INTRODUÇÃO
Ao fim do ano de 2019, a Covid-19 ganhou visibilidade mundial por causa de sua ação na província de Wuhan, na China. De forma abrupta e acelerada, ela se espalhou globalmente ganhando status de pandemia e, consequentemente, abalou a vida normal das pessoas em razão de seus efeitos assoladores1, provocando, em todo o mundo, mudanças nos âmbitos pessoal, profissional e social2. A necessidade de enfrentamento em todos esses níveis, o medo do desconhecido e do risco de transmissão do vírus para familiares, a sobrecarga do sistema de saúde e a vivência do luto se estabeleceram como novas problemáticas que impactaram a saúde mental das pessoas3.
Além disso, medidas sanitárias foram tomadas a fim de mitigar as contaminações, em especial o uso de máscaras e o distanciamento social4. Por conseguinte, diversas questões surgiram como um reflexo dessas medidas, como o convívio social conflituoso, problemas financeiros, dificuldade de praticar exercícios físicos, estresse e redução da qualidade do sono5. Diante de sua gravidade, a pandemia da Covid-19 se tornou o maior desafio enfrentado após a Segunda Guerra Mundial, com mais de 230 milhões de pessoas infectadas, cerca de cinco milhões de mortes, além de gerar calamidade social e econômica, como 205 milhões de pessoas desempregadas em 20226. O estresse psicológico vivenciado nesse contexto atingiu indivíduos saudáveis, provocou medo e estresse, intensificou esses sintomas naqueles com transtornos psiquiátricos preexistentes e gerou o caos nos âmbitos pessoal e familiar7.
Contudo, visando ao seguimento de projetos de vida, a pandemia se tornou um momento importante de mudanças no estilo de vida pessoal, nos contextos familiar, econômico e educacional8),(9. A sociedade precisou se reorganizar e enfrentar a realidade vigente, e mais desafios foram impostos às escolas e universidades que tiveram que adaptar seu formato de ensino, migrando do presencial para o modelo remoto10, o que alterou tanto o ensino e a aprendizado quanto a interação social e comunicação. O ensino on-line trouxe certo desconforto para um grande número de estudantes, tais como aqueles com dificuldades relacionadas ao acesso à internet, além de apatia em assistir às aulas, o que pode levar a problemas de assiduidade e participação nas aulas virtuais11.
A existência dos obstáculos enfrentados por alguns acadêmicos na pandemia tornou-se evidente. E a qualidade de vida dos universitários pode ter sido impactada negativamente pelo sofrimento mental causado pelas interrupções sociais e econômicas, pela incerteza sobre suas carreiras futuras, pela solidão e pelo medo de perder entes queridos12. Um estudo anterior1 mostrou alterações importantes na saúde mental da população mundial, com altas taxas nos resultados e prevalência de até 50,9% para ansiedade, 48,3% para depressão, 53,8% para transtorno de estresse pós-traumático (Tept), 38% para sofrimento psicológico e 81,9% para estresse. Diante disso, esse período pode se tornar um evento traumático e evoluir para um Tept, e colocar em risco a própria vida, visto que está ligado negativamente à ideação suicida.
O Tept é um tipo de distúrbio de ansiedade que engloba sintomas emocionais e psíquicos, podendo ter manifestações físicas, causados por evento traumático. Segundo o Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM)13, pode ser definido em função de exposição a episódio concreto ou ameaça de morte, lesão grave ou violação sexual. O indivíduo pode vivenciar diretamente o evento traumático, testemunhá-lo pessoalmente quando ocorrido com outras pessoas, descobrir sua ocorrência com um familiar ou amigo próximo, ou ser exposto de forma repetida ou extrema a detalhes aversivos do evento.
O Tept é um transtorno psiquiátrico prevalente e incapacitante que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), afeta dois milhões de pessoas no Brasil. É notório que várias doenças e distúrbios podem aumentar o risco de problemas de qualidade emocional em um indivíduo. Porém, um evento traumático também pode afetar sua saúde mental, visto que o risco de desenvolver Tept pode chegar a 15% da população geral14. Bo et al.15 mostraram que grande parte das pessoas com Covid-19 pesquisadas experimentaram tanto sofrimento físico quanto grande sofrimento psicológico, e sintomas de Tept estavam presentes em 96,2% delas.
Nesse sentido, este estudo buscou verificar a carga mental provocada pela pandemia da Covid-19, causada pelo novo coronavírus, o Sars-CoV-2, como um evento traumático ao ponto de causar transtornos psiquiátricos, como o Tept, e favorecer o desenvolvimento de transtornos mentais entre estudantes universitários.
MÉTODO
Tipo de estudo
Trata-se de um estudo transversal, quantitativo, realizado entre 10 de setembro de 2020 e 4 de janeiro de 2021, em que a variável dependente pesquisada foi a presença de sintomas relacionados ao estresse pós-traumático mediado pelo efeito psicológico causado pela pandemia do Sars-CoV-2.
