Introdução
O ensino da Matemática sempre esteve atrelado a fatores inerentes ao uso de tendências metodológicas, à formação inicial e continuada, à utilização de tecnologias a favor do processo pedagógico em sala de aula, entre outros. A chegada repentina da pandemia trouxe consigo a necessidade do distanciamento social, sendo que o advento do ensino remoto se tornou realidade nas escolas brasileiras. Neste contexto, os professores se viram obrigados em pouco espaço de tempo a verem suas habituais aulas presenciais serem trocadas por plataformas de reuniões digitais como o Google Meet e o Zoom. O quadro de giz foi substituído por slides e mesas digitalizadoras e as provas on-line passaram a ser adotadas de modo corriqueiro no dia a dia escolar.
Esse turbilhão de mudanças carregou muitos encontros e desencontros dos docentes de Matemática no que concerne ao desenvolvimento pedagógico de seu trabalho diário, pois as transformações foram muitas e o espaço temporário para que ocorressem foi escasso. Flores e Lima (2021, p. 95) atentam que para este momento “a força das circunstâncias compeliu a uma mudança desenvolvida sem a adequada reflexão, formação e preparação, submetendo os professores a adaptações nas suas práticas”. Sobre essa mesma ótica, Vasconcelos e Araújo (2020, p. 03) indagam “como os professores darão conta desta nova realidade se não tiverem competências essenciais para validar a prática?”. Somadas a este contexto de adaptações e competências essenciais que passaram a ser exigidas aos professores, não podemos nos esquecer da precariedade de infraestrutura das escolas públicas brasileiras apontadas por Silva e Souza (2013) que deflagram uma preocupação com a qualidade de ensino externada com os baixos índices de desempenho em avaliações de cunho nacional e que podem ser ainda mais agravados nesse período pandêmico com o ensino remoto.
A vista disso, entendemos como necessário para fins de compreensão do quadro atual de ensino remoto dar voz a professores de Matemática para que relatassem suas dificuldades vivenciadas no seu cotidiano de trabalho durante a pandemia de COVID-19. Dessa forma, nosso objetivo foi analisar e evidenciar as dificuldades encontradas por professores de matemática ao exercerem o ensino remoto e buscamos também apontar o que poderia ser tomado como ação de modo a melhorar esse processo.
Além desta introdução, esta pesquisa está subdividida em mais cinco seções. Na próxima seção discutimos teoricamente sobre este momento de pandemia e os percalços na vida dos professores. Na terceira seção apresentamos os procedimentos metodológicos da pesquisa. Na quarta e quintas seções, apresentamos respectivamente, a caracterização e formação dos professores pesquisados e a análise dos dados desenvolvida à luz dos pressupostos da Análise de Conteúdo de Bardin (2011), finalizando com a seção de considerações finais.
Referencial Teórico
Compreende-se que o ensino realizado por professores das mais diversas disciplinas e, em especial, da Matemática, é um processo complexo com diversos fatores que podem interferir na aprendizagem dos alunos. Além disso, resumir o trabalho do professor a “apenas” ensinar precisa ser repensado. Oliveira et al. (2012) destacam que:
Existe tanta coisa a fazer que simplesmente cumprir o que é especificado exige quase todos os esforços do professor, executando uma intensa quantidade de tarefas que na maior parte das vezes não foi elaborada ou decidida por ele, não existindo tempo para se parar para se pensar e discutir sobre essas tarefas. (OLIVEIRA et al., 2012, p. 14)
Desta forma, o processo de ensino acaba sendo cada vez mais complexo e trabalhoso ao professor. Com ênfase, antes da pandemia já tínhamos relatos sobre a precarização das escolas no Brasil, que apresentavam falta de material, de infraestrutura, de pessoal, entre outros, conforme apontam Silva e Souza (2013, p. 784) quando comentam que “[...] é necessário mostrar à sociedade brasileira as condições precárias que ainda persistem nas instituições públicas de ensino, suas relações com a qualidade da educação e com os baixos resultados obtidos nas avaliações nacionais”. À vista de todo esse cenário que os professores vinham e vem passando, em 2019 ocorreu a pandemia da COVID-19, que trouxe um novo significado ao ato de ensinar e aprender.
As aulas passaram do presencial para o ensino remoto, o uso do quadro e giz foi substituído pelo de tecnologias digitais como mesas digitalizadoras, as atividades antes planejadas para o trabalho presencial com os alunos tiveram que ser adaptadas, dentre diversas outras mudanças. No entanto, diversos professores não foram formados para este tipo de ensino com o uso das tecnologias digitais. Santos, Pessanha e Silva (2016, p. 5) já ressaltavam a importância de considerarmos também esse:
[...] uso adequado das novas tecnologias educativas, precisamos de professores bem formados, que sejam capazes de desenvolver uma prática educativa que viabilize a aprendizagem em todos os aspectos favorecendo a autonomia e proximidade do aluno e possibilitando uma formação significativa para os sujeitos que almejam elevar sua escolaridade e até mesmo melhorar sua condição social (SANTOS; PESSANHA; SILVA, 2016, p. 5).
