Introdução
Este trabalho pretende analisar um conjunto de atividades realizadas em uma disciplina eletiva, oferecida para uma Escola Estadual de Tempo Integral do Estado de São Paulo, localizada na cidade de Campinas. Esta disciplina teve como objetivo trabalhar o discurso do determinismo biológico na construção da compreensão de “ser humano” por parte dos estudantes.
A disciplina foi elaborada a partir da proposta de inserir o debate científico acerca de quem é o ser humano, a partir de contos de ficção científica. A proposta inicial era trabalhar com “Frankenstein ou o Prometeu Moderno”, de Mary Shelley e “2380 d.C.: O Homo sapiens é declarado extinto”, de Bruce Sterling. Devido à pandemia da Covid-19, a disciplina, que seria presencial, aconteceu no formato de aulas virtuais, assíncronas. Tal modelo não proporcionou o aprofundamento que se gostaria no conteúdo e nas relações da ficção e do conhecimento científico. Todavia, indicou a sua necessidade, enquanto ferramenta de acesso às informações científicas contemporâneas, as quais serão analisadas aqui.
Assim, este artigo se propõe a debater a definição de seres humanos, por estudantes de Ensino Médio de uma Escola Estadual de Tempo Integral, do município de Campinas, a partir de atividades desenvolvidas na disciplina Eu, humano? Ciência e Ficção, realizada no ano de 2020. Também foi debatida, a partir das atividades dos estudantes, a necessidade de inserção, no espaço escolar, de conhecimentos científicos articulados, não apenas à compreensão das tecnologias científicas, como a genética e a engenharia genética, mas também de um conhecimento que crie condições para um debate acerca do que estes conhecimentos significam e como eles podem ter efeitos na vida destes jovens.
Seres humanos: corpos e sujeitos inscritos em histórias
Em conjunto com as duas professoras, decidiu-se nomear a disciplina como “Eu, humano? Ciência e Ficção Científica”. A primeira parte do título fazendo referência aos estudos sobre a formação das subjetividades de diversas formas, culturalmente, biologicamente, e suas relações; a segunda, indicando que os temas de ciência e ficção científica seriam os fios condutores, além de, claro, chamar atenção e interesse dos alunos para participar da proposta, uma vez que a escolha vinha deles próprios, por participar, ou não, da eletiva.
A partir destas relações com o título, também se apontou a compreensão de corpo e ser humano, neste entrelaçamento biocultural. Nós temos e somos um corpo, que não se delimita ou define por nosso genoma, anatomia e fisiologias. Isto é, nossa materialidade biológica, tal como afirma Lewontin (2000, 2002), não é passível de construir um ser humano, ao ser transcrita. O ser humano, desta forma, é constituído por suas relações em uma sociedade. Foucault (2002a, p.22) também argumentará, neste sentido, que o corpo é “superfície de inscrição dos acontecimentos”. Assim, para compreendermos a constituição dos sujeitos, é preciso negar as essências, o genoma como determinação, nosso a priori narrado, transcrito e imposto à compreensão da espécie e do indivíduo. Pensar a constituição dos sujeitos é olhar para suas histórias, as relações de poder e resistência, inscritas em seus corpos (FOUCAULT, 2002a, 2002b).
As noções de seres humanos que se buscaram trabalhar, nesta disciplina eletiva, tratavam de seres humanos como constituídos nas relações sociais, perpassadas pela técnica e pela ciência, em narrativas ficcionais de clones e manipulações gênicas, em que se buscam aprimoramentos e upgrades para nossas características limitadas e ultrapassadas, buscando elementos nesta ciência que emerge como possibilidade futura e com seus debates éticos acerca dos usos destas tecnologias para uma construção de novos humanos, deixando sua materialidade para trás, para tornarem-se outra espécie. Tendo esta compreensão sobre corpo
e definições de sujeito e seres humanos, articulado aos espaços limítrofes em que a ficção científica possibilita abrir diálogos sobre quem somos e queremos ser, que o trabalho na disciplina eletiva Eu, humano? Ciência e Ficção Científica foi produzido.
A disciplina teve um encontro presencial e logo foi interrompida, em função da pandemia e o consequente cancelamento das aulas. Quando os trabalhos das disciplinas eletivas retornaram no modelo on-line, percebeu-se que o primeiro planejamento não teria condições de ser aplicado. Foi idealizada a escrita de contos ficcionais com os estudantes e isto demandaria muita atenção para cada um deles, o que se torna inviável dentro dos moldes existentes, sem a interação de sala de aula e com pouco acesso cotidiano às ferramentas virtuais disponíveis. Então, decidiu-se pela criação de atividades que seriam postadas semanalmente no Google Classroom, em um modelo de atividades assíncronas. Ao propor as atividades neste formato, era sabido que haveria o risco da baixa adesão. No entanto, dentre todas as opções que se faziam disponíveis, este foi o modelo organizado junto com a escola que pareceu ter maiores condições de dar seguimento para a disciplina.
