INTRODUÇÃO
O conhecimento sobre pesquisa científica e a compreensão dela são habilidades que devem ser desenvolvidas por todos os profissionais de saúde. É imprescindível que esses profissionais considerem a importância da metodologia científica mesmo que não estejam engajados diretamente na realização de pesquisas científicas1. Agregar experiência clínica e habilidade à análise crítica referente à informação científica contribui para a melhoria da qualidade da assistência à saúde, elemento preconizado pela Medicina Baseada em Evidências2.
É indubitável que o desenvolvimento dessas habilidades e competências em pesquisa contribui positivamente para a formação do futuro médico, estimulando a capacidade de avaliar a literatura, a experiência de trabalho em equipe, a aptidão na utilização de dados e na escrita de trabalhos científicos, bem como a formação de um pensamento crítico3),(4. Esse último fator é fundamental para que o médico consiga analisar criteriosamente a literatura, de forma a integrar os novos conhecimentos e as informações científicas à sua prática clínica cotidiana1),(5.
Apesar da importância do componente de metodologia da pesquisa na formação médica, estudos apontam que muitos países em desenvolvimento não o incluem de forma satisfatória nos currículos da graduação em Medicina6),(7. Tal cenário, por sua vez, contribui para que a temática de pesquisa seja colocada em segundo plano em detrimento de uma sobrecarga de disciplinas básicas e clínicas. Além disso, outros fatores podem dificultar o envolvimento do estudante de graduação com a pesquisa, como a ausência de fomento e de estímulo institucional, a falta de tempo por causa das demandas acadêmicas e a carência de material para pesquisa5),(8)-(10.
Com base no exposto, este estudo se propõe a verificar o interesse e envolvimento em pesquisa científica entre os estudantes de Medicina, analisando o perfil acadêmico e as atividades extracurriculares realizadas, além de avaliar a produção de material científico e identificar as motivações e dificuldades enfrentadas.
MÉTODO
Trata-se de um estudo transversal, de caráter descritivo e exploratório, com abordagem quantitativa.
A população-alvo foi composta por estudantes de Medicina de instituições de ensino superior (IES) localizadas na cidade de Salvador, na Bahia. Adotaram-se os seguintes critérios de inclusão: ter mais de 18 anos e estar regularmente matriculado no curso. É importante ressaltar que todas as instituições envolvidas no presente estudo ofertam no currículo o componente de metodologia da pesquisa científica na formação médica.
Para o cálculo do tamanho amostral, considerou-se a população total de estudantes de Medicina da cidade de Salvador em 2020, o que foi estimado com base nas vagas disponibilizadas pelo Ministério da Educação no ato de autorização do curso e no tempo de existência de cada um. Assim, o tamanho amostral foi calculado considerando uma população heterogênea de 7.500 estudantes de Medicina11, para um intervalo de confiança de 95% e erro amostral de 5%. Adicionando 10% de segurança em relação a perdas amostrais, estimou-se a participação de, pelo menos, 366 estudantes.
Foram registrados dados sociodemográficos (idade, sexo, renda familiar) e acadêmicos (ano em curso; natureza administrativa da instituição de ensino; realização de graduação prévia; participação em ligas acadêmicas, monitoria e grupos de pesquisa; publicação científica).
Além disso, coletaram-se informações sobre fatores que pudessem influenciar no interesse e envolvimento do estudante com pesquisa científica, como a presença de familiares com títulos acadêmicos (pais ou irmãos), a pretensão de trabalhar com pesquisa científica antes de ingressar na graduação e a percepção do elemento curricular mais importante para construção do conhecimento médico (prática, teoria ou pesquisa). Por fim, verificou-se o interesse e a motivação para produzir conteúdo científico e os fatores motivacionais e dificultadores para realizar pesquisa científica.
Para a avaliação do interesse, da motivação e das dificuldades em produzir conteúdo científico, utilizou-se uma escala Likert com cinco níveis de respostas, as quais, posteriormente, foram agrupadas em três estratos para análise: para interesse - concordância (total ou parcial), indiferença e discordância (total ou parcial); para motivação - motivados (total ou parcial), indiferentes e desmotivados (total ou parcial); para dificuldade - concordantes (total ou parcial), indiferentes e discordantes (total ou parcial).
Os discentes de Medicina foram convidados a participar da pesquisa por meio do método snowball 12, técnica de amostragem não probabilística que permite que os sujeitos de estudo recrutem outros sujeitos elegíveis para o próprio estudo.
