1 Introdução
Os temas educação ambiental e educação estética têm orientado as nossas pesquisas, pois nos instiga enquanto pesquisadores e docentes compreender melhor a presença destas duas áreas para a formação humana. São diversos os sujeitos com que dialogamos nos nossos cotidianos e entendemos que é preciso ater o olhar para uma educação emancipatória, favorecendo que o sujeito perceba o mundo antes de racionalizá-lo, propiciando a criticidade em seus discursos e ações.
Detemo-nos em abordar a questão da sustentabilidade a partir da educação estética e da educação ambiental, por compreendermos que a relação entre seres humanos e estética e a relação entre seres humanos e ambiente é indissociável e essencial na constituição deles. Assim, esse processo educativo pode contribuir para a emancipação dos sentidos e para a superação da alienação a qual estamos subjugados. Ampliando as possibilidades da humanidade de vivenciar experiências de profunda interação com o todo que o cerca e consigo, construindo assim o processo de humanização necessário.
Nesse artigo teórico, temos o objetivo de promover um diálogo com a educação ambiental e com a educação estética a partir de uma visão crítica e emancipatória, com o intuito de problematizar o conceito de sustentabilidade que se faz presente em nosso contexto atual. Vale destacar que como metodologia nos propomos apresentar, identificar e analisar os conceitos teóricos das referidas temáticas, apontando as possibilidades de traçar caminhos possíveis para uma educação humanizadora. A partir deste objetivo, estabelecemos a questão orientadora deste artigo: é possível ter um processo educativo para a sustentabilidade a partir da educação ambiental e da educação estética?
Compreendemos que a educação, por ser uma prática social, expressa o modo como os sujeitos se organizam e vivem em sociedade, como as pessoas conseguem se perceber como ser na natureza e da natureza. Por meio da educação estética e da educação ambiental é possível instigar no humano um repensar sobre os discursos e as ações, manifestando e potencializando os questionamentos e as reflexões acerca da realidade num processo de crítica e autocrítica, de práxis e de conscientização coletiva.
Portanto, uma educação comprometida com a sustentabilidade demanda compreender a função social da escola enquanto instrumento ideológico e político de intervenção e de transformação socioambiental. Dentro dessa reflexão é essencial que a educação ambiental e a educação estética estejam inseridas nos espaços formais e não formais. Assim, nesse artigo, contemplamos a educação ambiental inserida no espaço formal, ou seja, a educação ambiental comprometida com a organização do trabalho pedagógico, fundamentada na educação estética.
Entendemos que o desenvolvimento do conhecimento de forma a possibilitar a leitura crítica da realidade, contribuindo para a melhoria da vida em sociedade só é possível com a transformação profunda desse modo de sociabilidade. Caminhar em direção a um ambiente transformado requer a internalização do projeto de sociedade que respeite os ideais de vida com qualidade, bem como a percepção das dificuldades para torná-los reais. Partir do que se tem, com a clareza para onde se quer caminhar, enfatizando a importância da mobilização e ação de cada um, além do compromisso permanente com um projeto de sociedade emancipada.
2 A concepção do desenvolvimento sustentável
Os movimentos sociais impulsionaram as mudanças no debate ecológico. Vale dizer que as inserções dos movimentos sociais produziram fatos importantes que alteraram a trajetória da educação ambiental no mundo e especificamente no Brasil. A presença dos movimentos sociais no debate ecológico desencadeou uma crítica à sociedade capitalista, na década de 1960, o que instigou uma mudança de concepção quanto à relação ser humano e a natureza e quanto à relação ser humano e o meio.
A Conferência de Estocolmo em 1972 foi o ponto de partida para a educação ambiental e trouxe importantes decisões para o desenvolvimento de uma política mundial de proteção ambiental, a criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), bem como a elaboração do Programa Internacional de educação ambiental (PIEA), conhecida como "Recomendação 96". Essa última com o propósito de promover uma educação ambiental direcionada para atacar a crise do meio ambiente. A Conferência de Estocolmo estabeleceu a necessidade de começar um trabalho de educação em questões ambientais, dirigido a todas as gerações, a fim de promover a formação ambiental da opinião pública e desenvolver condutas individuais e coletivas de responsabilidade com a proteção e melhoria do meio em toda a dimensão humana.