A atividade que se decidiu analisar, neste trabalho, foi a primeira atividade avaliativa nesta “nova proposta” on-line. Elaborou-se para a disciplina um conto interativo, baseado no universo trazido por Bruce Sterling, no seu conto “2380 d.C.: O Homo sapiens é declarado extinto”.
Antes de abordar as atividades desenvolvidas, será apresentada uma breve biografia de Bruce Sterling e suas ideias sobre o subgênero cyberpunk, um panorama sobre o texto utilizado como pano de fundo do conto interativo e que ideias sobre o ser humano se desenham. Posteriormente, serão expostas as atividades do conto interativo, que foi baseado no conto “2380 d.C.: Homo sapiens é declarado extinto” e as respostas dadas pelos alunos, assim como as análises e inquietações que delas emergiram, tanto para compreender as concepções de ser humano construídas pelos estudantes ao serem estimulados pela obra de ficção científica em particular, quanto da necessidade de atividades como essa para se pensar o acesso ao conhecimento científico contemporâneo.
Bruce Sterling e o Cyberpunk
Michael Bruce Sterling é um escritor estadunidense nascido em abril de 1954, em Brownsville, Texas. Em 1976, formou-se em jornalismo na Universidade do Texas, em Austin, mesmo ano em que publicou sua primeira história “Man-Made Self” na antologia “Lone Star Universe: The First Anthology of Texas Science Fiction” (Wikipedia, 2021). Seu primeiro romance se chama Involution Ocean (1977) e narra a história de um viciado em drogas que sai em busca da substância próximo de sua fonte, as baleias. Em 1985, publicou o romance Schismatrix, primeira obra do universo compartilhado Shaper/Mechanist, que seria retomado em Schismatrix Plus, em 1996, adicionando uma coletânea de cinco contos na mesma linha do tempo. As histórias se passam em uma sociedade pós-humana, espalhada pelo sistema solar e fragmentada em duas facções concorrentes. Os Shapers que manipulam o corpo humano genética e psicologicamente, dando ênfase em linhagens genéticas perfeitas. Já os Mechanists se utilizam do aumento cibernético, avanços da computação, conhecimento técnico e drogas para atingir seus objetivos. Observa-se o interesse do autor por enredos que envolvam os limites da humanidade e suas possíveis alterações, em diferentes níveis.
Um de seus trabalhos de maior destaque foi a edição da coleção de contos Mirrorshades: The Cyberpunk Anthology de 1986, que se tornou, segundo Amaral (2004), uma espécie de manifesto cyberpunk. Sterling (1988) define o cyberpunk como a sobreposição entre espaços que foram formalmente separados; a integração entre a tecnologia e a contracultura dos anos 1980. “Uma aliança profana entre o mundo técnico e do mundo da dissidência organizada - o mundo underground da cultura pop, fluidez visionária e anarquia de rua”.
O autor ainda aponta temas centrais que aparecem repetidamente nas obras cyberpunk: membros protéticos, circuitos implantados, cirurgia estética, alteração genética, interfaces cérebro-computador, inteligência artificial, técnicas neuroquímicas que redefinem radicalmente a natureza da humanidade, da natureza do eu.
2380 d.C.: Homo sapiens é declarado extinto
Em 1999, “2380 d.C.: Homo sapiens é declarado extinto” foi publicado na revista científica Nature, na coluna Futures. A sessão é aberta para escritores conceituados ou iniciantes enviarem textos curtos (entre 850 e 950 palavras) em que, tipicamente, o assunto é futuro próximo e ficção científica hard1. No Brasil, a obra chegou à coleção de contos “Histórias de ficção científica”, de Para Gostar de Ler, de 2006, versão utilizada com os alunos no presente trabalho.
O conto é apresentado como uma reportagem de um futuro não tão distante, em que o resultado de uma pesquisa realizada por toda extensão terrestre conclui: “não há mais seres humanos”. Apesar de ainda ser possível encontrar tecido humano em laboratório para clonar quantas espécimes de Homo sapiens forem necessárias, a espécie se destacava pela produção cultural única. Outro estudo revelou não haver “nenhum cidadão vivendo com menos do que 35 por cento de encéfalo gel cultivado”.
Na história, um estatístico declara:
- Não vejo como você possa considerar qualquer ‘entidade’ humana, quando o cérebro dela é uma estrutura gelatinosa e cada célula de seu corpo contém uma grande quantidade de cadeias extras de DNA de nível industrial. Não apenas a humanidade está extinta, mas, falando estritamente, quase todas as pessoas vivas hoje deveriam ser classificadas como uma espécie singular, pós-natural e única no gênero (STERLING, 2006).
