1 Introdução
Nas últimas décadas do século passado, sobretudo no atual, as políticas públicas em educação reincidentemente tem sido foco de debates, pauta em eventos acadêmicos, objeto de reivindicações sindicais e de investigações científicas. Tal evidência tem rompido com os limites do âmbito educacional, alargando para outros domínios como as políticas econômicas e sociais, o que revela a necessidade de contribuição de outros campos do conhecimento para a sua análise. Santos et al. (2011) apontam que as políticas públicas detêm características multidisciplinares e multidimensionais. As explicações a seu respeito concentram-se na sua natureza e nos seus processos (SOUZA, 2006), e a dinâmica de análise permeada por diversas áreas.
Para Damasceno (2016) o referido campo tem crescido em qualidade e em volume de produção, o que demonstra uma maturidade na produção científica, de maneira que “as políticas públicas são uma área que possibilita uma infinidade de temas de investigação” (DAMASCENO, 2016, p. 153).
Neste sentido, as definições de políticas públicas são diversas a depender do autor que se desponta. A política:
[...] designa ser a ciência de bem governar um povo, constituído em Estado. Assim, é seu objetivo estabelecer os princípios, que se mostrem indispensáveis à realização de um governo, tanto mais perfeito, ao cumprimento de suas precípuas finalidades, em melhor proveito dos governantes e governados.
(SILVA, 1998, p. 617).
De maneira geral a política pretende o cumprimento de um bom governo, justo, igualitário, atendendo a parâmetros, leis. Já Souza (2006, p. 26) salienta que, após relacionar vários conceitos, é possível dizer que “política pública é um campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, colocar o governo em ação e ou analisar essa ação e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso das ações”.
As políticas públicas são criadas para atender a demandas sociais e/ou interesses políticos (BONETI, 2006), como necessidade de preparação para o acesso ao nível superior, necessidade de preparação para o mercado de trabalho, a extinção do analfabetismo, entre outras.
2 Breve histórico das políticas públicas educacionais
Sobreleva aqui a importância de uma contextualização histórica do campo das políticas públicas educacionais. São vários os contributos e defesas teóricas, políticas, econômicas por uma educação melhor (LESSARD, 2016). Os investimentos e “a mudança em educação foi uma preocupação capital [...] dos países, principalmente a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, no que diz respeito à massificação e democratização dos sistemas educativos” (LESSARD, 2016, p. 15). Dessa forma, foram criadas diversas políticas educacionais para atender demandas múltiplas.
O discurso sobre a melhoria educacional é universalizado por ordem tanto dos países, quanto por organizações interlocutoras de diálogos, agendas e eventos internacionais, o que é cada vez mais reforçado no contexto atual. A educação é capaz de elevar o “nível geral de instrução da população, formar uma mão de obra capaz de contribuir para o desenvolvimento econômico e garantir a formação de jovens cidadãos aptos a viverem em sociedades modernas e pluralistas” (LESSARD, 2016, p. 15).
De acordo com Lessard (2016), a evolução dos investimentos em educação no mundo pode ser destrinchada em três grandes momentos, a saber: primeiro período de modernização e democratização da educação, ou seja, Estado-Providência (1945-1973); segundo período de crítica do Estado-Providência e movimento conservador de restauração educativa (desde os choques do petróleo até os anos de 1990); terceiro momento de produção dos conhecimentos e competências na sociedade e a economia do saber (desde os anos de 1990 até hoje).
O primeiro período é também adjetivado de Estado-Providência (ou Estado de Bem-Estar Social) com a peculiaridade do Estado intervindo em várias áreas sociais. E na educação procurou desenvolver igualdade de oportunidades e ampliar a oferta educativa.
Em 1945 foi criada a Organização das Nações Unidas (ONU) e, por meio da Carta das Nações Unidas, a comunidade internacional fortaleceu a garantia dos direitos de cada pessoa, evidenciando a prioridade ao direito educacional. Tal direito é reincidente em tantos outros documentos, como na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no artigo 26, em 1948; no Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, no artigo 1º, em 1966.
