1 Introdução
Propomos aqui um plano de trabalho para realização de um roteiro de atividades pedagógicas que articule algumas das recomendações contidas nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Quilombola na Educação Básica (doravante “Diretrizes”) (BRASIL, 2012b) em escolas regulares que atendam estudantes quilombolas e não quilombolas. Trata-se da criação de um repositório de plantas de usos terapêuticos alternativos e complementares (tradicionais), termo utilizado para designar as plantas que são utilizadas em procedimentos cujo enfoque são os conhecimentos tradicionais, que incluem, por si, as práticas manuais e espirituais, através da utilização de ervas, partes animais e minerais, sem o uso de medicamentos quimicamente purificados. Inicialmente, o repositório será sistematizado como farmacopeia e replicado como horta medicinal na unidade escolar. O processo pode gerar um material didático em formato de cartilha (impressa e/ou digital) para ser usado e replicado posteriormente, seja na escola-sede do roteiro, seja em outras unidades da região.
Acreditamos que a realização desta experiência didática e a produção da cartilha, ambas com ênfase na diversidade de usos das plantas medicinais dentro e entre diferentes populações, possibilitarão à unidade escolar mediar um processo importante de reconhecimento de saberes e valorização de comunidades quilombolas na região em que estão inseridas. Para isso, é fundamental que a aplicação do plano de trabalho ocorra em interlocução direta e constante com a(s) comunidade(s) quilombola(s) envolvida(s), além de abarcar toda a comunidade escolar (incluindo estudantes de todas as idades, professores, gestores, quadro de apoio, familiares e moradores da região), buscando interações entre o currículo escolar e o “currículo invisível” (MOURA, 2005) da educação quilombola, ou seja, das práticas específicas de produção e transmissão de saber presentes no cotidiano dos territórios quilombolas.
Para além dos muros da escola, a experiência estimula que as próprias comunidades quilombolas identifiquem e reconheçam suas tradições em relação às terapias como um patrimônio cultural – uma vez que seus especialistas são detentores de conhecimentos transmitidos oralmente de geração para geração desde tempos imemoriais –, proporcionando como legado à população em geral a exploração de práticas seguras e eficazes para posterior utilização em cuidados primários de saúde.
Observamos que o verdadeiro objeto de investigação não é, pois, a planta na dualidade estrutura-função ou o ser humano, mas o inter-relacionamento desses elementos que juntos constituem rico patrimônio histórico, espacial e cultural. Essa perspectiva é compatível com a abordagem pedagógica a partir dos temas transversais e contribui para a formação de cidadãos capazes de identificar e valorizar a pluralidade cultural, combatendo de maneira ativa o racismo e qualquer outro tipo de discriminação.
O plano de trabalho é apresentado de maneira mais detalhada no tópico sobre metodologia, composto por orientações sobre o processo prévio de formação pedagógica e conscientização do corpo docente sobre as problemáticas relacionadas ao tema, seguido por um passo a passo com atividades pedagógicas com estudantes em 10 etapas de desenvolvimento.
Naturalmente que a aplicação exige adaptações para cada realidade escolar. Nesse sentido, as atividades não são vinculadas a níveis específicos de ensino, nem foi indicado cronograma de realização. Entretanto, recomenda-se que seu desenvolvimento seja anual ou, caso não seja possível, que tenha duração mínima de um semestre letivo.
2 Construindo caminhos
A premissa básica de propostas pedagógicas que atendam estudantes quilombolas é considerar o quanto a experiência escolar desses sujeitos foi historicamente marcada, seja na trajetória pessoal ou familiar, pelo estigma e o silenciamento (SILVA, 2012). Esse processo é mais uma manifestação do que Silvio Almeida (2018) denominou “racismo estrutural”, termo que sintetiza a complexa e profunda integração do racismo no modo de funcionar das diversas estruturas sociais das quais fazemos parte, seja a econômica, política, cultural etc. Diante dessa realidade, exige-se do campo educacional a elaboração de práticas que ressignifiquem o espaço e o saber escolar, tornando-o um ambiente especialmente acolhedor para este público.