O texto termina de forma humorada, anunciando um “Dia Circunsolar de Luto” marcando a extinção do Homo sapiens, porém, existe o temor de que as tradições fúnebres sejam interrompidas por ondas de entusiasmo público.
O autor brinca com a ideia de extinção da espécie humana e os limites do que nos define como tal. Existe uma fronteira de intervenções que exclui um indivíduo do pertencimento a esse grupo? Que tipo de mudanças são capazes disso? Modificações genéticas? O cultivo das próprias células neuronais e substituição pelo “encéfalo-gel”? O que, afinal, define quem são os humanos? Sua produção cultural única ou suas características biológicas?
São estes questionamentos tão importantes que a ficção científica, em especial o cyberpunk, conseguem levantar. O subgênero é, como define Sterling (1988), a “placa de Petri cultural em que linhas genéticas se unem” e permite um meio rico para procriação de concepções sobre as subjetividades e a união de temas, que parecem distantes quando tratados nas perspectivas da biologia ou sociologia separadamente.
O estudo ficcional de Sterling parece chegar a uma conclusão. Neste futuro já não existem mais humanos, cada indivíduo se tornou tão distante do considerado “normal” para seres humanos naturais, que se modificou em uma espécie singular.
Desta forma, nas atividades propostas, levantou-se o questionamento: como os alunos trabalhariam e articulariam suas concepções sobre o sujeito, quando estimulados pela obra? É com esta pergunta que se elaborou o conto interativo, em que o texto de Sterling foi utilizado como pano de fundo para uma história construída em que os alunos se colocam no lugar de personagens, que viajam para o futuro e se deparam com o fim da humanidade. Os alunos foram instruídos a ler o conto que inspira a atividade, no início das aulas virtuais.
As inexistências de um ser humano “puro”
No conto aqui reorganizado, os alunos tornaram-se personagens e deviam escolher algumas trajetórias e criar elementos do conto. A personagem do conto interativo era um adolescente mandado em uma missão de reconhecimento para o futuro e lá encontrava uma realidade em que já não existem mais seres humanos. Esta extinção não foi causada pela dizimação da humanidade, mas sim, pela implementação de partes artificiais aos corpos, a ponto de não mais existirem humanos “puros”. O conto foi apresentado para os alunos do formato de slides (Figura 01) e se dividiu em três capítulos, que foram liberados com intervalos de, pelo menos, uma semana, sendo que, em cada parte, os estudantes tinham uma atividade para ser respondida. Estas atividades eram integradas com a história que estava sendo contada e inseria os alunos como personagens da história, podendo tomar suas próprias decisões e participar da escrita deste conto.
No primeiro capítulo do conto, a personagem faz sua viagem no tempo e vai parar no ano 2.380 d.C.. Ao chegar no futuro, enquanto caminha pela rua, um jornal voa e atinge seu rosto. Ao pegá-lo e ler o título, fica sabendo sobre a extinção dos seres humanos.
Após isso, a personagem entra em uma loja de clonagem e biotecnologia e, ao dar o primeiro passo para dentro da loja, é sorteada para ganhar um clone grátis. Neste ponto, para conseguir o brinde, os alunos teriam que solucionar a um formulário2. Eles são, então, instruídos a responder perguntas sobre esse possível clone: se consideram, ou não, o clone um ser humano; o que poderia fazê-lo ser igual ou diferente do original; e se eles gostariam de fazer alguma modificação genética nesta nova forma de vida.
No segundo capítulo, a personagem é guiada para um museu, que conta a história da humanidade. Lá, encontra um holograma do naturalista Charles Darwin e tem uma conversa com ele. Nesta etapa, foi utilizado o site chat-forms.com que transforma formulários em um bot, simulando um diálogo. A representação do cientista, ao perceber que estava falando com o último humano “puro” deste tempo, faz perguntas sobre as novas possibilidades de modificações que as tecnologias futuristas trazem. Neste caso, os estudantes teriam essa possibilidade através da personagem e deviam apontar se fariam, ou não, modificações fisiológicas e anatômicas, além de justificar suas opções.
Por fim, no último capítulo, o holograma de Darwin chama um de seus superiores, que parecem interessados na pessoa do passado, para ter uma conversa. O superior faz, então, um discurso sobre como a sociedade está dividida, quanto à continuidade do uso das tecnologias de modificação corporal e cerebral, e pede à personagem uma opinião, pois está interessado na visão de alguém de fora da vivência que eles têm no futuro. Esta foi a atividade final do conto interativo e deveria ser feita em forma de testemunho, em um vídeo de até 5 minutos, se posicionando contra ou a favor destas modificações.
É importante ressaltar que algumas atividades tiveram mais adesão que outras, em função de toda a dificuldade imposta pela pandemia, para execução de atividades, tanto quanto de acompanhamento destes estudantes de forma mais efetiva. Para este artigo, foi analisada apenas a atividade 1.