Estes marcos documentais descrevem ações a serem executadas pelas nações, a exemplo da gratuidade do ensino elementar e secundário e da luta contra o analfabetismo. “Em suma, mesmo que a internacionalização ou globalização da educação ainda não fossem termos correntes, o desenvolvimento da educação pública e gratuita já era alvo de uma forte convergência internacional” (LESSARD, 2016, p. 21).
Segundo Lessard (2016), há estudos que comprovam que alguns países, como França, Inglaterra, Estados Unidos, investiram o dobro ou mais em educação, no intervalo de alguns anos. Países que investiram na formação humana partiam da compreensão teórica de que o desenvolvimento advém e demanda a existência de uma população qualificada e que a formação constitui um elemento importante para o fortalecimento de uma nação. Vista assim, a educação passa a ser um bem – uma propriedade – da pessoa e da nação. A Teoria do Capital Humano instigou, nesta perspectiva, investimentos, por defender que os mesmos seriam uma alavanca no crescimento da riqueza dos estados e progresso na qualidade de vida das pessoas (HAMELINE, 1997). Os países, então, aligeiraram-se, numa espécie de corrida, para democratizar ao máximo o acesso às escolas para o maior número possível de pessoas. Muitos países adotaram novas leis e políticas educativas.
Ao longo desse período, a educação torna-se, por excelência a maneira de resolver diferentes problemas sociais e econômicos, tais como a pobreza, a discriminação ou os maus hábitos de vida. [...] Novos programas e serviços foram criados em todas as séries, como educação sexual, educação especializada ou orientação escolar e profissional.
(LESSARD, 2016, p. 25)
O Brasil, neste período de 1946 a 1963, denominado de República Nova, vivenciou grande fertilidade na história educacional do país, por conta de Constituição que conclamou a educação como um direito de todos, foi publicado o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. Em 1962 são criados o Plano Nacional de Educação e o Programa Nacional de Alfabetização (ARANHA, 2006).
Mas o Brasil ainda está muito aquém dos países descritos, assim como de outros demais. Obstáculos de naturezas variadas, a exemplo do reduzido orçamento público para a educação e a descontinuidade de políticas educativas, impediam a consolidação de um sistema nacional de educação (SAVIANI, 2014).
O segundo período é mesclado por investidas nas reformas educacionais, planejadas a partir de meados da década de 1970. Muitas incertezas pairavam mundialmente, devido à Guerra do Vietnã, contestações estudantis e movimentos contraculturais, os choques do petróleo, a progressão inflacionária. Todos estes acontecimentos, aliados às dúvidas sobre o futuro, causaram medo de perdas de conquistas.
Ainda que os esforços do Estado-Providência fossem intensos, muitas críticas questionaram sua capacidade de promover a autonomia e o desenvolvimento humano, uma vez que a reprodução social e cultural era latente (BOURDIEU; PASSERON, 2011). As críticas denunciavam também que os jovens das classes populares eram conduzidos para funções subalternas no mercado de trabalho. Outros jovens careciam de conhecimentos, habilidades e competências que, teoricamente, deveriam ter devido à idade e, assim, não conseguiam uma função empregatícia.
Os crescentes e descontrolados custos do aparelho estatal, o aumento da precariedade, do desemprego, os problemas constantes em relação à aplicação das políticas públicas, contribuíram para que muitos grupos sociais questionassem o modus operandi das verbas públicas (LESSARD, 2016).
Neste emaranhado de avaliações e adjetivações negativas, a direita não perde a oportunidade e investe (sempre investiu!), com mais vigor, na proposta de não intervencionismo estatal. Ao invés disso, levanta-se a bandeira da desregulamentação, da descentralização, da redução das despesas públicas, e da privatização (PERONI, 2003). As propostas no mundo convergiam para um sistema educacional conservador, demarcando um período de políticas públicas menos universais e mais direcionadas a grupos específicos. Tudo isso fomentou um espírito conservador e o desejo de retornar ao ensino tradicional. (LESSARD, 2016).