Devemos ter em conta que, apesar de os territórios quilombolas brasileiros contarem com cerca de 2.300 unidades escolares, segundo o Censo Escolar de 2018 (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2018), milhares de suas crianças e jovens frequentam escolas regulares fora de suas comunidades (BRASIL, 2012a). A inclusão positivada desses estudantes, ou seja, uma inclusão em que a escola busque garantir o pleno aprendizado dessa criança ou adolescente quilombola a partir da valorização de sua especificidade histórico-cultural, é um desafio que pressupõe a incorporação de saberes no projeto político-pedagógico (PPP) escolar que, até então, não cabiam dentro dela (MANTOAN, 2003). Uma forma interessante de acessá-los é no exercício da escuta proposto por Paulo Freire (2015), no sentido de conhecer essa diversidade de trajetórias e torná-las parte dos ambientes legitimados de produção de saber. Neste sentido, Nilma Lino Gomes aponta no parecer que institui as Diretrizes a necessidade primordial de uma interação que garanta “o direito de consulta e a participação da comunidade e suas lideranças” (BRASIL, 2012a, p. 4).
Diante dessas premissas, consideramos que o plano de trabalho aqui proposto, feitas as devidas adaptações, pode ser realizado em qualquer localidade em que haja comunidades quilombolas. A fundamentação está logo no artigo 1º das Diretrizes, destacando que as recomendações não se destinam somente às escolas quilombolas, mas também a “estabelecimentos de ensino próximos a essas comunidades e que recebem parte significativa dos estudantes oriundos dos territórios quilombolas” (BRASIL, 2012a, art. 1º, § 1º, inciso IV). Para tanto, seria interessante que a organização curricular de tais estabelecimentos interagisse com algumas recomendações primordiais das Diretrizes direcionadas a escolas quilombolas:
fundamentando-se, informando-se e alimentando-se:
a) da memória coletiva;
b) das línguas reminiscentes;
c) dos marcos civilizatórios;
d) das práticas culturais;
e) das tecnologias e formas de produção do trabalho;
f) dos acervos e repertórios orais;
g) dos festejos, usos, tradições e demais elementos que conformam o patrimônio cultural das comunidades quilombolas de todo o país;
h) da territorialidade.
(BRASIL, 2012b, art. 1º, § 1, inciso I)
Com este gesto institucional pode-se favorecer a mencionada inclusão positivada de estudantes quilombolas, inaugurando uma organização e prática curricular comprometida com “os contextos socioculturais, regionais e territoriais das comunidades quilombolas em seus projetos de Educação Escolar Quilombola” (BRASIL, 2012b, art. 34, § 2º), mesmo sem ser uma escola quilombola. Cabe pontuar aqui que o termo “educação escolar quilombola”, ao salientar a espacialidade “escolar”, legitima também como educação os “conhecimentos, tecnologias, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição” (BRASIL, 2012b, art. 4, inciso III) no cotidiano das comunidades quilombolas. Portanto, com esta interação curricular, o estabelecimento de ensino estaria incorporando elementos da educação quilombola.
Isto posto, acreditamos que a conexão de saberes, integrados e sem clivagens hierárquicas, pode ser contemplada a partir da identificação de conhecimentos tradicionais sobre determinadas plantas e seus usos terapêuticos. Neste sentido, um roteiro com rodas de conversa, oficinas (em que a oralidade é alçada a outro patamar de importância) e entrevistas com especialistas quilombolas pode proporcionar uma interação que atenda diretamente às recomendações das Diretrizes, da realização de uma “articulação entre os conhecimentos científicos, os conhecimentos tradicionais e as práticas socioculturais próprias das comunidades quilombolas, num processo educativo dialógico e emancipatório” (BRASIL, 2012b, art. 17, 2º, inciso II).
Do ponto de vista da aprendizagem, podemos afirmar, a partir do conhecimento de experiências similares,1 que este tipo de interação com as comunidades quilombolas, o contato direto com plantas e a posterior pesquisa e identificação de suas propriedades, as entrevistas e sondagens para levantamento das doenças recorrentes e sistematização dos resultados constituem um arcabouço de vivências que proporcionam aos estudantes articulação entre diferentes estilos de aprendizagem, potencializando a consolidação de saberes (VIEIRA JUNIOR, 2014). Na abordagem metodológica que se segue, indicamos nos quadros das etapas do plano de trabalho quais estilos de aprendizagem podem ser contemplados com a realização de cada atividade.