A Conferência de Estocolmo deliberou que era preciso ocorrer “mudanças profundas nos modelos de desenvolvimento, nos hábitos e comportamentos dos indivíduos e da sociedade”, sendo a educação o caminho viável para se atingir a transformação almejada. No entanto, foi percebido que o modelo de educação possuía características distantes das realidades presentes na sociedade, assim fica evidente que seria preciso um novo processo educacional para exercer de forma satisfatória as concepções afirmadas na Conferência. Surge, então, a educação ambiental (DIAS, 2004).
Nesse contexto, surge a Carta de Belgrado, em 1975, que buscou a formação de uma estrutura global para a educação ambiental propiciando a “erradicação das causas básicas da pobreza, da fome, do analfabetismo, da poluição, da exploração e da dominação” (DIAS, 2004, p. 102). Na época, a Carta de Belgrado advertia quanto ao avanço tecnológico e o crescimento econômico, uma vez que, embora esse pressupusesse a “democratização” dos benefícios para humanidade em escala global, local e regional, também produziria sérias consequências socioambientais. Assim sendo, a Carta de Belgrado expõe a preocupação de que os cidadãos de todo o mundo insistissem a favor de medidas que dessem suporte ao tipo de crescimento econômico (SÃO PAULO, 1994). Os debates iniciados em Estocolmo e manifestos na Carta de Belgrado se intensificaram em Tbilisi.
Conforme Dias (2004), em 1977 ocorreu em Tbilisi o mais importante evento internacional em favor da educação ambiental, organizado pela UNESCO em colaboração com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Esse encontro ficou conhecido como sendo a Primeira Conferência Intergovernamental sobre educação ambiental, fortemente inspirada pela Carta de Belgrado, sendo responsável pela elaboração de princípios, estratégias e ações orientadoras em educação ambiental que são adotados até os dias atuais.
Contudo, somente em 1987, a ideia de desenvolvimento sustentável teve reconhecimento efetivo com a publicação do documento Our Common Future, Nosso Futuro Comum, como é bastante conhecido: Relatório Brundtland (ONU, 1987). Esse relatório é resultado do trabalho da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, da ONU, e segundo Diegues (2003), o mesmo teve como objetivo central apresentar um novo olhar sobre o desenvolvimento sustentável, definindo como processo que satisfaz as necessidades presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades. A partir desse momento, o conceito de desenvolvimento sustentável passa a ser conhecido.
Em 1992, ocorreu no Brasil a Conferência Internacional, organizada pela ONU, chamada Eco-92, realizada na cidade do Rio de Janeiro. Esta Conferência resultou na elaboração da Agenda 21, que é um conjunto de resoluções tomadas entre os diversos países participantes e que resultou em medidas para conciliar crescimento econômico e social com a preservação do meio ambiente. Na Agenda 21 cada país definiu as bases para a preservação do meio ambiente em seu território, com vistas ao desenvolvimento sustentável.
Percebemos que em tese, a preocupação com o desenvolvimento sustentável representa a possibilidade de garantir transformações sociopolíticas que não comprometam os sistemas ecológicos e sociais que sustentam as comunidades; na prática o que experimentamos são ações cada vez mais agressivas quanto à natureza e a própria humanidade. A realidade atual exige um repensar acerca das ações que temos com o ambiente em que vivemos e isto se produz na inter-relação dos saberes e das práticas coletivas que criam identidades e valores comuns e ações solidárias diante da crise sócio-ecológica-ambiental, numa perspectiva que privilegia o diálogo entre saberes (JACOBI, 2006), como também exige da humanidade uma tomada de decisão radical quanto à superação desse modelo de sociabilidade.
Vale esclarecer que o conceito sustentabilidade foi cunhado recentemente, no século XX (SIMÕES, 2009). O dicionário eletrônico Houaiss de língua portuguesa atribui a sua origem à formação da palavra sustentável (século XV) que apresenta o sufixo -vel sob a forma latina -bil(i) mais -dade. O sufixo -dade originado do latim -itas, o qual significa “o fato de ser, propriedade/qualidade de ser, atitude/ação de quem é, aquele/aquilo que é, conjunto do que é” (SIMÕES, 2009, p. 152). No entanto, na língua inglesa a origem da palavra sustainability deu-se em 1727 e na língua espanhola sustentabilidad surgiu no século XX (SIMÕES, 2009). Detalhando um pouco mais, na língua portuguesa a palavra sustentabilidade é originada do verbo sustentar que provém do latim sustentãre o qual significa “aguentar, apoiar, suportar”. Nesse sentido, sustentabilidade significa “segurar por baixo, impedir que caia, fazer face a, resistir a, conservar, manter, alimentar física ou moralmente” (CUNHA, 2010, p. 616).