Já o Brasil perpassou por um obscurantismo educacional sem precedentes, de 1964 a 1985, devido ao Regime Militar que abortou as possibilidades de revolucionar a educação brasileira, sob o pretexto de que as propostas educacionais eram comunizantes e subversivas. Universidades foram fechadas, professores calados, demitidos e presos. Muitos estudantes, professores e demais intelectuais que se rebelaram contra este regime, foram até exilados ou mortos (ASSIS, 2012).
Notadamente, a partir dos anos 1980 engendra-se o terceiro período, cujo contexto histórico é demarcado pela aceleração global da atividade financeira, automação da atividade manufatureira, perda de muitos empregos nos países ocidentais, desenvolvimento de novos conhecimentos (neurociências) e forte estabelecimento do liberalismo econômico, afamado por neoliberalismo (ANDERSON, 1995). Tais fatores foram significativos nas mudanças de concepções sobre os valores sociais e sobre a educação, de maneira que a confiança nas instituições e nos políticos diminuiu muito.
O novo mundo que se apresentava estava diretamente relacionado com a ideia de avanço. E no quesito da economia, todo e qualquer país desejava progredir, logo, relacionava este crescimento à educação de qualidade. A educação deveria conduzir os estudantes, além de competências básicas, como memorização, linguagem e cálculo, para habilidades mais vastas, a exemplo da reflexão eficaz, capacidade de evoluir perante as mudanças do mundo e dominá-las. Emana aqui o ideário de talentos individuais, o ensino enquanto propulsionador da criatividade, do trabalho em equipe, da tolerância e do respeito.
Esta lista de finalidades educativas propostas pelas organizações internacionais mostra que o período recente é exigente: trata-se, não tanto de garantir os conhecimentos básicos, mas sim de desenvolver as competências de alto nível impostas pela economia do saber, bem como pela globalização cultural e pelo pluralismo de valores que ela revela. [...]. Com efeito, a economia do saber pede uma educação ao longo da vida inteira, pois ela se baseia na capacidade de inovar das empresas.
(LESSARD, 2016, p. 38-39)
Nesta guisa, muitos países adotaram a nova gestão pública (lógica de mercado), modificaram seus programas de ensino, estabelecendo uma base comum de conhecimentos e competências, ampliou o campo de atuação dos professores, evidenciou o trabalho em equipe. Muitos documentos, como os relatórios da OCDE, de 1993, o relatório produzido por Delors, de 1996, reforçaram as reestruturações educacionais, a autonomia dos estabelecimentos de ensino, os quais deveriam prestar contas à comunidade.
A primazia é a lógica do mercado que dispõe de “ferramenta necessária para melhorar a eficácia e a eficiência dos sistemas educativos, fortalecendo neles uma lógica industrial” (LESSARD, 2016, p. 46). Este contexto compõe o quadro atual do neoliberalismo em que o desenvolvimento econômico norteia toda e qualquer ação, colocando as atividades no plano secundário e em prol da economia.
Alguns países, entretanto, onde há governos de orientação para a social-democracia e/ou onde as entidades sindicais são mais organizadas, conseguem frear um pouco as investidas neoliberais, pontuando assuntos democráticos e igualdade de oportunidades. Ainda que o referencial recente de educação seja muito bem apregoado e defendido o primeiro, do Estado-Providência, não foi extirpado totalmente.
Diante desta breve explanação histórica das políticas públicas educacionais internacionais, é importante destacar que não significa exatamente que o Brasil seguiu a referida linearidade ou que os investimentos e programas foram também iguais. Muitas diferenças existiram. Saviani (2014) aponta que a necessidade de ajustar as contas públicas repercute na diminuição da verba educacional. Todavia, neste século atual muitos avanços são considerados, a exemplo do Plano Nacional de Educação que estipula diretrizes, metas e orçamento para a educação (SAVIANI, 2014). De todo modo, a contextualização implica também em explicar que existem influências de cunho internacional na elaboração das políticas nacionais voltadas para a formação das populações, sobretudo as menos favorecidas economicamente, a exemplo do curso pré-vestibular Universidade Para Todos (UPT).