Além da ampliação da capacidade de aprendizagem, o processo de reconhecimento público de saberes tradicionais contribui diretamente para o fortalecimento da autoestima do estudante quilombola, que passa a ser valorizado por sua história e idiossincrasias, contemplando a necessidade de “promover o fortalecimento da identidade étnico-racial, da história e cultura afro-brasileira e africana ressignificada, recriada e reterritorializada nos territórios quilombolas” (BRASIL, 2012b, art. 35, inciso IV).
Essa perspectiva é importante quando temos em conta que a construção das identidades acontece de maneira dinâmica, não se manifestando como categorias estanques e homogêneas. São representações que vão tomando formas conflitantes ao longo do tempo, se refazendo e atualizando em relação a cada contexto (HALL, 2006). Nossa proposta de conexão entre escolas e comunidades quilombolas busca então criar contextos que abordem de outra forma as referências do estudante quilombola sobre o passado da população negra no Brasil – e, logo, sobre o seu próprio passado –, ressaltando uma imagem positiva: a de pessoas que, em condições adversas, lutaram e venceram, sendo a comunidade da qual faz parte um testemunho vivo e ativo desse processo (SILVA, 2012).
Essa perspectiva não deve negar os horrores do passado escravista e a subsequente desvalorização da identidade negra, mas focaliza outros aspectos que também estiveram presentes nesse processo histórico, explorando narrativas de iniciativas bem-sucedidas, seja de superação dos problemas, seja sobre outras formas de se relacionar com a natureza e em comunidade, narrativas, enfim, que escapam dos perigos da “história única” e linear muitas vezes proposta nos discursos históricos oficiais (ADICHIE, 2009).
Como a mediação direta destes contextos de relação entre diversidades de trajetórias e identidades fica a cargo do professor, a quem cabe conduzir cotidianamente o processo de forma integradora e não hierarquizada, é de suma importância um planejamento prévio que dê respaldo ao trabalho docente. Isso inclui um processo de formação em articulação direta e permanente com as comunidades quilombolas envolvidas, percurso que incrementa diretamente a formação sobre temas específicos da atividade e questões pedagógicas mais amplas da prática docente.
O cuidado com a formação docente também deve levar em conta os materiais didáticos utilizados. A despeito das orientações curriculares vigentes, os professores muitas vezes, por diferentes razões, atribuem ao livro didático o papel de roteiro para seu trabalho cotidiano (CHOPPIN, 2009). O problema é que boa parte das publicações ainda cria e reforça diversos estereótipos a respeito da população negra, ou da realidade quilombola, que consolidam representações sobre quais são os grupos sociais, ou saberes, exaltados como superiores (CAMPOS; GALLINARI, 2017).
Como forma de se contrapor a essa realidade, há um princípio no documento das Diretrizes que pontua a necessidade de ter sua realidade inserida “em todo o material didático e de apoio pedagógico produzido em articulação com a comunidade, sistemas de ensino e instituições de educação superior” (BRASIL, 2012b, art. 8, inciso XI). O registro da experiência com o roteiro aqui apresentado – e seus resultados – pode contemplar essa recomendação. Sua sistematização pode ser feita como produção de materiais didáticos que não só documentam todo o processo como podem (ou devem) ser utilizados ao longo do processo educacional posterior, seja da unidade escolar em questão, seja em outras instituições dispostas a implantar o plano de trabalho. A possibilidade de sistematização digital amplia ainda mais a acessibilidade e contribuição externa.
Por fim, todo o processo ratifica que “o currículo na educação escolar quilombola pode ser organizado por eixos temáticos, projetos de pesquisa, eixos geradores ou matrizes conceituais, em que os conteúdos das diversas disciplinas podem ser trabalhados numa perspectiva interdisciplinar” (BRASIL, 2012b, art. 37). Neste sentido, os quadros com as etapas do roteiro sugerem as áreas do conhecimento que podem ser contempladas com cada atividade.
3 Metodologia
O preparo inicial deve ser realizado nas instâncias de formação pedagógica da escola, necessariamente envolvendo professores e gestores, e preferencialmente incluindo outros funcionários da comunidade escolar.
Primeiramente, deve-se fazer um estudo e discussão do Parecer CNE/CEB nº 16/2012 (BRASIL, 2012a) das Diretrizes, para conhecer suas orientações e se apropriar de seus valores, uma vez que traz um histórico analítico do processo de reconhecimento das comunidades quilombolas. Trata-se de uma leitura de base, que pode ser incrementada por outros materiais pertinentes à realidade local. Como sugestão metodológica de estudo, pode-se dividir o corpo docente em vários grupos, destinando a cada um a leitura de uma parte do parecer, que será posteriormente apresentada ao conjunto dos grupos para discussão coletiva.