Após elucidarmos etimologicamente a origem do conceito de sustentabilidade, apresentaremos concepções de diferentes intelectuais acerca do mesmo na atualidade. Segundo Loureiro (2006), a diversidade na significação do termo sustentabilidade ou desenvolvimento sustentável gera uma problemática conceitual inerente ao emprego dessa palavra. Nesse sentido, o autor prefere usar “sustentabilidade significativa” para diferenciar dos demais conceitos que podem ser dúbios. Loureiro (2006, p. 33) define “sustentabilidade significativa” como “a negação absoluta dos modelos de desenvolvimento sustentáveis construídos no âmbito da economia de mercado, pois partem da primazia do capital sobre a vida, resultando na compreensão de natureza como externalidade e fonte de recursos para a satisfação da dinâmica econômica”.
Para Bertolucci (2007), o conceito de desenvolvimento sustentável exige que se pense de forma global e que se aja de forma local. Diegues (2003) aborda que desenvolvimento sustentável é uma possibilidade de resolver as contradições entre o crescimento econômico, a distribuição de renda e a necessidade de conservar os recursos ambientais atendendo as gerações atuais e futuras. Sauvé (1997) acrescenta que o conceito de desenvolvimento sustentável é associado com a educação ambiental para promover modelos baseados na sabedoria da utilização dos recursos, considerando a durabilidade e a equidade, sendo que o desenvolvimento sustentável é o objetivo mais decisivo da relação dos homens com a natureza.
Cabe ressaltar que o desenvolvimento sustentável é percebido como um conceito nebuloso, pois ele sanciona o status quo do lucro sustentável, sendo assim, torna-se difícil realizar uma mudança nas relações dos seres humanos com a natureza. Portanto, para Jacobi (2003) as dimensões assinaladas pelo conceito de desenvolvimento sustentável contemplam o cálculo econômico, o aspecto biofísico e o componente sociopolítico, como referenciais para a interpretação do mundo e para possibilitar interferências na lógica predatória prevalecente.
Para o referido autor, o desenvolvimento sustentável não deve se referir a um problema limitado de adequações ecológicas de um processo social, porém a uma estratégia múltipla para a sociedade, a necessidade de redefinir as relações entre a tríade homem-sociedade-natureza. É importante esclarecer que o desenvolvimento sustentável busca uma mudança substancial do próprio processo civilizatório, instigando no ser humano o desafio de pensar a passagem do conceito para a ação. O conceito do desenvolvimento sustentável originou-se da existência de uma crise ambiental, econômica, social, ou seja, de uma crise humana. Sendo assim, a ênfase deve se dar na superação dos déficits sociais, nas necessidades básicas e na alteração de padrões de consumo (JACOBI, 2003).
Desse modo, para se pensar em desenvolvimento sustentável é necessário ultrapassar a lógica capitalista e inverter a tendência autodestrutiva dos processos de desenvolvimento no abuso contra a natureza. É compreender o que realmente é essencial na vida humana, é conseguir ver para além da imediaticidade do cotidiano, é romper com a hegemonia do sistema capitalista e com sua capacidade destrutiva.
3 Educação ambiental e a sustentabilidade
A educação ambiental emancipatória consiste em compreender criticamente a crise ambiental como uma crise do modelo de sociabilidade vigente, com o propósito de desenvolver atitudes que lhes permitam adotar uma posição consciente e participativa a respeito das questões socioambientais. A educação ambiental visa à construção de relações sociais, econômicas e culturais capazes de respeitar e incorporar as diferenças em prol da liberdade para decidir caminhos alternativos de desenvolvimento, respeitando os limites dos ecossistemas, substrato de nossa própria possibilidade de sobrevivência como espécie (MEDINA, 2001).