Apesar de compreendermos essa importância da relação professor-tecnologias digitais, evidenciamos que diversos professores tiveram que desenvolver um processo de ensino adaptado, em que eles e os alunos aprendem juntos e buscam as melhores alternativas para favorecer a melhor aprendizagem, como já era destacado pelos autores. Não bastando apenas isso, outros fatores também acabaram surgindo nesta nova modalidade de ensino. Cordeiro (2020, p.12) reconhece em seu estudo “[...] que muitas escolas enfrentam o desafio da conectividade, há grande heterogeneidade no acesso a recursos tecnológicos entre classes sociais e muitos professores não possuem formação específica para lidar pedagogicamente com os recursos tecnológicos”.
Para Cao et al. (2021, p. 09, tradução nossa), com o advento das aulas remotas devido a pandemia de Covid-19, os professores sentiram-se “oprimidos ao serem expostos a um grande número de recursos pedagógicos digitais”. Segundo os autores, os docentes repentinamente tinham diversas opções pedagógicas de diferentes materiais em muitas formas, o que incluía planos de aula, videoaulas gravadas e apresentação de slides. Devido à falta de experiência, os professores sentiram dificuldades para decidir qual recurso digital seria mais adequado para o contexto de aulas on-line.
Consequentente, os obstáculos no ensino remoto também refletiram nos alunos. Um exemplo é o estudo de Mereles, Canese e Amarilla (2021) que, na ótica das dificuldades enfrentadas pelos alunos de ensino médio e ensino superior no Paraguai, mostrou-se:
[...] a falta de compreensão das tarefas atribuídas pelos professores, falta de motivação, problemas de conexão com a internet, falta de apoio ao ensino, falta de acesso à informação para realizar tarefas, falta de conhecimento no uso de ferramentas tecnológicas, pouco acesso à tecnologia, entre outros (MERELES; CANESE; AMARILLA, 2021, p. 15, tradução nossa).
Todos esses fatores corroboram para deixar o processo de ensino cada vez mais complexo e desafiador aos professores, já que, segundo o estudo de Santos (2020, p. 55), eles têm preocupações sobre “[...] a forma como deveriam desenvolver o conteúdo; oralidade; demonstração; fixação e ampliação; como garantir esse aprendizado no estudante, sem conseguir alcançar todos esses mecanismos”. Quando pensamos que o ensino remoto se apresentou como algo novo aos professores, compreendemos a insegurança que muitos têm em relação a cumprir o seu papel da melhor forma.
Além disso, percebemos que há diferença quando se ensina remotamente e presencialmente, pois a interação entre alunos e professores diminui (ANJOS, 2020), uma vez que nas plataformas de videoconferência como Google Meet e Zoom, dificilmente os alunos abrem a câmera para falar com os professores. O processo de avaliação também mudou, já que os formulários, no estilo questionário eletrônico, tiveram que fazer parte da rotina dos professores (SANTOS; ROSA; SOUZA, 2020).
Em maior profundidade, Rondini, Pedro e Duarte (2020, p. 53) destacam que além dos professores terem que lidar com essas diversas dificuldades, eles também têm que amparar os estudantes, uma vez que “[...] no contexto da crise, envolvem fatores que não estão relacionados apenas à questão dos conteúdos programáticos ou aos critérios e à metodologia do processo avaliativo, pois englobam questões sociais, familiares e econômicas dos estudantes”. Em concordância, Anjos (2020, p. 44) destaca em seu estudo que muitos alunos “[...] não têm acesso às tecnologias o que fez a participação cair drasticamente, afetando negativamente na construção do conhecimento, interesse e motivação”.
Diante deste cenário, vemos diversos casos de professores que além de elaborar a aula para o ensino remoto tem que pensar formas de disponibilizar o material aos alunos que não podem assistir estas aulas. Santos, Rosa e Souza (2020, p. 183) destacam esse cenário como “o grande desafio que tem sido para esses docentes ensinar matemática no atual cenário pandêmico, o que intensifica mais ainda sua luta diária por melhores condições de trabalho e valorização profissional”. Esta valorização também deve vir da sociedade, uma vez que pais e mães, que tiveram que fazer um papel de tutores de seus filhos, os auxiliando nas atividades, vivenciaram a dificuldade que é o ato de ensinar.