População e amostra
A população-alvo foi constituída por estudantes do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS) de uma universidade localizada na Região Sudeste do Brasil. Havia 1.912 estudantes matriculados em pelo menos um dos cinco cursos: Ciências Biológicas (406), Educação Física (639), Enfermagem (204), Medicina (426) e Odontologia (237). Todos os estudantes foram convidados a participar da pesquisa. No entanto, definiu-se a amostra por meio de cálculo amostral para populações finitas, considerando a prevalência do evento de interesse em 30%, nível de confiança de 95%, margem de erro de 3% e design effect (deff) = 2. Considerou-se ainda a proporcionalidade de participação de acadêmicos de todos os cursos. O tamanho mínimo da amostra calculado foi de 611 estudantes, sendo a amostra do estudo constituída por 618 estudantes, número superior ao mínimo exigido no cálculo amostral.
Coleta dos dados
Realizou-se a coleta de dados por meio de um formulário digital autoaplicável, criado na plataforma Google Forms e enviado diretamente para o e-mail de cada turma dos cursos do CCBS. O formulário foi divulgado durante aulas expositivas em todas as turmas e em redes sociais - Instagram e WhatsApp -, no intuito de estimular uma maior participação dos estudantes.
Além disso, os coordenadores de cursos e de períodos, assim como os professores e estudantes representantes de turmas, foram convidados, via e-mail e WhatsApp, a divulgar a pesquisa entre os universitários e, assim, oportunizar maior sensibilização sobre a importância do estudo. Realizou-se ainda uma parceria com as associações atléticas e centros acadêmicos dos cursos do CCBS para divulgação da pesquisa e sensibilização sobre a adesão a ela.
O formulário foi anônimo e organizado em seções, de acordo com temáticas de interesse. Utilizaram-se questionários validados para a coleta de dados, como a Escala de Impacto do Evento-Revisada (Impact of Event Scale-Revised - IES-R), o Patient Health Questionarie 9 (PHQ-9), a Escala de Depressão, Ansiedade e Estresse 21 (Depression, Anxiety and Stress Scale - DASS-21) e itens do questionário Estilo de Vida Fantástico. Para a coleta de dados sociodemográficos, utilizaram-se questões relacionadas às características dos estudantes, como sexo, idade, cor/etnia, orientação sexual, presença de necessidade especial e de doença crônica, estado civil, curso em que estavam matriculado, satisfação com o ensino remoto instituído pela universidade durante a pandemia, assim como autopercepção de sobrecarga acadêmica pelas atividades durante a pandemia, se reside sozinho, se trabalha e renda familiar antes da pandemia.
Sintomas de estresse pós-traumático causados pela pandemia foram avaliados por meio do instrumento IES-R, validado no Brasil16. A IES-R é uma escala composta por 22 itens, graduados de 0 a 4 pontos, referentes à presença, nos últimos sete dias, dos critérios diagnósticos do Tept estabelecidos pelo DSM-IV17. A IES-R é dividida em três subescalas: evitação, intrusão e hiperestimulação. O escore final do instrumento é calculado pela soma da média das subescalas, e o ponto de corte adotado para a presença de TEPT foi 5,6 pontos16.
Alguns itens do questionário Estilo de Vida Fantástico18 foram utilizados para verificação da prática de atividade física vigorosa e moderada semanal, consumo de álcool e de tabaco nos últimos 30 dias, assim como o uso de drogas (como maconha e cocaína) durante a pandemia.
O PHQ-9 foi utilizado para avaliar a presença de sintomas depressivos. O PHQ-9 possui dez itens, dos quais os nove primeiros são pontuados de 0 (“nenhum dia”) a 3 (“quase todos os dias”), de acordo com o número de dias em que os sintomas estiveram presentes nas últimas duas semanas19. O décimo item do questionário avalia o grau de comprometimento funcional causado pelos sintomas para realização de atividades, variando de “nenhuma dificuldade” a “extrema dificuldade”. A partir do escore do instrumento, obtido pela soma dos pontos das nove primeiras questões, pode-se classificar a severidade dos sintomas depressivos em: não há/mínima (de 0 a 4 pontos), depressão suave (de 5 a 9), depressão moderada (de 10 a 14), depressão moderadamente severa (de 15 a 19) e depressão severa (de 20 a 27).
Os sintomas de ansiedade e estresse foram verificados por meio da DASS-2120. Trata-se de uma escala de autorretato composta por 21 itens graduados de 0 (discordo totalmente) a 3 (concordo totalmente), que verificam a forma como o indivíduo se sentia na última semana. O instrumento DASS-21 é divido em subescalas para a depressão, ansiedade e estresse, e o escore de cada subescala é calculado separadamente e permite classificar os níveis de sintomas em normal, leve, moderado, grave e muito grave20.
Outros fatores avaliados foram: a autopercepção de saúde (de ruim a muito boa); a religiosidade - por meio da questão: “Até que ponto você se considera uma pessoa religiosa?”, com resposta variando de “muito religiosa” a “nem um pouco religiosa”; o pensamento sobre suicídio (“Nos últimos 12 meses, você alguma vez pensou seriamente em cometer suicídio?”).