A etapa seguinte já pode ser o levantamento das comunidades quilombolas do município ou entorno da escola. Para isso, pode-se recorrer a dados da administração municipal e a informações de conhecimento comum da comunidade escolar. Buscar conhecer previamente a quantidade de comunidades, sua realidade e a distância em relação à escola é fundamental para avaliar com quais comunidades é logisticamente viável estabelecer contato. O procedimento atende às recomendações das Diretrizes em seus artigos 1º, inciso VI, e 8º, inciso VIII (BRASIL, 2012b).
A partir daí já se pode fazer contato com as lideranças das comunidades, avaliando seu grau de receptividade para a experiência. Estudantes e/ou professores quilombolas podem ser bons mediadores neste primeiro contato. Destacamos a importância de, desde o início, incluir as comunidades com protagonismo nessa conexão de saberes, e não apenas como receptoras de decisões prévias. Daí a importância de um conhecimento anterior sobre suas realidades e expectativas, conforme recomendado nas Diretrizes:
§ 1º A construção do projeto político-pedagógico deverá pautar-se na realização de diagnóstico da realidade da comunidade quilombola e seu entorno, num processo dialógico que envolva as pessoas da comunidade, as lideranças e as diversas organizações existentes no território.
§ 2º […] o projeto político-pedagógico deverá considerar:
I – os conhecimentos tradicionais, a oralidade, a ancestralidade, a estética, as formas de trabalho, as tecnologias e a história de cada comunidade quilombola;
II – as formas por meio das quais as comunidades quilombolas vivenciam os seus processos educativos cotidianos em articulação com os conhecimentos escolares e demais conhecimentos produzidos pela sociedade mais ampla.
(BRASIL, 2012b, art. 32)
É, portanto, fundamental que as comunidades estejam de acordo com o trabalho de pesquisa e participem do planejamento das atividades com a escola, destacando interlocutores que facilitem um contato mais permanente. Recomendamos também a realização de visitas prévias ao território, a fim de melhor compor o planejamento das visitas com os estudantes.
Para que os primeiros contatos com a temática sejam realizados a partir da perspectiva quilombola, salienta-se que as atividades como rodas de conversa sobre o histórico das comunidades, oficinas sobre cultivo e uso das plantas e entrevistas ocorram necessariamente no território quilombola sob condução de seus membros e especialistas, garantindo também que professores e estudantes conheçam esses territórios, de forma a possibilitar que as práticas estejam de acordo com as recomendações das Diretrizes em seu artigo 8º, incisos VIII, XII, XIV (BRASIL, 2012b).
O contato realizado dessa maneira pode ser uma boa estratégia de interação. Vale lembrar que os conflitos (sobretudo fundiários e econômicos) se dão de maneira local; assim, numa mesma escola poderão estar professores e estudantes eventualmente oriundos de famílias em posições antagônicas nestes conflitos, ou ideologicamente hostis às comunidades quilombolas, o que pode dificultar o andamento do projeto no decorrer de sua aplicação, daí a importância de um início com articulações bem planejadas, empáticas e que se antecipem em relação às tensões da realidade objetiva.
Por fim, realiza-se o cronograma e planejamento pedagógico, dividindo turmas e professores de acordo com cada atividade, planejando o material, os recursos e a logística necessária para a realização, considerando as recomendações dos artigos 36 e 37 das Diretrizes (BRASIL, 2012b). Deve-se também definir o formato de apresentação dos resultados, a sistemática de registro para produção da cartilha e os registros necessários para a realização de uma feira científico-cultural.
Este é o momento em que a escola pode pensar globalmente sua atuação, considerando como cada parte da comunidade escolar pode contribuir da melhor forma. Exemplo: a turma de determinado estudante quilombola pode ter mais facilidade no contato com as comunidades; outra turma com professor ou estudante de família de agricultores pode ter mais facilidade na gestão da criação da horta; turmas de estudantes com leitura mais fluida podem realizar melhor a etapa de pesquisa das propriedades dos fármacos etc.
Ao final destas etapas, é desejável que a atividade seja incluída no PPP da escola, consolidando institucionalmente essa prática.