A partir destas reflexões apontadas, evidenciamos que a situação educacional do Brasil, tanto da infraestrutura como qualificação por rankings nacionais e internacionais da aprendizagem, antes da pandemia, já se encontrava desfavorável e que, durante a pandemia, diversos novos obstáculos foram surgindo. Desta forma, compreendemos a importância de observar quais foram essas dificuldades, sob a ótica dos professores, para que novas estratégias possam ser colocadas em prática, a fim de colaborar com um ensino e uma aprendizagem de qualidade.
Metodologia
Essa é uma pesquisa de natureza qualitativa, pois visa a apresentação, o tratamento e a compreensão de contextos sociais (SOUZA; KERBAUY, 2017). Além disso, é de caráter descritivo, pois “têm como objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis” (GIL, 2008, p. 28).
Deste modo, os sujeitos pesquisados foram 18 professores de Matemática dos anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. Dentre os pesquisados, 14 atuavam apenas em escolas públicas, 1 (um) apenas em escola privada e três atuavam concomitantemente em escolas públicas e privadas. O objeto de estudo foram as dificuldades encontradas pelos docentes com o ensino remoto adotado durante a pandemia de coronavírus no ano de 2020.
Para contextualizar, em relação ao ensino remoto na rede pública de ensino, o Estado do Paraná adotou inicialmente no mês de março de 2020 o uso de aulas assíncronas gravadas em estúdios e disponibilizadas aos estudantes através da TV e do You Tube. O controle de aulas e atividades eram feitas de modo remoto pelos professores por meio da plataforma Google Classroom. Os alunos também tinham acesso a links, atividades avaliativas e notas nesta plataforma. Além disso, podiam entrar em contato com o professor para sanar suas dúvidas.
A SEED-PR - Secretaria de Estado da Educação do Estado do Paraná foi a responsável por postar semanalmente as aulas assíncronas juntamente com atividades sugeridas de acordo com número de aulas de cada ano/série de cada disciplina, cabendo aos docentes acompanhar os andamentos das atividades realizadas pelos alunos, atendendo os questionamentos, adicionando materiais extras, atribuindo frequências e notas, verificando os alunos que não faziam as atividades e comunicando a equipe pedagógica da escola quando necessário. No mês de outubro do corrente ano, foi implementado que os professores deveriam fazer aulas síncronas semanais de 15 a 30 minutos por turma por meio do Google Meet.
Em relação à rede de ensino privada, a grande maioria adotou, desde o início da pandemia em março de 2020, as aulas remotas síncronas com vídeo chamadas e fazendo uso de diferentes plataformas educacionais privadas para atividades pedagógicas de ensino e aprendizagem.
Dentro deste panorama, partindo do pressuposto de que poderia haver dificuldades encontradas, buscamos neste estudo evidenciá-las por meio da visão de professores que participavam deste processo. Para alcançarmos nosso objetivo, devido ao momento pandêmico e por acreditarmos ser um meio mais seguro, fizemos o uso do questionário eletrônico - Google Formulários - contendo questões abertas e fechadas. O link para este questionário foi enviado para grupos de WhatsApp, Facebook e para listas de e-mails de professores de Matemática. As questões foram disponibilizadas entre os dias 01 e 30 de novembro de 2020 para que os docentes pudessem respondê-las.
Em relação às questões solicitadas no formulário, estas foram divididas em 3 seções, a saber: I) Dados Gerais; II) Formação Inicial e Continuada para o Ensino Remoto e Educação a Distância e III) O processo de ensino e aprendizagem de Matemática durante a pandemia da COVID - 19. O quadro 1 a seguir descreve as questões levantadas junto aos docentes.
Dados Gerais 1 - Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino 2 - Cidade/Estado: __________________________________ 3 - Formação acadêmica: ( ) Estudante de Licenciatura em Matemática ( ) Graduado (a) ( ) Mestrado ( ) Doutorado 4 - A quanto tempo leciona Matemática? ( ) 1 a 5 anos. ( ) 6 a 10 anos. ( ) 11 a 15 anos. ( ) Mais de 15 anos. 5 - Local(is) onde leciona durante a pandemia de COVID-19: ( ) Escola Pública. ( ) Escola Privada. ( ) Faculdade Pública. ( ) Faculdade Privada. |
Formação Inicial e Continuada para o Ensino Remoto 6 - Em sua formação inicial, como você avalia a sua formação para o uso de tecnologias no ensino remoto da disciplina de Matemática? Péssima ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) 5 Ótima 7 - Em relação a sua formação continuada, como você avalia essa formação para o uso de tecnologias no ensino remoto da disciplina de Matemática? Péssima ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ( ) 5 Ótima 8 - Como você avalia sua habilidade para usar tecnologias no ensino remoto na disciplina de Matemática? __________________________________ ________ |
O processo de ensino e aprendizagem de Matemática durante a pandemia de COVID - 19 9 - Para você quais são os pontos POSITIVOS do ensino de Matemática de forma remota? __________________________________ 10 - Você prefere lecionar aulas de matemática de forma: ( ) Remota ( ) Presencial 11- Quais são os pontos NEGATIVOS no processo de ensino de Matemática de forma remota? __________________________________ |
Fonte: Elaborado pelos autores
Primeiramente, apresentamos uma seção sobre a caracterização e formação que os professores relataram no questionário, quantificando suas respostas, de modo que em relação às questões objetivas (questões 6 e 7), usamos a escala Likert. Em seguida, o corpus da nossa pesquisa foi apresentado, conforme a análise realizada.