As questões referentes à pandemia da Covid-19 foram: infecção e diagnóstico positivo para Covid-19; falecimento de algum parente ou amigo próximo por causa de complicações da doença; e presença de sintomas gripais durante a pandemia, como febre, calafrios, cefaleia, tosse produtiva, dispneia, fadiga ou cansaço, dor de garganta, coriza, congestão nasal, náusea ou vômitos, diarreia, artralgia, mialgia e anosmia ou disgeusia. Verificou-se ainda se algum estudante necessitou de internação por causa da Covid-19 ou convive com algum indivíduo considerado como grupo de risco para a doença.
Os critérios de inclusão foram: estar matriculado, participando regularmente do curso e ter 18 ou mais anos de idade. Os critérios de exclusão foram a aquiescência com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) não selecionada pelo estudante e a não concordância em participar da pesquisa.
Análise estatística
Para a análise dos dados, utilizou-se o programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS®) versão 22.0. Foram apresentadas as frequências simples e relativa da variável dependente e das independentes, e a associação das variáveis independentes em relação à presença de sintomas de estresse pós-traumático. Realizaram-se análises bivariadas por meio da regressão de Poisson, apresentando razão de prevalência (RP) bruta, intervalo de confiança de 95% (IC95%) e p-valor. As variáveis independentes que apresentaram p-valor ≤ 0,20 na análise bivariada foram selecionadas para compor inicialmente o modelo múltiplo por meio da regressão de Poisson, com variância robusta. As variáveis foram retiradas uma a uma até permanecerem no modelo final apenas as variáveis associadas no nível de 5%. A magnitude das associações do modelo múltiplo foi estimada por RP ajustada, IC95% e p-valor ≤ 0,05, sendo a presença de Tept a categoria a ser testada. A qualidade do modelo foi avaliada por meio do teste de deviance.
Considerações éticas
Todos os participantes da pesquisa foram informados quanto ao procedimento metodológico e convidados a ler atentamente o TCLE, disponibilizado digitalmente. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Montes Claros, sob o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) nº 25716019.1.0000.5146 e Parecer de aprovação nº 3.724.553, de 25 de novembro de 2019. Desse modo, o presente estudo está respaldado pelos preceitos éticos, e estes foram devidamente respeitados, garantindo a voluntariedade da participação, o anonimato das respostas dos participantes e o sigilo dos dados coletados. Todos os participantes aceitaram participar da pesquisa ao concordarem com o TCLE informado digitalmente.
RESULTADOS
Foram respondidos 618 formulários pelos estudantes que pertenciam aos cursos de Educação Física (28,8%), Medicina (25,4%), Odontologia (18,1%), Ciências Biológicas (15,2%) e Enfermagem (12,5%). Entre os participantes, predominaram as seguintes características: sexo feminino, idade entre 21 e 25 anos, não brancos, heterossexuais, que não apresentava necessidade especial ou doença crônica e solteiros. A Tabela 1 apresenta a caracterização dos participantes por meio da análise descritiva das variáveis sociodemográficas e variáveis independentes analisadas.
VARIÁVEL | n | (%) |
---|---|---|
Sexo a | ||
Masculino | 173 | (28,1) |
Feminino | 442 | (71,9) |
Idade (anos) | ||
De 18 a 20 | 214 | (34,6) |
De 21 a 25 | 329 | (53,2) |
26 ou mais | 75 | (12,1) |
Cor | ||
Branca | 188 | (30,4) |
Preta/pardos/amarelos/indígenas | 430 | (69,6) |
Orientação sexual | ||
Heterossexual | 533 | (86,2) |
Outra orientação | 85 | (13,8) |
Possui necessidade especial | ||
Não | 589 | (95,3) |
Sim | 29 | (4,7) |
Presença de doença crônica | ||
Não | 429 | (69,4) |
Sim | 189 | (30,6) |
Estado civil | ||
Solteiro(a) | 570 | (92,2) |
Outro | 48 | (7,8) |
Curso universitário | ||
Ciências Biológicas | 94 | (15,2) |
Educação Física | 178 | (28,8) |
Enfermagem | 77 | (12,5) |
Medicina | 157 | (25,4) |
Odontologia | 112 | (18,1) |
Sobrecarga acadêmica | ||
Não | 83 | (13,4) |
Sim | 535 | (86,6) |
Satisfação com ensino remoto | ||