Nos momentos de interação, foram propostas atividades em que os estudantes participaram da construção do conto, sendo o preenchimento de um formulário para um serviço de clonagem; a conversa com um holograma de Charles Darwin; e a gravação de um vídeo que conferia o posicionamento individual do aluno sobre o uso do encéfalo-gel.
Clones: humanos ou robôs?
O primeiro capítulo da história se inicia com a personagem sendo acordada por uma mensagem de um cientista, que conheceu e jurou que a levaria para o futuro. Curiosa e desconfiada, decide ir ao laboratório para descobrir. Chegando lá, para a grande surpresa da protagonista, a máquina funciona e ela é mandada para o ano 2380 d.C. Antes que o herói consiga ver este novo tempo que o cerca, um jornal voa e atinge seu rosto. Este jornal é o conto de Bruce Sterling e os alunos são instruídos a ler o texto que fala sobre a extinção dos seres humanos. Esta foi denominada Atividade 01.
Quando a personagem se recupera do susto de se ver como única humana daquele ambiente, sua atenção é captada por um letreiro de uma fachada de loja, do outro lado da rua, que diz: “Planarium: clonagem e biotecnologia”. Ao entrar na loja, um alarme dispara e o robô que está no balcão se vira e anuncia: “Parabéns! Você é o cliente de número 999.999 e acaba de ganhar uma clonagem totalmente grátis”. Para que o brinde seja feito, o protagonista deve preencher um formulário entregue pela máquina. Este questionário encerra o primeiro capítulo do conto interativo.
O questionário (Figura 02) apresentado conta com as seguintes questões:
Nome completo.
Qual será o nome do seu clone?
O que poderia fazer este clone parecer com você? O que poderia fazer este clone diferente de você?
Você considera este clone humano? (Sim, não ou outro)
Quais situações, acontecimentos, características, etc. justificam sua opinião acima?
O pacote Ω 233.4 conta também com o serviço de edição de DNA-CRISPR. Existe alguma característica sua que você gostaria de MUDAR no clone? Se sim, o quê?
No total, onze alunos responderam a esta atividade. Os clones receberam os nomes mais criativos: Super Fabão, Tokki, Francyelen, Joelma e até Lavoisier. Curiosamente, três alunas decidiram chamar suas cópias genéticas por nomes tradicionalmente masculinos: Talita chamou de Roberto Araujo; Ursula, de Josh; e Daiane, de Robertinho Cabral. Na experiência em sala de aula, observou-se que os alunos tendem a uma visão muito mais fluida sobre o entendimento de questões de gênero do que gerações anteriores. Este pode ser um indicativo de noções de gênero, para estes adolescentes, vão além da simples determinação genética XX ou XY, noções que não foram trabalhadas nesta disciplina eletiva. Porém, conforme será explanado mais adiante, também podem indicar uma compreensão não muito clara do que seria um clone.
Talvez por ter uma formulação um pouco mais ampla, as questões seguintes (O que poderia fazer este clone parecer/diferente de você?) tiveram respostas um pouco confusas. De modo geral, as respostas foram categorizadas, conforme descrito abaixo, a partir das respostas dos estudantes, ao se referirem aos clones, em relação ao ser humano “original”:
Características físicas e comportamentais se assemelham e se diferenciam dos clones - Nesta categoria, foi apontada a divergência, isto é, como o clone se assemelharia completamente ou se diferenciaria completamente;
Características físicas se assemelham e comportamentais se diferenciam - nesta categoria, os estudantes se aproximaram mais da compreensão de que o clone é uma cópia do genoma e a personalidade não entra nesta lógica da cópia;
Características físicas se diferenciam e características comportamentais se assemelham;
Características comportamentais se assemelham e se diferenciam e há pouca ou nenhuma menção às características físicas.
Podemos ver algumas respostas dos estudantes indicadas no Quadro 01 3.
Na segunda parte da atividade, os estudantes deveriam responder se consideravam o clone como humano (resposta de múltipla escolha) e justificar as respostas. No quadro abaixo, mostram-se as respostas dos estudantes:
É interessante observar - talvez também fruto de uma atividade sem possibilidade de estabelecer um diálogo, com dúvidas e análise do conto em si - que alguns alunos apontaram a diferença do clone como o modo que ele deveria ser construído, como na resposta de Talita “Ser mais inteligente, porém não muito. Para que as coisas não saiam do controle”. Articulada à próxima pergunta, em que ela indica que o clone não é um ser humano e afirma que ele não deveria saber a verdade sobre ser um clone.
Já outros estudantes, como Higor, ressalta que apesar das aparências físicas semelhantes, o modo de pensar e agir difere. E Ursula aponta a biologia (ter sido feito a partir de células) como o que liga este clone a poder ser considerado humano. Denis já aponta que a humanidade do clone está em sua capacidade cognitiva.