Em relação às questões abertas (questões 8 e 11) fizemos o uso da Análise de Conteúdo de Bardin (2011) e realizamos a categorização a posteriori, ou seja, com as categorias emergindo de acordo com os dados levantados. Bardin (2011) descreve tal processo em três fases:
a) Pré-análise: quando o pesquisador escolhe os dados que serão colocados sob análise, que nesta pesquisa referem-se às respostas dos professores para as perguntas abertas 8 e 11. Para tanto, o material foi organizado, sendo feita leitura flutuante sobre o corpus, observadas as regras de exaustividade, representatividade, homogeneidade e pertinência.
b) Exploração do Material: Esta segunda fase é aquela na qual são administradas as decisões a serem tomadas e ocorre a manipulação das codificações, ou seja, quando os dados são tratados.
c) Tratamento dos resultados, inferências e interpretação: é a fase final onde é dada a significação aos resultados obtidos, ocorre o processo de inferência sobre os dados à luz dos referenciais teóricos adotados.
Caracterização e formação dos professores
A presente pesquisa contou com a participação de 18 professores de Matemática que fizeram a devolutiva do formulário enviado. Todos os docentes participantes eram residentes no Estado do Paraná. As questões 1 a 5 da seção Dados Gerais nos permitiram traçar o perfil destes professores. A Tabela 1 a seguir mostra o perfil dos docentes que responderam ao questionário.
Gênero | Formação acadêmica | Tempo que leciona | Local(is) em que lecionou na pandemia |
---|---|---|---|
Feminino: 72,2% | Estudante: 0% | 1 a 5 anos: 5,6% | Escola Pública: 94,4% |
Masculino: 27,8% | Graduado: 5,6% | 6 a 10 anos: 16,7% | Escola Privada: 22,2% |
Especialização: 61% | 11 a 15 anos: 27,7% | Faculdade Pública: 0% | |
Mestrado: 27,8% | Mais de 15 anos: 50% | Faculdade Privada: 0% | |
Doutorado: 5,6% |
Fonte: Elaborado pelos autores
Na Tabela 1, podemos observar que a maioria dos entrevistados eram do gênero feminino (72,2%), eram pós-graduados (61%), lecionavam a mais de 15 anos (50%) e trabalharam em escola pública durante a pandemia (94,4%). Por conseguinte, a seção Formação Inicial e Continuada para o Ensino Remoto e Educação à Distância - EAD, analisamos as questões 6 e 7 usando a escala Likert, cujos resultados podem ser evidenciados na Tabela 2 a seguir.
Em sua formação inicial, como você avalia a sua formação para o uso de tecnologias no ensino remoto da disciplina de Matemática? | |||||
---|---|---|---|---|---|
Nível de Concordância | 1 | 2 | 3 | 4 | 5 |
Porcentagem | 22,2% | 22,2% | 38,9% | 16,7% | 0% |
Em relação a sua formação continuada, como você avalia essa formação para o uso de tecnologias no ensino remoto da disciplina de Matemática? | |||||
Nível de Concordância | 1 | 2 | 3 | 4 | 5 |
Porcentagem | 11,1% | 22,2% | 16,7% | 44,4% | 5,6% |
Fonte: Elaborado pelos autores
Na Tabela 2, observamos que a maioria dos professores atribui um nível de concordância 3 (38,9%) ao avaliarem a sua formação inicial para o uso de tecnologias no ensino remoto e EAD. Ainda encontramos uma média ponderada 3 para todos os níveis de concordância. Quando tratamos da formação continuada, a maioria apontou o nível de concordância 4 (44,4%) com média ponderada 3,7 para todos os níveis de concordância. Tais dados mostram uma avaliação regular na visão dos professores quando o assunto é a preparação que tiveram em suas formações inicial e continuada para ministrarem suas aulas remotas fazendo uso de mídias tecnológicas.