Satisfeito | 133 | (21,5) |
Não satisfeito (insatisfeito/indiferente) | 485 | (78,5) |
Mora sozinho | ||
Sim | 79 | (12,8) |
Não | 539 | (87,2) |
Trabalho | ||
Não | 411 | (66,5) |
Sim (formal/informal) | 207 | (33,5) |
Renda familiar antes da pandemia | ||
Até 2 salários mínimos | 351 | (56,8) |
Entre 2 e 5 salários mínimos | 160 | (25,9) |
Mais de 5 salários mínimos | 107 | (17,3) |
Considera-se uma pessoa religiosa | ||
Muito/moderadamente | 343 | (55,5) |
Pouco/nem um pouco | 275 | (44,5) |
Autopercepção de saúde | ||
Boa/muito boa | 416 | (67,3) |
Regular/ruim | 202 | (32,7) |
Prática de atividade física vigorosa | ||
Até 3 vezes por semana | 526 | (85,1) |
Mais de 3 vezes por semana | 92 | (14,9) |
Prática de atividade física moderada | ||
Até 3 vezes por semana | 491 | (79,4) |
Mais de 3 vezes por semana | 127 | (20,6) |
Sintomas de depressão | ||
Sem sintomas depressivos/depressão suave | 208 | (33,6) |
Depressão moderada/moderadamente severa | 294 | (47,6) |
Depressão severa | 116 | (18,8) |
Sintomas de ansiedade | ||
Ansiedade normal/leve | 286 | (46,3) |
Ansiedade mínima/moderada | 137 | (22,2) |
Ansiedade grave/muito grave | 195 | (31,6) |
Sintomas de estresse | ||
Estresse normal/leve | 274 | (44,3) |
Estresse mínimo/moderado | 153 | (24,8) |
Estresse grave/muito grave | 191 | (30,9) |
Consumo de álcool nos últimos 30 dias | ||
De 0 a 10 vezes | 553 | (89,5) |
Mais de 10 vezes | 65 | (10,5) |
Consumo de tabaco nos últimos 30 dias | ||
De 0 a 10 vezes | 603 | (97,6) |
Mais de 10 vezes | 15 | (2,4) |
Uso de drogas durante a pandemia | ||
Nunca | 582 | (94,2) |
Algumas vezes | 36 | (5,8) |
Pensamento de suicídio | ||
Não | 510 | (82,5) |
Sim | 108 | (17,5) |
a Variação no n por conta de perdas de dados.
Fonte: Elaborada pelos autores.
Em relação à pandemia da Covid-19, predominou a ausência de diagnóstico para infecção do Sars-CoV-2, assim como ausência de falecimento de parentes e amigos em decorrência de complicações causadas pela doença. Contudo, a maioria referiu ter apresentado sintomas gripais durante o período e conviver com pessoas de grupo de risco. Em relação à internação por decorrência da Covid-19, nenhum estudante necessitou de cuidados hospitalares (Tabela 2).
VARIÁVEL | n | (%) |
---|---|---|
Diagnóstico para a Covid-19 | ||
Não | 589 | (95,3) |
Sim | 29 | (4,7) |
Algum parente ou amigo faleceu pela Covid-19 | ||
Não | 588 | (95,1) |
Sim | 30 | (4,9) |
Presença de sintomas gripais durante a pandemia | ||
Não | 240 | (38,8) |
Sim | 378 | (61,2) |
Sintomas apresentados durante a pandemia | ||
Febre | 82 | (13,3) |
Calafrios | 35 | (5,7) |
Cefaleia | 249 | (40,3) |
Tosse produtiva | 66 | (10,7) |
Dispneia | 70 | (11,3) |
Fadiga/cansaço | 145 | (23,5) |
Dor de garganta | 171 | (27,7) |
Coriza | 186 | (30,1) |
Congestão nasal | 162 | (26,2) |
Náusea ou vômitos | 50 | (8,1) |
Diarreia | 102 | (16,5) |
Artralgia | 40 | (6,5) |
Mialgia | 93 | (15) |
Anosmia/disgeusia | 49 | (7,9) |
Internação por causa da Covid-19 | ||
Não necessária | 157 | (25,4) |
Não se infectou com o coronavírus | 461 | (74,6) |
Convivência com grupo de risco | ||
Não | 158 | (25,6) |
Sim | 460 | (74,4) |
Fonte: Elaborada pelos autores.
A presença de sintomas de estresse pós-traumático verificados pela IES-R obteve prevalência de 32,7% (n = 202) entre os estudantes universitários das Ciências Biológicas e da Saúde. Ademais, calcularam-se a média e a mediana do escore do instrumento e de suas subescalas, cujos resultados estão dispostos no Gráfico 1.
A análise bivariada efetuada por meio da regressão de Poisson, com variância robusta, demonstrou associação significativa (p ≤ 0,05) entre Tept e ser do sexo feminino, possuir outra orientação sexual (homossexual, bissexual, pansexual, assexual), ter alguma condição crônica de saúde, pertencer ao curso de Educação Física, referir autopercepção de saúde como regular ou ruim, presença de sintomas depressivos, de ansiedade e de estresse, consumir álcool e tabaco mais de dez vezes nos últimos 30 dias, pensamento sobre suicídio no último ano e ter apresentado algum sintoma gripal durante a pandemia (Tabela 3).