Entre aqueles que responderam não, há os que indicam, claramente, não compreender o conceito de clonagem, como Quirana e Paula que tomam um clone como robô e Aline, que idealiza uma gestação sem corpo, o que torna o clone algo não humano, parcialmente.
Os dois, dos três alunos que responderam “outro”, também destacam o “sim” pelas suas características físicas, Ursula destaca que o clone “foi criado a partir de células humanoides” e Aline aponta que “ela faria o que todos os outros seres humanos fazem, pois ela teria uma pele humana e cabelos reais e comeria o que comemos, mas como ela não saiu de uma barriga, não foi gerada, não pode ser considerada uma pessoa humana. Por isso, ela seria uma parte humana e outra, não humana”.
Por fim, na última pergunta do formulário, era oferecido aos alunos um brinde de edição DNA-CRISPR para seus respectivos clones. Com esta pergunta, esperava-se que os alunos apresentassem que características parecem viáveis a serem modificadas a partir e uma mudança no seu DNA. Quatro alunos não demonstraram interesse na utilização da técnica: Higor, Daiane, Quiana e Denis.
Dentre as pessoas que escolheram a técnica para modificar características corporais, Ursula, cujo clone se chama Josh, diz que gostaria de mudar “a cor de seus cabelos para preto” e Talita diz que seu clone, Roberto Araujo, teria a “a aparência diferente da minha, afinal seria um homem”.
Mas também houve alunas que decidiram modificar, via tecnologia CRISPR, características comportamentais. Assim, Maria gostaria que seu clone tivesse como modificação “A submissão para com algumas vontades de pessoas e algumas características físicas”, Aline gostaria que seu clone Sophia fosse “mais extrovertida, menos indecisa e distraída”, Laura apontou que gostaria que o clone Layla “fosse mais calma” que ela que é “muito agitada”, Sabrina pede que Tokki tenha mais paciência. Por fim, Paula quer mudar a “Desconfiança e brava”.
Neste item, destaca-se que as respostas vinculadas à personalidade indicam traços que estas meninas não apreciam em si e foram, de alguma maneira, indicadas em respostas anteriores. Assim, Maria, que narrou como parecença deste clone suas características, como “jeito calmo, controlado”, gostaria, com a mudança do DNA-CRISPR, de um clone menos submisso com a vontade de pessoas. Enquanto Aline, que aponta como algo que seu clone Sophia não parece com ela “saber cantar e dançar”, gostaria de inserir uma mudança com esta técnica para tornar o clone “mais extrovertida”. As demais quatro alunas pedem modificações em características relacionadas à personalidade, como Aline, desejando que seu clone seja “mais extrovertida, menos indecisa e distraída”. Paula é a aluna que escreveu o texto mais longo sobre as semelhanças de seu clone, Amellia, que além de desconfiada, é amigável e acredita nas pessoas.
As tecnociências no meio acadêmico e na ficção científica
É interessante pensar o quanto se tem falado, dentro da academia e da ciência, sobre as relações entre a tecnologia e a produção de corpos. Desde compreensões acerca da genética humana (PROCHAZKA e FRANCELIN, 2018, ZANG e CHEN, 2021); dos limites das interferências em reproduções assistidas (CORREA, 2001), bem como pesquisa com células-tronco humanas e, recentemente, do uso de tecnologia CRISPR-Cas9 (COSTA, BRITO e CASTRO, 2021) - inclusive, técnica que possibilitou às pesquisadoras o Prêmio Nobel -, há que se pensar de que forma estas técnicas afetam o que se compreende como ser humano, bem como o que desejamos para nossos corpos e, também, quem têm acesso a este tipo de tecnologia.
O debate sobre clonagem em si foi bastante intenso no final dos anos 1990, em função da divulgação da técnica com a Ovelha Dolly. No âmbito da ficção, a clonagem foi pauta da novela da Rede Globo, O Clone, em 2003.
Mas não é recente, dentro da ficção científica, a busca por compreensões de como manipular nascimentos e construções de seres humanos com diferentes tecnologias. O conto de Sterling, utilizado pela atividade, aborda noções de sujeito construído a partir de artefatos, deixando de ser considerados humanos, data de 1999. Nas telas do cinema, o filme Matrix, também de 1999, tratava da criação de seres humanos, a partir de tecnologias de clonagem e reprodução in vitro extra corporais.
Antes disso, o filme Blade Runner, de 1982, também abordou o significado de seres humanos, a partir de replicantes, que foram considerados nocivos e banidos da Terra. Alguns destes replicantes não se reconheciam como tais, por terem memórias implantadas artificialmente. E é esta condição (ter memórias) uma das que remete à existência como humanos, no filme. Na literatura, o clássico Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, tinha como base uma sociedade cuja procriação acontecia fora do corpo também. Inclusive, a ideia de maternidade e nascimento é um grande tabu na sociedade criada pelo autor. As castas mais “avançadas” possuíam individualidade, enquanto que as castas subalternas eram clones e faziam serviços considerados inferiores. No entanto, a partir de condicionamentos específicos, todos “aprendiam” a ser felizes com suas funções sociais, reguladas, cotidianamente, com doses de soma, a droga da felicidade.