Em relação à questão 9, sobre os pontos positivos observados pelos professores no ensino da matemática no modo remoto, o professor P03 destaca a possibilidade de o aluno estudar em seu próprio tempo e assistir a mesma aula várias vezes:
(1) P03: Atingir alunos que têm tempos diferentes. Por exemplo, tem alunos que assistem aos vídeos mais de uma vez, voltam, anotam, o que não seria viável no presencial.
Os docentes também apontaram o aprendizado que tiveram em se tratando de ferramentas tecnológicas e por poderem verificar quão útil são para serem trabalhadas em sala de aula:
(2) P05: Temos de ver que as novas tecnologias precisam ser apreendidas e trabalhadas com mais frequência em sala de aula, uma vez que nossos alunos já conhecem bastante.
(3) P08: Aprendi novas tecnologias e formas de ensinar.
(4) P13: Aprendizado sobre uso de algumas ferramentas.
Por fim, P04 destaca a facilidade da utilização de provas on-line que podem ser corrigidas automaticamente e P07 salienta a satisfação em poder conhecer e fazer uso de jogos e aplicativos que nunca havia utilizado antes em sala de aula:
(5) P04: Provas on LINE é vida!!! Correção automática.
(6) P07: Poder usar tantos jogos e aplicativos que antes nunca havia usado.
Entretanto, quando indagados na questão 10 sobre o formato preferido para lecionar aulas, 83,3% preferiram o modo presencial e 16,7% o modo remoto. Este resultado é um indicativo que mostra que ocorreram dificuldades por estes docentes ao se verem obrigados a adotarem o modo remoto e terem que fazer o uso de tecnologias durante o período de pandemia da Covid-19.
Resultados e discussão
Tendo em vista essa caracterização e como os professores apontam sobre a formação que tiveram no uso de tecnologias ao ensino remoto, propusemos analisar as suas dificuldades, de modo que emergiram quatro categorias de dificuldades a posteriori, a saber: a) Dificuldades em habilidades para o uso de tecnologias; b) Dificuldades de infraestrutura para o ensino remoto; c) Dificuldades relacionadas aos alunos; d) Dificuldades relacionadas aos professores.
Dificuldades em habilidades para o uso de tecnologias
Nesta categoria, os docentes expuseram suas vivências em relação as suas habilidades para trabalhar com as tecnologias durante o ensino remoto. O quadro 2 a seguir enfatiza as principais falas.
Subcategoria | Falas dos professores |
---|---|
Sem dificuldades em habilidades | P07 - Boa, mas preciso de mais formação. Tenho falta de conhecimento de utilização do Classroom. P10 - Habilidades básicas, adquiridas ao longo da profissão e aperfeiçoadas por iniciativa própria. |
Com dificuldades em habilidades | P02 - Precária. P05 - Precisei aprender muita coisa de forma repentina, foi difícil. P12 - [...] ter que aprender a mexer nas plataformas digitais para mim foi muito difícil. P18 - Eu considero muito difícil. Ainda não consegui me entender muito bem. |
Fonte: Elaborador pelos autores
No Quadro 2, encontramos os docentes P07 e P10 considerando terem habilidades básicas e boas para o uso de tecnologias. Entretanto, P07 alega precisar de mais formação sobretudo pela “falta de conhecimento de utilização do Classroom”, enquanto P10 fala que suas habilidades foram “aperfeiçoadas por iniciativa própria”. Por outro lado, é possível verificar as dificuldades enfrentadas pelos professores P02, P05, P12 e P18 alegando precariedade de suas habilidades em relação ao uso de tecnologias e reclamando do pouco tempo para terem que aprender como usar ferramentas e plataformas digitais que foram adotadas no ensino remoto durante o período pandêmico. Corroborando com tal ideia, Irfan et al. (2020) em seu estudo também verificaram dificuldades de habilidades dos docentes relativas ao uso de tecnologias, sobretudo em plataformas on-line, fato que limitava as aulas destes professores a apresentação de materiais usando PowerPoint e leitura de textos.
Esse panorama vem de encontro a pesquisa de Sturion et al. (2018, p. 16) que levantaram a “falta de conhecimento de muitos professores em trabalhar com as tecnologias mediáticas e recursos digitais”. Tal fato, para Santos, Pessanha e Silva (2016), diz respeito à necessidade de melhoria na formação dos professores para o uso destas tecnologias garantindo assim um ambiente escolar em que a prática docente favoreça uma aprendizagem significativa dos estudantes de modo a elevar sua escolaridade.