VARIÁVEL | TEPT (IES-R) | RP bruta (IC95%) | p-valor | |
---|---|---|---|---|
Não | Sim | |||
n (%) | n (%) | |||
Sexo a | < 0,001 | |||
Masculino | 142 (82,1) | 31 (17,9) | 1,0 | |
Feminino | 271 (61,3) | 171 (28,7) | 2,15 (1,53;3,03) | |
Idade (anos) | 0,074 | |||
De 18 a 20 | 140 (65,4) | 74 (34,6) | 1,0 | |
De 21 a 25 | 216 (65,7) | 113 (34,3) | 0,57 (0,35;0,94) | |
26 ou mais | 60 (80) | 15 (20) | 0,99 (0,78;1,25) | |
Cor | 0,650 | |||
Branca | 129 (68,6) | 59 (31,4) | 1,0 | |
Preta/pardos/amarelos/indígenas | 287 (66,7) | 143 (33,3) | 1,06 (0,82;1,36) | |
Orientação sexual | 0,030 | |||
Heterossexual | 367 (68,9) | 166 (31,1) | 1,0 | |
Outra orientação | 49 (57,6) | 36 (42,4) | 1,36 (1,03;1,79) | |
Possui necessidade especial | 0,119 | |||
Não | 400 (67,9) | 189 (32,1) | 1,0 | |
Sim | 16 (55,2) | 13 (44,8) | 1,39 (0,91;2,12) | |
Presença de doença crônica | < 0,001 | |||
Não | 313 (73) | 116 (27) | 1,0 | |
Sim | 103 (54,5) | 86 (45,5) | 1,68 (1,35;2,09) | |
Estado civil | 0,161 | |||
Solteiro(a) | 379 (66,5) | 191 (33,5) | 1,0 | |
Outro | 37 (77,1) | 11 (22,9) | 0,68 (0,40;1,16) | |
Curso universitário | 0,003 | |||
Ciências Biológicas | 58 (61,7) | 36 (38,3) | 1,0 | |
Educação Física | 133 (74,7) | 45 (25,3) | 0,66 (0,46;0,94) | |
Enfermagem | 51 (66,2) | 26 (33,8) | 0,88 (0,58;1,32) | |
Medicina | 113 (72) | 44 (28) | 0,73 (0,51;1,04) | |
Odontologia | 61 (54,5) | 51 (32,7) | 1,18 (0,85;1,64) | |
Sobrecarga acadêmica | 0,091 | |||
Não | 63 (75,9) | 20 (24,1) | 1,0 | |
Sim | 353 (66) | 182 (34) | 1,41 (0,94;2,10) | |
Satisfação com ensino remoto | 0,089 | |||
Satisfeito | 98 (73,7) | 35 (26,3) | 1,0 | |
Não satisfeito (insatisfeito/indiferente) | 318 (65,6) | 167 (34,4) | 1,30 (0,96;1,78) | |
Mora sozinho | 0,963 | |||
Sim | 53 (67,1) | 26 (32,9) | 1,0 | |
Não | 363 (67,3) | 176 (32,7) | 0,99 (0,70;1,39) | |
Trabalho | 0,245 | |||
Não | 283 (68,9) | 128 (31,1) | 1,0 | |
Sim (formal/informal) | 133 (64,3) | 74 (35,7) | 1,14 (0,91;1,44) | |
Renda familiar antes da pandemia | 0,276 | |||
Até 2 salários mínimos | 234 (66,7) | 117 (33,3) | 1,0 | |
Entre 2 e 5 salários mínimos | 103 (64,4) | 57 (35,6) | 1,06 (0,82;1,38) | |
Mais de 5 salários mínimos | 79 (73,8) | 28 (26,2) | 0,78 (0,55;1,11) | |
Considera-se uma pessoa religiosa | 0,219 | |||
Muito/moderadamente | 238 (69,4) | 105 (30,6) | 1,0 | |
Pouco/nem um pouco | 178 (64,7) | 97 (35,3) | 1,15 (0,91;1,44) | |
Autopercepção de saúde | < 0,001 | |||
Boa/muito boa | 326 (78,4) | 90 (21,6) | 1,0 | |
Regular/ruim | 90 (44,6) | 112 (55,4) | 2,56 (2,05;3,19) | |
Prática de atividade física vigorosa | 0,798 | |||
Até 3 vezes por semana | 353 (67,1) | 173 (32,9) | 1,0 | |
Mais de 3 vezes por semana | 63 (68,5) | 29 (31,5) | 0,95 (0,69;1,32) | |
Prática de atividade física moderada | 0,463 | |||
Até 3 vezes por semana | 327 (66,6) | 164 (33,4) | 1,0 | |
Mais de 3 vezes por semana | 89 (70,1) | 38 (29,9) | 0,89 (0,66;1,20) | |
Depressão | < 0,001 | |||
Sem sintomas depressivos/depressão suave | 198 (95,2) | 10 (4,8) | 1,0 | |
Depressão moderada/moderadamente severa | 183 (62,2) | 111 (37,8) | 7,85 (4,21;14,63) | |
Depressão severa | 35 (30,2) | 81 (69,8) | 14,52 (7,84;26,9) | |
Ansiedade | < 0,001 | |||
Ansiedade normal/leve | 262 (91,6) | 24 (8,4) | 1,0 | |
Ansiedade mínima/moderada | 97 (70,8) | 40 (29,2) | 3,47 (2,18;5,53) | |
Ansiedade grave/muito grave | 57 (29,2) | 138 (79,8) | 8,43 (5,69;12,49) | |