Para a coleta de dados, aplicou-se um questionário estruturado, anônimo, de autopreenchimento, preparado pelos próprios pesquisadores, especificamente para esta pesquisa, composto por 21 perguntas de múltipla escolha. Elaborou-se o formulário na plataforma Microsoft Forms, cujo link foi enviado eletronicamente por meio das principais plataformas de comunicação, como redes sociais e grupos no WhatsApp.
Antes do início da coleta de dados, o questionário estruturado pelos pesquisadores passou por um processo de validação, a fim de melhorar a compreensão das afirmações, eliminar eventuais imprecisões e garantir o alcance dos objetivos propostos. Para tal, realizou-se um estudo-piloto com dez estudantes elegíveis para a pesquisa, de modo a garantir a confiabilidade e clareza do instrumento de coleta de dados. As respostas obtidas no estudo-piloto não foram utilizadas na amostra final do estudo.
Analisaram-se os dados por meio do programa estatístico IBM SPSS Statistics, versão 28.0. As variáveis categóricas foram apresentadas em números absolutos e relativos; e as variáveis contínuas, em média e desvio padrão por terem apresentado distribuição simétrica. Para verificar a existência de relação entre os ciclos acadêmicos e o interesse em pesquisa, agruparam-se os anos do curso em ciclo básico (primeiro e segundo anos), clínico (terceiro e quarto anos) e internato (quinto e sexto anos). A escala Likert foi agrupada em três estratos: concordância (total ou parcial), indiferença e discordância (total ou parcial). A comparação entre os grupos foi feita por meio do teste qui-quadrado, sendo considerado um valor de p < 0,05 como estatisticamente significante.
O presente trabalho está em consonância com as Resoluções nºs 466/2012 e 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto Mantenedor de Ensino Superior da Bahia: CAAE nº 47770721.4.0000.5032 e Parecer nº 4.812.636.
RESULTADOS
O estudo obteve 467 respostas aos formulários, das quais sete foram excluídas por não atenderem aos critérios de elegibilidade. Sendo assim, a amostra final foi composta por 460 participantes, correspondendo a um quantitativo 25,7% superior ao tamanho amostral mínimo calculado.
Dentre os estudantes participantes, a idade foi de 24,1+6,1 anos, sendo estes majoritariamente do sexo feminino (66,3%), de instituições privadas (80,2%), que se encontravam nos ciclos básico (45,4%) e clínico (46,7%) do curso de Medicina, que não cursaram outra graduação previamente (80,4%), e, dos que possuíam formação anterior, a graduação anterior foi na área de saúde (53,6%) (Figura 1).
Quando se analisaram as atividades extracurriculares, observaram-se diferenças em relação à participação em ligas acadêmicas, monitorias e grupos de pesquisa. Constatou-se a participação em ligas acadêmicas na maioria dos estudantes (54,6%), enquanto, nas atividades de monitoria e grupos de pesquisa, o envolvimento foi menos expressivo (29,1% e 31,1%, respectivamente) (Figura 2).
Com relação à produção científica, observou-se que 33,9% dos estudantes possuem resumos aceitos em congresso; 12,2%, artigos publicados como coautor; e apenas 7,4%, artigos publicados como autor principal. Dentre os estudantes que possuem produção científica, a maioria publicou de um a dois resumos (50,0%) e de um a dois artigos como autor principal ou coautor (94,1% e 85,8%, respectivamente) (Figura 2).
Quando se analisou o desejo de trabalhar com pesquisa, observou-se que apenas 45,2% dos estudantes afirmaram ter interesse prévio, anterior à graduação, enquanto 53,9% possuem desejo atual de trabalhar com pesquisa durante a graduação, sendo esse crescimento estatisticamente significante (p = 0,010) (Figura 2).
Com relação aos elementos que compõem a formação médica, evidenciou-se que 83,1% dos estudantes identificam a prática como elemento fundamental, sendo esta seguida pela pesquisa (8,9%) e, em sequência, pela teoria (8,0%).