4 Roteiro de atividades com estudantes
Pode ser realizado com estudantes de diferentes faixas etárias, com adaptações pertinentes à organização escolar e às habilidades das crianças. Os quadros 1 a 9 especificam as etapas.
Metodologia | Justificativa |
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Definição da área de abrangência (localização): Dentre as comunidades dos estudantes quilombolas, qual entrará no roteiro (as comunidades podem ser alteradas a cada experiência)? Após a escolha, sugerimos a caracterização da área de estudo, pontuando sua localização, seu clima, informando se a comunidade está localizada dentro de uma área de proteção ambiental, o número de pessoas/famílias que compõem a comunidade, em qual etapa está o processo de titulação etc. |
Atividade contempla as Diretrizes em seus artigos 17, inciso III; 32; e 35. |
Áreas: Artes, Geografia e Ciências/Biologia; Estilos de aprendizagem: sensoriais, visuais, ativos, sequenciais. |
Fonte: Autoria própria.
A etapa 2 (Quadro 2) envolve conversas sobre a formação da comunidade (primeiras famílias e formas de ocupação do território), formas de trabalho e principais atividades de seu cotidiano. Recomenda-se abordar quais são as doenças mais comuns no território (que ficam registradas na memória dos moradores) e como costumam tratar (Quadro 3).
Metodologia | Justificativa |
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Professores e estudantes devem realizar visita agendada à(s) comunidade(s) selecionada(s). Primeiro faz-se um breve roteiro de reconhecimento do território, seguido de rodas de conversa com as lideranças quilombolas previamente nomeadas que apresentarão a história da comunidade. Se for comunidade certificada, pesquisar antes o histórico junto à Fundação Palmares e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. As turmas podem ser distribuídas em distintas comunidades, ou entre diferentes membros de uma só comunidade. Isso garante diversidade de informações, sobre as quais se pode discutir posteriormente. |
Em acordo com Diretrizes nos artigos 1º , inciso V; 6º, inciso III; 7º, inciso XX; 8º, inciso VI; 17, incisos II e III; e 35. Conhecer o território quilombola e ouvir suas lideranças cria uma empatia inicial. |
De volta à sala de aula, as narrativas apresentadas podem ser relacionadas a tópicos da cronologia mais ampla da história nacional, estadual e municipal. É interessante que se façam desenhos e representações cartográficas dos percursos narrados. | Estabelecer analogias e comparações. |
Áreas: Artes, Geografia, História e Português. Estilos de aprendizagem: intuitivos, verbais, reflexivos, sequenciais. |
Fonte: Autoria própria.
Metodologia | Justificativa |
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Sondar entre os estudantes quais são as doenças percebidas por eles como recorrentes na região e dentro de suas famílias. Em seguida, os estudantes deverão ir às unidades básicas de saúde (UBS) mais próximas da(s) comunidade(s) escolhida(s) e coletar os dados a respeito das principais doenças que acometem os moradores da região. Professores podem auxiliar com pesquisa no âmbito da administração municipal. Pode-se realizar uma comparação entre quais doenças estão presentes nas comunidades quilombolas e fora delas. Pode-se relacionar as informações obtidas nas comunidades (nas rodas de conversa) com estatísticas da UBS, verificando quais são as doenças que levam quilombolas a procurar o atendimento de saúde municipal. |
Reconhecer as principais doenças que acometem a região facilita estabelecer o recorte das plantas de uso terapêutico que serão selecionadas. Comparar as informações obtidas na UBS com os conhecimentos pré-existentes dos estudantes sobre as doenças. |
Áreas: Ciências/Biologia, Geografia e Matemática. Estilos de aprendizagem: sensoriais, visuais, ativos, sequenciais. |
Fonte: Autoria própria.
Na etapa 4 (Quadro 4) deve-se buscar conhecer as plantas utilizadas para a prevenção e o tratamento das doenças levantadas no item anterior.