Dificuldades de infraestrutura para o ensino remoto
As dificuldades de infraestrutura para o ensino remoto tiveram apontamentos em duas vertentes: a primeira relacionada ao acesso à internet e a segunda a respeito de softwares e equipamentos. O Quadro 3 abaixo nos mostra a dimensão de tais dificuldades na ótica dos professores:
Subcategoria | Falas dos professores |
---|---|
Acesso à internet | P02 - Os alunos não possuem internet para estudar, então estão com atividades sendo impressas. P10 - A internet oscila muito. P11 - [...] internet ruim. P14 - A falta de internet e recursos para os alunos. |
Com softwares e equipamentos | P03 - A acessibilidade de aplicativos e softwares que não podem ser usados na escola, devido à falta de estrutura. P05 - Ferramentas tecnológicas insuficientes, não atendem a real necessidade. P09 - As instituições públicas não fornecem equipamentos necessários às aulas online. P12 - [Fazer] Investimento pessoal em tecnologia (computador novo, internet melhor, fones de ouvido, cadeira confortável). P18 - Falta equipamentos. |
Fonte: Elaborado pelos autores
É possível verificarmos que P02 e P04 apontam a falta de acesso à internet para estudantes, ao mesmo tempo em que P10 e P11 mencionaram a falta de qualidade do sinal da internet que fazem uso. Da mesma forma, Sabaruddin, Marzuk e Khairunnisak (2020) também citam em seu trabalho dificuldades de alunos tais como para se obter rede de internet em áreas remotas e o alto custo para pagá-la, as quais dificultam o acompanhamento das aulas on-line. Sobre este contexto, Almanthari, Malina e Bruce (2020), ao se depararem com dificuldades semelhantes em seu estudo com alunos da Indonésia, sugeriram como alternativa o fornecimento de vouchers aos alunos para conexão de Internet.
Dentro deste panorama de dificuldades de infraestrutura, o professor P3 aponta para situações vivenciadas em que os aplicativos e softwares não podem ser usados por falta de estrutura da escola, apontamento esse corroborado pelas respostas de P09 e P18 que confirmam a falta de equipamentos nas instituições nas quais trabalham. Por fim, o docente P05 denuncia o fato de as ferramentas tecnológicas serem insuficientes e não atenderem as reais necessidades pedagógicas. Além disso, verifica-se que P12 destaca a necessidade de fazer investimentos pessoais para compra de equipamentos para uso diário no trabalho remoto.
Esse contexto referenda o estudo de Sturion et al. (2018), Cordeiro (2020), Moreira (2020) e Sabaruddin, Marzuk e Khairunnisak (2020) que também encontraram precariedades de acesso à internet, equipamentos, aplicativos e softwares observadas tanto por professores quanto por alunos, apontando assim a necessidade de políticas públicas para investimentos na infraestrutura tecnológica das escolas brasileiras.
Dificuldades relacionadas aos alunos
A categoria de dificuldades relacionadas aos alunos revelou duas angústias principais dos docentes, a saber: a) a falta de atendimento pedagógico presencial e b) falta de frequência aliada ao desinteresse dos estudantes no decorrer das aulas remotas. O quadro 4 nos mostra os relatos dos professores em relação a tais dificuldades.
Subcategoria | Fala dos professores |
---|---|
Falta de atendimento pedagógico presencial | P02 - Falta de contato com o aluno, presencialmente já é difícil, imagina a distância. P03 - Você ter o contato direto com o aluno e auxiliar de forma necessária. [...] Em ter acesso aos alunos. P06 - Dificuldade no acompanhamento do desenvolvimento das atividades por parte dos alunos e a impossibilidade de orientá-los melhor durante o processo. P09 - De forma remota, não há como saber se os alunos estão entendendo o conteúdo, falta atividade em grupo, falta interação. P11 - Falta de assistência individual. P14 - [...] a perda do vínculo. |
Pouca frequência e desinteresse dos alunos | P01 - [Falta de] Participação dos alunos, pouco acesso P08 - [...] Ainda continua a questão de despertar o interesse dos alunos para com as aulas. P09 - Poucos alunos participando. P12 - Falta de interesse dos alunos. P16 - Falta de atenção dos alunos. [...] Elaborar atividades que consigam atender as necessidades de aprendizagem dos alunos mesmo porque a maioria ignora as mesmas. P17 - A realização das atividades são feitas sem conhecimentos científicos estudados, simplesmente para responder a chamada, pouco esforço realizado. |
Fonte: Elaborado pelos autores
É importante frisarmos o momento de apreensão vivido pelos docentes em relação à falta do atendimento presencial, resumido na resposta de P09 - “não há como saber se os alunos estão entendendo o conteúdo, falta atividade em grupo, falta interação”. Contexto similar é visto por Cao et al. (2021) ao apontarem em seu trabalho sobre o ensino remoto na China durante a pandemia, no qual descrevem problemas de interação professor-aluno e incapacidade de monitorar a participação dos alunos durante as aulas. No quadro 4 acima, constatamos que os professores P1, P08, P09, P12, P16 e P17 salientaram a falta de participação e desinteresse dos discentes durante as aulas na modalidade de ensino remoto no Estado do Paraná.