3 Metodologia
Muitas vezes é necessário lançar mão de várias estratégias para se fundamentar e desenvolver uma pesquisa e por esta máxima é que se faz opção por realizar este trabalho na perspectiva da Investigação Qualitativa (BOGDAN; BIKLEN, 1994).
No primeiro momento, a pesquisa aqui proposta é considerada bibliográfica (exploratória), pois descreve o objeto por meio da pesquisa bibliográfica, a qual, segundo Barros e Lehfeld (2012, p. 34), “é de grande valia e eficácia ao pesquisador porque ela permite obter conhecimentos já catalogados em bibliotecas, editoras, internet”. É necessário o estudo de livros, revistas, jornais, teses, dissertações, anais de eventos científicos e artigos publicados nos periódicos da área. Com este material bibliográfico e documental em mãos, avança-se na leitura e conseguinte escrita acerca do tema em evidência no que tange à fundamentação, ao percurso histórico e à legislação. A técnica da análise documental está presente, haja vista que são analisados decretos, leis, tabelas, editais que são concernentes ao referido curso Pré-Vestibular.
Diante do exposto, este estudo considera os aspectos quantitativos como forma de fundamentar e auxiliar os aspectos qualitativos (MILES; HUBERMAN, 1984). Os dados estatísticos podem servir como verificação das ideias desenvolvidas no decurso da investigação, pois “os investigadores qualitativos dispõem-se à recolha dos dados quantitativos de forma crítica”. (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 195). São dados que podem questionar, concordar ou reforçar as estatísticas e/ou as manifestações de sujeitos, quando for o caso. Permitem compreender, também, determinado objeto pelo viés da repercussão social.
4 Curso Pré-vestibular Universidade Para Todos
O curso pré-vestibular Universidade Para Todos (UPT) é componente de um programa mais amplo, denominado Faz Universitário e este se integra ao Programa de Educação Tributária da Bahia (PET/BA), criado pela Secretaria da Fazenda em parceria com a Secretaria de Educação (SEC), por meio do Decreto nº 8.583, de 14 de julho de 2003 que foi alterado pelo Decreto nº 9.149, de 23 de julho de 2004.
O programa almeja, dentre outros objetivos, fornecer condições de igualdade no mercado de trabalho para alunos egressos da Rede Pública, mediante o aprofundamento de estudos com vistas à realização dos processos seletivos de ingresso em Instituições de Ensino Superior (IES), conceder bolsas de estudos ou bolsas-auxílio para cursar o nível superior, proporcionar bolsa de iniciação ao trabalho, conscientizar sobre a função social do imposto e do exercício da cidadania (BAHIA, 2004).
Art. 1º [...] o Faz Universitário visa promover condições de igualdade social no mercado de trabalho para alunos egressos da Rede Pública de Ensino Estadual e/ou Municipal do Estado da Bahia sendo coordenado pela Secretaria da Fazenda e desenvolvido em parceria com a Secretaria da Educação do Estado da Bahia, com os seguintes objetivos:
aprofundar os conhecimentos da Educação Básica, adquiridos pelos alunos da Rede Pública de Ensino, visando ao processo seletivo em Instituições de Ensino Superior - IES;
subsidiar, mediante Bolsas de Estudo, formação de nível superior para alunos egressos da Rede Pública de Ensino Estadual e/ou Municipal do Estado da Bahia, que vierem a ingressar em IES particulares do Estado;
subsidiar, mediante Bolsa-Auxílio, formação de nível superior de alunos egressos da Rede Pública de Ensino Estadual e/ou Municipal do Estado da Bahia aprovados em processo seletivo em IES públicas no Estado da Bahia;
propiciar experiência profissional mediante Bolsa Iniciação ao Trabalho, a alunos egressos da Rede Pública de Ensino Estadual e/ou Municipal do Estado da Bahia que cursam em IES públicas no Estado da Bahia;
estimular a compreensão da função social do imposto;
incentivar o exercício da cidadania.