Metodologia | Justificativa |
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Os professores e estudantes deverão ir às comunidades e participar de oficinas com especialistas quilombolas, com os quais sugere-se compartilhar as informações obtidas na UBS. Assim como na etapa 2, as turmas podem ser divididas entre distintas comunidades, ou diferentes membros de uma só comunidade. |
Em acordo com Diretrizes nos artigos 1º, inciso V; 6º, inciso III; 7º, inciso XX; 8º, inciso VI; 17, incisos II e III; e 35. Conhecer plantas, suas propriedades conhecidas de forma tradicional e a diversidade de usos. Saber diferenciar o trabalho de curandeiros e benzedeiros e como cada um faz uso das plantas. Estabelecer relação com as religiosidades afro-brasileiras e seus sincretismos. Estabelecer reflexões sobre as questões de gênero, observando se há protagonismo das mulheres na organização dessas comunidades. |
Conversa entre professores e estudantes após as oficinas para avaliar a atividade. | Comparar as informações obtidas na oficina com os conhecimentos pré-existentes dos estudantes sobre as plantas e seus usos terapêuticos. |
Áreas: Ciências/Biologia, Geografia e História. Estilos de aprendizagem: sensoriais, visuais, ativos, globais. |
Fonte: Autoria própria.
Metodologia | Justificativa |
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Professores e estudantes deverão elaborar questionário prévio sobre as informações de interesse. Em seguida, visitarão comunidades para realizar entrevistas previamente agendadas (caso não seja viável nova saída, entrevistas podem ser realizadas no mesmo dia das oficinas). Estudantes de ensino médio podem visitar as comunidades sem os professores. Os estudantes das comunidades quilombolas escolhidas atuarão como mediadores, indicando para entrevista pessoas reconhecidas nas comunidades como excelentes conhecedoras das plantas. OBS. Entendendo a cultura como conhecimento compartilhado, então mesmo após escolha do informante é importante que o grupo responsável por essa visita/entrevista visite o maior número possível de residências, evidenciando a importância do trabalho. |
Em acordo com Diretrizes nos artigos 1º , inciso V; 6º, inciso III; 8º, inciso VI; 7º, inciso XX; 17, incisos II e III; e 35. Permitirá aos estudantes perceber quais conhecimentos os quilombolas têm sobre as plantas e seus usos terapêuticos. Os estudantes quilombolas terão um lugar privilegiado de escuta nesse momento ao contribuir com informações. Permitirá aos estudantes conhecer relatos de pessoas que fizeram tratamentos indicados pelos especialistas. Permitirá aos estudantes aferir como os quilombolas reconhecem seus especialistas, além de conhecer a trajetória pessoal de curandeiras e benzedeiras. |
Nessa etapa será realizado o levantamento etnobotânico, cruzando-se os dados obtidos nas UBS com as plantas utilizadas para prevenção e tratamento das doenças elencadas. | |
Áreas: Ciências/Biologia, Geografia, História e Português. Estilos de aprendizagem: intuitivos, verbais, reflexivos, sequenciais. |
Fonte: Autoria própria.
Metodologia | Justificativa |
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Estudantes, sob supervisão dos professores, fazem coleta a partir do levantamento etnobotânico realizado nas etapas anteriores. Incluir descrição da forma de uso dos espécimes (chá, pomada, xarope, emplasto…). Estudantes poderão identificar o nome científico das espécies coletadas com o auxílio de uma chave de identificação. Diferenciar partes da planta. É recomendável realizar registros com desenhos das plantas. |
Montagem de uma farmacopeia que pode servir de consulta para toda a comunidade escolar. Atividade prática de contato direto com as plantas, articulando diferentes estilos de aprendizagem. Conhecer o nome científico de plantas a partir do aprendizado de utilização de chaves de identificação. Conhecer as formas adequadas de armazenamento de cada planta. |
Áreas: Artes, Ciências/Biologia e Geografia. Estilos de aprendizagem: sensoriais, visuais, ativos, sequenciais. |
Fonte: Autoria própria.
Metodologia | Justificativa |
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Recomendamos pesquisa supervisionada ao material Ensinando sobre plantas medicinais na escola, desenvolvido pelo grupo de pesquisa da professora Maria das Graças Lins Brandão (BRANDÃO; ALMEIDA, 2011) – a fonte pode ser reavaliada a critério dos professores. | Estudantes buscarão dar ao conhecimento levantado nas etapas anteriores certo embasamento científico a partir da identificação de alguns grupos de metabólitos secundários (substâncias bioativas responsáveis pela atividade medicinal das plantas) que podem estar presentes nessas plantas. |
Como atividade prática, sugere-se experiência comparativa entre plantas coletadas e sachês de chá comercializados. | Observar a diferença de coloração entre as plantas coletadas e os chás delas comercializados. Articular diferentes estilos de aprendizagem. |
Áreas: Ciências/Biologia e Geografia. Estilos de aprendizagem: sensoriais, visuais, reflexivos, globais. |
Fonte: Autoria própria.