Anterior a isto, impossível não mencionar Frankenstein, que também idealizava a construção de um ser humano. Neste caso, não a partir de um clone, mas pela junção de partes de corpos variados, costurados e que ganhavam vida pela eletricidade. O cientista que dá nome à obra, Victor Frankenstein, se assombra com sua criatura e foge. O indivíduo, então, é impelido a aprender sobre a vida, já adulto, dando significado aos acontecimentos e aprendendo a ser humano e tendo negada esta possibilidade, a partir das relações que vai estabelecendo ao longo da trama, enquanto busca compreender “o quê e quem ele é”.
Seja em histórias ficcionais, em livros e no cinema, seja em debates científicos que aparecem em notícias de jornais, revistas e televisão, as tecnologias que nos possibilitam pensar o corpo e, também, questionar o conceito de ser humano e sujeito, imersos em nossa sociedade contemporânea, parece sempre visível em um mundo tão tecnológico como o nosso.
Ao longo de nossa trajetória como pesquisadores, temos pensado nos limites do determinismo biológico, articulando com questões de Capital Humano (FOUCAULT, 2008; LOPEZ-RUIZ, 2008), tanto quanto sobre a bioeconomia aliada à molecularização da vida (ROSE, 2010; 2011). Tudo isto discutindo seu potencial de construção de seres humanos idealizados, que podem ser modificados, em vida, ou como devir em reproduções assistidas, apontam a necessidade de termos um amplo debate ético com a sociedade, sobre que técnicas queremos em nosso futuro, interferindo em nossos corpos, e como isto diz respeito ao que consideramos ser humano e de que forma temos conceituado-o. E em que isto se relaciona com as atividades realizadas com esses adolescentes?
Seres humanos na ciência, na ficção científica e no Ensino Médio: buscas por democratização do conhecimento científico e tecnológico
Mais do que analisar se suas percepções e respostas dos estudantes estão corretas ou não - e considerando a fragilidade imposta pela falta de aprofundamento em atividades que poderiam ser desenvolvidas presencialmente, com debates mais articulados - estas respostas nos apontaram outras questões que, também, parecem urgentes dentro de um panorama educacional, social e cultural.
Inicialmente, o quanto todo o debate da construção dos corpos, a partir da possibilidade de mudanças (com a tecnologia CRISPR na atividade) não se marcou por um corpo idealizado que poderia ser melhor ou mais bonito - referente a padrões estéticos em uma sociedade que valoriza tanto isto.
No decorrer da atividade, três alunas centraram suas intenções de mudanças em comportamentos que elas mencionaram sobre elas, que poderiam ser diferentes. E não são mudanças banais: “não submissão”, “ser extrovertida”, “ter paciência”, “ser desconfiada”, longe de referir-se a pedidos simples de comportamento. Aqui, mais do que analisar se são, ou não, biológicos, na compreensão destas meninas, nos questionamos, ao ler as respostas, sobre a condição de a escola se configurar como um espaço de fala e de escuta sobre as demandas dos estudantes. Tanto para que se possibilite que se fale, quanto para que se aprenda a acolher tais falas e trabalhá-las de forma saudável.
Em outra direção, as atividades desenvolvidas possibilitaram outro caminho de debate necessário. Ao ler as respostas da atividade aqui exposta, nos questionávamos acerca de que modo gostaríamos de construir uma sociedade que debate questões éticas dos usos da ciência e dos modos como a produção científica narra nossos corpos, definindo, delimitando, normatizando e normalizando-os, sem que consigamos debater sobre estes temas em espaços escolarizados, além de outros espaços culturais?
As respostas dos estudantes, adolescentes entre 14 e 17 anos, apontam para um afastamento entre este “universo” ficcional científico e do conhecimento científico e tecnológico “de ponta”, como costumeiramente chamamos. Em outros momentos, parecem afinados com a compreensão destas tecnologias e estabelecem relações com o conto original.
Assim, o ser humano, ora aparece como essa matriz biológica, orgânica e que define também nossa personalidade, ora as parecenças limitam-se a marcadores anatômicos, os clones têm pele e aparência física de humanos, ou não são humanos por não ter um nascimento gestado dentro de outro corpo. São tidos como humanos por ter raciocínio, ou são tidos como robotizados e sem condição cognitiva independente.
Enquanto observávamos as respostas, nos deparamos com um passo anterior, que também não é novo, mas se fez imperativo no andamento do trabalho (talvez, exatamente, por ter sido desenvolvido à distância e sem condições de diálogos): como o conhecimento científico produzido em meios formais de pesquisa e as noções culturais que circulam pela ficção científica são compreendidas por este público?