(BAHIA, 2004, p. 01-02).
Perante estes pressupostos, o Projeto Faz Universitário se divide em duas fases: I- Preparando para a Universidade e II- Cursando a Universidade. Na fase I pretende-se capacitar os alunos egressos da rede pública estadual e/ou municipal do estado da Bahia, para elevar a competitividade do aluno para concorrer a processos seletivos, englobando as seguintes condições:
Art. 4º: I- Universidade para Todos curso preparatório, com aulas presenciais e/ou à distância, visando ao ingresso de alunos nas IES, incluindo temas relacionados com a formação da cidadania.
II- Tele Aula consiste em aulas apresentadas em blocos, produzidas em estúdio e veiculadas pela televisão.
Art. 5º - Para a ação Universidade para Todos o público alvo será constituído por estudantes egressos da Rede Pública de Ensino Estadual e/ou Municipal do Estado da Bahia.
Art. 6º - Para a Tele Aula, o público alvo será integrado por estudantes baianos.
(BAHIA, 2004, p. 07).
O Decreto rege, nos artigos sétimo e oitavo, que o curso preparatório Universidade para Todos deve ser ministrado diariamente, isto é, de segunda a sexta-feira, com duração de quatro horas aulas durante seis meses por ano. As disciplinas são português, redação, literatura, matemática, física, química, biologia, história, geografia e língua estrangeira. A estrutura organizacional do UPT é coordenada pela Secretaria da Educação (SEC), com execução das ações pelas universidades estaduais, isto é, Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), em vários municípios do estado. Já no caso da Tele Aula, a periodicidade será semanal, com duração de uma hora, no período de março a dezembro (BAHIA, 2004).
4.1 Orçamento Previsto Para o Curso Pré-Vestibular Universidade Para Todos
Em consulta à Lei Orçamentária Anual, (LOA, 2016; 2017; 2018) dos últimos três anos, do governo do estado da Bahia, ou seja, de 2016 a 2018, percebe-se oscilações na rubrica orçamentária no que diz respeito ao projeto Universidade Para Todos, ocorrendo decréscimos. No Ano de 2016, o orçamento estipulou onze milhões e oitocentos mil reais; no ano de 2017, a previsão foi de dez milhões de reais, enquanto que para 2018 foram previstos oito milhões e trezentos mil reais. O quadro abaixo demonstra os números da lei por ano com respectivos valores.
LOA | Valores anuais |
---|---|
LOA 2016 – Lei nº 13.470, de 30/12/2015 | 11.800.000,00 |
LOA 2017 – Lei nº 13.602, de 29/12/2016 | 10.000.000,00 |
PLOA 2018 – PLei nº 22.482, de 01/01/2018 | 8.300.000,00 |
Fonte: Elaborado pelo autor de acordo Loa (2016), Loa (2017) e Loa (2018).
Diante disso, nota-se que os valores apresentados no quadro demonstram que as políticas de contenção de gastos adotadas por governos de todo o país nos últimos anos, sobretudo, de 2015 até o momento vigente, tem repercutindo também – e fortemente –, na área educacional. As políticas sociais, quando se alardeia crise no país, são as primeiras a terem recursos cortados, sofrerem mudanças ou serem extintas (OLIVEIRA, 2011). O Decreto nº 16.593, de 18 de fevereiro de 2016, do governo do estado da Bahia, estabelece o contingenciamento no Orçamento do poder Executivo Estadual para o exercício de 2016, referente aos valores estipulados nas dotações dos órgãos, autarquias, fundações e empresas estatais, objetivando manter o equilíbrio das contas públicas e o cumprimento das metas fiscais. Este decreto ratifica a redução dos investimentos no projeto UPT.
Estes valores mencionados visam atender um determinado número de beneficiados para cursarem a UPT, conforme enquadramento nos critérios já descritos anteriormente. Embora a LOAnão determine o número de estudantes, foi possível saber o quantitativo por meio dos editais referentes à seleção de estudantes do 3º ano do ensino médio regular seriado ou egressos que estudaram em escolas públicas da Bahia, para o curso Pré-Vestibular Universidade Para Todos.