Metodologia | Justificativa |
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Ao final da coleta e identificação dos materiais vegetais, os estudantes montarão uma horta medicinal na escola, buscando cultivar o maior número possível de espécies medicinais levantadas. Para cada planta deverá ser confeccionada uma plaquinha indicando nome genérico (e específico, quando possível) e principais usos. A cada ano a horta poderá receber novas espécies, de acordo com os novos levantamentos e conhecimentos adquiridos. |
A experiência de cultivo é uma atividade prática e lúdica que permite articular intensamente diferentes estilos de aprendizagem. Aprofunda e consolida conhecimentos adquiridos ao longo da atividade. Promove o reconhecimento dos saberes tradicionais das comunidades quilombolas, que passam a ser experimentados por todos. Possibilita trazer para o cotidiano de toda a comunidade escolar os conhecimentos adquiridos ao longo da atividade. Em acordo com Diretrizes em seu princípio artigo 7º, inciso X; recomendação artigos 8º, inciso VI; e 17, incisos II e III. |
Áreas: Ciências/Biologia, Geografia, Matemática e Educação Física. Estilos de aprendizagem: sensoriais, visuais, ativos, sequenciais. |
Fonte: Autoria própria.
Metodologia | Justificativa |
Como produto do roteiro, os estudantes deverão desenvolver uma cartilha (impressa e/ou virtual) contendo as plantas medicinais levantadas e informações como formas de uso, indicação (doença), foto e ilustrações, demais nomes pelos quais ela é conhecida etc. Identificar as fontes e em qual comunidade esse conhecimento foi levantado. | A cartilha é um instrumento de informação e divulgação dos conhecimentos obtidos. Poderá ser distribuída para toda a comunidade escolar, comunidade quilombola e público em geral. A cartilha virtual deve ser de acesso livre a todos, preferencialmente com possibilidade de inserção de novos dados e um incentivo à replicação em outras regiões. Em acordo com Diretrizes nos artigos 8º, inciso XI; e 14. |
Áreas: Artes, Ciências/Biologia, Geografia, História e Português. Estilos de aprendizagem: intuitivos, verbais, reflexivos, sequenciais. |
Fonte: Autoria própria.
A etapa 10 contempla a apresentação da sistematização das pesquisas em feira científico-cultural, aberta a toda comunidade escolar e público em geral.
5 Considerações finais
O plano de trabalho aqui proposto defende a criação de ambientes pedagógicos de interação – equitativa e complementar – que contribuam para o reconhecimento e a valorização dos saberes construídos e experimentados nas comunidades quilombolas.
A estruturação é interdisciplinar, ampla e abrangente, garantindo aplicabilidade em contextos diversos. O passo inicial deve ser sempre a discussão de seus termos como um momento de formação que proporciona a gestores e professores de escolas regulares que atendam públicos quilombolas reflexões embasadas sobre as relações étnico-raciais no Brasil contemporâneo, no sentido de combater práticas de racismo e discriminação daí decorrentes.
Já a temática escolhida tem capacidade de, através da mediação da instituição escolar, estreitar relações entre comunidades numa determinada região, melhorando relações sociais não só entre os estudantes, mas entre toda a população envolvida, consolidando princípios democráticos. De maneira mais específica, o processo de levantamento das plantas medicinais utilizadas em terapias tradicionais de doenças recorrentes em determinada região com comunidades quilombolas, acompanhado de pesquisas com embasamento científico sobre suas propriedades, pode contribuir para a saúde local, melhorando a qualidade de vida da população. A sistematização em cartilha garante divulgação e permanência no tempo.
No que diz respeito aos processos de aprendizagem, o plano de trabalho beneficia diretamente os estudantes quilombolas, na medida em que valoriza seus repertórios, mas estende os benefícios a todas as crianças e adolescentes da escola, uma vez que as atividades têm caráter integrador e lúdico. Além disso, parte significativa das atividades acontece fora da instituição escolar, proporcionando outra receptividade por parte dos estudantes. Já a finalização com a produção da horta é uma atividade prática lúdica que consolida aprendizados e introduz no cotidiano as experiências compartilhadas ao longo do processo.