Nada do que diremos aqui é novo, estamos seguros disso. Todavia nos pareceu pertinente reiterar o que parece óbvio, dentro de um mundo em que o negacionismo científico se interpõe diariamente, o conhecimento parece estar à disposição de todos e a necessidade de pensarmos acerca da educação em ciências e seus propósitos se faz tão urgente (novamente).
As disciplinas eletivas, oferecidas nas Diretrizes do Programa de Ensino Integral (SÃO PAULO, 2012), objetivam, a partir da “democratização da educação, para uma escola universal de qualidade”, oferecer, portanto, “além de conteúdos acadêmicos, conteúdos socioculturais e a possibilidade de vivências direcionadas à qualidade de vida, ao exercício da convivência solidária, à leitura e interpretação do mundo em sua constante transformação”.
O modelo pedagógico de uma escola integral deve contar com “Currículo integralizado e diversificado, com matriz curricular flexível e as aulas e atividades complementares se desenvolverão com a participação e a presença contínua dos estudantes, professores e equipe gestora em todos os espaços e tempos da escola” (Idem, p. 13).
Elemento deste modelo, portanto, é a organização de uma fração do horário da escola com a chamada “Parte Diversificada”, o qual um dos componentes são as Disciplinas Eletivas. Estas devem levar em conta a interdisciplinaridade como “eixo metodológico para buscar a relação entre os temas explorados”, sendo capazes de propiciar “desenvolvimento das diferentes linguagens, plástica, verbal, matemática, gráfica e corporal, além de proporcionar a expressão e comunicação de ideias e a interpretação e a fruição de produções culturais”.
As disciplinas eletivas ocupam, dessa forma, um espaço “central no que tange à diversificação das experiências escolares, oferecendo um espaço privilegiado para a experimentação, a interdisciplinaridade e o aprofundamento dos estudos”. Para chegar nesses de disciplinas distintas, estando livres para escolher os temas abordados, “desde que se trate de um assunto relevante e que seja abordado de modo a aprofundar os conteúdos da Base Nacional Comum” (Idem, p. 29). No caso desta pesquisa, as professoras de Biologia e Sociologia que acompanharam a pesquisa, abriram espaço para que fosse feita e participaram da construção da proposta, ajudando a adequar os objetivos na realidade da escola.
Assim, em uma pesquisa que busca compreender discursos de determinismo biológico, a partir do uso de ficção científica em uma disciplina de Ensino Médio (e esta não foi a única atividade, mas sim a primeira e a que achamos que seria mais interessante para este artigo), nos chama a atenção a necessidade de termos espaços de aprendizagem de cultura e ciência de forma articulada, para além do ensinamento de resultados científicos prontos e acabados.
A nossa proposta com esta disciplina eletiva era, exatamente, articular estas questões, por intermédio de contos da ficção científica. Entremeados pelas dificuldades tecnológicas4 impostas pela pandemia, chegamos ao ponto dos resultados que são, simultaneamente, “óbvios”, mas denotam o constante distanciamento que segue sendo urgente no campo educacional e, também (ou principalmente), científico.
Tendo em vista nosso trabalho com o campo educacional, mas também no âmbito da divulgação científica, fomos compelidos a pensar, nestas atividades apresentadas, em um conceito da divulgação que consideramos relevante para este debate (e se encontra articulada na documentação das Diretrizes apresentadas acima): a democratização do acesso à informação científica.
No campo da divulgação científica, compreendia como um conjunto de estratégias de cientistas e comunicadores de tornar de domínio público o conhecimento científico (Carneiro, 2020, Bessa, 2015) debate-se o quanto a ideia de que “as informações estão no mundo”, em função das redes sociais, por exemplo, não reflete em uma democratização do acesso a esta informação. Isto não apenas no que tange às condições financeiras de termos os equipamentos necessários (como computadores, smartphones ou tablets) ou planos de serviços de acesso à internet, mas à democratização de acesso às condições de compreender a ciência, que tem sido debatida nas redes e diz respeito às nossas vidas de inúmeras maneiras.
E muito embora esta questão pareça ser ultrapassada, como um “eterno retorno”, voltamos às respostas de pensar clones como seres robotizados, ou que não são humanos por não nascerem de “dentro de um corpo”, tanto quanto clones que são descritos como possuindo todas as características de personalidade destes estudantes. Respostas como estas reforçam como aulas e encontros em que fossem discutidos temas como genética e técnicas de biologia molecular seriam de grande proveito, uma vez que permitiria aprofundar os pontos que foram levantados e investigar suas noções quando questionados sobre o DNA. A atividade levantou questões muito importantes envolvendo noções que os alunos trazem sobre o que torna uma criatura, ou não, humana e quais características podem ser alteradas por uma modificação de DNA.