Acreditamos na educação ambiental que versa na perspectiva emancipatória, enquanto “práxis social e processo de reflexão sobre a vida e a natureza, contribuindo com a transformação do modo como nos inserimos e existimos no mundo, a única categoria teórico-prática estruturante: a educação” (LOUREIRO, 2006, p. 35) que está centrada no engajamento individual e coletivo, no respeito à diversidade de saberes e práticas, no cuidado com o outro, com o ambiente em todas as suas dimensões.
Segundo Layrargues (2003), a educação ambiental visa à promoção da conversão de paradigmas e visões de mundo, na perspectiva da criação de um saber ambiental, buscando o espaço propício entre os sistemas sociais para se efetuar a discussão aprofundada a respeito das raízes e causas da crise ambiental. A educação ambiental, nesse contexto, é mais que o ensinamento de comportamentos adequados e de conteúdos científicos. Ela compartilha com a “educação estética a urgência de despertar no humano um olhar sobre si mesmo e o reconhecimento da expressão de suas dimensões não-conceituais como zonas de conhecimento capazes de fundar um novo posicionamento ético diante do outro e do mundo” (MARIN; OLIVEIRA, 2005, p. 210).
Ruscheinsky e Costa (2002) alertam que “a educação ambiental deve lidar com todos os aspectos da vida do cotidiano, como um sujeito em construção, no vir-a-ser consciente de seu tempo e de suas exigências de seu espaço”. Para isso, é necessário que se crie oportunidades de o ser humano conhecer-se como humano, reconhecer-se no mundo, o mundo de todos com responsabilidades nas suas ações e que indiquem a atuação de um sujeito realmente ético, no meio em que habita. “Sendo assim, a verdadeira educação ambiental deve pertencer à comunidade, partindo dela e a ela retornando”(RUSCHEINSKY; COSTA, 2002, p. 82).
Do mesmo modo, Loureiro (2006) reforça que a educação ambiental pode ser o elemento de transformação social embasada no diálogo, no exercício de cidadania, no fortalecimento dos sujeitos, na criação de projetos coletivos comunitários, na superação das formas de dominação social e cultural, na compreensão do mundo em sua complexidade e da vida em sua totalidade.
A sociedade atual vivencia uma crise ambiental decorrente de uma crise civilizatória antecipada por uma crise ética, devido à carência de valores entre os seres humanos. É um ciclo consolidado pelo próprio homem e que urge por uma nova conduta para que exista a inversão de paradigmas e visões de mundo, na perspectiva da criação de um saber ambiental, buscando o espaço propício entre os sistemas sociais para se efetuar a discussão aprofundada a respeito das raízes e causas da crise ambiental (LOUREIRO, 2006).
Para Pelizzoli (2003) a ética ambiental é a forma de instigar que o homem tenha consciência e coerência dos valores das suas ações, refletindo sobre as atitudes e os princípios que conduziram esses determinados atos, com o objetivo de alcançar o sentido fidedigno no contexto social que se incidiram as ações. De acordo com Loureiro (2006), a educação ambiental transformadora e emancipatória emprega o conhecimento derivado da apreensão da realidade, priorizando “projetos ambientalistas que visam à justiça social, ao equilíbrio ecossistêmico e à indissociabilidade entre humanidade-natureza”. (LOUREIRO, 2006, p.94).
Nesse sentido, a educação ambiental incita nos sujeitos a concretização de ações que conduzam a melhora da relação de cada um com o mundo, numa perspectiva de comunhão, contribuindo para o desenvolvimento de sociedades sustentáveis e responsáveis com o ambiente. Trata-se de uma abordagem de comprometimento, de responsabilidade de ser, de saber e de agir, o que implica lucidez, autenticidade e vontade de mudar a concepção de ambiente que se tem incentivado pelo modelo econômico vigente.
4 Educação estética: uma educação para a sustentabilidade
Na perspectiva do mundo atual, percebemos a necessidade de buscar meios para superar as dificuldades existentes na problemática socioambiental. É um grande desafio para todos nós encontrar a direção orientadora que conduza a educação emancipatória e humanizadora. Contudo, apenas pensar em saídas que conduzam a soluções momentâneas dentro do modelo atual não é suficiente, é preciso problematizar, contestar esse modelo linear-cartesiano de pensamento ao qual nossa cultura está condicionada. Torna-se, então, necessário buscar o rompimento com o paradigma estruturado com o intuito de percorrer um possível caminho sustentável, articulando os saberes que emergem das diversas áreas do conhecimento, o “pensamento que abraça a diversidade e reúne o separado” (MORIN, 2005, p. 142). Nas palavras de Almeida (2004, p. 17) é preciso “reunir em arquipélagos essas ilhas de conhecimento e fazê-las comunicarem entre si”.