No aspecto motivacional, nota-se que 66,1% dos estudantes se sentem motivados a produzir conteúdo científico (Tabela 1). Dentre os fatores motivacionais elencados por esses estudantes, os mais relatados foram: ter experiências em pesquisa (27,4%), interesse genuíno na descoberta científica (20,9%), direcionar a prática médica (15,9%) e incremento no currículo (15,9%) (Figura 3). Ademais, 80,9% dos estudantes consideram haver dificuldades e impedimentos para produzir conteúdo científico (Tabela 1). Os empecilhos com maior representatividade foram: orientação inadequada ou falta de orientação (16,0%), desconhecimento sobre o processo científico (15,7%), falta de tempo por conta das demandas da graduação (15,5%) e falta de estímulo institucional ou ausência de financiamento (15,0%) (Figura 3).
MOTIVAÇÃO | |
---|---|
Você se sente motivado a produzir conteúdo científico? | n (%) |
Concordância | 304 (66,1) |
Indiferença | 89 (19,3) |
Discordância | 67 (14,6) |
DIFICULDADES E IMPEDIMENTOS | |
Produzir conteúdo científico é difícil? | n (%) |
Concordância | 372 (80,9) |
Indiferença | 72 (15,7) |
Discordância | 16 (3,4) |
n: número absoluto; %: porcentagem.
Fonte: Elaborada pelos autores.
Não foi observada dependência entre o ciclo acadêmico em curso e a motivação ou a dificuldade para produzir cientificamente (Tabela 2), sugerindo que não há variação da motivação e da dificuldade à medida que a formação médica avança.
Variáveis | Ciclos acadêmicos | p* | ||
---|---|---|---|---|
Básico | Clínico | Internato | ||
Motivação, n (%) | ||||
Motivados | 145 (47,7) | 133 (43,8) | 26 (8,6) | 0,138 |
Indiferentes | 42 (47,2) | 41 (46,1) | 6 (6,7) | |
Desmotivados | 22 (32,8) | 41 (61,2) | 4 (6,0) | |
Dificuldade, n (%) | ||||
Concordantes | 159 (42,7) | 182 (48,9) | 31 (8,3) | 0,219 |
Indiferentes | 41 (56,9) | 27 (37,5) | 4 (5,6) | |
Discordantes | 9 (56,3) | 6 (37,5) | 1 (6,3) |
n: número absoluto; %: porcentagem; * teste qui-quadrado.
Fonte: Elaborada pelos autores.
Quando se analisaram a motivação e a dificuldade para produzir cientificamente entre estudantes de IES públicas e privadas, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas (Tabela 3).
Variáveis | IES | p* | |
---|---|---|---|
Pública (n = 91) | Privada (n = 369) | ||
Motivação, n (%) | |||
Motivados | 58 (63,7) | 246 (66,7) | 0,660 |
Indiferentes | 17 (18,7) | 72 (19,5) | |
Desmotivados | 16 (17,6) | 51 (13,8) | |
Dificuldade, n (%) | |||
Concordantes | 79 (86,8) | 239 (79,4) | 0,272 |
Indiferentes | 10 (11,0) | 62 (16,8) | |
Discordantes | 2 (2,2) | 14 (3,8) |
IES: instituição de ensino superior; n: número absoluto; %: porcentagem; * teste qui-quadrado.
Fonte: Elaborada pelos autores.
DISCUSSÃO
O presente estudo demonstrou que é alto o interesse dos estudantes de Medicina em pesquisa científica. Entretanto, apenas uma pequena parcela deles está envolvida com essas atividades, majoritariamente com aquelas desenvolvidas nas ligas acadêmicas.
É importante salientar que a formação médica possui estreita relação com a compreensão das evidências científicas. As Diretrizes Curriculares Nacionais para cursos de Medicina (DCN)13 trazem, explicitamente, a necessidade da formação de médicos cientificamente críticos e reflexivos. Diante disso, o presente estudo traz luz à reflexão quanto ao envolvimento dos estudantes de Medicina com a pesquisa científica ao longo de sua formação acadêmica.
A pesquisa científica está intrinsecamente presente no conhecimento médico e, ao longo dos séculos, provou-se de grande importância para o desenvolvimento da prática médica e de suas tecnologias14),(15. Logo, no curso de graduação, espera-se que a metodologia científica e as atividades relacionadas a ela estejam bem estruturadas, de modo a permitir o aprimoramento precoce de atitudes em relação à ciência1 e gerar estímulo para que parte desses estudantes continue a produzir conhecimento e tecnologia por meio de pesquisas científicas próprias após o término do curso16.