Por outro lado, tais respostas reforçaram o quão distante está o conhecimento científico de seus cotidianos e das possibilidades de argumentação acerca de questões científicas, dentro de contextos culturais e sociais. Considerando que este conhecimento diz respeito não apenas à sua aplicação na sociedade, mas também à compreensão do que é ser humano e como ele é definido cientificamente, a partir de preceitos que são éticos, estéticos e normativos, não é trivial o distanciamento do debate científico e das vidas destes jovens.
Finalizando
Neste trabalho, apresenta-se uma parte da pesquisa sobre Ficção Científica e noções de sujeitos, em uma Escola Estadual de Tempo Integral de Ensino Médio, a partir de uma disciplina eletiva. Não se busca, com este artigo, invalidar conhecimentos científicos trabalhados nas escolas e, além disso, aponta-se a imensa dificuldade de aprofundamento da temática pretendida, em aulas assíncronas, em um contexto de pandemia e sem ter condições de implementar um estudo com mais tempo e dedicação, para aproveitamento de todos - estudantes, docentes e pesquisadores - para um diálogo mais profícuo.
Nesse sentido, os primeiros resultados relacionam-se, exatamente, com a necessidade de ampliar o debate interdisciplinar - social e biológico - de como se constitui o ser humano e as implicações de tais compreensões, a partir do desenvolvimento tecnológico e científico atual.
Aponta-se, também, que este debate não se restringe à escola, mas aos espaços de produção de conhecimento científico, a partir de ações de democratização do acesso ao conhecimento científico, com debates mais amplos com a sociedade, para diferentes públicos e em espaços sociais e culturais variados. Dessa maneira, tanto a escola precisa criar espaços de ensino-aprendizado diferenciados, mas também instituições científicas e grupos de pesquisa precisariam começar a ocupar mais os espaços sociais e culturais, debatendo, de forma mais acessível, sobre suas produções e de que forma estas se relacionam (ou podem se relacionar) com a sociedade. Tais iniciativas são fundamentais, pois podem abranger atividades que não se prendem aos formalismos de conteúdos que, muitas vezes, são difíceis de ser desenovelados dentro do cotidiano escolar.
Nossas inquietações, frente às atividades desenvolvidas na escola, mais do que respostas definitivas e resultados “seguros de aprendizagem” alcançados com estes jovens, apontaram mais sobre caminhos para pensarmos novas propostas, com o estabelecimento de diálogos para aprofundamentos maiores com estes estudantes.
Além disso, desenvolver esta pesquisa, tão perpassada pela tecnologia, mas tão distante das possibilidades de um diálogo presencial com os estudantes, pontuou inúmeros questionamentos acerca do paradoxo de se trabalhar a ficção científica - tão cheia de grandes potenciais no futuro - enquanto todos permaneciam presos em casa, mediados por telas, pensando sobre o ser humano atrelado à tecnologia.
Neste ponto, apesar do debate parecer se costurar em si mesmo - tecnologia sendo usada para falar de um futuro tecnológico -, foi visível que a sociedade da informação, como nos diz Larrosa (2002), se contrapõe à experiência e ao saber da experiência (e, em nosso caso, às condições de criar um espaço em que a experiência pudesse “passar por nós”, pesquisadores e estudantes).
Por fim, as propostas, tanto da disciplina eletiva, quanto das provocações e inquietações acerca das respostas dos estudantes, do uso da ficção científica e a necessidade de escolas e instituições acadêmico-científicas pensarem em um maior acesso ao conhecimento científico não se faz a partir da lógica da legitimação da ciência, frente a outros saberes. Pelo contrário…
É válido pensar sobre a criação de condições, na sociedade, em que conceitos técnico científicos sejam pensados e usados (por pesquisadores, docentes e pelos estudantes), “como caixas de ferramentas”, tal como diz Deleuze, em relação às teorias (Foucault e Deleuze, 2002), seja para construir novas histórias ficcionais e pensar em personagens constituídos por narrativas científicas distópicas; seja para que teoria e prática não se dissociem. Isto é, pensarmos, argumentarmos e olharmos para como nossos corpos, nossa vida e sociedade (objetos e fenômenos naturais e sociais) a partir de conhecimentos científicos.
Mas também (e principalmente) aprendendo a utilizar estas ferramentas das “caixas teóricas” como rotina, criando espaços de ruptura, questionamentos. Teorias como entremeios em que seja possível observar, perguntar, dialogar, pensar juntos sobre nós, nossos corpos, nossa humanidade, nossa sociedade. Algo tal como a heterotopia Foucaultiana (Foucault, 2013): um livro aberto cuja propriedade é nos manter fora. O espaço que se abre, mas nunca como definitivo estará (ou nos deixará) no mesmo lugar.