Estresse | < 0,001 | |||
Estresse normal/leve | 256 (93,4) | 18 (6,6) | 1,0 | |
Estresse mínimo/moderado | 106 (69,3) | 47 (30,7) | 4,67 (2,81;7,75) | |
Estresse grave/ muito grave | 54 (28,3) | 137 (71,7) | 10,91 (6,92;17,2) | |
Consumo de álcool nos últimos 30 dias | < 0,001 | |||
De 0 a 10 vezes | 385 (69,6) | 168 (30,4) | 1,0 | |
Mais de 10 vezes | 31 (47,7) | 34 (52,3) | 1,72 (1,32;2,24) | |
Consumo de tabaco nos últimos 30 dias | < 0,001 | |||
De 0 a 10 vezes | 412 (68,3) | 191 (31,7) | 1,0 | |
Mais de 10 vezes | 4 (26,7) | 11 (73,3) | 2,31 (1,67;3,21) | |
Uso de drogas durante a pandemia | 0,208 | |||
Nunca | 395 (67,9) | 187 (32,1) | 1,0 | |
Algumas vezes | 21 (58,3) | 15 (41,7) | 1,29 (0,86;1,94) | |
Pensamento de suicídio | < 0,001 | |||
Não | 368 (72,2) | 142 (27,8) | 1,0 | |
Sim | 48 (44,4) | 60 (55,6) | 1,99 (1,60;2,48) | |
Diagnóstico para a Covid-19 | 0,345 | |||
Não | 394 (66,9) | 195 (33,1) | 1,0 | |
Sim | 22 (75,9) | 7 (24,1) | 0,72 (0,37;1,40) | |
Algum parente ou amigo faleceu pela Covid-19 | 0,624 | |||
Não | 397 (67,5) | 191 (32,5) | 1,0 | |
Sim | 19 (63,3) | 11 (36,7) | 1,12 (0,69;1,83) | |
Presença de sintomas gripais durante a pandemia | < 0,001 | |||
Não | 188 (78,3) | 52 (21,7) | 1,0 | |
Sim | 228 (60,3) | 150 (39,7) | 1,83 (1,39;2,40) | |
Internação por conta da Covid-19 | 0,080 | |||
Não infectado pelo coronavírus | 319 (69,2) | 142 (30,8) | 1,0 | |
Não necessária | 97 (61,8) | 60 (38,2) | 1,24 (0,97;1,57) | |
Convivência com grupo de risco | 0,143 | |||
Não | 114 (72,2) | 44 (27,8) | 1,0 | |
Sim | 302 (65,7) | 158 (34,3) | 1,23 (0,93;1,63) |
Tept: transtorno de estresse pós-traumático; IES-R: Escala de Impacto do Evento-Revisada; RP: razão de prevalência; IC95%: intervalo de confiança de 95%; p-valor: teste de Wald. a Variação no n por conta de perdas de dados.
Fonte: Elaborada pelos autores.
No modelo múltiplo com RP ajustada, IC95% e p ≤ 0,05, os fatores que mantiveram a associação estatisticamente significativa com a presença de sintomas de Tept induzidos pela pandemia da Covid-19 entre os estudantes de Ciências Biológicas e da Saúde foram a presença de sintomas depressivos, de estresse e de ansiedade, a presença de autopercepção de saúde regular ou ruim, a presença de sintomas gripais durante a pandemia e o curso acadêmico (Tabela 4).
Fatores associados | RP ajustada (IC95%) | p-valor |
---|---|---|
Depressão | 0,023 | |
Sem sintomas depressivos/depressão suave | 1 | |
Depressão moderada/moderadamente severa | 2,81 (1,31;6,17) | |
Depressão severa | 2,85 (1,34;5,89) | |
Estresse | 0,001 | |
Estresse normal/leve | 1 | |
Estresse mínimo/moderado | 1,97 (1,05;3,72) | |
Estresse grave/ muito grave | 2,93 (1,53;5,62) | |
Ansiedade | 0,003 | |
Ansiedade normal/leve | 1 | |
Ansiedade mínima/moderada | 1,57 (0,95;2,62) | |
Ansiedade grave/muito grave | 2,29 (1,35;3,87) | |
Autopercepção de saúde | 0,035 | |
Boa/muito boa | 1 | |
Regular/ruim | 1,24 (1,01;1,51) | |
Presença de sintomas gripas durante a pandemia | 0,019 | |
Não | 1 | |
Sim | 1,30 (1,04;1,63) | |
Curso | 0,034 | |
Ciências Biológicas | 1 | |
Educação Física | 0,86 (0,64;1,15) | |
Enfermagem | 0,88 (0,64;1,22) | |
Medicina | 1,14 (0,87;1,48) | |
Odontologia | 1,25 (0,96;1,63) | |
Deviance: 0,442 / p-valor: 0,550 |
RP: Razão de prevalência; IC95%: intervalo de confiança de 95%; p-valor: teste de Wald.