No contexto da formação médica, a pesquisa científica pode ser introduzida de várias maneiras, como por meio da iniciação científica16 e de mentorias científicas17. Ao realizarem essas atividades, os estudantes são capazes de absorver qualidades éticas cultivadas na prática clínica de forma mais intensa que em aulas convencionais, além de receberem estímulos para se tornarem futuros pesquisadores16. Acredita-se que o estudante compreenda a importância dessa atividade científica para a sua formação, fato demonstrado por Oliveira et al.5 que, ao analisarem a prática de iniciação científica em seis cursos médicos de quatro estados brasileiros, apontaram que ela foi defendida como obrigatória por 84% dos estudantes. Ademais, alguns estudos consideram que a curricularização das atividades de pesquisa científica possa aumentar o interesse e o envolvimento dos acadêmicos de Medicina17),(18.
Além da iniciação científica, as ligas acadêmicas exercem uma influência relevante no envolvimento científico dos estudantes, especialmente no oferecimento de oportunidades de pesquisa aplicada e no engajamento em grupos de pesquisa19. Isso pôde ser atestado no presente estudo, em que foi demonstrada uma majoritária participação dos estudantes em ligas acadêmicas quando comparada à participação em atividades de monitoria e grupos de pesquisa. Consoante a isso, é sabido que as ligas acadêmicas possibilitam uma formação diferenciada em saúde ao anteciparem a inserção de seus integrantes nos campos de atuação e preencherem as lacunas do conhecimento, principalmente por meio do protagonismo e autonomia discentes, o que favorece a participação dos estudantes em atividades de extensão acadêmica20),(21.
Corroborando os resultados obtidos por estudos anteriores22)-(25, identificou-se um baixo percentual de estudantes que possuem artigos publicados em periódicos científicos ou resumos em anais de congressos e eventos ao longo da graduação. A alta demanda curricular obrigatória dos cursos de Medicina14),(26),(27, somada ao fato de que o papel da graduação não é formar pesquisadores, pode contribuir para esse contexto. Por conseguinte, no intuito de reverter esse cenário, diversas instituições de ensino têm implementado estratégias acadêmicas para aprimorar o engajamento científico dos estudantes28),(29 por meio da implantação de currículos inovadores30. Das práticas exitosas que vêm sendo implementadas, uma é a mentoria científica17. Essa atividade promove o estímulo à pesquisa por meio do acompanhamento do estudante de forma seriada ao longo de sua formação científica, com incentivos e estabelecimento de metas até a efetiva publicação do trabalho científico17.
Com relação aos elementos mais importantes para sua formação médica, notou-se uma supervalorização das atividades práticas em detrimento da pesquisa e da teoria. Esse achado pode ser explicado pelo processo de construção de conhecimento em que a prática tem sido reconhecida como eixo. A partir deste, os problemas emergentes no cotidiano da formação são identificados, questionados, teorizados e investigados não como meros exemplos da aplicação teórica, mas como núcleos da produção e difusão das teorias científicas31.
Contudo, a relação entre esses elementos é fundamental, visto que tanto a pesquisa aperfeiçoa o conhecimento teórico quanto o profundo conhecimento da teoria fomenta questões para a realização de boas pesquisas, caminhando para o progresso da ciência e de suas aplicações. Diante disso, diversas instituições de ensino vêm implementando programas obrigatórios de pesquisa ao longo da graduação5),(6.
Notou-se ainda que a maioria dos estudantes participantes se sente motivada a produzir conteúdo científico, sendo as principais motivações a oportunidade de ter experiência com pesquisa e o interesse genuíno na descoberta científica. Tais resultados dialogam com o estudo de Stone et al.7, no qual também se evidenciam interesse e atitude positiva dos estudantes de Medicina em relação à pesquisa científica, variando os aspectos motivacionais. Entretanto, o interesse dos estudantes nessa área de atuação não se reflete na formação de médicos-cientistas na mesma proporção, o que, por sua vez, pode estar intimamente relacionado aos fatores dificultadores.
A dificuldade em produzir cientificamente foi evidenciada no presente estudo, estando associada a fatores dificultadores como orientação inadequada, ou a falta dela, aliada ao desconhecimento do processo científico que impede os estudantes de reconhecer oportunidades de pesquisa1),(7. Acredita-se que essas dificuldades e impedimentos podem ampliar o distanciamento entre os estudantes e a pesquisa científica.