Sobre este quadro de desinteresse, Wijaya (2021, p. 12, tradução nossa), ao pesquisar sobre as dificuldades apontadas pelos pais de estudantes chineses relativas ao ensino remoto, verificou que estes pais “precisavam dar total atenção a seus filhos quando assistiam as videoaulas. Pois havia momentos em que os alunos terminavam de assistir a videoaula e tomavam o notebook ou o celular para jogar”. Buscando contornar essa situação, Daniel (2020) aponta que segundo pesquisadores, o tempo ideal de uma videoaula deveria se estender de 5 a 10 minutos, para que os alunos não achem o vídeo “chato” e tenham interesse em ver as próximas videoaulas, evitando assim o quadro de desânimo e abandono das aulas remotas.
Em nosso estudo, esse cenário de dificuldades no ensino remoto foi apontado pelos professores, revelando o mesmo motivo: a baixa frequência dos estudantes nas aulas via Google Meet implementadas pela SEED-PR a partir do mês de outubro de 2020. Essa baixa frequência de presença dos alunos nas aulas remotas também foi identificada no estudo de Proença, Mendes e Oliveira (2021), segundo a visão de licenciandos em matemática que realizaram o estágio curricular supervisionado por meio do ensino remoto em uma escola sob a jurisdição da SEED-PR.
As dificuldades elencadas também foram identificadas no trabalho de Anjos (2020) que verificou a diminuição da interação entre professores e alunos, o que causou dificuldades no processo de ensino e aprendizagem. Mendes, Luz e Pereira (2021), ao pesquisarem as dificuldades elencadas por alunos do Ensino Médio, apontaram insatisfação dos discentes pela falta de esclarecimento de dúvidas e a impossibilidade de comunicação rápida com o professor por causa do ensino remoto.
Tais percalços, desinteresse, baixa frequência e a falta engajamento dos estudantes também foram observados no trabalho de Flores e Lima (2021). O que torna todo este contexto ainda mais preocupante é que Cury (2020) em seu estudo indicou que os docentes não se sentiam preparados para contornar esses impedimentos encontrados e, de certa maneira, não vislumbravam alternativas para reverter tais situações dificultosas vivenciadas por eles durante as aulas remotas.
Dificuldades relacionadas aos professores
Por fim, a categoria de dificuldades relacionadas aos professores apontou para dificuldades de adaptação ao ensino remoto e para o aumento da carga laboral dos professores. O Quadro 5 a seguir nos traz luz para esse contexto vivenciado.
Subcategorias | Fala dos Professores |
---|---|
Adaptação ao trabalho remoto | P04 - Adaptação. P10 - Adaptar, a resolução de problemas, como equação e geometria, no programa do google ou Power point. P11 - Falta de se expressar, sanei esta dificuldade com uma mesa digitalizadora showwwww! P14 - Ter que aprender a usar as tecnologias. P18 - Eu sinto dificuldade em avaliar meu aluno. Acho que o contato pessoal nos mostra se o aluno entendeu ou não o conteúdo. [...] Dificuldade em explicar um conteúdo, sem estar fazendo e mostrando a ele o passo a passo. Por mais que eu fale e mostre um exercício resolvido, tenho a impressão que ele não entendeu. |
Aumento da carga laboral | P08 - [...] precisamos aprender a nos organizar e a trabalhar dessa forma e é muito mais difícil e trabalhosa. P09 - Sobrecarga de trabalho em relação ao ensino presencial. P11 - [...] trabalho triplicado (ex. Preparar aula de vídeo, slides, atividades impressas, entre outros). P15 - Tempo dedicação muito maior para o professor. P17 - Tem gerado muita demanda de trabalho. Temos quer fazer o resgate de aluno que não possui recursos suficientes para realizar as atividades online ou mesmo interesse por parte do mesmo para concretizar as atividades. |
Fonte: Elaborado pelos autores
Verificamos que os professores deram ênfase às dificuldades para se adaptarem aos processos pedagógicos de ensino aprendizagem que envolviam a nova realidade do ensino remoto. Em relação ao ensino da Matemática, tais adaptações envolveram as dificuldades para trabalhar a resolução de problemas e a geometria apontadas por P10; a dificuldade de se expressar matematicamente, que foi resolvida por P11 com o uso de uma mesa digital; em aprender as tecnologias conforme salienta P15; e para avaliar os alunos em demanda, apontada por P18. Em se tratando do aumento da carga de trabalho laboral, muitos professores apontaram a necessidade de mais tempo para o preparo de suas aulas e o atendimento pedagógico de alunos por diferentes motivos.