Fonte: Elaborada pelos autores.
DISCUSSÃO
Neste estudo, foram investigados 618 acadêmicos de cursos da área de Ciências Biológicas e da Saúde, durante a pandemia da Covid-19. Na análise multivariada, verificou-se uma associação significativa entre o Tept e a presença de sintomas depressivos, de estresse e de ansiedade, autopercepção negativa da saúde, presença de sintomas gripais durante a pandemia e estar cursando Odontologia.
A prevalência de sintomas depressivos severos, de ansiedade grave a muito grave e de estresse grave a muito grave verificados na população investigada chamou a atenção, sendo encontrados 18,8%, 31,6% e 30,9%, respectivamente. Ademais, verificou-se uma associação significativa entre o Tept e a presença desses sintomas. Os níveis de ansiedade entre estudantes universitários durante a pandemia da Covid-19 revelaram que a saúde mental deles foi afetada, tendo em vista que 24,9% dessa população apresentou alguma forma de sintomatologia ansiosa, variando de leve a grave21. Esse resultado indica a gênese de sofrimento mental durante o período pandêmico e em decorrência direta dele. Nesse sentido, foram relatados sentimentos de desconforto, preocupação, inquietação, perda de sentido da vida, iminência de pânico e sentimento de não saber o que fazer22, corroborando a prevalência elevada dos sintomas de ansiedade, estresse e depressão e sua relação com os sintomas de Tept.
Uma revisão sistemática com metanálise realizada em 202123, que incluiu um total de 55 estudos e considerou 68 amostras independentes ou subamostras, mostrou que pesquisas realizadas entre as populações afetadas pelo surto de Sars-CoV-2 apontaram que o risco de contaminação, infecção e morte de entes queridos, medidas de contenção, isolamento social e solidão estão entre os principais fatores de risco associados ao sofrimento psíquico, à ansiedade e ao estresse. A disrupção da rotina acadêmica, de aulas práticas e de estágios curriculares, que culminou no distanciamento de amigos e colegas, e na preocupação relativa ao atraso de atividades e de prosseguimento do curso, foi outro fator associado à alteração da saúde mental durante a pandemia24. Posto isso, fica evidente que a pandemia, ao elevar os níveis de sofrimento mental, provocou um impacto importante na alta da prevalência de Tept, depressão, ansiedade, insônia e sofrimento psicológico23.
Ademais, é possível que a mudança brusca da metodologia tradicional de ensino na sala de aula para o aprendizado remoto tenha influenciado negativamente a saúde mental dos estudantes, visto que a frustração com a estrutura e a abordagem do ensino on-line podem ter provocado a aquisição insatisfatória de conhecimento pelos estudantes universitários11 e, por conseguinte, o incremento nos níveis de ansiedade e estresse. Há que se considerar ainda o impacto do isolamento social e o impedimento das interações sociais habituais em razão das estratégias de mitigação da pandemia da Covid-19, posto que, em conjunto, esses fatores engendraram consequências psicológicas negativas, que descompensaram ou intensificaram sintomas prévios de transtornos mentais e, paralelamente, limitaram o acesso aos serviços psiquiátricos para amparo a essas enfermidades25. De mesmo modo, é possível que o isolamento social tenha aprofundado experiências de solidão26.
Outrossim, os estressores psicossociais também podem ter contribuído para a intensificação do sofrimento mental durante a pandemia25, visto que se associaram a taxas relativamente altas de ansiedade, depressão, Tept e sintomas de sofrimento psicológico entre a população afetada por Covid-19 em vários países27. Nessa perspectiva, o fato de possuir parentes ou conhecidos infectados pelo vírus Sars-CoV-2 foi descrito como um importante fator estressor intrinsicamente vinculado a quadros de ansiedade entre universitários. Em decorrência disso, a presença de distúrbios de saúde mental, especialmente a depressão, realçou mudanças comportamentais e adoção de hábitos inadequados de saúde, como o uso abusivo de substâncias28. Assim, o aumento do consumo de bebidas alcoólicas, por um lado, emerge como parte de um coping desajustado10, em consequência dos fatores estressores concernentes à pandemia, mas, por outro, agrava os sintomas psicopatológicos29 inicialmente presentes, elevando sua prevalência.