Vale endossar que a educação estética é um campo essencial para a “emancipação completa de todas as qualidades e sentidos humanos” (MARX, 2010, p. 109), afetados, segundo Karl Marx (2010), pela alienação1 causada pelo avanço do modelo capitalista de sociedade que estrutura a vida humana. Podemos dizer que a educação estética está presente nesse artigo pela possibilidade de romper com a limitação da capacidade subjetiva sobre determinada atividade artística, pois a criação artística tem sentido se apresentar sentido para o sujeito. Para Marx (2010), se há um empobrecimento na qualidade e nos sentidos humanos, há também um empobrecimento e um esgotamento estético nas relações do sujeito com os outros sujeitos e com os objetos de criação.
Mészáros (2006, p. 191), parafraseando o dizer de Marx (2010), afirma que “a humanidade sem arte e ciência seria uma humanidade enormemente empobrecida, se pudesse ser concebida em termos históricos concretos”. Nas palavras de Marx, fica evidente a necessidade de ultrapassar as barreiras que impedem a arte de ser reconhecida como uma atividade vital no desenvolvimento humano.
Ao aprofundar essa discussão, Sánchez Vázquez (2010, p. 76) analisa que “na relação estética o sujeito entra em contato com o objeto mediante a totalidade de sua riqueza humana, não apenas sensivelmente, mas também intelectiva e afetivamente”. Percebemos que a relação estética do homem com os objetos é consequência da história da humanidade e surge no processo de afirmação do ser humano, no mundo objetivo como expressão de seus sentidos. Para Sánchez Vázquez (2010, p. 49), a relação estética do homem com a realidade ocorre no momento em que o “subjetivo se torna objetivo (objeto), e o objeto se torna sujeito, mas um sujeito cuja expressão já objetivada não só supera o marco de subjetividade, como pode ser compartilhada por outros sujeitos”. Nesse sentido, expomos que a criação estética é a expressão do sujeito em que ele exterioriza e reconhece a si mesmo. Isso significa que a relação entre sujeito e objeto precisa ser compreendida em uma perspectiva dialética, na qual ambos não se extinguem e nem se sobrepõem um ao outro. Logo, sujeito e objeto constituem dialeticamente a própria natureza da relação estética.
Vale esclarecer que a palavra estética se originou de “aisthesis: em grego, a capacidade humana de sentir o mundo, de senti-lo organizadamente, conferindo à realidade uma ordem primordial, um sentido – há muito sentido naquilo que é sentido por nós” (DUARTE JÚNIOR, 2010, p. 25). Alinhamos o nosso pensamento com a ideia do autor na medida em que entendemos que a estética não se restringe apenas à ideia de beleza como representação de um conhecimento sensível. Sendo assim, percebemos que a estética é a educação da percepção sensível, pertencendo a outras categorias, como: o feio, o trágico, o cômico, o grotesco, ou seja, a educação estética ultrapassa os padrões socialmente aceitos e determinados, pois prioriza o sentimento que causa em cada sujeito, podendo ser de admiração ou de estranheza.
Dando continuidade a essa discussão, após a justificativa inicial da importância da educação estética na formação humana, mostramos, na sequência, o lugar que a estética pode ocupar na educação. Um dos desafios da educação é propiciar, em um primeiro momento, o desenvolvimento da liberdade criadora no sujeito, a fim de que consiga promover a constituição do sujeito crítico, atingindo, como consequência, a superação da percepção de mundo puramente racional. Vale dizer que a educação precisa dar oportunidade de o sujeito conseguir se emancipar da homogeneização globalizante, de um imaginário padronizado pelos meios de comunicação e por valores oriundos da indústria cultural.
