retirada individual de cada questão variaram de 0,856 a 0,870, indicando boa consistência interna e confiabilidade (Tabela 3).
Item | Alfa de Cronbach | Item | Alfa de Cronbach | Item | Alfa de Cronbach |
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1 | 0,861 | 13 | 0,859 | 25 | 0,861 |
2 | 0,868 | 14 | 0,861 | 26 | 0,859 |
3 | 0,863 | 15 | 0,861 | 27 | 0,870 |
4 | 0,860 | 16 | 0,864 | 28 | 0,863 |
5 | 0,860 | 17 | 0,865 | 29 | 0,856 |
6 | 0,866 | 18 | 0,865 | 30 | 0,862 |
7 | 0,863 | 19 | 0,860 | 31 | 0,860 |
8 | 0,860 | 20 | 0,863 | 32 | 0,858 |
9 | 0,863 | 21 | 0,862 | 33 | 0,866 |
10 | 0,865 | 22 | 0,858 | 34 | 0,865 |
11 | 0,861 | 23 | 0,864 | 35 | 0,866 |
12 | 0,863 | 24 | 0,859 | 36 | 0,867 |
Fonte: Elaborada pelos autores.
DISCUSSÃO
A adaptação ocorreu dentro do prazo proposto e cumprindo todas as fases planejadas18),(19. O questionário original tratava sobre a opinião das pessoas sobre o profissionalismo, não sobre a atitude delas. No questionário original, os respondentes foram solicitados a avaliar até que ponto cada afirmação refletia a definição deles de profissionalismo. As afirmativas foram modificadas da terceira pessoa para primeira pessoa, a fim avaliar a atitude do respondente em relação ao profissionalismo, o que inviabiliza a comparação dessa versão adaptada com o estudo original e os estudos realizados em outros países. No entanto, a mudança na flexão verbal torna a resposta mais pessoal e direta, motivando maior reflexão do indivíduo sobre o próprio comportamento. Algumas afirmativas foram mais difíceis de adaptar. A exploração do significado de cada questão permitiu que a versão adaptada permanecesse com equivalência na sua aplicação. O tópico sobre voluntariado, apesar de não fazer parte da cultura brasileira, foi mantido por avaliar altruísmo. A pontualidade foi incluída entre as afirmativas por ser um tópico relevante no Brasil, apesar de não estar no questionário original, uma vez que não é uma dificuldade nos Estados Unidos.
O alfa de Cronbach indicou boa consistência interna na versão pré-final, mesmo com pequeno número de respondedores.
Uma das limitações deste estudo é inerente ao instrumento utilizado para a avaliação dos níveis de profissionalismo. Os instrumentos autoaplicáveis que avaliam atitude apresentam tendência a superestimar os escores, uma vez que os respondentes podem indicar a resposta que consideram socialmente aceitável e não necessariamente a avaliação sincera de sua atitude, um viés cognitivo descrito como da desejabilidade social20. O próprio sujeito da pesquisa pode determinar um fator de erro quando apresenta o desejo de uma imagem socialmente aceitável ou uma tendência a concordar ou não com afirmações independentemente do seu conteúdo. Há incapacidade de determinar em que medida as respostas refletem com precisão as experiências e expectativas dos entrevistados. Para minimizar esses possíveis fatores de erro, os voluntários foram informados que suas respostas eram confidenciais, utilizadas exclusivamente para fins de pesquisa e devidamente aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição. Essa garantia pode reduzir a tendência de respostas socialmente desejáveis, mas pode não ser suficiente21),(22. Quando se utiliza um questionário autoaplicado, não é analisado o comportamento real do respondente e sim sua atitude. Embora existam vínculos entre atitudes e comportamentos, é preciso ter cautela, pois esse instrumento retrata as atitudes em relação ao profissionalismo em um determinado momento. Não identifica se os entrevistados realmente se comportam de maneira consistente com as atitudes relatadas. Além disso, a avaliação do profissionalismo não deve ser reduzida apenas à dimensão da autoavaliação, sendo necessário considerar também a avaliação por pares, por outros profissionais de saúde e, ainda, por pacientes e familiares.
Apesar dessas limitações, a versão desenvolvida com base no PSCOMPQ é ferramenta de autorreflexão que pode ajudar a educação médica a avançar nos esforços para aprimorar o profissionalismo, e, até onde se sabe, trata-se de estudo inédito no Brasil.
CONCLUSÕES
O PSCOMPQ adaptado para o português brasileiro apresentou alta equivalência semântica, idiomática, experiencial e conceitual. Trata-se de um marco importante para o estudo do profissionalismo médico no Brasil, podendo ser utilizado tanto na educação continuada de profissionais já formados como na educação médica, como ferramenta de reflexão e avaliação.