Neste estudo, verificou-se, ainda, uma prevalência de autopercepção negativa da saúde (32,7%), acima da encontrada em outros estudos, que, de modo geral, apresenta-se em torno de 20%30. Talvez essa diferença esteja associada com a especificidade e as particularidades da amostra estudada, tais como as vivências de mudanças relacionadas ao ensino on-line, a sobrecarga acadêmica e o fato de serem estudantes de cursos de ciências da saúde, além de todo o contexto atual da pandemia da Covid-19 e de suas implicações. A autoavaliação do estado de saúde busca, de forma subjetiva, descrever o estado de saúde atual do indivíduo e constitui uma das variáveis mais utilizadas em estudos epidemiológicos31. Existe uma relação importante entre a autopercepção de saúde regular ou ruim e o desenvolvimento de sinais de estresse psicológico, o que predispõe o indivíduo a desenvolver transtornos mentais, inclusive o Tept32, e isso pode ter contribuído para a vigência da associação significativa encontrada no modelo múltiplo realizado nesta pesquisa.
A associação entre presença de sintomas gripais e Tept encontrada neste estudo foi vultosa (p ≤ 0,001), já que 60,3% dos pesquisados que apresentaram tais sintomas manifestaram também sintomas de Tept. Diante disso, é possível que essa variável seja fator importante de contribuição para o desenvolvimento de Tept, visto que pessoas que apresentaram sintomas gripais durante o surto de Sars-CoV-2 tiveram um impacto danoso em sua saúde física e mental em rezão de acusações de espalharem o vírus, além de sofrerem atitudes hostis que lhes causaram pressão psicológica, conforme verificado no estudo de Zhen et al.33, realizado com 1.153 estudantes universitários. Ainda de acordo com esse estudo, a pandemia da Covid-19 pode ser vista como um evento traumático, com capacidade de causar sintomas de Tept, já que, entre os jovens que experimentaram a pandemia e a quarentena do coronavírus e sofreram com elas, muitos tiveram seus comportamentos agressivos aumentados, com uma tendência a passar por altos níveis de raiva e medo33.
Quanto aos cursos de graduação em que os pesquisados estavam matriculados, verificou-se uma associação da maior prevalência dos sintomas de Tept entre universitários da Odontologia no modelo múltiplo (RP = 1,25), a qual se justifica, talvez, pelo fato de que os procedimentos odontológicos cursam com a produção e a disseminação de gotículas e aerossóis34. A saliva, com a qual os dentistas e os acadêmicos de Odontologia estão em constante contato, deriva de glândulas salivares, que se comportam como reservatórios do vírus Sars-CoV-2, colocando, assim, essas pessoas em maior risco35),(36. Em 2020, um estudo realizado com uma amostra de 669 dentistas oriundos de mais de 30 países constatou que mais de dois terços dos participantes apresentavam sintomas de ansiedade e medo perante os efeitos da pandemia da Covid-19, tornando-os mais suscetíveis ao desenvolvimento de transtornos mentais, como o Tept37. No entanto, vale destacar a importante associação com o Tept encontrada neste estudo entre os acadêmicos de Medicina (RP = 1,14), a qual pode estar relacionada às questões econômicas, aos efeitos da quarentena na rotina diária e às mudanças acadêmicas38. A esses fatores somaram-se a interrupção dos planos e a incerteza do futuro na carreira profissional7.
É preciso ressaltar, no entanto, a contribuição de um fator de impacto significativo na vida acadêmica, durante o período pandêmico - o ensino on-line. Posto que a comunicação on-line possui o mesmo objetivo que o ensino presencial - transferir informação, conhecimento, pensamento, entre outros39 -, é possível que a mudança brusca da abordagem tradicional na sala de aula (presencial) para o aprendizado remoto tenha contribuído negativamente para a saúde mental dos estudantes, na medida em que se modificou o método de alcance desse objetivo. Concernente a outros estudos, foi possível estabelecer, portanto, que a pandemia e seus fatores associados impactaram a vida acadêmica e a saúde dos universitários e de seus familiares, tendo em vista a observação das reações emocionais negativas, como estresse, ansiedade, luto, raiva e pânico, por consequência da preocupação com o atraso das atividades acadêmicas e do medo de adoecimento34.
CONCLUSÃO
Este estudo investigou a autopercepção do estado psicológico dos estudantes universitários de Ciências Biológicas e da Saúde durante a pandemia da Covid-19. Verificou-se que houve impacto significativo na saúde mental desses acadêmicos com presença de sintomas depressivos, ansiedade e estresse acima dos encontrados na literatura científica, e, consequentemente, constatou-se alta na prevalência do Tept. Os estudantes universitários constituem uma população muito vulnerável a problemas psicológicos e, em emergências de saúde pública, podem ter a saúde mental mais afetada. Por se tratar de uma população com tendência a experimentar comportamentos suicidas, requer maior atenção, ajuda e apoio da família, da sociedade e das instituições acadêmicas. Os achados deste estudo indicam a importância de implementar mais programas de intervenção precoce e ações rigorosas, ao fornecer evidências para que universidades e governo adotem políticas públicas a fim de minimizar esse problema, seja na reflexão sobre o papel que desempenham na promoção da saúde e na prevenção do sofrimento psíquico, atuando de forma enérgica contra esse mal, seja por meio de serviços psicológicos qualificados, direcionados aos estudantes universitários e familiares. Ademais, estudos longitudinais adicionais podem fortalecer nossos achados.