O Edital da Secretaria de Educação do estado da Bahia nº 01/2016 (doravante edital SEC, 2016), publicado em 9 de maio de 2016, estipula, no Artigo 1º, inciso 1.1 que objetiva: “[...] o preenchimento de 12.825 (doze mil, oitocentos e vinte cinco) vagas” (SEC, 2016, p. 01), o que se pode considerar um número significativo. Já o edital SEC nº 04/2017, publicado em 25 de maio de 2017, determina a oferta de 16.400 (dezesseis mil e quatrocentas vagas), o que significa 3575 (três mil quinhentos e setenta e cinco) vagas a mais em relação a 2016 (SEC, 2017). Posteriormente, em 2018, o edital SEC nº 05/2018, publicado em 10 de maio, do corrente ano, descreve a oferta de 14000 (catorze mil vagas), número inferior a 2017, ou seja, duas mil vagas (SEC, 2018). O quadro a seguir ilustra os dados descritos aqui.
INSTITUIÇÃO | 2016 | 2017 | 2018 |
---|---|---|---|
Universidade do Estado da Bahia – UNEB | 9.050 | 11.800 | 10.500 |
Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS | 700 | 1.000 | 1.000 |
Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC | 1.575 | 1.500 | 650 |
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB | 1.500 | 2.100 | 1.850 |
Total | 12.825 | 16.400 | 14.000 |
Fonte: Elaborado pelo autor de acordo Sec (2016), Sec (2017) e Sec (2018).
Se em 2016 o projeto UPT disponibilizou, na LOA, R$ 11.800.00,00 para atender 12.825 estudantes; em 2017 a LOA estipulou R$ 10.000.000,00 para atender 16.400 estudantes, isto é, houve diminuição de R$ 1.800.000,00 e aumento de 3575 vagas para os estudantes. Em 2018 o recuso decresceu ainda mais, haja vista que o orçamento estipulou R$ 8.300.000,00, resultando em R$ 1.700.000,00 a menos em relação a 2017, com vistas a atender quatorze mil alunos, ou seja, dois mil a menos, em comparação ao ano anterior.
Fazendo a somatória do público atendido nestes três anos, o quantitativo atingiu 43.225 beneficiados, número de significativa expressão, haja vista que o projeto atende 176 municípios do estado baiano, segundo o site do projeto (UNIVERSIDADE PARA TODOS, 2018) A somatória dos recursos antevistos nas LOAs consultadas no triênio anteriormente mencionado, perfazem R$ 30.100.000,00, valores considerados significativos para o projeto. Mais de 40 mil jovens tiveram a oportunidade de cursar o UPT gratuitamente, além de receber outros materiais gratuitos, a exemplo do material didático, composto por quatro volumes de módulos, e do uniforme, composto por uma camisa. Os estudantes que têm a frequência de, no mínimo, 75% das aulas ministradas fazem jus à isenção do processo seletivo vestibular de uma instituição de ensino superior pública (IES) que coordena o curso na cidade que o aluno estuda.
Salienta-se que os recursos aqui apresentados não apenas objetivam a aquisição de materiais didáticos e uniformes, como também determinam o pagamento de bolsas aos profissionais envolvidos no projeto, a saber: professores/monitores, equipe técnica composta, por exemplo, de professores especialistas, gestores de polo, supervisores de polo, secretários, coordenadores pedagógicos. Como estas funções executivas do projeto não constituem objeto central neste trabalho, não aprofundaremos a discussão sobre elas.
No que tange às características do perfil do público do UPT, muitos:
São oriundos de famílias de classe social baixa ou média, cujos pais são trabalhadores urbanos, prestam serviços para a prefeitura, como professores, serviços gerais. Outros pais atuam no comércio local, como balconistas, vendedores, serviços gerais, ou pedreiros, serventes de pedreiros, faxineiras. No caso dos pais de filhos da zona rural, como é de praxe, trabalham como lavradores. Alguns recebem um salário mínimo, outros recebem valores inferiores a isso e há aqueles que tem a maior parte da renda advinda de programas sociais, do governo federal, como o Bolsa Família.