Existe a necessidade de uma educação que promova o ato de criação e faça referência a tudo que envolve a dimensão sensível do humano e do mundo que o cerca, entendendo os diversos fenômenos que esse mundo lhe oferece a cada instante, significando, expressando e sentindo-o constantemente. Educar esteticamente é promover e despertar a sensibilidade e a percepção, propiciando as condições fundamentais de o sujeito reencontrar-se livremente consigo mesmo e com o mundo circundante. Ao mesmo tempo é instigar em sua subjetividade, o reconhecimento no ambiente vivido, as marcas da cultura desse meio, percebendo na sua história de vida as construções compartilhadas nas relações sociais em que estabelece no seu cotidiano. Portanto, essas percepções permitem o sujeito ultrapassar as possibilidades de indeterminação, de reconstrução de sua subjetividade, adotando novos valores e modos de viver, fazendo com que o sujeito se sinta pertencente a um contexto histórico-social (SILVEIRA, 2007).
Para Estévez (2003, p. 56-57), a formação integral da personalidade “requer o desenvolvimento de elevados sentimentos estéticos que se projetam na atividade humana”. Assim, a educação estética permite a construção da concepção de mundo, delineando “as normas sociais no profundo mundo psicológico-emocional do indivíduo, a fim de que se convertam em normas de sua conduta” (Ibid.). Sendo um dos objetivos essenciais da educação estética o desenvolvimento das capacidades criativas da personalidade em todas as redes de relações do sujeito.
A experiência estética é capaz de estabelecer o equilíbrio no processo de formação do sujeito, pois estimula uma gama de experiências enriquecedoras no nível do inconsciente e do consciente, em um canal aberto para a expressividade, a criatividade e a atitude crítica. Assim, adquire-se o conhecimento e a capacidade de juízo sempre que a experiência estética comprometa o ser humano em sua totalidade, de modo que cada sentido entre em harmonia com o ambiente e seu sujeito, mostrando-se intencionalmente ativo no terreno estético. Desse modo, o elemento estético é o que melhor equilibra os diversos componentes da formação humana.
Educar esteticamente é despertar no sujeito “seus inesgotáveis impulsos criadores e orientá-los a novas buscas e descobertas” (ESTÉVEZ, 2003, p.81). Assim, incita-se a formação do sentido estético da personalidade, desenvolvendo a formação de seus sentimentos, necessidades, interesses, ideais e gostos estéticos em interação com a realidade. É a transformação da cultura estética da sociedade em cultura estética do indivíduo, é o desenvolvimento do mundo espiritual do indivíduo (ESTÉVEZ, 2003).
Estévez (2003, p 71) diz que a educação estética atua como um “metafator da educação, ou, dito de outra forma, pelo caráter universal de sua ação”. O sentido estético “está presente em toda inter-relação homem-homem, homem-natureza e homem-sociedade” (Ibid.). Desse modo, a educação estética é o processo capaz de promover a formação da personalidade que conscientiza, interage e transforma o mundo de acordo com o ideal estético-social.
Compreendemos que a educação estética possui um valor inquestionável, pois ela pode ensinar ao ser humano uma nova percepção de ver o outro e a si mesmo. Nesse sentido, ela é uma necessidade humana, uma necessidade de todos, para que consigam despertar para um novo mundo, abrindo-se a ele de forma interativa. Assim, com a educação estética tem-se um novo modelo de desenvolvimento que apregoa a compatibilização da dimensão econômica, social e ambiental, pois dado os modelos vigentes em pouco tempo a sustentabilidade do planeta não estará mais garantida. É por meio da educação ambiental em espaços formais e não formais, em que exista a relação dialógica entre os sujeitos, fundamentada na educação estética é que se pode pensar em sustentabilidade, em lutar por uma sociedade sustentável, por uma cidade sustentável, por uma educação sustentável, por uma vida sustentável para o ser humano. É preciso pensar em sustentabilidade que não seja apenas formal, mas que seja para sustentar a vida a partir das relações com o outro.
Vale reforçar que mobilizamos os nossos estudos no encontro da Educação Ambiental e da Educação Estética com o objetivo de repensar em um processo de educação para a sustentabilidade, que contemple o desenvolvimento das potencialidades e dos sentidos dos sujeitos em processo de ensino e aprendizagem. Na análise e na discussão dos resultados compreendemos que a educação estética é a educação dos sentidos, dos sentimentos, da capacidade de transformar a realidade sempre na interação com o ambiente, buscando melhor qualidade nas relações. A educação estética é concebida como um princípio de desenvolver a atividade criadora nos sujeitos, pois somos todos criativos, embora com significações diferentes, porque somos sujeitos sócio-históricos constituídos culturalmente em espaços próprios e diversos. Entendemos que a relação estética do homem com a sua criação é consequência da história individual de cada um e surge no processo de afirmação do ser humano no mundo objetivo como expressão de sua essência. Nesse sentido, percebemos que a criação estética é a expressão do sujeito que externaliza e consegue se reconhecer nessa criação (DOLCI; MOLON, 2018).