Sobre este panorama, voltamos aqui ao pensamento de Oliveira et al. (2012) que nos abrem os olhos que o trabalho do professor não está apenas no ato de ensinar, mas numa série de fatores que não dependem só dele, haja vista a necessidade do preparo de aulas, atendimento a pais e alunos, burocracias escolares etc. Deste modo, o Quadro 5 mostra dois fatos relevantes observados pelos docentes pesquisados e que estão relacionados ao inesperado advento do ensino remoto causado pela pandemia do coronavírus:
a) a necessidade de adaptação ao trabalho remoto: fato este já evidenciado por Cao et al. (2021) e por Vasconcelos e Araújo (2020). Estes últimos, enfatizam que é “Importante também considerar que alguns profissionais da educação estão buscando, neste momento, reinventar sua prática, aprendendo novas estratégias que, certamente, irão contribuir de forma efetiva quando do retorno às atividades presenciais” (VASCONCELOS; ARAÚJO, 2020, p. 07).
b) o aumento de carga laboral: esta dificuldade foi muito mencionada pelos professores e, do mesmo modo, Vasconcelos e Araújo (2020, p. 07) complementam sobre esse apontamento: “Vale ressaltar que a carga horária, muitas vezes, tem sido extrapolada em relação ao tempo de atuação em sala de aula, causando um estresse e sobrecarga ao trabalho docente, que pode comprometer o desempenho deste profissional”.
Os dois fatos supracitados nos levam a questionar se os docentes estão tendo uma qualidade de ensino satisfatória em suas aulas, haja vista o pouco tempo para adaptação somado ao aumento da carga horária de trabalho, o que torna o trabalho pedagógico do professor exaustivo, bem como dificulta o sucesso da abordagem metodológica de sua aula, que agora ocorre de maneira virtual.
Considerações finais
Este trabalho buscou analisar e evidenciar as dificuldades encontradas por professores de matemática ao exercerem o ensino remoto, durante a pandemia de COVID-19. Os 18 professores participantes da pesquisa responderam a um questionário on-line sobre esse ensino.
Por meio das quatro categorias de dificuldades que emergiram, verificamos a falta de estrutura escolar pela falta de acesso à internet e substancializadas com insuficiência de equipamentos e aplicativos para serem utilizados no ensino remoto, afetando estudantes e professores.
No que se refere ao professor, constatamos a falta de habilidades no uso de tecnologias, a necessidade de adaptação e o aumento da carga de trabalho que, consequentemente, coloca em situação duvidosa a promoção da qualidade do processo de ensino e aprendizagem em sala de aula, que em curto espaço de tempo tornou-se virtual. Além disso, isso também acabou por refletir nos alunos, uma vez que os docentes apontaram que a aula remota dificultou o atendimento pedagógico aos alunos, num processo que culminou ainda com a baixa frequência e o desinteresse desses estudantes pelas aulas via Google Meet implementadas a partir de outubro de 2020.
Diante desses resultados, nosso estudo contribui ao evidenciar a necessidade de formação de professores para o uso de tecnologias não apenas devido a este contexto de ensino remoto, mas ainda porque de alguma forma revelamos que é urgente que os professores aprendam a utilizar a tecnologia. Esse fato se sustenta porque mostramos que 83,3% dos professores pesquisados preferem o ensino presencial e também porque o estudo de Mendes, Luz e Pereira (2021) apontou que 94,4% dos estudantes de Ensino Médio também preferiram o ensino presencial.
Portanto, entendemos que é necessária a realização de pesquisas que ofertem uma formação aos professores em tecnologias ao ensino, ou seja, são necessárias “ações públicas orientadas ao fomento do letramento digital de professores a partir da formação de professores, conduzindo ao redimensionamento da epistemologia subjacente às práticas docentes frente às tecnologias digitais” (FLORES; LIMA, 2021, p. 109).
Dentro deste cenário, os professores de matemática devem receber mais apoio pedagógico para o ensino remoto. Tal suporte deve permitir a inclusão do conhecimento sobre o modo de uso de ferramentas tecnológicas, sobre como fazer a integração de tecnologias com práticas de ensino e como lidar com quaisquer problemas potenciais que surjam inesperadamente no andamento da aula remota (CAO et al., 2021, p. 10, tradução nossa).
Deste modo, vemos que o período da pandemia trouxe para a educação um cenário digital em que podemos vislumbrar oportunidades de construção pedagógica e institucional e, além disso, para que possamos refletir sobre o que pode ser aproveitado para o legado pós-pandêmico. Para que isso ocorra, o apoio pedagógico, o investimento em formação inicial e continuada e na infraestrutura das instituições de ensino públicas são prioridades fundamentais.