(SOUSA; NUNES, 2017, p. 1225).
Sousa e Nunes (2017) destacam que os estudantes do curso UPT, quando questionados sobre a avaliação dele, responderam que o curso é bom, pois auxiliou muito nos processos seletivos realizados e na aprovação. Outros estudantes pontuaram como ótimo, suprindo as expectativas de ensino e aprendizagem, uma vez que ficaram muito tempo sem estudar após a conclusão do Ensino Médio. Alguns alunos salientaram que é importante que o curso inicie mais cedo, ou seja, no mês de março, em vez de junho, pois assim seria possível estudarem por um período de tempo maior e, consequentemente, se prepararem melhor para os vestibulares e o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).
Diante dos dados aqui descritos, sobreleva-se a importância de manter os valores estipulados na LOA ou aumentá-los a cada ano, dada a dimensão do projeto UPT e o grande número de estudantes que são atendidos ano após ano. São atendidos 176 municípios, porém a Bahia compõe-se de 417 municípios. Ainda que não se implemente em toda a Bahia, é razoável projetar a expansão para o maior número possível de cidades, consoante aos critérios do projeto. Pondera-se que, apesar de algumas críticas feitas pelos cursistas e de redução dos recursos, o número de atendidos é grande e a contribuição no preparo para o acesso ao nível superior é perceptível.
5 Considerações parciais
É sabido que o maior investimento na educação universitária é visto como uma alavanca de progressão da economia, uma forma de os indivíduos conseguirem melhores postos de trabalho e terem melhores rendas. O relatório denominado Olhar sobre a Educação, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 2009, preconiza mais investimentos na educação superior, contribuindo para o maior nível de competência da população e da mão de obra, além de corroborar para o desenvolvimento do capitalismo.
Além desta perspectiva econômica, conforme estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) nº 9394/1996, no Artigo 43, incisos do I ao VI, a educação superior estimula a criação cultural e sua respectiva difusão, o desenvolvimento científico e tecnológico e o pensamento reflexivo. Procura-se, estimular o conhecimento dos problemas do mundo presentes, de maneira que, capacitadas, as pessoas conheçam os problemas nacionais e regionais, visando atuar na comunidade de forma contundente, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida em diversos aspectos.
O Estado Brasileiro intenta avanços no campo da economia, principalmente, do desenvolvimento social e científico, o que é possível com maiores investimentos, conforme se acredita internacionalmente. Os investimentos em educação devem almejar o rompimento de hiatos e distâncias sociais entre as diversas classes, principalmente aquelas que foram historicamente excluídas. O aumento da oferta de vagas é salutar, entretanto, para além das atividades rotineiras, é preciso avançar no sentido de desenvolver ações e políticas públicas específicas para os públicos excluídos, com regras diferenciadas para o acesso à educação superior. A manutenção de regras iguais para públicos diferentes perpetua as desigualdades.
O curso UPT que foi criado em 2003 e existe até hoje, tem quinze anos de existência, podendo ser considerado uma política pública, haja vista que se manteve em diferentes gestões do estado da Bahia. É possível ponderar que é uma política que almeja o Estado de Bem-Estar Social (Estado-Providência), pois o Estado fornece preparo aos estudantes com vistas a lograrem êxito nos processos seletivos vestibulares e no Exame Nacional do Ensino Médio para acessarem o Ensino Superior. Mesmo com os cortes no orçamento para o projeto UPT, ora por justificativa da crise econômica, ora por respaldo na lógica do mercado que defende a eficácia e a eficiência pela lógica industrial, existem resultados benéficos e significativos no tocante ao acesso ao nível superior. Conforme explanado anteriormente, os egressos do curso UPT ponderaram que o mesmo é bom e contribuiu significativamente para a aprovação em processos seletivos, supriu as expectativas de ensino aprendizagem daqueles que ficaram muitos anos sem estudar.