Associamos a educação estética com a educação ambiental porque compreendemos que para atingir um processo educativo para a sustentabilidade é fundamental a associação entre estas áreas do conhecimento. Ratificamos esta associação porque a educação estética é uma maneira de proporcionar um repensar nas determinadas condições do trabalho alienado e suas repercussões na realidade em que os sujeitos vivem, nas questões ambientais, nas diferenças e desigualdades entre os sujeitos. Pensamos que a educação ambiental aliada a educação estética pode ser uma possível alavanca para modificar a realidade em que vivemos em busca de propiciar um processo educativo mais humanizador. Desse modo, o encontro da educação ambiental e da educação estética instiga um movimento de repensar as condições de vida no processo social em que se vive, sendo um movimento essencial para a promoção de novas ações para a melhoria das relações ambientais, ressignificando os modos de ser e de agir com o outro e consigo mesmo.
5 Considerações finais
Nesse artigo, buscamos promover um diálogo com a educação ambiental e com a educação estética com o intuito de problematizar o conceito de sustentabilidade que se faz presente em nossa sociedade. Entendemos a necessidade de opor-se ao modelo de desenvolvimento sustentável que visa o crescimento econômico, promovendo a desigualdade social e econômica entre os indivíduos, priorizando a “sustentabilidade significativa” abordada por Loureiro (2006).
Ao concluir esse estudo, podemos dizer que a partir das análises e reflexões acerca do objetivo traçado, bem como da questão que nos orientou nesse artigo, visualizamos que é possível promover um processo de educação para a sustentabilidade por meio da associação da educação ambiental e da educação estética, visto que, ao desenvolver a sensibilidade que propicia compreender o mundo e o ser humano na diversidade de ser ele mesmo, a educação estética rompe com a racionalidade de pensamento e com a redução de entendimento de mundo e a educação ambiental é uma nova maneira de ver o ambiente e suas relações, com o intuito de repensar as ações e os comportamentos com o outro, para ter novas ações humanizadoras. Complementando, podemos dizer que a educação ambiental e a educação estética conectadas é um modo de promover a comunhão entre o sensível e o ambiente, multiplicando essa comunhão nas demais relações com os outros seres.
Entretanto, pensamos que para alcançar a sustentabilidade significativa que tanto se almeja é preciso realizar um olhar introspectivo e perceber que primeiro temos que resolver os problemas existentes para alcançar uma cidade sustentável, uma sociedade sustentável, uma vida sustentável. É importante refletir sobre as dificuldades que se fazem presentes em nossas vidas e ter consciência de que não é possível vivermos eternamente fazendo ajustes e reformas em uma sociedade desumana, que promove o trabalho alienante, que coloca a natureza como uma externalidade e o outro como objeto de consumo, uma mercadoria.
Acreditamos que não é possível falar em cidade sustentável ou sociedade sustentável se não se garante a sustentabilidade humana, se não nos preocupamos com a preservação da condição humana, se não garantimos a sustentabilidade no processo educativo. Nesse sentido, para avançarmos nesse processo educativo, acreditamos que a educação ambiental e a educação estética trazem contribuições significativas, pois entendemos que é fundamental considerar as práticas sociais e pedagógicas como espaços possíveis de devires, de aprendizagens políticas, de redefinição do modo de vida cotidiana e da sociabilidade, propiciando assegurar condições dignas de vida a todos, buscando uma possibilidade de equilíbrio humano.
Para nós, a educação é o processo que favorece o desenvolvimento humano em sua totalidade, sendo um instrumento gerador das transformações sociais, é base para aquisição de autonomia, fonte de visão prospectiva, sendo o elemento de integração e conquista do sentimento e da consciência de cidadania. Sob este aspecto, a educação ambiental e a educação estética propiciam a visão social, ecológica e espiritual da sociedade e apresentam o possível potencial transformador necessário para a construção de um mundo melhor, de um mundo mais sensível com o olhar do cuidado com o outro, de um mundo que se quer diferente desse que se vive.