Ademais, os fatores dificultadores evidenciados neste estudo apresentaram proporção semelhante à de outros estudos disponíveis na literatura5),(7),(9. Quando se faz uma análise comparativa com outro estudo brasileiro realizado há mais dez anos, a falta de estímulo institucional continua a ser a maior e mais importante dificuldade. Esse achado chama a atenção, pois, mesmo após mais de uma década, há persistência de um sistema de ensino deficitário nesse aspecto. Além disso, vale destacar que, em ambos os estudos aqui comparados, não é demonstrado desinteresse por parte do estudante, o que reforça questões extrínsecas ao indivíduo como mais relevantes para a falta de envolvimento em pesquisa.
Por sua vez, Oliveira et al.5 apontam para a carência de condições materiais como obstáculo importante. Entretanto, esse elemento não foi apontado como um problema relevante pela grande maioria dos estudantes. Essa diferença, provavelmente, decorre do predomínio da participação de estudantes de instituições privadas no presente estudo, em contraste aos de instituições públicas no estudo anterior. Além disso, deve-se considerar o avanço dos meios de informação e comunicação que ocorreu em mais de uma década de intervalo entre esses estudos.
Ademais, o fato de não ter sido observada variação da motivação e dificuldade à medida que a formação médica avança aponta para um possível déficit na robustez da matriz curricular no âmbito da pesquisa. Em contraposição, o avançar do curso poderia ser uma ferramenta crucial para o amadurecimento dos estudantes em pesquisa. Entretanto, alguns estudos não demonstraram mudança na inclinação pela carreira científica4),(10, fato que diverge dos achados aqui apresentados.
Com relação à distribuição de estudantes entre as escolas públicas e privadas, no momento em que o estudo foi realizado, havia em funcionamento seis cursos de Medicina na cidade de Salvador, dos quais 67% eram ofertados por IES privadas, sendo estas responsáveis por 85% das vagas disponibilizadas11. No presente estudo, a distribuição de estudantes de IES públicas e privadas corrobora essa proporção. É importante salientar que algumas dessas IES possuem maior tempo de implantação que outras, o que torna bastante diversificada a distribuição de estudantes entre elas. Entretanto, o estudo contou com a participação de estudantes de todas essas IES, sendo essa distribuição representativa da população-alvo.
Os dados aqui apresentados reforçam a necessidade de implementação de estratégias acadêmicas que permitam a mudança desse cenário, favorecendo o interesse e engajamento científico dos estudantes de Medicina. Esse é um dos maiores desafios acadêmicos da atualidade. Sendo assim, a fim de modificar o cenário atual, é necessário que haja uma reflexão crítica por parte das instituições envolvidas no processo de formação dos estudantes de Medicina, objetivando a implementação de estratégias que visem à redução dos elementos dificultadores, bem como a potencialização dos fatores motivacionais. Somente assim, a pesquisa científica poderá ser entendida na prática como um pilar fundamental da formação acadêmica brasileira.
Dentre essas estratégias acadêmicas, a oferta de bolsas de iniciação científica pode estimular a participação em pesquisa e projetos institucionais. Esse fomento ocorre de forma diversificada entre as instituições públicas e privadas no país, podendo exercer um efeito motivador. Nesse contexto, analisar essas possíveis diferenças entre instituições públicas e privadas pode ser considerada uma interessante temática para pesquisas futuras.
Por fim, como potencial limitação do estudo, tem-se a utilização de uma amostra obtida por meio do método snowball, sendo composta por indivíduos que se voluntariaram a responder ao questionário e, possivelmente, já predispostos a participar de pesquisas, o que pode suscitar a possibilidade de um viés de seleção. No entanto, essa condição não invalida os achados aqui apresentados, visto que foi utilizada uma amostra superior à estabelecida pelo cálculo amostral, representando um quantitativo expressivo de estudantes participantes.
CONCLUSÃO
Os estudantes de Medicina demonstram interesse e participação em pesquisa científica, entretanto aqueles que, de fato, estão envolvidos representam a minoria. Esse comportamento pode estar associado às dificuldades elencadas pelos estudantes para a produção científica, principalmente associadas a orientação inadequada, desconhecimento sobre o processo científico, falta de tempo por conta das demandas da graduação e falta de estímulo ou financiamento institucional. Ademais, evidenciou-se que não há variação da motivação e da dificuldade à medida que a formação médica avança.